Acórdão nº 2111/18.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | PEDRO MARCHÃO MARQUES |
Data da Resolução | 12 de Setembro de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório João ..........
intentou a presente acção administrativa ao abrigo do disposto no artigo 48.º, n.º 1 in fine, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, contra o Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE e contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP, mediante a qual peticionou a condenação destas a assumir a responsabilidade pelo acidente de trabalho, com o inerente desencadeamento do procedimento para a verificação e atribuição da incapacidade permanente e respectiva atribuição da indemnização devida, acrescida de juros de mora.
Por sentença do TAC de Lisboa de 17.05.2019, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo sido fixado o seguinte dispositivo: “Condeno o 2.º Réu ─ Caixa Geral de Aposentações, I.P. (CGA) ─ na verificação e reparação da incapacidade permanente respeitante ao acidente em serviço sofrido pelo Autor a 25/10/2012, devendo para tanto diligenciar pela realização da junta médica destinada à verificação e graduação daquela incapacidade, seguindo-se os demais termos.
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Absolvo o 1º Réu ─ Centro Hospitalar Lisboa Norte, E.P.E. ─ do pedido.
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Condeno o 2.º Réu nas custas do processo, calculadas nos termos do art.º 12.º/1/c) do RCP e da tabela I-B do mesmo Regulamento”.
A Caixa Geral de Aposentações vem interpor recurso da mesma decisão, concluindo a sua alegação como segue: A- Por força do disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, exercendo a Autor funções numa entidade pública empresarial, o regime de proteção em caso de acidente de trabalho que lhe é aplicável é o previsto no Código de Trabalho.
B- Sendo o Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE, uma entidade pública empresarial, sempre se terá de considerar que os seus trabalhadores, independentemente de lhes ser aplicável o regime de proteção social convergente ou o regime geral de segurança social, não se encontram abrangidos por tal diploma, sendo-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho.
C- Decorre do regime previsto no Código de Trabalho, designadamente dos seus artigos 281.º e seguintes, que, aplicando-se tal regime, não existe qualquer intervenção da Caixa Geral de Aposentações na qualificação da lesão como acidente de trabalho ou na fixação da incapacidade permanente.
D- Pelo que, a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não compete, por conseguinte, à Caixa Geral de Aposentações, mas sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.
E- Com aquela norma, evita-se que a CGA tenha de reparar acidentes cujo encargo com a reparação acaba por recair sobre a entidade empregadora, no caso o Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE (cfr. o disposto no artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro).
F- A solução consagrada na lei traduz a intenção do legislador de tratar por igual os trabalhadores que exerçam funções em entidades de natureza empresarial, independentemente da natureza do vínculo de que sejam titulares.
G- O n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, veio alterar o regime, determinando que aos trabalhadores das entidades públicas empresariais do SNS que mantenham o regime de proteção social convergente é aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, que apenas poderá ser aplicado aos acidentes ocorridos após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro.
H- Pelo que ao decidir de modo diferente, violou a sentença Recorrida o disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.
O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE.
e o Autor e ora Recorrido contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.
• Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, com a manutenção da sentença recorrida.
• Com dispensa dos vistos legais, importa apreciar e decidir.
• I. 2.
Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar - Se o tribunal a quo errou no julgamento de direito ao não ter concluído que a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não competia à Caixa Geral de Aposentações, mas sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.
• II.
Fundamentação II.1.
De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis:
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JOÃO .......... exercia em Outubro de 2012 as funções de médico, com a categoria de Assistente Graduado Sénior – Chefe do Serviço de Neurologia ─ integrado no mapa do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, E.P.E, ao abrigo de um contrato de trabalho em funções públicas [hoje Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, E.P.E.] — acordo, cfr. fls. 13/68 e 68/68 do processo administrativo junto pelo CHULN (PA1).
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No dia 25/10/2012 sofreu uma queda nas instalações daquele hospital que veio a ser qualificada como “acidente de trabalho” a 30/10/2012 — cfr. participação e qualificação a fls. 2, 15e ss./68 e 68/68 do PA1.
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Aquando da alta atribuída por Junta Médica da ADSE a 29/08/2013 foi proposta a apresentação a Junta Médica da CGA para graduação da incapacidade parcial permanente (IPP) ─ cfr. fls. 11/68 do PA1.
