Acórdão nº 580/18.4BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Agosto de 2019
Magistrado Responsável | SOFIA DAVID |
Data da Resolução | 22 de Agosto de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, interpôs recurso da sentença do TAF de Beja, que julgou procedente o pedido de suspensão de eficácia do despacho do Presidente do Conselho Directivo (CD) do IFAP, que determinou a rescisão unilateral do contrato de atribuição de apoio financeiro e ordenou a devolução do apoio concedido.
Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões: “A. O presente recurso jurisdicional vem interposto da douta sentença, datada de 18 de maio de 2019, proferida nos autos à margem identificados, a qual julgou procedente a presente providência cautelar dando por verificados ambos os requisitos previstos nos n°s 1 e n° 2 do artigo 120° do CPTA e, consequentemente determinou a suspensão de eficácia da decisão final proferida pelo IFAP, I.P. constante de ofício n° 5…/2018 DAI-UREC que havia determinado a rescisão unilateral do contrato de atribuição de ajudas, com a exigência de devolução das verbas indevidamente recebidas, no montante total de 178.144,45 EUR.
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A decisão recorrida encontra-se ferida de error in judicando, determinada pela incorreta decisão sobre a matéria de facto e pela incorreta interpretação e aplicação das normas legais e processuais aplicáveis ao caso sub judice.
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Importa, desde logo, salientar que, a sentença proferida, apesar de concluir pela «existência de imprecisões, incongruências e contradições entre os testemunhos (v.g. quanto ao número de trabalhadores, suas funções e vinculo; quanto à disponibilidade e/ou vendas de bombons aos hóspedes do Palacete e quanto ao que foi feito em termos de promoção da empresa até 2018) e entre estes e a prova documental, o que não foi ignorado, mas aceite e valorado, atenta a produção de prova apreciada no seu conjunto» (realçado nosso), dá como assente os factos G), H), I) e J), mas não o poderia ter feito, existindo erro notório na avaliação da matéria de facto considerada indiciariamente provada, propondo-se a eliminação dos factos G), H), I) e J) e aditamento do facto F.1) .
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De facto, basta uma breve análise à prova documental existente no processo, isto é, ao DOC. 23 junto ao requerimento inicial para concluir que os factos G) e I) estão incorretos e deverão ser eliminados porque as máquinas de produção de chocolates não constituem os únicos ativos relevantes da Requerente e dispõe de meios financeiros que lhe permitam devolver o montante concedido pela Entidade Requerida.
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Também o facto H) da matéria de facto dada como provada é falso, porque nenhuma testemunha disse que as máquinas «constituem o único meio de produção do produto (bombons industriais com recheio artesanal) da empresa Requerente», antes, pelo contrário, TODAS realçaram a possibilidade de produção artesanal dos bombons ainda que o processo pudesse ser mais moroso, e, como tal, deverá ser eliminado.
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Relativamente ao facto J) o mesmo deverá ser eliminado porque como resulta do facto C) da matéria de facto assente e do teor do DOC. 5 junto ao requerimento inicial, o contrato de investimento foi celebrado em 2014 e de acordo com a cláusula 4ª, n° 1 do contrato, a data fim da execução material do projeto de investimento terminava a 30/06/2014. Logo, tratando-se o DOC. 23 de balancete de 2018, a conclusão do facto J) é conclusiva e tendenciosa porque não resulta do DOC. 23, nem dos depoimentos prestadas a aplicação do investimento, como pretende dar a entender o Tribunal a quo, num juízo conclusivo e tendencioso, mas apenas a enumeração de algumas despesas e receitas da requerente, salientando-se que a requerente não procedeu à junção aos autos do IRC de 2017 ou de 2018.
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Acresce ao exposto que esta conclusão é contraditória com o referido no depoimento de J..., responsável pela contabilidade da empresa Requerente, que reconheceu o «significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura» e admitido pelo próprio Tribunal a quo (cfr. fls. 11 da sentença proferida, relativamente ao depoimento de J...).
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Deste modo, o Tribunal a quo ignorou deliberadamente a seguinte matéria de facto, apesar da mesma ser referida posteriormente na argumentação de direito, a saber fls. 11 da sentença proferida, entendemos que a mesma deveria constar da matéria de facto dada como assente.
I. Face ao exposto, propõe-se que seja aditado o facto F.1) com o seguinte teor: F.1) De acordo com o responsável pela contabilidade da empresa pese embora a atual situação de pré-insolvência da empresa Requerente (v.g.: face ao significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura; subsistindo face às entradas de dinheiro dos sócios; prejuízos acumulados, etc) existem já algumas evidências ao nível da faturação que permitem admitir como possível a alteração de tal situação, uma vez que os acordos comerciais entretanto fechados e a fechar, estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio, cuja viabilidade económica dependerá das entradas futuras em resultado dos negócios que estão a ser fechados hoje e de não ter que proceder à devolução imediata do montante em causa nos autos (cfr. fls. 11 da sentença proferida, relativamente ao depoimento de J...).
