Acórdão nº 01846/19.1BEPRT-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução20 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO CMPH-D. S. – EMPRESA DE H. M. DO MUNICIPIO DO P…, E.M., com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datado de 13.09.2019, promanado no âmbito da presente Ação Administrativa Urgente de Contencioso Pré-Contratual intentada por ABB – A. B. B., S.A., contra a aqui Recorrente, que indeferiu o seu pedido de levantamento suspensivo decorrente do artigo 103º-A do C.P.T.A.

Em alegações, a Recorrente formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) A.

O presente recurso tem por objeto a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de indeferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático relativamente ao contrato de empreitada sub iudice, que consiste na execução de trabalhos que visam a conclusão de um projeto de reabilitação global de um bairro social na cidade do Porto que, a ser adiado - como resulta da decisão recorrida conduzirá à manutenção, durante largos meses ou anos, de um espaço público degradado (em virtude, além do mais, da execução das obras que consistiam na primeira fase do projeto) e de um verdadeiro estaleiro a céu aberto.

B.

Esse espaço público, em vez de ser devolvido aos habitantes do bairro - que dele foram privados inicialmente pela existência de construções clandestinas e degradação de estruturas e, mais recentemente, pelo resultado da realização da primeira fase das obras de Requalificação do Bairro - manter-se-á sem possibilidade de ser fruído por pessoas que já são socialmente desfavorecidas, agravando as suas dificuldades de inclusão social e desenvolvimento pessoal.

C.

A isso juntam-se os efeitos sobre as infraestruturas básicas existentes e que estão em avançado estado de degradação e que, já tendo sido substituídas nos edifícios reabilitados, têm as ligações ao espaço público dependentes da execução da empreitada sub iudice.

D.

A Sentença recorrida julga erradamente vários aspetos relacionados com a matéria de facto, a saber: (i) Erro quanto ao juízo e valoração dos elementos de prova presentes nos autos, que deveriam ter servido para dar como provados os elementos de facto necessários ao levantamento do efeito suspensivo; (") Erro quanto à fundamentação crítica e análise que levou à decisão sobre a matéria de facto considerada como não provada; (iii) Erro de facto da matéria dada como provada.

E. Erra o Tribunal a quo ao considerar faltar prova de que a empreitada em causa nos autos (...) se encontra estritamente ligada à reabilitação do próprio Bairro" (cfr. Sentença, página 14, 3º parágrafo), isto quando isso é um facto notório e está implícito em um dos factos que foi dado como provado pelo Tribunal, concretamente o primeiro do qual resulta que "por anúncio publicado, na 2º Série do Diário da República, foi dada publicidade ao concurso para execução da empreitada de "ARRANJOS EXTERIORES DO BAIRRO (...), BLOCOS 1 A 9" (sublinhado nosso) (cfr. Sentença, página 5, 2º parágrafo).

F.

Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, a ora Recorrente não se limitou a alegações genérica ou conclusivas; nos artigos 27º, 33º, 34º, 36º e 51º a 54º do requerimento para o levantamento do efeito suspensivo são referenciados vários documentos juntos com o mesmo requerimento - que não são sequer referenciados na sentença recorrida -, pelo que não corresponde à verdade que não tenha sido junta a competente prova dos elementos de facto que sustentam o pedido de levantamento do efeito suspensivo.

G.

A decisão recorrida é, particularmente, omissa quanto às fotografias juntas aos autos, não existindo qualquer referência ou apreciação das mesmas, sequer para desconsiderar a realidade que visam atestar.

H.

Assim, afigura-se errada a apreciação da prova junta que deveria, ao contrário do decidido, ter sido suficiente para provar o seguinte: (i) A urgência da intervenção no bairro social, designadamente, devido à implementação de várias construções clandestinas ao nível dos pisos térreos e de apropriações indevidas, quer em espaços verdes como em vedações - facto que deveria ter sido considerado provado por força de documento reprográfico que constava do requerimento apresentado, sob a designação "Imagem 1".

