Acórdão nº 2511/14.1BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução04 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO O Município de Cascais, devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 18/04/2017, que no âmbito da ação administrativa especial de impugnação de ato administrativo, instaurada por J....

, julgou a ação procedente e anulou a decisão de aplicação da pena disciplinar de multa.

* Formula o aqui Recorrente, Município de Cascais nas respetivas alegações (cfr. fls. 159 e segs. – paginação referente ao processo em suporte físico, tal como as referências posteriores), as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem: “A. O presente Recurso é interposto, da sentença proferida pelo Tribunal a quo, em 18.04.2017 nos autos acima referenciados, que julgou procedente a ação administrativa especial, e, em consequência anula a decisão impugnada datada de 7.7.2014, que aplicou ao Autor a pena de multa de € 200,00, suspensa, pelo período de 120 dias, nos termos do artigo n.º 25º n.º 2 do Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro (doravante ED).

B. Entende a ora Recorrente que a sentença padece de vício de erro na apreciação da matéria de facto e, em consequência, de erro de julgamento, em virtude do Tribunal a quo ter concluído que o autor não pode ser punido porque não infringiu os deveres profissionais de zelo e lealdade.

C. Dos factos provados resulta claramente que a conduta do ora Recorrido violou os deveres de zelo e de lealdade em virtude de ter obrigação de saber que a sua conduta não era permitida.

D. Existindo um auto de vistoria no processo, o ora Recorrido não podia simplesmente ter elaborado outro auto e introduzi-lo no processo SPO 1709/2013.

E. O ora Recorrido tinha a obrigação de informar a sua Chefia de que aquele auto não era válido, por estar desconforme com a vistoria realizada em 12.8.2013, devendo ser, por isso, revogado e realizada nova vistoria.

F. Da factualidade provada resulta que o ora Recorrido, podia ter agido de outra forma e que intencionalmente não informou a sua Chefia de todos os factos, não reclamou da ordem recebida e elaborou outro auto, não afastando, por isso, a sua responsabilidade disciplinar.

G. O dever de zelo impõe a obrigação de se atuar utilizando os conhecimentos e as competências consideradas essenciais para a concretização dos objetivos do serviço.

H. O dever de lealdade implica que funcionário seja obrigado a prosseguir a sua atividade para além de um estrito cumprimento, criando-lhe deveres acessórios de "bom cumprimento", ou cumprimento tendo em vista os objetivos concretos do serviço.

I. No caso em concreto, o ora Recorrido tinha obrigação de saber, e sabia, que não podia inserir outro auto de vistoria no processo, ou outro documento com esse fim, sem que o primeiro tivesse sido revogado.

J. Acresce que o ora Recorrido agiu, em obediência a um ordem emanada da sua chefia, cuja finalidade sabia ser errónea, sem ter esclarecido a sua chefia do erro em que esta incorria e sem lhe dar conhecimento de todos os factos, pelo que, agiu violando o dever de zelo e o dever de lealdade ao abrigo do disposto nas alíneas e) e g) do n.º 2 do artigo 3º do Estatuto Disciplinar.

K. Do relatório final resulta claro que o Recorrido com a sua conduta violou os deveres de zelo e de lealdade, não se compreendendo a posição do Tribunal a quo ao considerar que a demandada não concretiza as normas violadas.

L. Da matéria provada não resulta que tenham sido detetadas ou invocadas causas de exclusão da ilicitude, nem fundamento para afastamento do dolo face à sua conduta já que atendendo à função desempenhada tinha pleno conhecimento dos factos e dos seus deveres.

M. Razão pela qual a ora Recorrente entende que a douta sentença merece censura, e requer a V. Exas. a respetiva revogação e substituição por outra que reconheça que foi praticada infração disciplinar por violação dos deveres de zelo e de lealdade.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente e alterada a decisão recorrida.

* O ora Recorrido, notificado da admissão do recursão, apresentou contra-alegações, tendo assim concluído: “

  1. A título de conclusão, poderemos dizer que não assiste razão à recorrente, quando afirma que a sentença padece de vício de erro na apreciação da matéria de facto e, em consequência, de erro de julgamento, em virtude do tribunal a quo ter concluído que o recorrido não pode ser punido porque não infringiu os deveres profissionais de zelo e lealdade b) O recorrido nunca perpetuou comportamentos que se consubstanciem em prática de violação dos deveres a que estava obrigado, até porque, nunca na acusação que lhe foi comunicada, o mesmo não vinha acusado de não avisar o chefe.

  2. O recorrido defendeu-se dos factos que vinham vertidos na acusação e, em parte alguma, essa acusação fez referência a que o recorrido tinha que avisar o chefe de que já existia outro auto.

  3. Na verdade, primeiro que tudo, o documento junto pelo recorrido, não era um auto, pois só estava assinado por este, e) Depois, o auto elaborado a assinado pelos Técnicos V…., V… e P…., um auto de vistoria, que foi introduzido no processo, sem o conhecimento do recorrido.

  4. Nunca o recorrido, introduziu no processo outro auto, pois só estaremos perante um auto de vistoria, quando elaborado pelos intervenientes e por este s assinados.

  5. O auto de vistoria, resulta de um conjunto de intervenientes, um órgão colegial, que elabora e assina um auto comprovativo da sua intervenção, o que não foi o caso, pelo que não tinha nem tem razão a Recorrente, ao informar que houve por parte do tribunal a quo erro na interpretação da matéria de facto.

  6. O recorrido não só informou a sua chefia da existência de um auto de vistoria assinado pelos Técnicos V…, V….. e P…., um auto de vistoria, que foi introduzido no processo como também deu conhecimento à chefia de que havia um auto de vistoria assinado pelos Técnicos V...., V....e P…., um auto de vistoria, que foi introduzido no processo, sem o seu conhecimento, pois este tinha isso efetuar uma vistoria e não tinha elaborado o auto de vistoria por discórdia entre os mesmos do colégio que constituíam a vistoria.

  7. Portanto, não houve por parte do recorrido, qualquer obrigação de informar o chefe de que já existia um auto de vistoria.

  8. O que o recorrido tinha que fazer e fez, foi informar a sua chefia que, na sua ausência, tinha sido elaborado um auto de vistoria, pelos Técnicos V...., V....e P…., um auto de vistoria, e que foi introduzido no processo.

  9. Portanto e bem, o tribunal a quo decidiu e bem que o recorrido, não violou nenhum deveres a que estava obrigado, pelo que não assiste razão à recorrente mas ao tribunal a que bem decidiu.”.

Pede que seja mantida a decisão do Tribunal a quo.

* Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não foi emitido parecer.

* O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II.

DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas pelo Recorrente, resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de: Erro de julgamento, por errada apreciação da matéria de facto ao concluir que o Autor não infringiu os deveres de zelo e de lealdade, em violação das alíneas e) e g), do n.º 2 do artigo 3.º do Estatuto Disciplinar.

III.

FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “

  1. O autor é licenciado em arquitetura e exerce funções na Câmara Municipal de Cascais, na carreira de Técnico Superior – ver documentos juntos aos autos.

    B) No dia 5.9.2013 foi efetuada participação pelo Engenheiro P...., Chefe da Divisão de Fiscalização, Obras e Infraestruturas da Câmara Municipal de Cascais, pela eventual prática do crime de falsificação de documento, pela eventual prática do crime de subtração de documento, previsto pelo art 259º do Código Penal, eventual violação do dever geral de...

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