Acórdão nº 1471/11.5BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 11 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução11 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 31.10.2018, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a oposição apresentada por N..................

(doravante Recorrido ou oponente), ao processo de execução fiscal (PEF) n.º 3301.............., que o Serviço de Finanças (SF) de Lisboa 4 lhe moveu, por reversão de dívidas de IRC do ano de 2008 da devedora originária R...................., Lda.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I.

Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida por N..................à execução fiscal n.º 3301.............., contra si revertida e instaurada originariamente contra a sociedade “R............LDA”, NIPC 501.......... por dívidas de IVA do ano de 2008, no valor total de € 4.145,37, fundamentando a sua posição, em suma, na sua ilegitimidade, por não exercício efectivo da gerência.

II.

A Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à aplicação do artigo 24.º, n.º 1, aliena b) da LGT.

III.

Na verdade, da inscrição no registo comercial da nomeação de alguém como gerente ou administrador resulta a presunção legal de que é gerente/administrador de direito, não de que exerce efectivas funções de gerência/administração (cfr. art.º 11.º do Código do Registo Comercial).

IV.

O estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa.

V.

Ou seja, não resulta dos autos, qualquer incapacidade legal do oponente para o exercício das suas funções, pelo que, a sua responsabilidade inicia-se qua a sua nomeação para o exercício do cargo e da sua livre aceitação do cargo de gerente/administrador.

VI.

Relativamente à gerência, na esteira da Douta sentença do 2.º Juízo Cível do Circulo de Santa Maria da Feira, sentença A. Ordinária n.º 237/2002 “os gestores ou administradores estatutários, ainda que não o sejam na prática, encontram-se numa posição legal de garante em relação aos credores sociais, com vista a que os “gerentes de facto” adoptem métodos de um “gestor criterioso”, impondo-se-lhes um dever de vigilância quanto aos procedimentos de gestão adoptados por este último”.

VII.

“No caso da omissão desse dever de vigilância e se os “gestores ou administradores de facto” não actuarem de modo diligente no exercício dessas funções de direcção, os dirigentes societários estatutários respondem civilmente perante os credores sociais pelos danos causados por aqueles outros “dirigentes de facto”.

VIII.

O Recorrido no exercício das suas funções na sociedade executada tinha como dever zelar pelo cumprimento das obrigações legais da mesma, nomeadamente, em sede de obrigações fiscais.

IX.

Assim, a alegação de que não teve intervenção nos destinos da sociedade, como era seu dever, apenas reforça a posição passiva que norteou a sua actuação, enquanto gerente da sociedade R..........., Lda., por condutas omissivas, ou seja, que se demitiu dos seus deveres, designadamente, de vigilância e diligência de gerência.

X.

Como nos ensina Lima Guerreiro in Lei Geral Tributária, anotada, pág.144/145: “(…)a culpa na insuficiência do património societário pode, hoje, resultar não apenas de condutas comitivas, como omissivas, em particular o não exercício, por desinteresse, das funções de administração e gerência. Nenhum obstáculo legal impede que seja fundamento de responsabilidade tributária essa conduta, já que o abandono legitimo dessas funções configura um facto ilícito e culposo para efeitos do regime da responsabilidade subsidiária (…)”. (destaques nossos) XI.

Ora a nomeação do gerente de uma sociedade, baseada na experiência comum, resulta que o mesmo exercerá as suas funções, por ser conatural de que quem é nomeado para um cargo o exerça na realidade.

XII.

“ (...) a jurisprudência tem vindo a entender que a lei não exige, apara responsabilização dos gerentes pelas dívidas fiscais da sociedade, que estes exerçam uma administração continuada, nem em todas as áreas que se desenvolve a actividade da sociedade”- acórdão do TCA Norte, processo n.º 00129/98 de 06 de Julho.

XIII.

Ora, em bom rigor, não se percebe o alcance pretendido com a aquisição onerosa de uma participação na sociedade – pelo Recorrido – a subsequente designação, nesse mesmo momento, da qualidade de gerente para, logo de seguida, se demitir das suas obrigações e responsabilidades.

XIV.

Afigura-se-nos algo imperceptível como pode o Recorrido afirmar e a sentença proferida confirmar que nunca exerceu a gerência de facto atendendo ao facto de que a sua assinatura, conjuntamente com a de outro socio, tinham a autoridade legal para vincular a devedora originaria no giro comercial.

XV.

Antes do mais se diga que a lei não faz qualquer distinção, para efeitos de responsabilidade subsidiária, entre actos de gestão ou de gerência técnica e actos de natureza administrativa ou financeira. Mais se discorda, ainda, com a sentença recorrida na parte em que desconsidera, por completo e reduz a insignificante a prova da participação do Recorrido nas assembleias gerias da devedora originária.

XVI.

Mas mais evidente é ainda que resulta da leitura da referida acta que, não só o Recorrido tinha perfeito conhecimento da estrutura, funcionamento e desempenho da devedora originária, como era ele quem dava as orientações gerais, como a seguir se transcreve: “o sócio-gerente N..................sugeriu que a forma da liquidação fosse aprovada de imediato… o sócio-gerente N..................colocou então à consideração da assembleia a possibilidade de (…)”.

XVII.

Afigura-se-nos, assim, pouco crível a versão apresentada de um total alheamento e ignorância da situação financeira e fiscal da devedora original. Igualmente pouco crível - até porque nenhuma explicação é dada para o facto - de que o Recorrido tenha adquirido onerosamente uma quota da sociedade, tenha sido designado como sócio- gerente, para nada. Afinal não geria, não tinha lucros, apenas trabalhava como “mero vendedor” enfim, a sua entrada para a sociedade é apresentada como um acto totalmente inútil, a nível de órgão societário.

XVIII.

Não pode a Fazenda Pública concordar com a sentença ora recorrida, nem tão pouco com a versão apresentada pelo Recorrido de negação total da prática de qualquer acto administrativo quando é evidente que o mesmo participava nas Assembleias Gerais da sociedade, podendo até afirmar-se que, face ao supra transcrito, as liderava.

XIX.

E perante tal factualidade, mostra-se sólida a conclusão, extraída por presunção judicial, de que o oponente/Recorrido exerceu a gerência da devedora originária em período concomitante com o da dívida ou seu pagamento.

XX.

A Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à aplicação do artigo 24.º, n.º 1, aliena b) da LGT.

XXI.

Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente oposição judicial, enferma de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei”.

O Recorrido apresentou contra-alegações, nas quais referiu: “

  1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida por N..................à execução fiscal n.º 3301.............., contra si revertida e instaurada originariamente contra a sociedade “R.......... LDA”, NIPC 501.......... por dívidas de IVA do ano de 2008, no valor total de €...

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