Acórdão nº 979/19.9BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Outubro de 2019
Magistrado Responsável | JORGE PELICANO |
Data da Resolução | 24 de Outubro de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: A………………..
, que diz ser nacional do Afeganistão e aí nascido a 19/12/1999, vem intentar recurso da sentença proferida a 04/07/2019, que declarou improcedente o pedido de anulação do despacho da Directora Nacional do SEF que considerou que o pedido de protecção internacional por ele apresentado é inadmissível e determinou a sua transferência para a Suécia, por ser este o país competente para conhecer de tal pedido.
Apresentou as seguintes conclusões com as alegações do recurso: A. O Autor impugnante e ora recorrente, para prova dos alegados factos, requereu no processo em primeira instância a produção de provas: (Perícia exarada pelo CPR sobre questão dos refugiados do Afeganistão, e declaração de parte do requerente do asilo), contudo, no processo não foram produzidas tais provas.
B. Não houve despacho / sentença fundamentado, que se pronunciasse sobre as mesmas, sua oportunidade, interesse, admissibilidade, para o processo, o que, a não ter acontecido, constitui omissão de pronúncia e preterição dos direitos de defesa do Impugnante, porquanto, não lhe foi permitido produzir em Julgamento, provas legal e tempestivamente requeridas, que sendo produzidas em Julgamento, permitiriam a prova de tais factos por si alegados, e que seriam essenciais para a decisão de mérito, nomeadamente nos termos e para os efeitos da consideração e aplicação do princípio do ‘NON REFOULEMENT’, daí resultando face ao exposto, a NULIDADE DA DECISÃO proferida pelo Tribunal de Circulo de Lisboa, o que se invoca e aduz para todos os legais efeitos.
C. Não obstante tal ter sido expressamente alegado pelo impugnante em sede de alegação de direito junto do TAC de Lisboa, o Tribunal ‘a quo’, recusou expressamente analisar, pronunciar-se e decidir, sobre a violação daqueles princípios (beneficio da dúvida e ‘non refoulement’), por os considerar, ‘in casu’, irrelevantes, não obstante invocados e alegados.
D. Tais princípios, pela sua dimensão e importância, nomeadamente, o risco de morte do requerente em caso de expulsão / deportação para o Afeganistão, como tal invocado implicaria face ao principio do beneficio da dúvida a concessão da situação de asilo como requerida, e que, nessa sequência, o principio de non refoulement’, se aplicaria também imediatamente, visto o Reino da Suécia ter acordos bilaterais de extradição directa com o Afeganistão, e por via disso, não ter garantido a segurança do cidadão refugiado, não apresentando garantias da sua não devolução ao referido país.
E. O princípio da não repulsão (Non-Refoulement, em francês, como é mais conhecido ao nível internacional) proíbe a «devolução» de um refugiado a um país onde possa estar sujeito a perseguição ou tortura.
F. Este princípio é um elemento fundamental do Direito Internacional e do respeito pelos Direitos do Homem, e de acordo com o artigo 33.° da Convenção de 1951, «nenhum dos Estados contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam ameaçadas em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas».
G. O Princípio da Não Devolução foi igualmente invocado a propósito da extradição, sendo que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem tem produzido igualmente jurisprudência em sede de interpretação do artigo 3.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem aplicando o Princípio da Não Devolução.
H. O princípio do “non refoulement” apresenta-se como argumento e norma imperativa do direito internacional, sendo hoje entendido como uma forma de proteção dos direitos humanos para um tipo específico de pessoa, o refugiado, desde logo pela proibição de expulsar ou de repelir o estrangeiro para um lugar onde a sua vida ou liberdade estejam ameaçadas. É hoje verdadeiro direito consuetudinário internacional, ‘ius cogens’.
I. Não poderia nem deveria o Tribunal ‘a quo’ ter deixado de produzir prova, nem deixar de apreciar e discutir a aplicação dos indicados princípios do beneficio da dúvida e do ‘non refoulement’, porquanto constando estes de normas imperativas do direito internacional, nomeadamente emanados de Convenções, como a Convenção Europeia dos Direitos do Homem; J. Os alegados princípios, nomeadamente o principio do beneficio da dúvida e o principio do ‘non refoulement’, constando de Convenções e Tratados Internacionais, são de aplicação primordial e automática, prevalecendo sobre quaisquer regulamentos, nomeadamente sobre o Regulamento de Dublin.
K. Pelo que, ‘in casu’, mal andou o Mmo. Juiz ‘a quo’, ao decidir que os demais vícios de violação de lei alegados, em concreto violação do princípio do benefício da dúvida e do princípio do “non refoulement”, são absolutamente irrelevantes.
L. Ao decidir de tal forma, o Mmo. Juiz ‘a quo’ incorreu a sentença no vicio de omissão de pronúncia, M. Além de má interpretação e aplicação do disposto na al. a) do n.° 1 do art. 19.°- A e do n.° 2 do art. 37.° ambos da Lei n.° 27/2008, de 30-6, bem como do n.° 3 do art. 3.° do Regulamento Dublin, no confronto com o art. 4.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, e artigo 3.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, quanto à aplicação do Princípio da Não Devolução.
N. Tudo, constituindo NULIDADE da douta Sentença.
Nestes termos, E nos mais de direito doutamente supridos e aplicados, - Deve ser recebido o presente RECURSO, por via do qual, deve ser anulada ou declarada a nulidade da referida decisão proferida pelo TAC de Lisboa, porque infundada e não provada nem devidamente fundamentada, ferida com vicio de omissão de pronúncia, de recusa da protecção internacional / asilo ao requerente, nos termos do...
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