Acórdão nº 400/07.5BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, no 2º Juízo da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul I – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por ORLANDO .........., visando a revogação da sentença de 25-10-2016, que julgou totalmente improcedente a acção ADMINISTRATIVA ESPECIAL proposta contra o MUNICÍPIO DE GRÂNDOLA, na qual peticionou a declaração de que a Entidade Demandada omitiu a prática de ato a que estava obrigada e, bem assim, a sua intimação a emitir o alvará de licença de construção requerido, fixação de sanção pecuniária compulsória e ainda a condenação no pagamento de indemnização ao A. pelos danos que se vierem a liquidar em sede de execução de sentença.

Nas suas alegações, formulou o Recorrente as seguintes conclusões: “ 1ª O aresto em recurso enferma da nulidade prevista na alínea c) do nª 1 do artº 615° do CPC por haver uma absoluta contradição entre os factos dados por provados e a decisão alcançada, uma vez que é de todo Inconciliável que se dê por provado que o procedimento de pagamento das taxas foi suspenso e depois se conclua e decida que é legal a recusa da emissão do alvará por as taxas (cujo procedimento fora suspenso) não terem sido pagas. Acresce que 2° O aresto em recurso enferma Igualmente da nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artº 615° do CPC, seja por ter decidido uma questão que não fora Invocada por qualquer das partes e de que não poderia conhecer - a questão da falta de fundamentação do acto que ordenara a suspensão do procedimento de emissão do alvará -, seja por ter deixado de conhecer questões efectivamente colocadas pelas partes - a ilegalidade do acto que ordenara a suspensão por não haver norma legal a autorizar a suspensão do procedimento especial de emissão de alvará e por o artº 31° do CPA não ser aplicável ao caso sub judice.

  1. O aresto em recurso incorreu em manifesto erro de julgamento na decisão da matéria de facto, uma vez que deu por provados inúmeros factos que não foram alegados pelas partes (v. alíneas B), F), G), H), J), K), L), S), T), Z) da factologia dada por provada), que não assumiam a qualidade de factos instrumentais e que nem sequer foram submetidos a prova, numa clara violação do princípio do dispositivo, do princípio do contraditório e do princípio da igualdade de armas entre as partes, podendo-se dizer que, apesar de os factos não terem sido alegados, basta ao Estado colocar uma foto ou qualquer outra informação no processo instrutor para que o Tribunal dê logo por provado que aquela foto ou que aquela informação é verdadeira, sem sequer submeter esses pretensos e nunca alegados factos a prova e ao contraditório do administrado. 4° Contra o exposto não procede o argumento de que os factos não alegados pelas parles constavam do processo instrutor, uma vez que não se pode ignorar que o princípio do inquisitório não permite ao Tribunal socorrer-se de factos não alegados e ir "pesquisar novos factos" no processo instrutor, para além de que este processo é elaborado por uma das parles em litígio e, portanto, não só não faz prova plena dos factos como seguramente o que dele consta e não foi alegado nos articulados tem de ser sujeito a prova e ao contraditório da outra parte, sob pena de a igualdade de armas consagrada na lei processual não passar de "letra morta" e de uma parte ter mais direitos e mais credibilidade em juízo do que a outra, ao ponto de lhe bastar Juntar um conjunto de documentos particulares para que o que neles se afirma passar a ser "pura verdade" e nem sequer merecer ser submetido a prova. Para além disso, 5° O aresto em recurso incorreu em flagrante erro de julgamento ao considerar legítima a recusa de emissão do alvará, uma vez que tal recusa viola frontalmente o princípio da legalidade, consagrado no ar!º 3° do CPA, e o disposto no nº 5 do artº 76º do DL nº 555/ 99, representando ainda a Imposição de uma restrição por via administrativa a um direito, liberdade e garantia - o direito de propriedade privada -, ao arrepio do disposto no artº 18º da Constituição - que determina justamente que as restrições têm de estar expressamente previstas na lei.

