Acórdão nº 2412/17.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO J.... interpôs recurso da sentença do TAC de Lisboa, que julgou extinto o presente processo cautelar, no qual peticiona a suspensão da eficácia do acto administrativo de encerramento do estabelecimento de apoio social sem denominação, sito na Rua Dr. C…. nº ….Lisboa.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente as seguintes conclusões:”A. Não pode o Recorrente aceitar a Decisão de improcedência da Acção Principal, uma vez que, nada na lei refere que o prazo de três meses para instaurar a Acção Principal de que os Autos Cautelares dependem se inicia a contar da notificação do acto ocorrido aos 27/09/2017.

  1. Na realidade, o acto administrativo que os Autos Cautelares visam suspender a sua eficácia embora tenha sido notificado aos 27/09/2017, só se tornaria efectivo 30 dias depois, conforme a sua própria notificação, ou seja, o acto administrativo só se tornou exequível aos 27/10/2017.

  2. Tendo sido essa data que o Recorrente tomou em consideração para cumprir o prazo de 3 meses para instaurar a Acção Principal.

  3. Cumprindo assim o ónus que sobre si impende.

  4. Assim, nos termos do disposto no artigo 58.º do CPTA o prazo de três meses foi cumprido, pois só após a eficácia do acto administrativo é que o mesmo se torna estável no ordenamento jurídico, só dessa data em diante é possível o mesmo produzir os seus efeitos na esfera jurídica do Requerente.

  5. Não houve assim incumprimento do prazo para a propositura da acção principal, o que se requer a V. Exas. se Dignem revogar a Sentença recorrida, substituindo-a por uma outra que a admita, prosseguindo-se os seus termos até final.

  6. Por outro lado, o Recorrente invocou também a nulidade do acto administrativo.

  7. Sendo que “… as providências cautelares relativas a actos nulos, tal como as respectivas acções, não estão sujeitas a prazo ...”, porque “… os actos nulos podem ser impugnados a todo o tempo - art. 134.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo -, não existe qualquer prazo expresso para intentar as providências cautelares nesta hipótese e, pelo contrário, podem ser intentadas já depois de interposta a acção principal - art. 114.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos …”.

    I. A doutrina produzida nesta sede veio sustentar, igualmente, a possibilidade de dedução de providência cautelar de suspensão de eficácia para além do prazo previsto no art. 58.º, n.º 2 e 3 do CPTA [relativos aos actos administrativos arguidos de anulabilidade] quando sejam invocadas ilegalidades geradoras de nulidade ou inexistência, sendo que tal suspensão de eficácia só deverá ser recusada se for manifesta a improcedência das causas de nulidade ou de inexistência invocadas (cfr. M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha, in: ob. cit., págs. 727 e 728; A….. em “Tutela cautelar: prazos, caducidade e repetição da providência” in: CJA n.º 75, págs. 28 e segs.).

  8. É certo que entre o procedimento cautelar e o meio contencioso principal existe uma relação de instrumentalidade e de dependência do primeiro relativamente ao segundo.

  9. Na verdade, sendo o direito processual instrumental em relação ao direito material e o direito de acção o meio por intermédio do qual se faz valer o direito material afirmado pelo A. (cfr. art. 20.º da CRP), o procedimento cautelar, enquanto meio no qual se pretende provisoriamente acautelar o direito afirmado, caracteriza-se por uma instrumentalidade, a “garantia da garantia” na expressão feliz de Calamandrei ou, como ensinava J. Alberto dos Reis, é um tipo de tutela jurisdicional que visa apontar os meios para que a tutela jurisdicional final realize os seus fins.

    L. As providências cautelares estão necessariamente dependentes de uma acção já pendente ou a instaurar posteriormente, acautelando ou antecipando provisoriamente os efeitos da pronúncia jurisdicional definitiva, na pressuposição de que venha a ser favorável ao requerente a decisão a proferir no processo principal.

  10. De harmonia com o que se dispõe na al. a) do n.º 1 do art. 114.º do CPTA as providências cautelares podem ser apresentadas previamente, juntamente ou na pendência do processo principal.

  11. A lei, todavia, não indica de forma especificada nenhum prazo para a apresentação desse pedido cautelar, o que exige que o intérprete analise as normas legais atinentes a essa matéria tendo em vista encontrar a melhor e a mais adequada solução.

  12. Assim, no que toca aos actos anuláveis e quando o meio principal a utilizar seja a acção administrativa especial, essa solução apresenta-se sem dificuldades, porquanto a mesma surge claramente, ainda que de modo indirecto, do disposto nos arts. 58.º, 113.º e 123.º, n.º 1, al. a) do CPTA.