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Mediante requerimento apresentado pelo Autor, foi determinada, a 2/9/2013, a solicitação de Junta Médica à Caixa Geral de Aposentações para determinação da IPP ─ cfr. fls. 13 e ss./68 do PA1.
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O 1º R (CHULN) enviou o procedimento referente àquele acidente ao 2.º R (CGA), solicitando a aludida Junta Médica ─ cfr. fls. 12/68 do PA1.
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Por referência ao Ofício-Circular n.º …/2014 de 09/05/2014 da CGA, o 2º R devolveu, sob ofício de 29/08/2014, o processo relativo ao acidente do Autor ao, então, CHLN, por entender que aquele não se encontrava abrangido pelo regime do Decreto-Lei n.º 503/99, e que «a responsabilidade pela reparação do acidente em causa é da entidade empregadora ou da entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade pelo risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho» ─ cfr. fls. 24/68 do PA1.
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Sob ofício n.º 00…, de 5 de Fevereiro de 2015, o então CHLN (1º Réu nestes autos) remeteu ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho de Lisboa o processo de acidente de trabalho do Autor (e de outros), designadamente, para efeitos do disposto no art.º 99.º e ss. do Código de Processo do Trabalho ─ cfr. DOC 3 junto com a PI e fls. 48 e ss./68 do PA1.
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Esse processo foi devolvido ao CHNL sob despacho do Procurador da República Coordenador, de 20/02/2015, que concluiu pela incompetência, em razão da matéria, das Instâncias Centrais de Trabalho (antes denominadas Tribunais de Trabalho) para conhecer daqueles acidentes em serviço aos quais seria de aplicar o regime jurídico do Decreto-Lei n.º 503/99 ─ cfr. fls. 49 e ss./68 do PA1.
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Da remessa mencionada na alínea g), e da devolução mencionada na alínea anterior, foi o Autor informado ─ cfr. DOC 3 junto com a PI.
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O 1º Réu informou ainda o Autor de que havia interposto recurso hierárquico da decisão mencionada em h) para o Conselho Superior do Ministério Público ─ cfr. o mesmo DOC 3.
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O recurso mencionado na alínea anterior ainda não obteve resposta ─ cfr. informação prestada pelo 1º Reú em audiência prévia.
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Da remessa mencionada na alínea g) foi também dado conhecimento ao 2º Réu, conforme informação de 16/4/2015, a fls. 61/68 do PA1.
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Por missiva dirigida pelo Autor ao 2º Réu, e recebida a 8 de Agosto de 2018, indagou aquele se o 2º Réu assumia a responsabilidade respeitante ao sinistro em causa, ao abrigo do regime previsto no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro ─ cfr. fls. 22 e 23 do PA junto pela CGA, PA2.
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Por ofício n.º 904/2018, datado de 9/8/2018, respondeu a CGA ao Autor que «o referido o referido acidente, não se encontra enquadrado nos termos do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, em conformidade com o disposto no artigo 40.º daquele diploma, uma vez que se trata de um acidente ocorrido em outubro de 2012, anterior à data da sua produção de efeitos (2017-01-01), pelo que, não se encontra abrangido pelo regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro» ─ cfr. fls. 29/30 do mesmo PA2.
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Também o 1º Réu prestou informações ao Autor, a 16 de Agosto de 2018, no sentido de não ter obtido resposta do recurso hierárquico mencionado em j) e de que iriam novamente ser remetidos os processos de acidente em serviço à CGA ─ cfr. DOC 8 junto com a petição inicial.
Conforme melhor se perceberá adiante, o dissentimento do Autor e dos Réus não é factual e assenta antes num desacordo quanto ao âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, por referência ao disposto no art.º 2.º/4, na redação introduzida pelo artigo 9.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, que é questão melhor tratada no âmbito da análise jurídica/fundamentação de Direito.
Foi exarada a seguinte motivação da decisão sobre a matéria de facto: Analisando agora criticamente o resultado probatório (art.º 607.º/4 CPC), importa referir que a convicção do Tribunal quanto a todos os factos provados vertidos se formou com base na análise do teor dos documentos pontualmente invocados, juntos pelo Autor e constantes dos PAs apensos pelos dois Réus, e na posição expressa pelas partes nos respectivos articulados.
• II.2.
De direito A questão controvertida no recurso prende-se com o âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, por referência ao disposto no art. 2.º, nº 4, na redacção introduzida pelo artigo...
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