Acórdão nº 00678/10.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução29 de Novembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO ACOP-Associação de Consumidores de Portugal instaurou acção administrativa especial contra V.-Empresa de Águas e Saneamento de G... e V..., E.I.M.S.A (posteriormente foram admitidos, como intervenientes, os Municípios de G... e V...), todos melhor identificados nos autos, pedindo, fundamentalmente, a (…) declaração de ilegalidade da alínea c) do nº 1 do artigo 30º do Regulamento dos Sistemas Públicos de Distribuição de Água e de Drenagem de Águas Residuais dos concelhos de G... e V..., publicado no D.R., 2ª série, nº 170, de 04/09/2007, por falta de adequado suporte legal e violação dos artigos 282º e segs. do Dec. Reg. 23/95, de 23/08.

Deduziu outros pedidos, todos dependentes da conclusão que se venha a extrair da ilegalidade da sobredita norma.

Por acórdão proferido pelo TAF de Braga foi julgada parcialmente procedente a acção e condenada a Ré V.: -a abster-se de proceder à cobrança de quantias relativas à instalação/ligação aos respectivos ramais de ligação aos consumidores das Freguesias de S... e G...; -a restituir as somas cobradas a esse título aos consumidores das Freguesias de S... e G...; -julgados improcedentes os demais pedidos.

Deste vêm interpostos recursos: Alegando, a Ré V.

concluiu: INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DESTE TRIBUNAL 1º Em 10 de Abril de 2013, o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sobre a questão colocada, em sede de reenvio prejudicial, pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferiu acórdão (o qual se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido), com o seguinte sumário: “No domínio de vigência da Lei das Finanças Locais de 2007 (Lei nº 2/2007, de 15 de Janeiro) e do D.L. nº 194/2009, de 20 de Agosto, cabe na competência dos tribunais tributários a apreciação de litígios emergentes da cobrança coerciva de dívidas a uma empresa municipal provenientes de abastecimento público de águas, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos, uma vez que, o termo “preços” utilizado naquela Lei equivale ao conceito de “tarifas” usado nas anteriores Leis de Finanças Locais e a que a doutrina e jurisprudência reconheciam a natureza de taxas, pelo que podem tais dividas ser coercivamente cobradas em processo de execução fiscal.

  1. Na presente acção está em causa a cobrança e o pagamento/não pagamento, por parte dos utentes/beneficiários, do “preço”, taxa” ou “tarifa” relativo à instalação de ramais de ligação domésticos quer de abastecimento de água, quer de saneamento, pelo que a causa de pedir e os pedidos enquadram-se no domínio de uma relação jurídica fiscal.

  2. Assim, este tribunal carece de competência em razão da matéria para o julgamento do litigio “sub judice” já que a cobrança do custo dos ramais domiciliários de água e saneamento é uma questão fiscal para a qual é competente o tribunal tributário, conforme resulta do referido acórdão do Pleno do STA e ainda dos artigos 13º do CPTA; 101º a 103º, 493º nº2, 494º, alínea a) e 495º, do CPC, e art. 49º, nº1, al. c) do ETAF.

  3. A infracção das regras de competência em razão da matéria determina a incompetência absoluta do tribunal (art. 101º nº2, do C.P.C.).

  4. A incompetência absoluta do tribunal pode ser arguida pelas partes e deve ser suscitada oficiosamente pelo tribunal em qualquer estado do processo, enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa (art. 102º nº 1, do C.P.C.), situação que aqui se verifica.

  5. Conforme prescreve o art. 13º do CPTA, com o título “Conhecimento da competência e do âmbito da jurisdição”: “O âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria”.

  6. Acresce que, conforme é jurisprudência firmada, a declaração genérica ou tabelar no despacho saneador sobre a competência do tribunal (como foi feita neste processo), não faz caso julgado formal, não estando impedido o julgador administrativo, à luz do que se dispõe nos art.ºs 13º do CPTA, 102º nº 1, 510º nº 3 e 666º do CPC, de vir a suscitar e a declarar o tribunal incompetente.

  7. Sendo a incompetência material uma incompetência absoluta do Tribunal (cfr. art. 101º do C.P.C.), tal situação constitui uma excepção dilatória (art. 494º, al. a), do C.P.C.) conduzente à absolvição da Ré da instância (art. 288º nº1 al. a) e art. 493º nº2, do C.P.C.).

    II SINDICABILIDADE DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO CONSTANTE DA SENTENÇA/ACORDÂO RECORRIDO 9º Foi fixada na matéria de facto um ofício do extinto IRAR- Instituto Regulador de Águas e Resíduos, com o nº 000575/2007, de 7 de Fevereiro de 2007, que a Autora juntou com a sua acção, e que versa sobre uma situação particular, a reclamação à facturação de ramais de ligação na freguesia da Marinha das Ondas (Figueira da Foz), e não foi considerado o parecer que a Ré juntou aos autos nas suas primeiras alegações de recurso (em 1/06/2011) da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, I.P. actualmente com a designação de ERSAR, emitido em 2011-05-20, sobre o assunto “tarifas de ramal de ligação”, de carácter geral e abstracto, o qual contém o entendimento actual e perfilhado pela entidade reguladora do sector sobre a matéria em causa nesta acção.

