Acórdão nº 1236/16.8BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | ALDA NUNES |
Data da Resolução | 21 de Novembro de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório Maria C.........., Maria J..........
e Maria S..........
recorrem da sentença proferida, a 17.6.2019, pelo TAF de Leiria, que julgou a ação administrativa para efetivação de responsabilidade civil extracontratual do Estado, com base no funcionamento da administração da justiça, parcialmente procedente e condenou o Estado Português a pagar: (a) à autora Maria C..... a quantia de €: 1.500,00 e às autoras Maria J..... e Maria S..... a quantia de €: 200,00 a cada uma, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos em virtude da duração excessiva do processo nº 286/11.5TBABT, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento; (b) os honorários do advogado nos presentes autos, na parte em que comprovadamente sejam superiores às despesas ressarcidas através da aplicação da legislação de custas; (c) todas as quantias devidas a título de imposto sobre os montantes indemnizatórios ora atribuídos, (d) absolvendo o Estado do demais peticionado pelas autoras.
As recorrentes em sede de alegações formularam as seguintes conclusões: 1 – «Ficou provado nos presentes autos que é imputável ao Estado Português, enquanto juiz, toda a duração da tramitação do processo nº 286/11.5TBABT, desde a instauração do processo até ser proferida decisão, ou seja, desde 09/03/2011 e até 25/02/2015, descontado o período de dois meses em que o processo atrasou por erro na indicação da morada do marido da A. Maria C....., o que perfaz um total 3 anos, 9 meses e 5 dias; 2 – Dos factos assentes resultou também que as Recorrentes acreditavam que o processo em causa se resolveria mais rapidamente e a demora causou-lhes desgaste, preocupação, nervosismo e desgosto, até à sua resolução; 3 – De acordo com entendimento jurisprudencial aceite sem reservas, as normas de Direito interno respeitantes à responsabilidade civil do Estado Juiz, devem ser objeto de interpretação conforme à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e devem ser aplicados tomando em consideração a jurisprudência do TEDH; 4 – De acordo com a Jurisprudência do TEDH, existe um núcleo de processos em que a indemnização por cada ano de demora do processo pode subir do patamar de € 1.000,00 a € 1.500,00 para € 2.000,00; 5 – De acordo com o Acórdão Apicella C. Italie de 10/11/2004, considerando nº --, “O montante global será aumentado até 2.000. se o que estiver em causa for importante, nomeadamente em matéria de direito do trabalho, estado e capacidade das pessoas, pensões, processos particularmente importantes relativamente à saúde ou à vida das pessoas.”; 6 – No caso concreto, a Recorrente Maria C..... e marido intentaram ação declarativa relativa a casa de habitação tomada de arrendamento, sendo a indemnização por danos morais fixada no valor de 1500,00€ para a Recorrente Maria C..... e de € 200,00 para as Recorrentes Maria J..... e Maria S....., na qualidade de herdeiras, irrisória, cuja fixação não encontra eco na Jurisprudência do TEDH ou Nacional, sendo o montante inaceitável e desfasado dos parâmetros daquelas duas Jurisprudências; 7 – No processo 286/11.5TBABT inexistiu recurso, as partes chegaram a acordo, pelo que nem foram ouvidas quaisquer testemunhas, ou deduzidos incidentes complexos, não se tendo verificado comportamento da parte, nem dificuldade da causa ou da tramitação, justificação para tamanha demora, desde a data de entrada da petição inicial até à prolação da decisão de homologação do acordo, a não ser a falha do sistema judicial; 8 – Ora, o Tribunal a quo afastou-se, de forma escandalosa, dos critérios indemnizatórios da jurisprudência do TEDH e Nacional, dado que o caso sub judice possui todos os requisitos para que lhe seja fixado, por cada ano de duração do processo, uma indemnização não inferior a € 2000,00, num total de € 7500,00 euros para cada um dos Autores; 10 – O Tribunal a quo também se distanciou dos critérios de determinação da razoabilidade da duração processual, porquanto não se pode considerar aceitável a duração de um processo por três anos, quando em causa estava a simples apreciação de ação declarativa, sem instância de recurso.
11 – A apreciação e integração do conceito obtenção de decisão em “prazo razoável” constitui um processo de avaliação a ter de ser aferido “in concreto”.
12 – Pelo que, analisando o caso concreto, o processo 286/11.5TBABT nunca devia ter ultrapassado um ano.
13 – A ser de outro modo, o Recorrido teria um imerecido prémio, dado que este tipo de decisões tem e deve assumir um carácter penalizador no sentido de se evitar a repetição de práticas que levem a que, um processo desta natureza, demore a mais de cinco anos a ser resolvido.
