Acórdão nº 00906/12.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Apar |
Data da Resolução | 13 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO S. A. M. e A. M. M. T. instauraram acção administrativa especial contra o Ministério da Administração Interna, todos melhor identificados nos autos, visando reagir contra o acto administrativo da autoria do Director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que decidiu pela sua demissão.
Por acórdão proferido pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção.
Deste vem interposto recurso.
Alegando, Aqueles formularam as seguintes conclusões: a) Os AA. foram alvo do processo disciplinar comum com o número 050/GI/2009; b) Por conseguinte, os AA. apresentaram a sua defesa no referido processo disciplinar, juntando prova e indicando as suas testemunhas; c) O Instrutor do processo disciplinar decidiu, com base no art. 53°, n.° 3 da Lei 58/2008 de 9 de Setembro, pela dispensa da inquirição das testemunhas arroladas pelos AA.; d) Das testemunhas indicadas, algumas já haviam sido inquiridas em sede do processo-crime, mas, por outro lado, haviam testemunhas que não tinham prestado depoimento naquele processo-crime; e) A dispensa das testemunhas que ainda não tinham prestado depoimento, com base no citado n.° 3 do art. 53° da Lei 58/2008 de 09 de Setembro, só pode ocorrer quando se considere suficientemente provados os factos alegados pelos AA.; f) In casu, não obstante o Instrutor conhecer o referido normativo, este dispensou as testemunhas arroladas pelos AA., mas, CONTRA LEGEM não considerou como provados os factos alegados por estes na sua defesa, ou seja, estamos perante uma INCONSTITUCIONALIDADE; g) O processo disciplinar é completamente autónomo do processo-crime, pelo que, a prova apresentada naquele pode consubstanciar uma decisão distinta da sentença obtida em sede do processo-crime; h) Tal como supra se demonstrou, atento aos factos sobre Elizabeth Lima, é possível que no processo disciplinar se demonstre que factos tidos como provados no processo-crime não o deveriam ter sido; i) Do processo disciplinar constam determinados factos considerados como provados que, em sede do processo-crime, não tiveram a mesma consideração; j) O indeferimento de diligências probatórias requeridas pelos AA., nomeadamente a inquirição de testemunhas e quando tal prejudique a descoberta da verdade material, constitui uma violação do direito da defesa dos AA., o que torna nulo o processo disciplinar, por inconstitucionalidade; k) O indeferimento da inquirição das testemunhas arroladas, sem qualquer sombra de dúvidas, prejudica a descoberta da verdade material, bem como obsta ao exercício do contraditório, violando assim um direito constitucionalmente garantido; I) O depoimento das testemunhas dispensadas, no nosso modesto entendimento, poderia levar ao arquivamento do processo disciplinar, tanto que, a dispensa consubstancia a prova dos factos alegados pelos AA.; DESTA FORMA, Salvo o devido respeito, das presentes conclusões e da análise do argumentário do presente resultará, salvo devida opinião em contrário, a natural absolvição dos AA. ora em recurso, o que se requer e roga, em anulação do acórdão, ora em crise, fazendo-se JUSTIÇA, considerando-se assim o acto administrativo como nulo.
O Réu ofereceu contra-alegações, concluindo: 24° Os Recorrentes vêm impugnar a sentença do Tribunal a quo com fundamento em erro de julgamento.
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Os Recorrentes limitam-se a apresentar o respectivo entendimento jurídico contrário a toda a fundamentação jurídica proferida na sentença do Tribunal a quo, sendo certo que não controverte a matéria de facto levada a probatório.
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Sustentam os Recorrentes que a rejeição de inquirição de testemunhas arroladas, por parte do Instrutor do processo disciplinar, determina a nulidade do procedimento sancionatório na medida em que coarcta o direito de defesa dos Requerentes, consubstanciando uma inconstitucionalidade.
Não lhes assiste razão.
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O Instrutor do processo disciplinar sustentou a sua decisão de rejeição de inquirição de testemunhas arroladas pelos Recorrentes no facto de as mesmas (pelo menos a sua maioria) terem sido já inquiridas em sede de processo crime, bem como ao facto de os factos sobre que iria incidir o seu testemunho estarem já plenamente comprovados.
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Não obstante o processo disciplinar ser autónomo do processo crime, sendo distintas as valorações em cada um deles se possa fazer dos mesmos factos e circunstâncias, o entendimento da jurisprudência e da doutrina vai no sentido de que a decisão disciplinar está obrigada a atender aos factos que a decisão penal, transitada em julgado, considerou provados.
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Os ilícitos com relevância criminal pelos quais os Recorrentes foram condenados em processo crime, têm exacta correspondência com a violação dos deveres gerais e especiais de conduta que impendem sobre os agentes da Administração Pública em geral e sobre os funcionários da carreira de investigação da Entidade Recorrida, em particular. Há uma perfeita sintonia quanto à violação dos valores éticos, morais e sociais, cuja defesa cumpre salvaguardar criminal e disciplinarmente.
