Acórdão nº 2341/10.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA PINHOL
Data da Resolução16 de Setembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I.

RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA veio recorrer da sentença do Mmº Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a oposição deduzida contra a execução fiscal inicialmente instaurada contra a Sociedade «A…..

– S….., Lda» para cobrança coerciva de dívidas referentes a IVA dos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005, no montante total de € 17.257,72 e que reverteu contra a oponente S......

, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: «I.

o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a oposição judicial, intentada por S......, já devidamente identificada nos autos e que, em consequência, ordenou a extinção contra si da execução por dívidas da sociedade “A..... - S....., Lda.” (PEF 42…… e apensos).

II.

Entende a Fazenda Pública que mal esteve o Tribunal a quo na douta sentença proferida porquanto, existindo elementos nos autos que impunham decisão diversa na apreciação dos factos relevantes, promoveu uma errónea aplicação do direito a estes mesmos factos, ao considerar que os factos dados como provados não demonstram com segurança uma realidade susceptível de evidenciar o exercício da gerência efectiva ou de facto por parte da Oponente; entendimento este que não deve subsistir por não ser congruente com os elementos constantes dos autos, impondo-se, salvo melhor opinião, a anulação da sentença recorrida.

III.

Ora, como bem refere a sentença recorrida, não é possível partir-se do pressuposto de que com a mera prova da titularidade da qualidade de gerente pode presumir-se a gerência de facto, sendo todavia possível efectuar tal presunção se o tribunal, à face das regras da experiência, entender que há uma forte probabilidade de nesse exercício a gerência de facto ter ocorrido.

IV.

E tendo presente este entendimento constantemente reafirmado pelos nossos tribunais superiores é que a Fazenda Pública entende constarem dos autos elementos suficientes para através de uma presunção judicial inferir a gerência de facto da Oponente.

V.

E para isto não convocamos somente a gerência de direito, mas ainda os diversos elementos que resultaram provados na sentença recorrida e que impunham uma decisão diferente daquela veio à luz.

VI.

Com efeito, resultam dos autos que a Oponente representava a devedora originária diante dos clientes e também era o rosto da sociedade devedora originária diante dos terceiros, vinculando-a perante terceiros.

VII.

O facto de a mesma não contactar directamente o contabilista da sociedade ou dar a ordem de pagamento dos impostos não determina inexoravelmente o seu afastamento da gerência de facto. Nesta parte, importante é ter presente que os rumos da sociedade passavam também pelas suas mãos. E como resulta do probatório, a Oponente teve divergências com a outra sócia gerente, sua irmã, sobre os rumos da sociedade, o que a determinado momento levou a que renunciasse à gerência da devedora originária. Daqui resulta a conclusão empírica de que ambas discutiam constantemente os destinos da empresa que tinham de gerir e que só com o agravamento destas divergências a Oponente resolveu se afastar da gerência da mesma através da renúncia à gerência nominal.

VIII.

Resulta ainda dos autos que os rendimentos auferidos pela Oponente eram variáveis, o que indicia não ser a mesma uma mera trabalhadora cumpridora de ordens da outra gerente, sua irmã. Esta circunstância permite inferir que a mesma assumia também os riscos do negócio, auferindo rendimentos na medida dos resultados obtidos, pois que também ela seria responsável por estes.

IX.

Consta também do probatório que a oponente assinava documentos e cheques e estava ciente das contas por pagar. Deste modo, não se pode obliterar que era peça fundamental no funcionamento da devedora originária, podendo se quisesse contrapor a sua vontade à vontade da outra sócia gerente, o que aliás se subentende pelo facto de a sociedade se vincular através da assinatura conjunta de ambos os gerentes.

X.

Tendo tudo isto presente, deve-se atentar no disposto no art.º 24º, n.º1, al. b) da Lei Geral Tributária (LGT) o qual dispõe que: 1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si: (…) b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

XI. Mais tem sido entendimento constante da jurisprudência dos nossos tribunais que “O tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição quanto à gerência de facto, pode utilizar presunções judiciais, motivo por que, com base na gerência de direito e noutras circunstâncias do caso, nomeadamente as posições assumidas no processo e provas produzidas ou não pelo revertido e pela Fazenda Pública, pode, usando de regras de experiência, inferir a gerência de facto”- cfr. Acórdão do TCAN n.º 00349/05.6BEBRG, de 03/11/2010.

XII.

Todo o acervo processual, designadamente aquele reflectido no probatório da sentença em causa, inclui elementos factuais que permitem ao julgador, no uso das mais elementares regras da experiência e do bom senso, concluir que a Oponente foi gerente de facto da devedora originária, exercendo-a em conjunto com a sua irmã até ao momento em que as divergências se tornaram inconciliáveis. Face ao referido, deve-se assim concluir que a Oponente era gerente de direito e gerente de facto, sendo responsável pelo facto de a devedora originária não ter cumprido o dever fundamental de pagar os impostos.

XIII.

Em suma, com o devido e muito respeito, a Sentença ora recorrida, ao decidir como efectivamente o fez, menosprezou o entendimento consolidado e...

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