Acórdão nº 00716/11.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução17 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Município de (...) veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 31.08.2018, pela qual foi julgada a presente acção administrativa comum, com forma ordinária, intentada, pela M.E.C.

, S.A.

contra o Recorrente, parcialmente procedente e, em consequência, condenado o Réu a pagar à Autora a quantia de 90.116,62 €, acrescida dos juros de mora, vencidos e vincendos, desde a citação e até efetivo e integral pagamento; condenado o Réu a pagar à Autora a quantia que se vier a apurar em sede de incidente de liquidação de sentença, inerente ao valor dos sobrecustos indirectos fixos mensais suportados em resultado da necessidade de permanência em obra para além do prazo inicialmente previsto e durante o período de suspensão dos trabalhos, não podendo, todavia, exceder o montante de 208.523,80 €, correspondente ao valor do pedido (298.640,42 €) deduzido do valor já atribuído de 90.116,62 €.

Invocou para tanto, em síntese, que os pontos 11º, 20º, 43º, 44º e 46º da matéria de facto dada como provada em 1ª instância devem ser eliminados, que se considere provado o facto constante da alínea f) dos factos dados como não provados em Iª Instância, que se adite a data da colocação do estaleiro; que a indemnização abrange apenas os danos emergentes; que a indemnização do artigo 196º é residual e, como tal, não aplicável; que há duplicação da contabilização dos danos dos dois regimes (suspensão dos trabalhos e maior onerosidade), que se verifica uma não reserva de direitos por parte do Empreiteiro e discorda da relegação para liquidação em execução de sentença de parte dos danos.

A Recorrida, M.E.C.

, S.A., não apresentou contra-alegações.

A M.E.C.

, S.A.

veio também interpor recurso da referida sentença, invocando que os factos dados como não provados de g) a k), devem ser dados como provados e a decisão recorrida deve ser revogada na parte em que relegou para liquidação em execução da sentença inerente ao valor dos sobrecustos indirectos fixos mensais suportados em resultado da necessidade de permanência em obra para além do prazo inicialmente previsto e durante o período de suspensão dos trabalhos e pugnando pela condenação dos juros à taxa comercial e desde a citação relativamente a todo o pedido.

O Município de (...) apresentou contra-alegações, opondo-se ao pedido pela Autora.

O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I.I. - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional interposto pelo Município de (...):

A) A sentença recorrida dá como provado que “Aquando da celebração do referido contrato, a A. tinha a expectativa de que seria possível aceder, nesse momento, à totalidade das parcelas de terreno afetas à empreitada, bem como obter a totalidade dos elementos de projeto em condições temporais adequadas à sua execução, implementando o plano de trabalhos proposto de forma a cumprir o prazo contratual de 550 dias” (cf. ponto 11 da matéria de facto dada como provada).

B) E também considera provado que “verificaram-se problemas de indefinição do projeto de execução, nomeadamente ao nível da implantação altimétrica e da drenagem, que condicionaram os trabalhos de terraplanagens, pavimentações, sinalização e, bem assim, a construção da obra de arte prevista (passagem agrícola)” (cf. ponto 20 da matéria de facto dada como provada).

C) No que se refere ao ponto 11 da matéria de facto confundem-se ainda dois factos relevantes do julgamento da causa: um, relativo à disponibilidade das parcelas de terreno afectas à empreitada e, outro, relativo à obtenção pelo Empreiteiro (em condições temporalmente adequadas) da totalidade dos elementos do projeto e que sai reforçado no ponto 20 da matéria de facto dada como provada.

D) O julgamento da matéria de facto relativamente à disponibilidade da totalidade das parcelas de terreno afectas à empreitada parte de uma proposição do Tribunal a quo que se tem que censurar, pois que, na falta de elementos (constantes das peças do procedimento de contratação prévio) em sentido contrário, o Recorrido Empreiteiro não tinha como saber dos condicionalismos relacionados com os processos expropriativos ainda em curso, o que é uma proposição juridicamente errada porque contraria o regime jurídico aplicável ao procedimento de contratação prévio ao contrato sub iudice.

E) Da prova testemunhal invocada pela sentença recorrida não resulta qualquer diligência por parte do recorrido empreiteiro no sentido de averiguar a disponibilidade das parcelas expropriadas, pelo que a conclusão da sentença recorrida é errada, em primeiro lugar, porque contraria as exigências legais de diligência impostas aos concorrentes dos procedimentos de contratação pública.

F) Cabe aos concorrentes de procedimentos de contratação pública um dever de diligência na verificação e detecção de elementos omissos ou insuficientemente especificados nas peças de procedimento, como o ordenava, designadamente, o n.º 1 do artigo 81.º do REOP, requerendo dos concorrentes que, no primeiro terço do prazo de apresentação de propostas, solicitassem “os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação dos elementos patenteados”.

