Acórdão nº 00240/18.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução31 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO G.M.M.M.

e N.M.S.R.

, com os sinais dos autos, vêm intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [doravante T.A.F. do Porto], de 30.11.2018, proferida no âmbito da presente Ação Administrativa intentada pelos Recorrentes contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, também com os sinais dos autos, que julgou improcedente a presente ação, e, consequentemente, absolveu o Réu do pedido.

Em alegações, os Recorrentes formularam as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) A - O Tribunal Constitucional, 1ª Secção, Acórdão 583/2018 de 8 Nov. 2018, Processo 188/2018 em que foi relator o M. Juiz Cons. Teles Pereira julgou “ É inconstitucional a norma segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão.

B - Este entendimento aplica-se integralmente ao caso dos AA.

C- O contrato de trabalho (CT) dos AA. cessou em 13/4/2015.

D- A insolvência da J.. deu entrada em 5 de maio de 2015 e só foi decretada em 23 de abril de 2017, quase 2 anos depois de ser requerida pelos aqui AA..

E- Quando a requereram preenchiam todos os requisitos para terem direito ao FGS e os seus créditos estavam vencidos nos 6 meses que antecederam a propositura da ação de insolvência.

F- O FGS só pode ser requerido depois da entidade empregadora ser declarada insolvente.

G- Resulta desta premissa a declaração, que durante todo o período de pendência do processo de insolvência o prazo para requerer o FGS está suspenso.

H- No caso dos autos, só se podendo contar o período até à entrada do processo (de 13/4/2015 a 5 de maio de 2015, num total de 22 dias) e depois da sentença de insolvência até ao pedido de pagamento do FGS (de 23/4/2017 a 5/6/2017 e 20/6/2017, num total de 42 dias e de 57 dias ).

I - Descontando o período de suspensão, os AA. requereram o pagamento do FGS num prazo de 64 dias e 79 dias , não tendo violado qualquer prazo de prescrição ou caducidade.

SEM PRESCINDIR, J- Durante a pendência da insolvência, e porque esta, apesar de se tratar dum processo de natureza urgente, estava a arrastar-se devido à demora duma perícia judicial ordenada pelo Tribunal, os AA. intentaram ação emergente de contrato de trabalho no Tribunal do Trabalho de Vila Nova de Gaia, na qual obtiveram sentença que condenou a J.. na totalidade do pedido, ou seja, no valor dos créditos reclamados ao FGS.

L - Tal processo interrompeu o prazo de prescrição dos créditos, que , após a prolação da mesma em 18/05/2016 ( notificada a 20/5/2016), começou a correr novamente só a partir do transito em julgado da decisão que pôs termos ao processo (vide n° 1 do art. 326° do Código Civil).

M - Assim sendo, como é, o transito em julgado só se operou em 25 de junho de 2016 ( 20/5 + 3 dias de dilação + 30 dias do prazo de recurso + 3 dias do prazo com multa), data em que voltou a correr novamente o prazo de prescrição de 1 ano.

N - O FGS foi requerido, respetivamente a 5/6/2017 e 20/6/2017, dentro, portanto, do prazo de prescrição de 1 ano.

O - Em todas as situações expostas, os AA. reclamaram os créditos atempadamente, falecendo o argumento do FGS de que não foram apresentados dentro do prazo de 1 ano após a cessação do contrato de trabalho.

P - Não ocorre, por isso, o motivo invocado pelo FGS para indeferir o pagamento dos créditos, designadamente o decurso do prazo previsto n° 8 do artº. 2º. do Dec. Lei n° 59/2015, de 21 de abril, o qual, não sendo de caducidade, conforme entendimento do Tribunal Constitucional, esteve suspenso durante todo o período de pendência da ação de insolvência (desde a entrada até à sentença que declara a insolvência da requerida) e depois com a propositura da ação no Tribunal do Trabalho.

Q- Outro entendimento, defrauda completamente o que esteve na origem da criação do FGS e o fim que o mesmo visa.

R- No entendimento sufragado pela decisão ora posta em crise, basta que o processo de insolvência dure mais de 1 ano (no atual estado dos Tribunais de Comércio qualquer insolvência contestada dura mais do que isso) para que todos os trabalhadores abrangidos deixem de ter direito ao FGS.

S -Não foi para isso que o FGS foi criado, não foi esse o espírito da Lei, nem pode ser esse o entendimento, sob pena de se estar a pôr em causa direitos fundamentais dos trabalhadores, o que a nossa Constituição não permite.