  8. Dada a relevância e importância deste parecer devia o mesmo fazer parte da base factual fixada na douta sentença/acordão recorrido, sendo certo que é sobre a matéria de facto considerada provada que é formulado o juízo de direito.

    Impõe-se, assim, o aditamento de um novo facto, que passaria a ter o nº 6, com o seguinte conteúdo: “Pela Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos, I.P. actualmente com a designação de ERSAR, foi emitido em 2011-05-20, um parecer sobre o assunto “tarifas de ramal de ligação”, do qual designadamente consta que a responsabilidade pelo pagamento dos custos de construção dos ramais de ligação é dos respectivos utilizadores e que a entidades gestoras podem repercutir esses custos através de tarifas especificas aplicadas por ocasião da construção dos ramais de ligação – conforme documento de fls. dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.” III- NULIDADES DA SENTENÇA 11º Por outro lado, e, com todo o respeito, a douta sentença padece das nulidades estatuídas no art. 668º, nº1, al.s b) e c) do C.P.C.

    ex vi art. 1º do CPTA, porque não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão e porque os fundamentos da sentença estão em manifesta oposição e contradição com a decisão.

  9. Na sentença/acórdão recorrido considerou-se que o art. 30º nº1 al. c) do Regulamento dos Sistemas Públicos e Prediais (…) de G... e V...

    não é ilegal, ao prever que o custeamento de tal operação (construção do ramal de ligação) deve ser suportado pelo respectivo utente, no entanto tal custeamento não poderá ser feito cobrando directamente dos utentes as quantias, conforme vem sucedendo, e condenou a V. a abster-se de proceder à cobrança das quantias relativas à instalação/ligação aos respectivos ramais de ligação aos consumidores das freguesias de S... e G... e ainda condenou-a a restituir-lhes as quantias já cobradas a esse título.

  10. Esta norma regulamentar prevê a responsabilidade do utilizador pagar o respectivo ramal de ligação e a faculdade da V. lhe exigir tal pagamento e é ao abrigo desta e doutras normas, legais e regulamentares, que a V. vem cobrando dos utilizadores tais custos.

  11. Ora, se a norma do art. 30º do Regulamento não é ilegal fica-se sem saber, porque a sentença não o diz, por que razão a Ré V. não pode fazer a cobrança da forma como vem fazendo e qual a disposição legal que está a infringir ao actuar da forma como actua.

  12. Não basta dizer-se que a V. não pode cobrar directamente dos utentes as quantias correspondentes aos ramais domiciliários, é necessário que se fundamente de facto e de direito as razões porque o não pode fazer.

  13. Se a norma regulamentar ao abrigo da qual a Ré vem fazendo a cobrança de ramais domiciliários não é considerada ilegal, nem outras o foram, qual é então a norma jurídica que está a violar para não poder proceder à cobrança? A decisão recorrida não o diz.

  14. Ora, para a Ré ser condenada a abster-se de proceder à cobrança das quantias relativas à instalação/ligação aos respectivos ramais de ligação e condenada a restituir as quantias já cobradas a esse título aos consumidores das freguesias de S... e G..., é porque os Senhores Juízes considerem a sua actuação ilegal, e se é ilegal é porque está a infringir normas legais, no entanto, a decisão recorrida não diz quais, sendo totalmente omissa quanto à fundamentação de direito, ou seja, não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão, o que constitui nulidade nos termos do art. 668º nº1 al. b) do C.P.C.

    ex vi art. 1º do CPTA.

  15. Acresce que os fundamentos da sentença estão em manifesta oposição e contradição com a decisão, na medida em que toda a fundamentação da sentença conduzia logicamente a uma decisão diversa da que foi proferida.

  16. Com efeito, toda a argumentação desenvolvida ao longo da decisão aponta clara e inequivocamente no sentido de que cabe aos utilizadores pagarem os custos de construção dos ramais de ligação e que a cobrança desses custos pela entidade gestora é legítima, legal e justa, mas a decisão foi em sentido oposto e condenou a Ré V. a abster-se de cobrar tais quantias e ainda a condenou a reembolsar os consumidores das freguesias aqui representados pela Autora.

  17. A sentença/acórdão recorrida corporiza assim um vício lógico de raciocínio pois as suas premissas de facto e de direito impunham uma decisão e acabou por extrair outra oposta.

  18. Ora, entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; “quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, isto é, quando...

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