Acórdão nº 00040/17.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução15 de Novembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório L. F. . C. F.

, no âmbito da Ação Administrativa Comum para condenação a abstenção de comportamentos intentada pela Junta de Freguesia de M..., tendente, em síntese, “a condenar o Réu a abster-se de gravar e colher imagens da assembleia de freguesia de M... ... deixando de perturbar o normal andamento da mesma ...

” inconformado com a Sentença proferida no TAF de Viseu em 31 de março de 2019 que o condenou “a abster-se de gravar e colher imagens da Assembleia de Freguesia de M... ... deixando de perturbar o normal andamento da mesma ... quando está na qualidade de eleito local e membro da mesma”, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, aí tendo concluído: “1. Da condenação do recorrente e da fundamentação da sentença parece resultar que o bem jurídico que o tribunal considerou violada pela sua atuação foi um de três: a garantia de normal funcionamento da assembleia de freguesia; os direitos e deveres do recorrente enquanto jornalista e sobretudo a sua independência; os direitos e deveres do recorrente enquanto eleito local e sobretudo o seu dever de participação ativa na assembleia.

2. Porque relevantes para a apreciação da possibilidade de a atuação do recorrente perturbar o funcionamento da assembleia, deverá ser admitido a fazer prova sobre os factos alegados nos artigos 6, 7 e 8 da contestação.

3. A atuação do recorrente, ao acionar uma câmara de filmar digital, não é suscetível, só por si, de perturbar os trabalhos da assembleia.

4. A considerar-se que a atuação do recorrente, ao acionar uma câmara de filmar digital previamente a participar na assembleia viola os seus deveres enquanto jornalista, então nem a autora nem o tribunal administrativo têm jurisdição sobre esse comportamento, que será sindicável, quanto muito, pela Comissão da Carteira Profissional.

5. A considerar-se que a atuação do recorrente, ao acionar uma câmara de filmar digital, previamente a participar na assembleia, viola os seus deveres enquanto deputado eleito da assembleia de freguesia, assim se justificando a jurisdição administrativa, ainda seria necessário considerar-se que esse ato constitui um ato administrativo nos termos e para os efeitos do art.º 37.º, 2, c), do CPTA - e não é.

6. A única forma de enquadrar a atuação do recorrente na jurisdição administrativa no dispositivo seria proibir a sua participação na assembleia quando tivesse acionado a máquina de filmar e não proibir a sua atividade enquanto jornalista quando participasse como deputado na assembleia.

7. Uma vez que tal pedido não foi formulado, nunca o recorrente poderia ver proibida, nessas circunstâncias, a sua participação na assembleia.

8. A atuação do recorrente não se encontra proibida por nenhuma norma jurídica.

9. A douta sentença recorrida viola, para além do mais, os artigos 38.º e 48.º da Constituição da República Portuguesa e o art.º 37.º, 2, c), do CPTA.

Termos em que deverá ser revogada a douta sentença recorrida, absolvendo-se o réu do pedido; caso assim se não entenda, deverão os autos prosseguir para o réu poder fazer prova da matéria por si alegada nos artigos 6.º, 7.º e 8.º da contestação.” A aqui Recorrida/JF veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 1 de julho de 2019, sem conclusões, afirmando, a final, que “inexiste assim qualquer vício da sentença, razão pela qual deve a sentença recorrida ser mantida, improcedendo assim o recurso, fazendo-se a devida Justiça.” O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por despacho de 23 de setembro de 2019.

O Ministério Público junto deste Tribunal notificado a 1 de outubro de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos artº.s 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, importando verificar, designadamente, se se mostrará adequado e eticamente admissível, o exercício simultâneo da atividade de jornalista com a de eleito Local numa Assembleia de Freguesia.

III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade: “1) Na sequência das eleições autárquicas do ano de 2013, foram eleitos, entre outros, na Freguesia de M..., concelho de Tondela, o aqui réu, pelo Partido Socialista, que exerce as funções de membro da Assembleia de Freguesia e os Senhores J. A. . O. D., que exerce as de Presidente de Junta e o Senhor H. G. R., que exerce as funções de Presidente da Assembleia de Freguesia, estes dois pelo Partido Social Democrata.

2) Desde então e nos termos do art.º 11, n.º 1 da Lei 75/2013 de 12 de Setembro, que a Assembleia de Freguesia tem reunido ordinariamente nos meses de Abril, Junho, Setembro e Novembro ou Dezembro.

3) Em 21 de Dezembro de 2013, os eleitos locais daquela freguesia aprovaram nos termos do artº 10º nº 1, al. a) daquela lei, o Regimento da Assembleia de Freguesia de M..., que se junta como Doc. n.º 1 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.

4) Que regula e tem regulado desde então o funcionamento daquele órgão.

