Acórdão nº 01642/06.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução13 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO 1-M., LDA, instaurou ação administrativa especial contra o MUNICÍPIO DE (...), visando obter: (i) a declaração de inexistência jurídica do despacho de 2 de abril de 2001, da autoria do Vereador do Urbanismo da CMVNG proferido ao abrigo da delegação de competências; (ii) a declaração de nulidade do despacho de 18 de dezembro de 2000 da autoria do Presidente da Câmara Municipal, que por sua vez declarou a nulidade de anterior despacho proferido pelo Presidente de Câmara em 10 de abril de 1997 que aprovou o projeto de arquitetura no âmbito do processo de licenciamento de obras particulares nº 19/97, averbado em nome da autora, com fundamento no facto do terreno aedificandi constituir uma parcela autónoma, perfeitamente individualizada da área sobrante do prédio e com área inferior à exigida pelo art.º 37.ºdo Regulamento do PDM, ou seja, inferior a 10.000 m2 para nela ser edificada a construção pretendida; (iii) a declaração de nulidade consequencial dos atos consubstanciados: a) no despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...) proferido em 5 de abril de 2006 que ordenou a demolição, a realizar no prazo de trinta dias, de todas as construções ilegais existentes no prédio sito no ângulo da EN 222 com a Rua da (...), levadas a efeito sem licenciamento municipal, em violação do disposto no art. 4º do DL 555/99, de 16 de dezembro, com a redação dada pelo DL 177/01, de 04 de junho, em cumprimento do disposto no nº1 do artigo 106º do citado diploma legal; b)no despacho desta última data, constante da comunicação junta sob doc. nº 1, dos 3º e 4º requeridos, que ordenou que a autora procedesse a tal demolição no prazo de trinta dias contados da referida notificação, sob pena de serem iniciados os procedimentos tendentes à demolição coerciva, com custos a cargo da aqui autora, nos termos do nº 4 do art. 106º e 107º e ss do supra referido diploma legal; (iv) para o caso de assim se não entender, a anulação dos referidos atos com fundamento em vício de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de facto; (vi) por efeito da declaração de inexistência jurídica do primeiro dos atos impugnados e da nulidade que lhe é cominada por lei, que seja declarado válido o ato que por ele foi declarado nulo, ordenando-se o prosseguimento do procedimento administrativo de licenciamento.

2-Para fundamentar a sua pretensão, alegou, em síntese, que iniciou a construção de uma moradia unifamiliar, num terreno que constitui um prédio com a área de 33.660 m2, cujo licenciamento e projeto de arquitetura foi aprovado em 10.04.1997, mas anulado com fundamento na existência de mais duas casas de habitação nesse terreno e na circunstância da área destinada à implantação da construção ser inferior à permitida para construção pelo PDM naquela zona, o que não corresponde à realidade.

3-Assim, o despacho que declarou nulo o licenciamento, em 02.04.2001 é nulo e inexistente, porque definiu o direito de propriedade em termos diversos do registo predial, função que apenas cabe ao Tribunal, tendo a entidade demandada agido em manifesta usurpação de poderes.

4-Mais alegou que em conformidade com o art.º 37.º, al. a) do PDM de VNG, em prédio com 10.000 m2 inserido em área não urbana de transformação condicionada, é conferida a faculdade de edificar uma moradia destinada a habitação, sendo o ato impugnado nulo por restringir o conteúdo do direito, fundamental, de propriedade da autora, como são nulos todos os demais atos consequenciais; 5-Que os referidos atos violam o art.º 37.º, al. a) do PDM, sendo nulos, e que a demolição ordenada assenta em pressupostos de facto inexatos, pelo que sendo a demolição a ultima ratio ( art. 106º do RJUE) nada impede que, a existir necessidade de alteração ou correção ao projeto ela se faça, salientando que, o PDM se encontra(va) em fase de conclusão estando o prédio em causa proposto para integrar o perímetro urbano, inexistindo obstáculos do interesse público opostos à manutenção de tal edificação.

6-O Réu apresentou contestação defendendo-se por exceção e por impugnação.

7-Invocou a exceção da sua ilegitimidade passiva, a inimpugnabilidade do ato de 5.04.2006 e a extemporaneidade da ação.

8-Impugnou, sustentando, em síntese, a validade dos atos em crise, invocando que para efeitos urbanísticos importa a realidade de facto e não a realidade constante no registo predial, conquanto o registo predial tem por finalidade dar publicidade à situação jurídica dos prédios e não definir os seus elementos, não se verificando nenhuma violação do direito de propriedade da Autora, que não comporta, de forma automática, o direito de construir. Mais alegou, que no prédio da autora já se encontra concluída a construção, com escritórios e um stand de automóveis, quando para essa área o PDM apenas permite construção para habitação. Conclui pela improcedência da ação.

