Acórdão nº 1339/18.4BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução07 de Novembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: E….. M…., S.A.

, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 04/05/2019, que no âmbito da ação de contencioso pré-contratual movida contra o Turismo de Portugal, I.P.

e a Contrainteressada, M……. – D. C. E……, SA, julgou a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada do pedido, na parte em que a sentença recorrida manteve a admissão da proposta da Contrainteressada e decidiu sobre a legalidade do procedimento pré-contratual.

A Entidade Demandada, Turismo de Portugal, I.P.

apresentou recurso subordinado contra a sentença recorrida na parte em que julgou prejudicado o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático.

* Formula a Autora, aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “a) No caso dos autos, dois dos anexos ao programa de concurso do “Turismo de Portugal” – anexos VI e VIII – foram elaborados em papel timbrado da concorrente M………, situação que em 24/06/2018, no Relatório Final, o Júri do Concurso justificou declarando tratar-se «uma inserção automática e não utilizada voluntariamente, no rodapé do documento Excel, nos anexos VI e VIII do programa de concurso” e alegadamente “ um lapso manifesto que decorre de ter sido utilizado um ficheiro electrónico na posse da entidade adjudicante que foi na sua origem, um ficheiro entregue pela M……, num contexto de execução de contratos anteriores, e ora utilizado, por economia de meios, transpondo para o presente procedimento os termos e as condições que a entidade adjudicante pretendia ver ver observados pelos concorrentes interessados”.

b) O Tribunal a quo, considerou que tal circunstância não gera a invalidade do concurso, não obstante concluir que «A este propósito não nos parece que se possa aceitar como razoável o facto de alegadamente a referência à Contra-interessada não estar visível na altura em que os documentos foram elaborados, mas apenas com a impressão do documento ou gravação em “pdf”, pois que tal justificação cai por terra a partir do momento em que os documentos foram submetidos na plataforma electrónica sem que o lapso, agora visível para todos os interessados no procedimento concursal, tivesse sido corrigido por iniciativa da entidade adjudicante, como, aliás, se impunha.

».

c) Como se impunha, sendo que o mínimo que se impunha à Ré era demonstrar cabalmente que tal documento fora apresentado pela Contra-interessada «num contexto de execução de contratos anteriores», identificando concretamente o procedimento concursal em que tal entrega, de um documento relativo a indicações técnicas de apresentação de maquetas que são apresentadas em sede de apresentação de proposta (!), ocorreu» exibindo o original, ou ao menos – e nem isso fez! d) De resto, esta “explicação” do Réu Turismo de Portugal, não permite compreender, sequer, a razão da utilização desses documentos, notando-se aliás que o documento correspondente ao anexo VI, é um mero quadro, de grande simplicidade, cuja necessidade de aproveitamento “por economia de meios” não constitui explicação verosímil; ao que acresce que, tratando-se de «Indicações Técnicas para elaboração de Maqueta», não se vislumbra sequer como tal documento, que será sempre um documento integrante da proposta, pode aparecer num «contexto de execução de contratos anteriores», tanto mais que, pasme-se, além do timbre da concorrente “M……..”, em dois dos anexos do programa de concurso, dos mesmos consta a data de elaboração do documento, 06/04/2018, sendo que o anúncio do concurso, foi publicado no Diário da Republica, II série, n.º 69, de 09/04/2018, ou seja, 3 dias depois! e) É pois este circunstancialismo que leva a Ré a recorrer, inconformada, senão mesmo perplexa perante uma sentença que, confrontada com uma factualidade inexplicável, e inexplicada, perante uma justificação, pelo júri do concurso, que faz jus ao dito “pior a emenda do que o soneto”, acaba por determinar a improcedência do pedido anulatório, não vendo – quer a jusante, na elaboração do programa de concurso, quer a montante, na justificação apresentada pelo júri – qualquer vício; E por isso delimita o presente recurso, tão só, a essa questão.