14 – As exigências do artigo 6º do TEDH, do artigo 20º, nº 2 da CRP e 2º do CPC, foram completamente demovidas do caso concreto, em benefício do infrator, atendendo a que a indemnização fixada consiste numa indemnização miserabilista, violadora do direito à justiça em prazo razoável e que tem que ser acolhida pelos nossos Tribunais, sob pena do Estado acabar por ser condenado no TEDH, esgotadas que sejam todas as etapas recursivas possíveis nos Tribunais Nacionais; 16 – A decisão deve ser revogada e substituída por outra que atribua uma indemnização adequada às Recorrentes, mostrando-se violados os artigos 20º CRP, 6º CEDH, 496º do Código Civil e 615º, 1, c) do CPC».
O Ministério Público, em representação do Estado Português, ora recorrido, contra-alegou o recurso concluindo: 1. «Contrariamente ao defendido pelas Recorrentes, não resultou provado, “que as recorrentes acreditavam que o processo em causa se resolveria mais rapidamente e a demora causou-lhes desgaste, preocupação, nervosismo e desgosto, até à sua resolução, sendo que, como bem referiu a Mma. Juiz, na fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada, no âmbito da sentença sub judice, “Quanto ao demais, as testemunhas nada concretizaram especificamente quanto a repercussões da demora do processo no estado de espírito das Autoras Maria J..... e Maria S....., sendo que os depoimentos prestados foram absolutamente vagos, genéricos e sem qualquer concretização, nada dali resultando quanto às consequências quanto a estas Autoras da demora na resolução do litígio levado ao processo judicial em apreço, de onde resultou a não prova dos factos referidos em A)”.
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De facto, o que resultou dos autos e não nos merece qualquer reparo, face à doutrina e jurisprudência dominantes, quer a nível nacional, quer a nível europeu, foi que “As autoras tinham a expectativa que o Proc. nº 286/11.5 TBABT se resolveria mais rapidamente do que sucedeu, concretamente que demorasse um ou dois anos” e que a demora do Proc. nº 286/11.5TBABT causou à Autora Maria C.......... ansiedade, angústia, incerteza, preocupações e aborrecimentos, por ter estado sem saber qual o desfecho do processo durante anos” (cfr. fls. 11 e 12 da sentença).
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Tendo em consideração tais factos e respeitada a doutrina e a jurisprudência atualmente maioritárias quer no TEDH, quer nos Tribunais Nacionais, foi decidido, pela Mma. Juiz subscritora da sentença recorrida, condenar o demandado no pagamento da quantia de 1.500 Euros (mil euros e quinhentos euros), à Autora Maria C.......... e 200 Euros (duzentos euros) às Autoras Maria J..... Tavares e Maria S..... , “a título de 4. indemnização por danos não patrimoniais sofridos em virtude da duração excessiva do Proc. nº 286/11.5 TBABT”.
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Assim, no que respeita à primeira questão suscitada, pelas Recorrentes, entendemos que a mesma é completamente desprovida de fundamento uma vez que o Tribunal apurou devidamente a matéria factual dos autos e respeitou os critérios indemnizatórios da jurisprudência do TEDH e Nacional, como facilmente se pode constatar da leitura dos diversos Acórdãos citados a fls. 14 a 63, cujo teor aqui damos como integralmente reproduzido.
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Por todo o exposto e tendo em consideração as especificidades do presente caso concreto, bem como a deficitária situação económico-financeira do país, resulta óbvia, em nosso entender, a conclusão de que nunca poderia ser legitimamente aplicável, in casu, o quantum indemnizatório pretendido pelas Autoras recorrentes, o qual afigura-se-nos carecer de qualquer fundamento plausível ou razoável.
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No que respeita, por seu lado, à segunda e à terceira questões suscitadas pelas Autoras Recorrentes, entende-se que as mesmas são igualmente desprovidas de fundamento, tendo em consideração que “de acordo com a jurisprudência do TEDH, a duração média – que corresponde à duração razoável – de um processo em primeira instância é de cerca de 3 anos e a duração média de todo o processo deve corresponder, em princípio, a um período que vai de 4 a 6 anos, salvo casos especiais” (cfr. Isabel Celeste Fonseca, in CJA, nº 72, p. 45 e 46), sendo que o que resultou provado na sentença recorrida e, como tal foi considerado, foi um atraso de 9 meses e 5 dias, por se ter considerado que o processo esteve pendente na primeira instância durante 3 anos, 9 meses e 5 dias (imputáveis ao Estado Português).
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Do exposto, bem como do teor da fundamentação da decisão recorrida, facilmente se pode depreender que o Tribunal não se distanciou “dos critérios de determinação da razoabilidade da duração processual” e que as exigências do art. 6º do TEDH, do art. 20º nº 2 e 2º do CPC não foram “completamente demovidas do caso concreto, em benefício do infrator”, tanto mais que não se pode considerar a atribuição de um montante de 1.500 Euros de indemnização, à Autora Maria C..... por um atraso de 9 meses e 5 dias, “uma indemnização miserabilista, violadora do direito à justiça em prazo razoável”, como pretendido pelas recorrentes, sendo que, como bem referido, pela Mma. Juiz a quo, o litígio em causa possuiu diminuta relevância para as esferas jurídicas das restantes Autoras, pelo que não se justificava, de todo, a atribuição de...
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