9-Notificou-se a autora para responder, querendo, às exceções invocadas pelo Réu, o que fez, sustentado a sua improcedência.

10-Por despacho saneador de fls. 107 a 112 dos autos, julgaram-se improcedentes as exceções invocadas.

11-Notificaram-se as partes para apresentar alegações (artigo 91º nº 4 CPTA), tendo apenas o Réu usado dessa faculdade.

12-Por acórdão de 26 de abril de 2012, o tribunal a quo julgou a presente ação totalmente improcedente, por não provada, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: «Pelo exposto, acordam os Juízes que compõem o presente Tribunal Coletivo em julgar a presente ação administrativa especial totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se o Réu dos pedidos. Custas pela Autora – artigo 446º CPC ex vi artigo 1º do CPTA. Registe e Notifique».

13-Inconformada com decisão, a Autora veio dela interpor recurso de apelação para este Tribunal Central Administrativo do Norte, formulando as seguintes conclusões: «Quanto aos fundamentos de facto * Uma nulidade da sentença 1. A decisão recorrida, conforme resulta do seu expresso teor, julgou provados 18 factos e declarou que não existiam factos não provados; lidos os factos provados, constata-se facilmente que de tal elenco não constam todos os factos alegados pela recorrente.

  1. Se não há factos não provados, tem que se concluir que todos os factos se encontram provados; mas se dos factos provados não constam todos os factos alegados, então a sentença, quanto à decisão de facto, incorre em manifesta contradição entre os fundamentos e a decisão, sendo nula (cfr. art.º668º, nº 1, alínea c) do CPC), invalidade processual que expressamente se invoca.

    * Outra nulidade da sentença 3. Objetivamente, a decisão recorrida não se pronunciou quanto aos factos alegados pela aqui recorrente nos artigos 18º, 19º, 20º, 21º (factos todos esses de relevo idêntico ao consagrado no nº 12 dos “provados “ da sentença que, por sua vez, foi pela recorrente alegado no artigo 17º da sua PI), 38º, 39º e 75º da Petição Inicial; 4. Tal omissão de pronúncia importa da mesma forma a nulidade da sentença (cfr. art.º 668º, nº 1, al. d) do CPC), invalidade processual que expressamente se invoca.

    Quanto à impugnação da decisão proferida quanto á matéria de facto: 5. Por acordo e por documentos tem que se considerar provado também que: * Não existem no prédio a que se refere o facto 12 dos provados, quaisquer construções, maxime habitações, sendo o mesmo constituído simplesmente e na sua totalidade, por terreno lavradio e terra a mato (factos de 18º e 19º da PI, não impugnados pela entidade recorrida -cfr. art.ºs 52º e 53º da contestação - e que resultam também dos documentos nºs 1 e 3 juntos à PI); * do processo de licenciamento em causa não constava nem até hoje consta identificada qualquer habitação anterior à aqui em causa, que não existe (factos de 20º e 21º da PI que resultam assentes do cotejo desse mesmo processo de licenciamento, anexado pela entidade recorrida aos autos); 6. Constam do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão e tais elementos impõem a modificação da matéria de facto de forma a serem nela integrados, como factos provados, os que vêm de se referir, alegados pela recorrente nos artigos 18º, 19º, 20º, 21º, 38º e 75º da Petição inicial (art.º 712º, nº 1, als. a), 1ª parte e b) do CPC) Quanto aos fundamentos de direito * Quanto à usurpação de poder 7. A controvérsia não resulta de a entidade recorrida entender que o prédio tem área diversa da constante do registo predial, pois não entende.

  2. O que ela faz é outra coisa: com base na inexatidão de outros elementos da descrição predial (desde logo por ali não estarem refletidas as vias públicas que atravessam esse prédio) conclui que o titular do direito de propriedade tem dois prédios distintos, provocados pelo atravessamento por tais vias públicas, tendo este (o prédio que aqui importa), área inferior a dez mil metros quadrados.

  3. Os recorridos nem por um momento duvidam que o titular do direito de propriedade tem uma área superior a trinta mil metros quadrados e que, se desconsideradas as vias que o atravessam, essa área constituiria um único prédio; o que eles decidiram é que não se tratava mais do mesmo prédio, porque existem vias públicas que o atravessam e que, na sua perspetiva, individualizam juridicamente cada uma das partes que de tal atravessamento resultaram.

  4. O Vereador do Pelouro do Urbanismo não podia determinar de forma diversa o direito de propriedade do recorrente do licenciamento, designadamente atribuindo autonomia ou individualização jurídica a parte do objeto de tal direito, dessa forma definindo dois objetos perfeitamente distintos e dois distintos direitos de propriedade na esfera jurídica de tal recorrente, incidindo cada qual sobre objeto diverso: um sobre a parcela autónoma e outro sobre a área sobrante.

  5. Não é da competência de nenhum dos recorridos e, designadamente, do Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de (...) e dos órgãos...

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