f) Este juízo, na situação fáctica apurada, um procedimento concursal baseado em documentos fabricados e fornecidos pela concorrente, tem-se como inadequado e incorrecto, enfermando de erro de julgamento, chocando qualquer pessoa juridicamente esclarecida, respaldando, enfim, uma inaceitável flacidez dos princípios da imparcialidade, da legalidade, da boa-fé, da tutela da confiança, da concorrência, da transparência, da igualdade de tratamento e da não-discriminação g) Se a transparência administrativa existe como “uma forma de garantir, preventivamente, a imparcialidade da actuação da Administração”, tratando-se e proteger a imagem de imparcialidade e bom nome da Administração, e simultaneamente de assegurar aos cidadãos que podem acreditar e confiar numa Administração com essas características, então, à mulher de César não lhe basta ser séria; Tem de o parecer!, h) E no caso concreto, é manifesto, não parece: a jusante, pela utilização de documentos ou elementos fornecidos por um dos concorrentes, a montante, pelo carácter implausível e lacunar da justificação dada para o que ocorreu… sem olvidar aos “casos” em que o Turismo de Portugal, aqui Réu, se vê actualmente envolvido! i) De resto, no caso concreto, o vício supra descrito subsume-se, também, à previsão do art.º 55º al. i), do C.C.T., que considera como “Impedimento”, impeditivo da candidatura, o facto de o concorrente: «Te(r) a qualquer título, prestado, direta ou indiretamente, assessoria ou apoio técnico na preparação e elaboração das peças do procedimento que lhes confira vantagem que falseie as condições normais de concorrência;»; Mas ultrapassa essa questão, subsumindo-se desde logo à violação dos referidos princípios.

j) Por outro lado, na apreciação das propostas, o júri do concurso obnubila o facto de a proposta da M........... ser desconforme a vários requisitos plasmados no Programa de Concurso: desde logo, a proposta do concorrente M........... não prevê o acesso à internet por banda larga wifi, previsto no art.º 21º, al. D), e 22, nº2, al. B), do caderno de encargos; E apresentando um total de 8 mesas de apoio e 2 BANCOS por cada mesa, quando o caderno de encargos, na Cláusula 17ª, al. c), prevê a existência de «Zona de reuniões com mesa e cadeiras, num mínimo de 3 e no máximo 6».

k) Quanto a tais discrepâncias, e não obstante na sequência do relatório preliminar a ora requerente ser ter pronunciado no sentido de determinarem a exclusão da proposta da M..........., o júri do concurso, no seu relatório preliminar, fez “vista grossa”; E perante a pronúncia da ora Recorrente, em sede de audição prévia, final, passou por tal questão como cão por vinha vindimada, l) O que só vem “reforçar” a violação, grosseira, do princípio da imparcialidade, da legalidade, da boa-fé, da tutela da confiança, da concorrência, da transparência, da igualdade de tratamento e da não-discriminação, incumprindo o dever de fundamentação e pronúncia sustentada, no que ao princípio da participação diz respeito.

m) Aceitar aquela conduta e actuação como legítima ou como válida constituiria uma quebra irreparável no assegurar duma efectiva garantia e respeito do princípio da imparcialidade enquanto princípio estruturante e basilar do decidir administrativo e da própria deontologia administrativa» (pois) «Em suma, haverá violação do princípio da imparcialidade sempre que um determinado procedimento ou intervenção em procedimento façam perigar ou recear pela quebra das garantias de isenção, de transparência e de neutralidade, já que à Administração não basta ser imparcial exigindo-se também que pareça imparcial:» (Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 13-05-2011).

n) É que, «o valor ou interesse jurídico tutelado com a transparência é o mero risco ou perigo de quebra do dever de imparcialidade, independentemente de se ter produzido, em concreto, uma efectiva actuação imparcial.», pois, «Em tempos de muita desconfiança, (…) tudo deve ser feito para dissipar suspeitas e reforçar a confiança dos cidadãos na Administração Pública, na construção do verdadeiro Estado de Direito. A ilicitude da acção ou omissão administrativa reside, desde logo, naquilo que for susceptível de configurar, por critérios de razoabilidade e tendo em vista os ditames da ética, o perigo do aproveitamento ou do favorecimento, independentemente da verificação do dano.

». (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01-10-2003).”.

Pede a procedência do recurso e a substituição da sentença recorrida por outra que julgue nulo o Relatório Final no que respeita à decisão de exclusão da Autora no procedimento concursal.

* A Contrainteressada, ora Recorrida, notificada apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: “A. A Recorrente limitou o recurso a uma única questão (tendo assim excluído do mesmo os outros supostos vícios, considerados improcedentes, que tinham sido objeto da petição inicial): a questão da suposta ilegal admissão da M........... pelo facto de existirem dois documentos do concurso - o anexo VI e o anexo VIII - nos quais aparece a referência «M...........» e a data de 6-4-2018 (alínea e) das conclusões).

B. Pretende a mesma que a proposta da M........... deveria ter sido excluída por violação, entre outros princípios, do princípio da imparcialidade e da transparência administrativa que existe como «uma forma de garantir preventivamente a imparcialidade da atuação da Administração», existindo ainda supostamente uma violação do disposto no artigo 55.º, n.º 1, alínea i) do CCP.

C. Sucede que, embora se possa admitir a consideração da sentença recorrida de que a referência em causa...

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