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Verificando-se coincidência de violações (criminais e disciplinares), não tendo sido imputáveis aos ora Recorrentes, na acusação em sede de procedimento disciplinar, quaisquer outros factos novos constitui dever do Instrutor aproveitar a prova que sobre os mesmos factos foi produzida e considerada provada em Tribunal (processo crime com sentença transitada em julgado), beneficiando com isso a decisão final do processo disciplinar.
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Neste âmbito, a condenação dos ora Recorrentes em processo criminal por determinados factos, não pode deixar de implicar a prova desses mesmos factos em processo disciplinar.
Acresce que a prova coligida no âmbito do processo disciplinar legitima uma convicção segura da materialidade dos factos imputados e do circunstancialismo que rodeou a prática da infracção imputada aos Recorrentes.
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Deve a decisão disciplinar ser considerada válida e tomada em conformidade com o ordenamento jurídico, não enfermando de qualquer vício de facto ou de direito (mormente de inconstitucionalidade, como invocado pelos Recorrentes).
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Em sede de recurso jurisdicional vêm os Recorrentes juntar aos autos documentos com vista a colocar em causa o mérito da decisão proferida.
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Documentação essa que em nosso entender deve ser rejeitada, pois os factos que os Recorrentes pretendem demonstrar com os documentos em causa terão ocorrido em 2004-2006, antes mesmo da entrada em juízo da acção administrativa, não tendo sido justificadas, por outro lado, as razões de só agora fazer tal junção aos autos, na medida em que à data da entrada da acção em juízo os mesmos já estariam disponíveis e seriam do seu conhecimento.
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Não obstante, a documentação agora junta aos autos é manifestamente irrelevante para a descoberta da verdade material, sendo que nem a decisão disciplinar nem a sentença do tribunal a quo sustentaram as suas decisões nesse facto.
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O que esteve em causa e em análise no procedimento disciplinar foi a violação dos deveres gerais e especiais dos ora Recorrentes, enquanto funcionários da carreira de investigação da Entidade Recorrida.
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A factualidade sobre a qual incidiu a decisão disciplinar e, posteriormente, foi proferida sentença judicial é diversa e bastante mais ampla (factualidade que ficou determinada em sede própria sem que tenha sido posta em causa).
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Reitere-se que os Recorrentes não se insurgem, nem põem em causa a factualidade dada como assente, quer em sede de procedimento disciplinar, quer já em sede contenciosa. Pelo contrário, aceitam-na fazendo um raciocínio diverso daquele que foi elaborado pela ora Entidade Recorrida e pelo Tribunal a quo.
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Acompanhamos a sentença do Tribunal a quo que procedeu a um correcto enquadramento dos factos relevantes para a decisão a proferir, não estando a mesma inquinada de nulidade. Antes pelo contrário, a sentença fez um preciso enquadramento jurídico-legal da questão em litígio nos presentes autos.
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O Tribunal a quo procedeu a um correcto enquadramento dos factos relevantes para a decisão a proferir, não existindo qualquer erro de facto que deva ser corrigido ou omissão que deva ser colmatada, sendo a factualidade assente na sentença suficiente para alicerçar a respectiva fundamentação de facto.
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Não enferma a sentença recorrida de vício que acarrete a nulidade da mesma. Antes pelo contrário, a sentença recorrida subsumiu correctamente os factos ao direito aplicável, 42° Urge, pois, concluir que a sentença recorrida não enferma de quaisquer vícios ou erros de julgamento, mostrando-se inteiramente válida e legal.
Nestes termos, deverá ser negado provimento ao presente recurso, fazendo-se JUSTIÇA O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1. Em 28.09.2007, deu entrada no Gabinete do Director-Geral do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o ofício da Direcção Regional do Norte, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, com a referência NRA/DRN – 4048 – 26.09.2007, dirigido à Direcção Regional do Norte do S.E.F., remetendo o oficio do 3.º Juízo do Tribunal de Instrução Criminal do Porto, datado de 14.09.2007, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e de onde se extrai o seguinte: “Informo V. Ex.ª, que, por despacho proferido nos autos acima identificados, os arguidos A. M. M. T.
e S. A. M.
ficaram com a seguinte medida de coacção: Suspensão do exercício das suas funções na D.R.N: - Serviço de Estrangeiros e Fronteiras do Porto e ainda sujeitos à proibição de contactos com a co-arguida Josiane dos Santos Dantas e outros cidadãos estrangeiros que os arguidos relacionem com os factos investigados nestes autos, conforme cópia do despacho que se junta” (cfr. fls. 2 e 3, do processo administrativo); 2. Por despacho do Coordenador do Gabinete...
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