Na verdade, 6° É pacífico nos presentes autos que a Câmara Municipal de Grândola licenciou em 31 de Maio de 2006 a reconstrução e ampliação de uma moradia existente no terreno do A,, que este requereu a emissão do alvará de construção e que o Município não o emitiu com fundamento no facto de ter decretado a suspensão do procedimento para a emissão do alvará de licença de construção, Incluindo o pagamento das respectivas taxas. 7° Consequentemente, a única questão jurídica relevante nos presentes autos prende-se com saber se por lei é permitido ao Município suspender o procedimento de emissão do alvará de licença de construção, designadamente com fundamento numa outra decisão tomada no âmbito de um outro procedimento administrativo que nada tem a ver com o licenciamento da construção que motivara o pedido de emissão do respectivo alvará. Ora, 8ª De acordo com a tramitação prevista na lei especial que rege o procedimento de emissão do alvará de licenciamento da construção, a Administração tem 30 dias para emitir o alvará e só pode recusar a sua emissão nas situações taxativamente enunciadas na lei (v. nºs 1, 4 e 5 do artº 76º do DL nº 555/99), pelo que não constando entre tais fundamentos a suspensão do próprio procedimento conducente à emissão do alvará - mas apenas a suspensão, revogação ou anulação do próprio acto de licenciamento - é por demais notório que a entidade demandada aditou por via administrativa um novo fundamento de recusa de emissão de alvará, em clara violação do princípio da legalidade, do disposto no nª 5 do criº 76º do DL nº 555/99, e do criº 18° da Constituição, que apenas permite restrições a direitos fundamentais previstas expressamente na lei. Por outro lado, 9º A suspensão do procedimento conducente à emissão do alvará de licença de construção com fundamento no ar!° 31° do CPA é completamente ilegal, seja por em causa estar um procedimento especial de curta duração e com garantias acrescidas para o administrado, ao qual, portanto, não é aplicável a figura da suspensão prevista na lei geral (v., neste sentido o n. 7 do artº 2° do CPA à data em vigor), mas também por no caso sub judicie não estarem sequer preenchidos os pressupostos de que o referido artigo do CPA faz depender a possibilidade de ser decretada a suspensão de um procedimento administrativo, não havendo qualquer relação de prejudicialidade entre o procedimento de emissão do alvará de uma construção já licenciada e o procedimento de demolição de dois pré-fabricados. I0º Para além disso, mesmo que por hipótese houvesse qualquer relação de prejudicialidade, sempre a suspensão do procedimento conducente à emissão do alvará até à decisão da Impugnação judicial da ordem de demolição dos pré- fabricados representaria uma clara violação do disposto no artº 106° do DL nº 555/ 99 e do efeito suspensivo Inerente à Impugnação judicial de tal ordem de demolição, uma vez que estando ex vi legis suspensos os efeitos do decidido no procedimento de demolição não poderia a entidade demandada socorrer-se de um ceio cujos efeitos estavam suspensos para suspender outro procedimento administrativo, justamente por Isso constituir uma forma encapotada de atribuir eficácia a decisões que eram Ineficazes por força de lei. 11º Consequentemente, não prevendo as normas especiais que regem o procedimento especial de emissão do alvará a possibilidade de não se emitir - ao fim de 30 dias - o alvará com fundamento na suspensão do próprio procedimento conducente à emissão desse mesmo alvará e não sendo aplicável ao mesmo - até por os respectivos pressupostos não estarem preenchidos - a figura geral da suspensão do procedimento administrativo prevista no artº 31º do CPA, é por demais evidente o erro de julgamento em que Incorreu o aresto em recurso ao considerar legal a não emissão do alvará por parte da entidade demandada, até por ser entendimento da doutrina especializada que "tendo o acto de licenciamento ou de autorização sido validamente produzido, estando apenas a produção de efeitos dependente da emissão de alvará, não há como recusar a sua emissão" (v. M8 JOSÉ CASTANHEIRA NEVES, FERNANDA PAULO OLIVEIRA, DULCE LOPES, in Regime Jurídico da Urbanização e Edificação Comentado, Almedina, 2006, pág. 376). 12ª O erro de julgamento em que Incorreu o aresto em recurso ao considerar legítima a recusa de emissão do alvará ainda mais notório se torna se se tiver presente que, em virtude de se ter decretado a suspensão do procedimento destinado à emissão daquele alvará, não poderia a questão do não pagamento das taxas ser impeditiva da intimação da entidade demandada a emitir o alvará, justamente por as taxas não terem sido pagas precisamente em virtude da ilegal suspensão do procedimento decretada pela entidade demandada - suspensão essa que implicava a suspensão da própria liquidação e pagamento das taxas, como reconheceu o Tribunal a quo -, razão pela qual a não Intimação à emissão do alvará com o argumento de as taxas não terem sido pagas representa uma afronta das mais elementares regras de justiça e constitui uma compensação para quem violou a lei e por culpa de quem as taxas não foram pagas. 13ª Por Isso mesmo, uma vez demonstrada a Ilegalidade do acto de suspensão do procedimento destinado à emissão do alvará de licenciamento, o Tribunal a quo teria de ter Intimado o Município de Grãndola a retomar o procedimento administrativo e a emitir o alvará, sendo certo que se depois dessa Intimação as taxas não fossem pagas estaria a Câmara Municipal em condições de, então sim, legitimamente não emitir o alvará. Nestes termos, Deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, com as legais consequências. Assim será cumprido o Direito e feita JUSTIÇA! ” Não houve contra-alegações por parte do MUNICÍPIO DE GRÂNDOLA.

A Mª Juíza a quo admitiu o recurso e pronunciou-se...

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