Acórdão nº 00296/19.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução20 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório D. E., Unipessoal, Lda. e Residência (...), Unipessoal, Lda., no âmbito da identificada Intimação para proteção de Direitos Liberdades de Garantias que apresentaram contra o Centro Hospitalar (...), tendente a, “…ser a Requerida intimada a deixar as Requerentes desempenhar a sua atividade comercial e social de acompanhamento dos seus utentes/clientes no Serviço de Urgência e Consulta Externa em qualquer hospital do Centro Hospitalar (...), deixando de impedir os funcionários e representantes das Requerentes de entrar e permanecer livremente nos termos da lei aplicável no serviço de urgência e consultas externas do Centro Hospitalar (...) aquando do exercício do serviço de acompanhamento a doentes no Serviço de Urgência Geral e Consultas Externas...” inconformadas com a Sentença proferida no TAF de Viseu, que em 29 de setembro de 2019, indeferiu o pedido de intimação, vieram em 18 de outubro de 2019 recorrer da mesma para esta instância, concluindo: “1. Em observância da lei e do direito, o Tribunal recorrido devia ter dado provimento à providência de intimação para defesa de direitos, liberdades e garantias.

  1. A douta Sentença, aqui objeto de recurso, padece de erro, designadamente pela incorreta interpretação e aplicação das normas jurídicas face à factualidade pelas recorrentes alegado.

  2. Deste modo, não devia ter sido dado como “apurado” que as recorrentes não apresentaram qualquer documento de autorização para o acompanhamento dos utentes, ou seja, os pontos 9, 11 e 16 dos factos dados como provados.

  3. Uma vez que, resulta exatamente o contrário, atento o facto dado como provado pelo tribunal constante no ponto 17 dos factos provados.

  4. A sentença recorrida enferma assim de insanável nulidade por contradição manifesta entre a decisão e os fundamentos, uma vez que não se pode dar como provado que afinal as recorrentes fizeram a apresentação do documento que legitima o acompanhamento (Cfr. ponto 17 dos factos provados) e depois afirmar na fundamentação que não o apresentaram (Cfr. pág. 14 da sentença).

  5. Além disso, o tribunal recorrido violou o princípio do contraditório e da tutela jurisdicional efetiva, realizando uma autêntica denegação de defesa de direitos, ao escolher os factos dados como provados e não provados sem ouvir as partes e a prova apresentada, estando os factos totalmente controvertidos.

  6. Devia pois, ter sido ordenada uma audiência oral nos termos do disposto no art. 110.º, n.º3, al. c) do CPTA.

  7. No presente caso estão reunidos todos os pressupostos para a utilização da intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, nomeadamente porque está a ser vedado a utilização de um direito fundamental e de se tratar de uma situação urgente.

  8. É necessário, no caso concreto, pelos fundamentos expostos, a emissão de uma decisão de fundo no processo, indispensável para proteção de um direito, liberdade ou garantia, devendo impor-se uma conduta à recorrida que permita às recorrentes exercerem o seu direito, situação que não pode ser decretada por outro meio.

  9. A sentença recorrida, para além de nula por contradição entre os fundamentos e a decisão (art.º 668º, n.º 1, al. c) do C.P.C., não fez a melhor e mais correta interpretação e aplicação ao caso das pertinentes disposições legais, violando assim o disposto nos arts. 12º n.º 1 e 2, 13º n.º 1, 20º n.º 5, 61º e 268.º n.º 4 da CRP, artigos 2º, 7º, 109.º, 110.º, 110º-A, 111.º, 122.º e ss e 131 do CPTA e arts. 1º, 2º, 3º e 12º da Lei 33/2009 de 14 de Julho e ainda a Portaria 67/2012 de 21/03.

Pelo que, no provimento do presente recurso, deve revogar-se Sentença recorrida que foi desfavorável às A.A./Recorrentes, e por via disso, e pelas razões supra invocadas, ser a mesma substituída por outra decisão desse distinto tribunal ad quem que julgue procedente a presente ação, nomeadamente ordenar a produção da prova, com as demais consequências legais, assim resultando mais bem aplicada a lei e realizada a JUSTIÇA.” O aqui Recorrido/Centro Hospitalar veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 13 de novembro de 2019, no qual concluiu: “1) A sentença do tribunal recorrido não merece qualquer censura, uma vez que fez uma correta interpretação e aplicação do direito aplicável à matéria factual apurada e não padece de qualquer um dos vícios assacados pelas recorrentes; 2) Em momento algum as Recorrentes demonstram ter apresentado junto dos serviços de Urgência do CHTV, EPE comprovativo de terem, a seu cuidado, os utentes que queriam acompanhar.

3) Andou bem o tribunal recorrido ao decidir que “como resulta das normas aplicáveis, não existe direito ao acompanhamento irrestrito e submetido a ditames comerciais como os requerentes entendem”.

