Acórdão nº 688/15.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: A........, Lda., posteriormente designada por L…., Lda, devidamente identificada nos autos de ação administrativa de impugnação de ato administrativo, instaurada contra o Instituto da Segurança Social, IP, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão proferida em 31/12/2017, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou procedentes as exceções dilatórias de inimpugnabilidade e de caducidade do direito de acção e absolveu a Entidade Demandada da instância.

* Formula a aqui Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “

  1. A A. em ação administrativa especial movida contra o Instituto da Segurança Social, peticionou a anulação do ato que ordenou a reposição do valor de € 18.049,80, correspondente à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego reconhecido à beneficiária A..... , alegando que não foi notificada anteriormente da existência de qualquer processo relacionado com a trabalhadora em causa, e muito menos da decisão e fundamentos que levaram a tal nota de reposição ou à obrigatoriedade de restituir qualquer prestação.

  2. Alegou ainda que tal falta de comunicação à entidade empregadora, determinou desde logo o coartar do seu direito de defesa, bem como dos seus direitos de audiência previa, pelo que deverá ser anulada a nota de reposição e ordenado que seja cumprido o direito de audiência previa ou, caso assim não se entenda, lhe seja notificada a decisão e seus fundamentos, uma vez que a atuação do órgão em causa viola os mais elementares princípios constitucionais e previstos no Código do Procedimento Administrativo - art. 55º, n.ºs 1 e 3 do CPA, art. 100º do mesmo diploma e ainda, o principio da participação - art. 8º e 66º CPA.

  3. Por fim que da nota de reposição em apreço não resultam quais os factos que lhe deram origem, nem os fundamentos de Direito da mesma. Como tal, a ordem de reposição ordenada e notificada é nula. - arts. 123º, 124º e 125º do CPA.

  4. A R. defendeu-se por exceção.

  5. Veio a ser proferido saneador-sentença em 31 de dezembro de 2017, a julgar procedentes as exceções de impugnabilidade do ato e de caducidade do direito de ação invocadas pelo Réu, com a sua consequente absolvição da instância.

  6. A A. não pode aceitar sem mais a decisão do Tribunal a quo.

  7. De facto, têm sido considerados pela doutrina e Jurisprudência requisitos dos atos confirmativos o conhecimento do interessado do ato confirmado e da sua recorribilidade, a identidade de sujeitos, a existência da mesma situação fáctica (identidade do objeto), o mesmo regime jurídico e a mesma decisão, quer no ato confirmado, como no ato confirmativo e a lesividade do ato confirmado, não sendo estes, em princípio contenciosamente impugnáveis.

  8. No entanto, diga-se antes de mais, que ao admitir-se que quanto à identidade dos sujeitos na parte Autora que não constitui requisito essencial a idêntica personalidade, relevando apenas a origem da titularidade dos poderes exercidos, está a retirar-se toda a virtualidade ao meio de Impugnação Recurso Hierárquico.

  9. Acresce que esta forma de salvaguarda dos direitos dos particulares por ser graciosa e não contenciosa deveria em todo o caso prevalecer, ainda que tenha deixado de ser regra.

  10. Importa ainda referir que são inúmeras as vantagens que este meio comporta, mormente a nível de facilidade de interposição e custos, sendo portanto uma garantia imprescindível na salvaguarda efetiva dos direitos dos administrados.

  11. O despacho impugnado não pode ser tido como meramente confirmativo da decisão anterior de indeferimento, uma vez que é proferido após o exercício do contraditório por parte da A.

  12. O despacho é ainda impugnável porque, apesar do exercício do contraditório, o mesmo não está devidamente fundamentado nem faz qualquer apreciação crítica dos argumentos deduzidos.

  13. O despacho impugnado é um verdadeiro ato administrativo nos termos do disposto no art.º 148.º do CPTA.

  14. Aliás, o ato supra referido tem verdadeira eficácia externa e é potencialmente lesivo de direitos ou interesses legalmente protegidos – critério máximo –, pois destina-se a firmar uma decisão com esse intuito, ainda que tenha havido um ato que o precedeu - e esse sim sem efeitos estáveis, dado o seu carácter unilateral e desprovido do contraditório exigível em qualquer processo justo e equitativo.

  15. Acresce que in casu e na realidade, não fora tomada qualquer decisão que se possa estabilizar na ordem jurídica, uma vez que o ato primário careceu de falta de fundamentação e que tal facto serviu inclusive de base ao recurso hierárquico.

  16. A decisão que recaiu sobre o recurso hierárquico interposto, ao manter nos precisos termos a decisão recorrida, transportou consigo os mesmos vícios, e o próprio de omissão de pronúncia e de emissão de juízo valorativo acerca dos argumentos proferidos pelo A. no exercício do contraditório.