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Assim, o ora recorrente entende que o Tribunal “a quo’’ errou na apreciação da decisão da matéria de facto, ignorando deliberadamente o teor da totalidade dos documentos indicados na matéria de facto dada por provada, julgando incorretamente os factos G), H), I) e J) da matéria de facto dada como provada, face à errada apreciação da prova produzida a respeito de cada um deles, encerrando juízos conclusivos e, como tal, deverão ser eliminados e deverá ser aditado o facto F.1).
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Quanto ao fumus boni iuris, a sentença proferida faz uma incorreta interpretação dos factos e do direito aplicável, porque resulta duma leitura sumária ao DOC. 5 junto ao requerimento inicial, facto dado como provado na alínea C) da matéria de facto dada como assente, as obrigações e prazos a que a requerente estava obrigada, cfr. a este propósito a cláusula 4ª do DOC. 5 junto ao requerimento inicial, da qual consta expressamente que a execução material da operação teve início em 01/01/2013 e fim em 30/06/2014, ocorrendo o termo da operação em 12/11/2018 e não março de 2019 como resulta da sentença proferida, razão pela qual a fundamentação da mesma é contraditória com a própria matéria de facto dada como assente e, como tal, deverá ser revogada.
L. Qualquer cidadão comum ao ler a decisão final compreende que o que está em causa são as obrigações do contrato e o cumprimento dos indicadores de realização material do projeto a que a beneficiária se propôs, metas e indicadores/aprovados em candidatura, não podendo ser abertos precedentes em tão sensível domínio.
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Aliás, resulta da própria sentença proferida, que M..., sócio-gerente da empresa Requerente, prestou declarações sobre factos em que teve intervenção pessoal, sublinhando «que a procura de produto diferenciador - recheio dos bombons; marca e caixas para o mercado internacional - demorou mais tempo do que o previsto no plano de negócios inicialmente apresentado, aduzindo ainda que a opção pela disponibilização de bombons aos clientes do Palacete, e não a sua venda, pode não ter sido a melhor solução, mas que o esforço comercial - sobretudo em feiras de especialidade e internacionais - que tem vindo a ser desenvolvido, começa agora a dar sinais encorajadores em termos de resultados económicos» (realçado nosso, cfr. fls. 10 da sentença proferida relativamente à declaração de parte), ou seja, a própria requerente demonstra que compreendeu perfeitamente o fundamento de facto e de direito da decisão cuja suspensão requer! N. Com efeito, conforme resulta das declarações de parte prestadas e dos depoimentos, as alegadas ilegalidades assacadas ao ato não se apresentam como ostensivas, antes obrigando o Tribunal a proceder a uma tarefa de escrutínio e a um trabalho de análise.
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Quer isto dizer que o fumus boni iuris respeitante ao direito a exercer na ação principal não está evidenciado, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo.
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O próprio responsável pela contabilidade da empresa confirmou o «significativo atraso verificado na concretização do projeto por referência à avaliação inicial feita no plano de negócio apresentado com a candidatura» e «estão a dar uma perspetiva clara de recuperação e de arranque do modelo de negócio», sendo evidente que a requerente violou os objetivos fixados por si própria para a operação em causa, a questão a ser decidida em sede principal é a consequência legal do referido atraso.
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Tendo em conta, quer a documentação junta pela requerente, quer os depoimentos prestados, quer a decisão final proferida pelo ora requerido, verifica-se que as alegadas “vicissitudes” relativas aos prazos de execução são da exclusiva responsabilidade da requerente e serão matéria para ser objeto de análise no âmbito de um processo principal e não no âmbito dos presentes autos cautelares, não se verificando o fumus boni juris.
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Quanto ao periculum in mora, a requerente limitou-se a alegar meros prejuízos, não os provando nem densificando, ou seja, nem sequer alegou factos demonstrativos da sua verificação, limitando-se a referir que o ato suspendendo lhe irá causar graves prejuízos de difícil reparação.
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Salvo melhor entendimento, na situação em apreço, mesmo considerando a matéria de facto dada como provada nas alíneas G) a L) da matéria de facto dada como assente, o Tribunal a quo não quantificou, nem densificou o impacto que a execução do ato teria na situação económica da ora recorrida, nem identificou em que medida torna impossível a execução do projeto, limitando-se a acolher os argumentos invocados pela recorrida, que mais não são do que meros...
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