Acórdão nº 00189/19.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução13 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Município de M e a Junta de Freguesia de M vieram interpor o presente recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 28.06.2019, pela qual foi julgada totalmente improcedente o a providência cautelar intentada contra a Águas do C L, S.A.

e o M de C para “abstenção, com efeito imediatos, da realização de descargas de efluentes não tratados no sistema hídrico do Município de M, por via do mecanismo de descarga de emergência acoplado às Estações Elevatórias do P (CT03) e das C (CT04) freguesia de São C e da T, respectivamente, concelho de C, localizada na fronteira daquele município com os ora Requerentes” (depois de requerido que “os pontos II) a IV) do petitório sejam tidas por não escritas por carecerem de provisoriedade”.

Invocaram para tanto, em síntese, que: verificou-se a nulidade decorrente de se ter preterido a produção de prova requerida pelos Requerentes sem que se percebam os fundamentos dessa decisão; a própria sentença recorrida omite a pronúncia sobre uma questão essencial suscitada no articulado inicial e não se percebem os fundamentos do indeferimento, como base na falta do requisito “fumus boni iuris”, face à manifesta ilegalidade da conduta dos Requeridos.

A Á do C L, S.A. contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

Também o M de C apresentou contra-alegações defendendo de igual modo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

  1. O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal a quo proferida em 01.07.2019, no âmbito dos autos de processo contencioso cautelar nº 189/19.5 CBR, que indeferiu o pedido da providência cautelar de intimação à abstenção ou adopção de conduta.

  2. Os Recorrentes, no decurso do seu pedido apontam matéria de facto que foi ignorada na decisão proferida, não tendo o Tribunal os considerado como provados ou não provados, mais concretamente: 1) Que a descarga de emergência em caso de sobrecarga do sistema passou a funcionar de forma regular oposta à sua função inicial/legal (vg artigo 18º do requerimento inicial). Quer isto dizer que, as descargas que deveriam ocorrer apenas pontualmente e em situações de emergência, passaram a acorrer com uma periodicidade e volume totalmente anormais (vg. artigo 19º do requerimento inicial).

    2) Chegando a longos períodos em que as mesmas tiveram periodicidade diária, e por longos períodos ininterruptos (vg art. 20º do requerimento). No ano de 2014 estas descargas de emergência, ainda que um pouco por todo o sistema, quer no território do Requerente, quer nalguns pontos do território do município Contrainteressado, passaram a assumir proporções desastrosas, com especial gravidade na Estação Elevatória da C (CT04) e Estação Elevatória do P (CT03), freguesias da T e de São C, respetivamente, limite com o concelho e freguesia de M (vg. art. 21º do requerimento).

    3) Nesta Estação Elevatória, a infraestrutura de descarga de emergência passou a registar descargas diárias e constantes, durante meses e meses consecutivos (vg. art. 22º do requerimento inicial) de tais factos, a requerida ADCL foi por diversas vezes interpelada para pôr termo à situação de ilegalidade nas descargas realizadas.

    4) Na plena assunção da existência de irregularidade na sua conduta, a Requerida por diversas vezes reuniu com o Requerente e com o contrainteressado município de C, com vista à identificação e resolução do problema.

    5) tanto assim é, que foi apresentada pela Requerida, no ano de 2016, um estudo elaborado pelo Professor Dr. Saldanha Matos, do qual resultava um plano de ação com duas medidas, a saber: - A primeira, de execução imediata (à data) consubstanciada no aumento da capacidade de bombagem do sistema em alta, com aumento do caudal das respetivas bombas, entre outros pequenos investimentos; - A segunda, de execução mais prolongada no tempo, que consistia na construção de uma Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) no sistema de infiltração, com bacias de infiltração nos terrenos baldios da freguesia da T, C.

  3. Os Recorrentes articularam as razões que, no seu entender, subjazem à manifesta procedência da pretensão e formular no pedido principal, e requereu- com lhe competia- a produção de prova testemunhal por, no seu entender, esse ser essencial à prova da matéria alegada.