  17. Ainda que se admitisse o carácter confirmativo do ato, o ato tido como primário pela ora Ré, só poderia ser considerado nulo, dada a sua falta de fundamentação, a sua ininteligibilidade, o seu carácter lesivo de direitos fundamentais do administrado e a interpretação e aplicação atroz ao sentido da lei que consigo comporta.

  18. Acresce que a nossa Lei Fundamental, por via do número 4 do artigo 268º garante aos administrados o direito a impugnar junto dos tribunais quaisquer atos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma.

  19. Conclui-se deste modo, que é inegável a impugnabilidade do ato tido pela ora Ré como meramente confirmativo e com cuja classificação não se pode compactuar.

  20. Por outro lado, a nota de reposição impugnada, ainda que se destinasse a pôr em prática a determinação contida no ato exequendo, é inegável que é lesivo de direitos ou interesses legalmente protegidos da A.

  21. Certo é ainda, que o ato em causa ao ser consequência lógica de um ato que padece de nulidade, conforme se crê veemente, não poderá deixar de ser impugnável.

  22. Invoca ainda a Ré a caducidade do Direito de Ação quanto ao Ato Primário, exceção a qual o Tribunal a quo deu como procedente.

  23. Com tal decisão a A. não se pode igualmente conformar, uma vez que esse ato primário, não lhe fora, para todos os efeitos, notificado.

  24. Alega ainda a Ré, que mesmo que ainda só se tivesse em conta a data de recebimento da nota de reposição n.º 803… de 12/12/2012, na data de 17/12/2012 pela ora A., e da qual a mesma apresentou recurso hierárquico, vislumbra-se igualmente a extemporaneidade do meio processual utilizado.

  25. Ora, em 7/03/2013 a A. interpôs recurso hierárquico da decisão final constante da nota de reposição n.º 803…., a qual lhe foi notificada em 17/12/2012.

  26. O dito recurso hierárquico foi objeto de análise e decisão, a qual foi notificada à A. em 08/01/2015.

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  27. De acordo com o artigo 172º do CPA, o autor do ato em crise, deve no prazo de 15 dias pronunciar-se sobre o recurso e remetê-lo ao órgão competente para dele conhecer, notificando o recorrente de tal remessa, o que não aconteceu.

    bb) Por sua vez, nos termos do artigo 175º/1 CPA, a administração tem 30 dias úteis para decidir do meio gracioso, ou seja, tinha até à data de 14/05/2013 para decidir daquele, o que também não aconteceu. Apenas em 22/12/2014 foi proferido despacho de indeferimento do recurso hierárquico apresentado, tendo sido o mesmo notificado à ora A. em 08/01/2015.

    cc) Assim, a A. em 20 de março de 2015, apresentou ação administrativa especial de pretensão conexa com atos administrativos, a qual julga não poder ser tida como extemporânea, em caso algum.

    dd) Se não vejamos, o artigo 59º/4 do CPTA, na redação em vigor à data dos factos ditava: “A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal”.

    ee) Desta leitura e de acordo com a interpretação mais favorável ao Administrado - que se encontra em desvantagem na relação controvertida-, facilmente se depreende que a suspensão do prazo de impugnação contenciosa apenas cessa com a notificação da decisão da impugnação administrativa.

    ff) Aliás, leitura diferente não resulta da lei e não vai de encontro às legítimas expetativas do administrado, ora A.

    gg) Refira-se ainda que da parte da Ré, por causas que o A. desconhece, foi ultrapassado largamente o prazo legalmente previsto para a remessa do processo ao órgão competente, e ainda de forma mais sobeja, o previsto para a decisão do recurso hierárquico interposto.

    hh) É inevitável afirmar-se que estamos perante uma verdadeira omissão do dever de decidir por parte do R. e sendo a pretensão do Administrado obter uma nova decisão que permita atender aos seus legítimos interesses, teria este que beneficiar da suspensão do prazo de impugnação contenciosa até que da decisão da impugnação administrativa fosse notificado.

    ii) Entendimento diferente e, salvo melhor opinião, afigura-se para o A. como um permitir de atropelos graves aos seus direitos como Administrado, pois a este não foi sequer dada, em tempo útil, uma resposta ao seu pedido de reavaliação da sua situação.

    jj) Acresce que a lei ao não impedir a impugnação contenciosa do ato na pendência da impugnação administrativa, também a tal não obriga.

    kk) Refira-se ainda que são inúmeros os benefícios de uma suspensão automática do prazo para impugnação contenciosa, com o recurso à via administrativa.

    ll) Em todo o caso, a impugnação de atos nulos, conforme se julga ser o ato primário, pode ser feita a todo o tempo, conforme o plasmado no número 1 do artigo 58º do CPTA.”.

    Pede que a sentença seja revogada e substituída por outra que não obste à apreciação do mérito da causa.

    * O Recorrido, Instituto da Segurança Social, IP, notificado, apresentou contraalegações, tendo assim concluído: “A-...

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