  13. Na verdade, resulta da conjugação destas normas que tal pedido terá de ser interposto dentro do prazo previsto para a interposição daquele meio contencioso principal, salvo se se tratar de providência deduzida na pendência daquele processo.

  14. E isto porque, fora daquelas situações de dedução na pendência na acção principal, se o interessado optar por apresentar o pedido cautelar juntamente com a acção administrativa especial o prazo a observar - atenta a natureza acessória e instrumental daquele pedido - terá de ser o previsto para a apresentação da acção, mas se se inclinar pela apresentação prévia desse pedido está obrigado a apresentá-lo também dentro do prazo previsto para a interposição da acção, uma vez que o pedido cautelar caducará com o termo do prazo concedido ao interessado para dedução do meio contencioso adequado de impugnação de actos anuláveis, sem a respectiva interposição.

  15. Caso estejamos perante a dedução de meio contencioso em que se invoque(m) ilegalidade(s) gerador(as) de nulidade ou de inexistência do acto o pedido cautelar pode ser apresentado conjuntamente com a acção administrativa e se a apresentação desta pode ser feita a todo o tempo aquele pedido também poderá ser feito a todo o tempo, desde que o mesmo acompanhe a apresentação daquela acção administrativa.

  16. Também tal pedido cautelar pode ser apresentado previamente à instauração da acção administrativa especial e pode-o ser a todo o tempo, mas, então, uma vez instaurada a providência e esta decidida favoravelmente com trânsito em julgado o mesmo terá de instaurar a acção administrativa no prazo de três meses contados desde o trânsito em julgado da decisão cautelar [cfr. art. 123.º, n.º 2 do CPTA] sob pena de caducidade, já que se assim não for o requerente, obtido o deferimento da sua providência, poderia manter-se indefinidamente inactivo e, desta forma, alcançar por meios ínvios, certamente não desejados pelo legislador, a paralisação definitiva dos efeitos do acto.

  17. Não basta, pois, que o requerente tenha interposto o meio contencioso principal, visto ainda ser necessário que esse meio venha a ser interposto no prazo legalmente estabelecido naquele normativo para lograr assegurar e beneficiar do deferimento da tutela cautelar.

  18. Atente-se, ainda, que o A. de acção administrativa não sujeita a prazo, mormente, uma acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo fundada em ilegalidade geradora do desvalor da nulidade, pode na pendência daquela acção deduzir também meio contencioso cautelar com vista a assegurar, em termos preventivos, aquela tutela e, reunidos os requisitos legais, obter a procedência da sua pretensão cautelar.

    V. O regime enunciado no art. 123.º do CPTA constitui, como aludimos, uma decorrência dessa instrumentalidade das providências cautelares em relação ao processo principal, inferindo-se do seu teor a clara dependência entre as providências decretadas e as vicissitudes relativas a este processo.

  19. Este preceito disciplina as várias ocorrências das quais pode resultar a caducidade das providências cautelares decretadas na acção administrativa principal instaurada [cfr. n.º 1 e suas várias alíneas] ou a instaurar [cfr. seu n.º 2], pressupondo-se neste normativo que tenha já havido decretamento/deferimento de providência cautelar cuja caducidade vem, entretanto, a produzir-se por verificação de alguma das situações ali elencadas.

    X. Por outro lado, do regime do preceito em análise não se extrai qualquer regra para as situações em que, na pendência de meio contencioso cautelar e sem que no mesmo tivesse sido emitida qualquer decisão judicial, venha a ocorrer caducidade do direito que se pretendia vir a tutelar na acção principal e que o meio cautelar era dependente.

  20. De facto, como acabámos de referir o art. 123.º do CPTA mostra-se gizado no pressuposto de que tenha sido decretada providência cautelar, decretamento esse que vem, todavia, a caducar preenchidas que se mostrem as condições enumeradas nos n.ºs 1 e 2, sendo que naquela outra situação, ora acabada de enunciar no parágrafo antecedente, o preceito não responde, nem prevê, impondo-se o recurso à regra decorrente do art. 389.º do CPC e que conduz à extinção da instância cautelar por inutilidade superveniente da lide por força do art. 287.º, al. e) do mesmo Código “ex vi” art. 01.º do CPTA (M. Aroso de Almeida e C. A. Fernandes Cadilha in: ob. cit., págs. 726/727, nota 1).

  21. Não fará sentido que o tribunal prossiga os autos cautelares para prolação de uma decisão de mérito em termos cautelares, quando, na hipótese de ela vir a...

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