  4. Toda esta matéria de facto, que os recorrentes no decurso do seu pedido apontaram, foi ignorada na decisão proferida.

  5. O Tribunal a quo fez tábua rasa destes factos alegados pelos ora Recorrentes, não os tendo considerado provados ou não provados, verificando-se o vício processual de omissão de pronúncia que reconduz-se a uma ausência de emissão de um juízo apreciativo sobre uma questão processual ou de direito material substantivo que os sujeitos tenham, expressamente, suscitado ou posto em equação perante o Tribunal e que este, em homenagem ao princípio do dever de cognoscibilidade, deva tomar conhecimento.

  6. Os factos alegados são essenciais para a demonstração da existência de ilegalidades cometidas pela requerida. Ao atuar deste modo, o Tribunal a quo não se pronuncia acerca da questão primordial levantada pelos Requerentes no seu pedido: a descarga de emergência em caso de sobrecarga do sistema – passou a funcionar de forma regular oposta à sua função inicial/legal.

  7. Quer com isto dizer-se que, os mecanismos de descarga de emergência presentes nas estações elevatórias dos sistemas “em alta”, são derrogações legais à proteção dos direitos ao ambiente, saúde pública e salubridade (que os Requerentes invocam e alegam estarem a ser violados).

  8. Aqui reside todo o fundamento da pretensão do Requerente, pelo que não há forma da sentença recorrida concluir de forma correta (e mesmo legal, como se alega), se na mesma não se tenha o Mmo. Juiz debruçado detalhadamente sobre a prova deste facto: a descarga de emergência tem sido usada dentro dos limites legais ou não? E para concluir sobre tal facto, há que se arrimar em elementos probatórios, quer os que estejam já carreados nos autos, quer aqueles cuja produção se pediu expressamente no requerimento inicial.

  9. Ora, tal não foi feito na sentença recorrida, ficando por classificar como provados ou não provados, os factos que maior relevo assumem para a boa decisão da causa.

  10. Os recorrentes para a cabal compreensão dos factos alegados no pedido decisão que aqui se discute formularam o pedido de audição de testemunhas.

  11. Perante o requerido o Tribunal no texto da decisão, afirma o seguinte: “Dispensa-se a produção de prova indicada pelas partes, por se considerar desnecessária (…) em virtude de não resultar das oposições apresentadas (…) que exista matéria de facto controvertida que exija a realização de diligências instrutórias adicionais (…)” L) O raciocínio seguido pelo Tribunal neste ponto é omisso, não permitindo aos Recorrentes perceber o motivo da desconsideração da sua tese, nomeadamente, a da existência de descargas de efluentes excessivas/ilegais e cuja atuação deve ser imputada à requerida.

  12. Segundo o artigo 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei. Para cumprir a exigência constitucional, a fundamentação há-de ser expressa, clara, coerente e suficiente. Ou seja, a fundamentação deve ser adequada à importância e circunstância da decisão, o que não sucede neste caso.

  13. A falta de fundamentação no que concerne à dispensa da produção de prova indicada pelos Recorrentes e ainda o raciocínio insuficiente seguido quanto ao indeferimento do pedido, não cumpre com a função de defesa, pois que estes não são capazes de conhecer todos os motivos que levaram o Tribunal a decidir em certo sentido, não conferindo pois a possibilidade de estruturar cabalmente a sua atuação/estratégia processual.

  14. Quer-se-nos parecer que o Tribunal a quo faz, nesta sede, uma adesão à tese perfilhada pela recorrida e contrainteressada, no entanto o mesmo não resulta de forma expressa da leitura da decisão.

  15. No caso dos autos, o Tribunal não aplicou nem interpretou as normas em que os Recorrentes assentaram as suas pretensões, ficando os mesmos sem perceber, afinal, se existem ou não descargas ilegais, sendo certo que para os recorrentes essa...

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