Acórdão nº 00579/16.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução12 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A CVM – Atividades Hoteleiras ACE, devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa que intentou contra o Município de C...

na qual peticionou, “que seja anulado o ato administrativo correspondente à deliberação n.º 2135/2016, de 06/06/2016, da Câmara Municipal de C..., pela qual foi determinada a cessação do Alvará n.º 3/2004, de 29/10 – Renovação, concedido ao A., ao abrigo dos pontos 8.3, 8.3.1, 8.3.1.1 e 8.3.2 das Condições Gerais do Caderno de Encargos referente ao “Concurso Público destinado à atribuição de licença para utilização e exploração de estabelecimentos de restauração ou afins no Parque VM... – 3.ª Fase”, nos termos e com os fundamentos expressos na informação n.º 19633, de 25/05/2016, da Diretora do Departamento de Administração Geral, tudo com as legais consequências”, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença do TAF de Coimbra de 3 de janeiro de 2019 que julgou “procedente a exceção de incompetência absoluta deste tribunal, por preterição do tribunal arbitral voluntário”.

Formulou o aqui Recorrente/CV nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentado em 12 de fevereiro de 2019, as seguintes conclusões: “1. A douta sentença recorrida de fls. deve ser revogada.

  1. A convenção de arbitragem, sob qualquer uma das formas em que é admitida, constitui um negócio jurídico próprio e autónomo, que está sujeito a forma escrita, constituindo um acordo assinado pelas partes intervenientes.

  2. No caso dos autos, tal convenção não existe, na medida em que nenhum acordo ou convenção de arbitragem foi assinado entre A. e R.

  3. O R., regulou os direitos e deveres da A., no âmbito de uma concessão de exploração, por meio de ato administrativo, em alternativa à figura do contrato administrativo.

  4. Consequentemente, e debalde existir um procedimento público de seleção prévio à emanação daquele ato administrativo regulador, nenhuma convenção de arbitragem foi formalizada entre as partes.

  5. Com o devido respeito, a mera situação de sujeição gerada pela adesão do A. ao ato administrativo titulador da concessão não configura uma “convenção de arbitragem”.

  6. Nada impedindo que o R., querendo, submetesse à subscrição pelo A. de uma convenção de arbitragem propriamente dita, o que não fez.

  7. A forma escrita da convenção de arbitragem é da maior relevância, para poder sujeitá-la à hermenêutica dos artigos 236º, nº 1 e 238º, nº 1, do Código Civil, verificando-se, dessa forma, se houve, ou não, uma renúncia expressa à jurisdição estadual.

  8. Dado que é sabido que é possível haver competências concorrentes entre o foro estadual e o foro arbitral, cabendo a escolha ao demandante.

  9. O que, no caso vertente, não é possível fazer.

  10. E que é da maior importância para definir o âmbito de aplicação de uma alegada convenção de arbitragem.

  11. Tanto mais que, da redação do CPTA em vigor à época (2004), decorria claramente que a lei não queria submeter à arbitrabilidade todos os atos administrativos.

  12. Designadamente, os atos inválidos, cf. al. c) do nº 1 do artigo 180º do CPTA (conjugado com o disposto no artigo 140º do CPA, na redação conferida pelo Decreto-Lei nº 442/91, de 9.11).

  13. Com efeito, o ato de atribuição de licença é um ato constitutivo de direitos, pelo que apenas poderia ser revogado com fundamento na sua invalidade.

  14. Ora, mesmo que se entenda que existia uma convenção de arbitragem – o que não se concede – não é possível deixar de interpretar a sua latitude e eficácia em face do conspecto vigente à data (2004).

  15. Sendo claro que, nessa ocasião, não havia uma arbitrabilidade plena de atos administrativos, o que só veio a ocorrer em 2015.

  16. Donde, a concluir-se existir uma “convenção de arbitragem”, sempre a mesma teria de ser o produto de uma vontade hipotético-conjuntural, a qual, sendo reportada à data da sua formação, nunca poderia incluir atos administrativos “extracontratuais”, designadamente, atos como aquele objeto dos presentes autos.