5) Desde que foi eleito em 2013 que o Réu tem exercido as suas funções de eleito local, vogal da Assembleia de Freguesia de M....

6) O Réu é também diretor da publicação trimestral gratuita propriedade da Casa do Povo de M..., AUGACIAR, Doc nº 2 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.

7) Acontece porém que em Dezembro de 2015, na Assembleia ordinária da Assembleia do dia 21, o réu montou e colocou a funcionar para colheita de som e imagem uma câmara de filmar, para gravar a assembleia.

8) Nenhum pedido de gravação foi feito chegar ao presidente da Assembleia de Freguesia ou à mesa para tanto.

9) O presidente daquela Assembleia, H. G. R., na sua qualidade de presidente da Assembleia de Freguesia ou à mesa para tanto questionou de quem era a máquina.

10) Ao que o Réu responder ser dele.

11) O presidente da Assembleia de Freguesia pediu-lhe que a desligasse e este recusou fazê-lo, alegando ser “diretor do AUGACIAR”.

12) O presidente da Junta, no uso da palavra informou que não dava autorização pessoal para ser filmado.

13) Após a abertura dos trabalhos da Assembleia o eleito local A. F. e R. S. usaram da palavra e questionaram sobre a qualidade em que o réu gravava, isto é, se enquanto eleito local ou enquanto diretor do Augaciar e se era ou não jornalista.

14) Pela mesa da Assembleia ter dúvidas sobre a legalidade da gravação e filmagem, a sua eventual dupla qualidade de jornalista e eleito local e a falta de autorização da mesa para filmar.

15) O presidente da mesa da Assembleia suspendeu então os trabalhos.

16) Tudo conforme ata que se junta como doc nº 3 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.

17) No dia 29 de dezembro, na continuação da AF, o réu persistiu no comportamento de montar uma máquina de filmar e começou a gravar, colhendo imagens e som dos trabalhos, ainda antes do início da assembleia.

18) Informando que iria gravar na qualidade de diretor do Augaciar.

19) Questionado sobre se estava identificado como jornalista, respondeu que era diretor do Augaciar.

20) Questionado sobre em que qualidade está na assembleia, se enquanto jornalista ou eleito local, esclareceu que tinha ligado a câmara como diretor do jornal e que estava presente na Assembleia como eleito.

21) O presidente da mesa, face às dúvidas que demonstrou ter sobre a legalidade da gravação e colheita de imagens, decidiu colocar o assunto à votação da assembleia, nos seguintes termos: “Quem é que é a favor que seja filmada ou gravada a reunião?”.

22) Votação essa que obteve um voto a favor da eleita E. P. e os votos contra de H. R., R. S., R. C., A. F. e R. L..

23) O réu recusou-se a votar a questão, por considerar se tratar de uma proposta ilegal.

24) A câmara continuou a gravar e colher imagens.

25) O Presidente da Assembleia por entender que os trabalhos estavam a ser perturbados, solicitou a presença da GNR.

26) Que compareceu no local.

27) E questionaram os agentes ao eleito local, ora réu nos presentes autos, se tinha credencial para poder gravar e filmar.

28) A GNR procedeu à sua detenção, com apreensão do material.

29) E o réu acompanhou a GNR, saindo em conjunto da sala da Junta, onde decorriam os trabalhos da Assembleia.

30) Tendo corrido posteriormente um inquérito judicial nessa sequência, na Comarca de Viseu, Tondela, com o nº 447/15.8GCTND, conforme melhor identificação no Doc nº 4 que se junta.

31) Em que o réu foi acusado do crime de desobediência e condenado naquela comarca, havendo entretanto recorrido para o tribunal superior, da Relação de Coimbra, dessa sentença, aguardando a consequente decisão.

32) Daquela reunião foi lavrada ata, que se junta como doc. nº 5 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.

33) Aconteceu ainda que o Presidente da Assembleia de Freguesia de M..., convocou uma reunião ordinária para o dia 23 de Abril de 2016.

34) E novamente nessa Assembleia o réu montou e colocou a funcionar, para colheita de som e imagem, uma câmara de filmar, para gravar a assembleia, ainda antes do seu início.

35) O presidente daquela Assembleia, H. G. R., por nenhum pedido de gravação lhe ter sido feito chegar, na sua qualidade de presidente da Assembleia de Freguesia ou à mesa para tanto, 36) Questionou de quem era a máquina.

37) Ao que o Réu acabou por responder ser dele.

38) O presidente da Assembleia de Freguesia questionou o Réu se tinha credencial de jornalista, à semelhança de outros jornalistas que ali se encontravam, nomeadamente a Sra. D. M. C. R. e o S. A. P..

39) Ao que o Réu respondeu que o presidente não sabia o que era...

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