(ii) A necessidade de criar espaços de estacionamento que respondam às reais necessidades dos moradores, uma vez que o atual estacionamento é feito através de uma utilização indevida dos passeios, o que impossibilita o trânsito por parte dos peões, em particular pessoas com mobilidade reduzida ou pessoas com deficiência (Imagem 2)" - facto que deveria ter sido considerado provado por força de documento reprográfico que constava do requerimento apresentado, sob a designação "Imagem 2".

(iii) A suspensão da presente empreitada terá um forte e grave impacto na sustentabilidade económica da empresa, entidade adjudicante - facto que deveria ter sido considerado provado por força de documento n.º 3 junto aos autos.

(iv) A empreitada encontrava-se organizada por fases, tendo a primeira comportado a demolição de áreas de génese ilegal, conforme consta do facto 3 considerado provado e do artigo 5º, nº 2 do PC e alegado no artigo 33º do requerimento.

(v) Segundo as regras de experiência, e fazendo recurso de parâmetros lógicos, deste facto resultam duas ilações notórias que se passam a descrever e que deveriam ter sido consideradas pelo Tribunal: a) a demolição destas edificações comportou o sacrifício pessoal e patrimonial dos moradores do bairro.

b) a demolição de tais edificações implicou a construção de estaleiros de obras, a destruição de passeios, muros e vedações e a acumulação de resíduos e lixos que permanecerão no local até ao retomar dos trabalhos.

A suspensão da reabilitação implica a contínua degradação de todas as infraestruturas de ligação públicas que se encontram em mau estado de conservação e que permitem o abastecimento de gás, eletricidade, telecomunicações e iluminação às habitações - facto alegado no artigo 25.9 do requerimento e provado através de documento n.9 1 junto em requerimento autónomo posterior.

(vii) A suspensão do processo terá um impacto desproporcionado na capacidade financeira da empresa - facto alegado no artigo 52º do Requerimento e provado através dos documentos n.ºs 2 e 3 juntos aos autos.

(viii) A suspensão do processo implica a perda de verbas públicas, que se encontravam destinadas ao exercício desta atividade - facto alegado nos artigos 53º e 54º do Requerimento e provado através dos documentos n.ºs 1, 2 e 3 juntos aos autos.

Assim e com o devido respeito, o Tribunal errou ao não considerar como pontos de facto provados os factos que se acabam de descrever.

I.

O próprio Tribunal a quo permite-se, a este propósito, dizer uma coisa e o seu contrário já que, embora afirme que (a) "resulta do probatório (...) [que da empreitada resultam], trabalhos de indiscutível importância para o bem-estar de todos quantos habitam no referido Bairro." (cfr. página 13 da sentença, 1º parágrafo); (b) "Não há, pois, qualquer dúvida quanto à necessidade de execução dos trabalhos que foram objeto do concurso bem assim como faz implicações que decorreram da suspensão do ato de adjudicação do concurso à ora contra-interessada, implicações também a nível da programação da atividade da Ré que resultam da suspensão dos efeitos do contrato, tal como vem alegado'', (cfr. página 13 da sentença, 2º parágrafo); e ainda que (c) “ (...) é certo que a suspensão do ato de adjudicação tem consequências negativas para o interesse público que a R. defende, desde logo, impedido o prosseguimento do procedimento programado e devidamente iniciado (...)" (cfr. página 14 da sentença, 1º parágrafo).

Apesar da convicção resultante das passagens transcritas esta não se reflete minimamente nos factos considerados provados.

Os factos considerados provados, com exceção dos factos 7 e 8, relacionam-se com matéria a ser discutida na ação principal, o que revela por si só uma ausência de fundamentação crítica quanto à matéria de facto trazida para o presente incidente.

Deste modo, não só errou o Tribunal na apreciação dos elementos juntos ao processo, como também incorreu em erro quanto ao juízo e valoração dos elementos de prova presentes nos autos, quanto à fundamentação crítica e análise que levou à decisão sobre a matéria...

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