T - Do atrás exposto, resulta que os AA. , aqui recorrentes, praticaram todos os atos dentro dos prazos, estando os créditos por si reclamados e reconhecidos pela AI abrangidos pelas obrigações de pagamento que incumbem ao FGS .

U - A douta sentença violou o disposto no Dec. Lei n° 59/2015, de 21 de abril , designadamente no art. 2º e outros e o disposto no art. 59°, n° 3 da Constituição da República Portuguesa, pelo que deve proceder o presente recurso, revogando-se a sentença, com as legais consequência.

(…)”.

* Notificado que foi para o efeito, o Recorrido apresentou contra-alegações que concluiu da seguinte forma: “(…) A.

Os requerimentos dos AA. foram apresentados ao FGS em 19.06.2017 e 02.06.2017, altura em que se encontrava em vigor o novo diploma legal regulador do FGS, DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015.

B.

Assim, os referidos requerimentos do A. Fora apreciados à luz deste diploma legal.

C.

Este diploma previa um prazo de 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho para que seja apresentado junto dos serviços da Segurança Social o requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho.

D.

De resto, já o anterior regime legal, previsto na Lei 35/2004, de 29/07, estabelecia no seu art.° 319.° 3, um prazo para a apresentação do requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho, que era de 3 meses antes do termo do prazo de prescrição, ou seja 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho.

E.

Deste modo se verifica que sempre existiu um prazo para apresentação dos requerimentos ao FGS, sendo que o atual regime prevê um prazo de caducidade findo o qual cessa o direito de os ex-trabalhadores das EE insolventes requererem o pagamento dos créditos ao FGS.

F.

Prazo este que, na situação concreta, também está ultrapassado à luz do anterior diploma legal Lei 35/2004, de 29/07.

G. Sendo aplicável o novo regime, de acordo com o art.° 3.° do DL 59/2015, de 21.04, e consequentemente o prazo de caducidade nele previsto, temos de considerar como estando legalmente esgotado o prazo para a apresentação dos requerimentos ao FGS, à luz do diploma DL 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015, Termos em que, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que mantenha a decisão de indeferimento proferida pela Exma. Senhora Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial.

(…)”.

* O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

* O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer no sentido da procedência do presente recurso jurisdicional.

* Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* *II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, a questão essencial a dirimir nos autos resume-se a saber se a sentença recorrida, ao julgar nos termos descritos nos autos, incorreu em erro de julgamento de direito, por violação “(…) do disposto no Dec. Lei n° 59/2015, de 21 de abril , designadamente no art. 2º e outros e o disposto no art. 59°, n° 3 da Constituição da República Portuguesa (…)”.

* *III – FUNDAMENTAÇÃO III.1 – DE FACTO Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte: “(…) 1.

Os AA. foram admitidos ao serviço da sociedade J..-Fabricação de Mobiliário e Equipamento para Comércio, Lda. ao abrigo do contrato de trabalho celebrado em, respetivamente, 02/04/2009 e 01/10/2010; 2.

Os AA. tinham a categoria profissional de, respetivamente, serralheiro e chefe de equipa, auferindo, respetivamente, 615,00 €, acrescido do subsídio de alimentação diário de 5,50 € e 1.000,00 €, acrescido do subsídio de alimentação diário de 5,50 €.

3.

A partir de dezembro de 2014 a dita sociedade deixou de cumprir as suas obrigações para com os trabalhadores, nestes se incluindo os AA., deixando de pagar salários atempadamente.

4.

Assim não pagou aos AA. o salário relativo ao mês de dezembro de 2014.

5.

Os AA. suspenderam o contrato de trabalho nos termos dos cartas que enviaram à empregadora e à ACT com efeitos a 24 de janeiro de 2015.

6.

A Ré não pagou a(o)s AA. as retribuições em atraso, nem lhes pagou os 24 dias de trabalho de janeiro de 2015.

7.

Em 09/04/2015, data em que havia decorrido mais de 60 dias sobre a data de vencimento das referidas retribuições em mora e fundando-se na referida falta de pagamento dessas retribuições, os AA. resolveram o contrato de trabalho, nos termos das cartas que enviaram sob registo com AR nesse referido dia 9 de abril de 2015 e recebidas pela J.. a 13/4/2015 - cfr. docs n° 1 e 2 juntos aos autos com a p.i. e que aqui se dão por integralmente reproduzidos; 8.

Em 5 de maio de 2015, os AA. intentaram judicialmente o pedido de declaração de insolvência da J.. , dentro de todos os prazos de garantia, para efeitos do FGS, dos créditos reclamados.

9.

A sentença que...

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