G) Sucede que o Recorrido Empreiteiro não requereu qualquer esclarecimento a propósito da disponibilidade jurídica dos terrenos em que se desenvolveria a empreitada, antes optando por “após visita ao local dos trabalhos”, pressupor, sem qualquer outro elemento escrito ou outra informação, nomeadamente verbal, a propender no mesmo sentido, que “à data da Consignação, não existirão quaisquer condicionalismos relacionados com a disponibilidade das áreas de trabalho” (cf. pág. 8 da sentença recorrida, ponto 6 da matéria de facto dada como provada).

H) Foi, temerariamente e sem qualquer base fáctica, que o Recorrido Empreiteiro avançou para a apresentação da sua proposta, pois o que é que uma visita ao local – para mais em zona em que não havia efetiva presença de gentes – pode revelar sobre a disponibilidade jurídica das parcelas de terreno em causa? Não pode revelar nada, não revela nada de juridicamente seguro e que não devesse ter suscitado dúvidas a um concorrente minimamente diligente.

I) Por isso, a sentença recorrida, ao arrepio das obrigações legais de diligência que se impõem aos concorrentes em procedimento de contratação pública, deu guarida a tal atitude relevou, ao nível do julgamento da matéria de facto, o que o Recorrido Empreiteiro inscreveu, temerariamente – sem outro elemento de apoio que não fosse uma visita ou local e sem colocar qualquer pedido de esclarecimento a esse respeito – na sua proposta e essa inscrição temerária não pode valer como elemento de prova a ser utilizada para dar como provado o ponto 11 da matéria de facto e a serem dados como não provados os factos inscritos nas alíneas a) a c) da matéria de facto dada como não provada (cf. pág. 25 da sentença recorrida).

J) É absolutamente irrelevante o mencionado na memória descritiva da proposta a respeito da expectativa da inexistência de condicionalismos relacionados com a disponibilidade de áreas de trabalho e a sua assunção, sem qualquer apoio documental ou outro e originada na não colocação de qualquer pedido de esclarecimento, deveria ter sido, quanto muito e como se verá em ponto subsequente, ser relevada para efeitos de aferir da eventual culpa do lesado (admitindo-se, para este efeito e apenas por cautela de patrocínio, que houve efetiva lesão).

K) A proposição de que parte a sentença recorrida é errada, em segundo lugar, porque o mencionado na proposta a propósito das consignações (cf. pág. 8 da sentença recorrida) não tem valor interpretativo e, como tal, não pode valer como elemento de prova determinante da convicção do julgador, como resulta da pág. 27 da sentença recorrida.

L) O valor interpretativo do disposto na proposta é definido no Caderno de Encargos, dispondo-se o seguinte: “

  1. O estabelecido no próprio título contratual prevalecerá sobre o que constar de todos os demais documentos; b) O estabelecido na proposta prevalecerá sobre todos os restantes documentos, salvo naquilo em que tiver sido alterado pelo título contratual” (cf. cláusula 1.3.1. do caderno de encargos).

M) O título contratual integra “as cláusulas do contrato e o estabelecido em todos os documentos que dele fazem parte integrante” [cf. alínea a) da cláusula 1.1.1 do caderno de encargos] e, entre esses documentos, a proposta é, de acordo com o fixado na cláusula 1.1.2. do caderno de encargos, um elemento interpretativo residual, pelo que, antes dessa proposta se perfilam o “caderno de encargos, os restantes elementos patenteados a concurso e mencionados no índice geral, a proposta do empreiteiro”.

N) Consequentemente, é por isso residual – face aos elementos determinantes do contrato (seu clausulado, caderno de encargos, eventuais esclarecimentos – o valor interpretativo de um documento que a sentença recorrida assumiu como determinante para o julgamento dos pontos da matéria de facto determinantes da condenação do Recorrente Município no pagamento de uma indemnização.

O) Em consequência, errou a sentença recorrida ao dar como provado o facto constante do ponto 11 da matéria de facto dada como provada e, o mesmo passo, ao dar como não provados dos factos constantes das alíneas a), b) e c) da matéria de facto dada como não provada (cf. pág. 25 da sentença recorrida), violando, assim, o disposto no artigo 81.º do REOP e cláusula 1.3.1. do caderno de encargos.

P) Por isso, deve ser considerado como não provado o facto 11, invocando-se os depoimentos de L.C.M.

, cujo depoimento se encontra gravado em CD desde os 00:59:49 minutos a 01:30:08 hora e de A.O.S.A.

, cujo depoimento se encontra gravado em CD desde as 02:35:27 horas às 04:08:58 horas...

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