4) O direito ao acompanhamento é um direito do utente do Serviço Nacional de Saúde, devendo os serviços inseridos no SNS garanti-lo dentro das possibilidades concretas que se apresentam: a. Não pode interferir com a prestação de cuidados de saúde a todos quantos estão doentes naquele serviço; b. Pode ser limitado sempre que a realidade das circunstâncias o determine (como é o caso da exiguidade das instalações do recorrido).

5) Para além disso, qualquer acompanhante está sujeito aos deveres de urbanidade e respeito por todos, devendo a violação desses deveres ditar a saída do mesmo das instalações.

6) Os serviços do Recorrido agiram para com as recorrentes da mesma forma que agem com qualquer acompanhante, não havendo qualquer discriminação como bem decidiu o tribunal recorrido.

7) No ponto 17 dos factos provados, o tribunal a quo dá como provado o teor do aditamento à participação efetuada no dia 13/07/2019.

8) Isto é, que esse auto existe, naqueles termos, e não que os factos aí narrados ocorreram, pelo que não existe qualquer contradição na douta sentença.

9) O art. 110º nº 3 al. c) do CPTA confere ao juiz a faculdade de promover uma audiência oral, sendo alternativa à resposta escrita da entidade requerida, prevista no nº 1 10) O nº 3 tem um campo de aplicação restrito às situações em que se verifique “especial urgência”, que o tribunal a quo entendeu não se verificar.

11) As recorrentes não alegam que a junção do documento se tornou necessária em virtude do julgamento em 1ª instância, sendo certo que, o mesmo retrata novos factos que não são objeto destes autos.

12) Por ser assim, não deve o documento ser admitido sob pena de violação das normas constantes nos arts. 651º e 425º do CPC, aplicáveis ex vi art. 140º nº 3 do CPTA.

Nestes termos, deve o recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a douta sentença proferida.” Devidamente notificado o Ministério Público junto deste Tribunal, em 25 de novembro de 2019, nada veio dizer, requerer ou promover.

Com dispensa de vistos prévios (art.º 36º, nº 2, do CPTA), cumpre decidir.

II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelas Recorrentes, onde se suscita, designadamente, que por parte do Centro Hospitalar, terá sido violado o Artº 12º nº 1 da Lei nº 33/2009, ao ser, alegadamente, vedado o direito ao acompanhamento dos doentes aí internados, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada: “1) A primeira Requerente é uma sociedade comercial, com sede no Terreiro (...) e tem como objeto social a atividade de construção civil e obras públicas. Compra, venda e revenda de imóveis e dos adquiridos para esse fim. Promoção imobiliária e administração de imóveis; Atividades de angariação e avaliação imobiliária; Atividades de imóveis por conta de outrem; Arrendamento e alojamento turístico; Gestão de arrendamento; Administração de condomínios; Atividades de arquitetura, de engenharia, de técnicas afins; Atividades de Consultadoria; Serviços médicos, designadamente atividades de prática clínica em ambulatório e com internamento, de medicina dentária e odontologia, laboratórios de análises clínicas, enfermagem, serviços de ambulância, centro de recolha e banco de órgãos; Atividades dos estabelecimentos de cuidados continuados integrados, com alojamento; Atividades de apoio social para pessoas idosas com deficiência, com e sem alojamento. Atividades de apoio social com alojamento para crianças e jovens. Atividades de cuidados para crianças, sem alojamento. Comércio a retalho de material ótico (Cfr. p.f. código de acesso à Certidão Permanente 8812-0328-5278).

2) No âmbito da sua atividade e na prossecução do seu fim social a Requerente realiza serviços de acompanhamento social hospitalar de utentes/idosos de diversas instituições/lares aderentes a este serviço.

3) A segunda Requerente é um Centro de Dia e Casa de Repouso (Cfr. p.f. código de acesso à Certidão Permanente (…).

4) No passado dia 11/07/2019, de manhã, o Sr. G.A.A.C., acompanhava um utente do lar, Residência Rural de Repouso de (...).

5) Sucede que, na zona de triagem do serviço de urgência do hospital (...), foi abordado pelo Enfermeiro Chefe J. G., e informado “que da próxima vez que o visse naquele serviço o impediria de entrar, segundo ordens do Conselho de Administração do Hospital”.

6) Tendo o Sr. G. C. respondido que faz serviço de acompanhamento há vários anos e nunca lhe aconteceu tal situação.

7) Nesta sequência e nesse mesmo dia (11/07/2019), já no período da tarde, o mesmo Sr. G. C., encontrava-se no interior das urgências do Hospital S. Teotónio de V…, junto de um idoso, a realizar o acompanhamento do mesmo (para substituir a auxiliar que acompanhava o utente desde as 12:37 horas), que provinha do Lar Centro...

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