  17. Aliás, nesse sentido depõe a fórmula ambígua da alegada “convenção”, a qual nem sequer é clara quanto ao seu objeto.

  18. Razão pela qual não poderia o Tribunal recorrido lançar mão da alteração legislativa de 2015 para afirmar que, numa disposição de 2004, já se previa a arbitrabilidade de atos administrativos como o dos autos.

  19. O que, claramente, faz tábua rasa de qualquer vontade hipotética, descaracterizando definitivamente a existência de qualquer convenção (que, caso existisse, deveria ser interpretada, o que não foi).

  20. Pelo que, também por aqui, se verifica a inexistência de qualquer exceção de preterição de Tribunal Arbitral.

  21. Devendo revogar-se a douta sentença de fls., julgando-se improcedente tal exceção, determinando-se o ulterior prosseguimento dos autos, com as legais consequências.

Termos em que, nos mais de Direito que V. Ex.ªs doutamente suprirão, e em conformidade com as conclusões supra alinhadas, se deve dar provimento ao presente recurso ordinário de apelação, e, consequentemente, revogar-se a douta sentença recorrida de fls., substituindo-se a mesma por decisão que julgue totalmente improcedente a exceção de preterição de Tribunal Arbitral invocada pelo R., ordenando-se o ulterior prosseguimento dos autos, tudo com as legais consequências.”*O Recorrido/Município, não veio a apresentar contra-alegações de Recurso.

*O Despacho de admissão do Recurso veio a ser proferido em 1 de abril de 2019.

*Já neste TCAN, tendo o Ministério Público sido notificado em 8 de abril de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.

*Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

*II - Questões a apreciar As questões a apreciar resultam da necessidade de verificar, designadamente, a invocada inexistência de convenção de arbitragem, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada, a qual aqui se reproduz: “1) Em 2004 o R. lançou o procedimento de “Concurso Público destinado à atribuição de licença para utilização e exploração de estabelecimentos de restauração ou afins no Parque VM... – 3.ª Fase”, tendo o A. apresentado proposta (acordo e cfr. processo administrativo).

2) Do ponto 20 do Programa do Concurso, sob a epígrafe “Minuta do alvará de licença, notificação, adjudicação e caução”, consta o seguinte: “20.1 Ao concorrente cuja proposta haja sido preferida será enviada formalmente uma minuta do Alvará de licença, ficando aquele obrigado a pronunciar-se sobre a mesma no prazo de cinco (5) dias úteis após a sua receção, findo o qual, se o não fizer, se considerará aprovada a mesma minuta.

20.2 As bases do Alvará de licença a celebrar para a Exploração serão estabelecidas atendendo aos elementos incluídos no Processo de Concurso e aos apresentados pelo concorrente preferido desde que aceites pela Entidade Adjudicante.

20.3 Consideram-se integrados no Alvará de licença em tudo quanto por ele não for explícita ou implicitamente contrariado, todos os elementos patentes no concurso e demais elementos definidos no Caderno de Encargos como sendo parte integrante do Alvará de licença” (cfr. Programa do Concurso constante de doc. de fls. não numeradas do processo administrativo).

3) Da cláusula 10.2 do Caderno de Encargos do concurso, sob a epígrafe “Arbitragem”, consta o seguinte: “10.2.1. As dúvidas ou divergências que possam surgir na interpretação ou execução do Alvará da Licença serão submetidas à decisão de Tribunal Arbitral, a instituir nos termos da Lei Geral.

10.2.2. O Tribunal Arbitral funcionará na Comarca de Coimbra” (cfr. Caderno de Encargos constante de doc. de fls. não numeradas do processo administrativo).

4) Na sequência da escolha da proposta apresentada pelo A. no concurso público em apreço e após notificação para o efeito, este pronunciou-se, por carta datada de 26/07/2004, sobre o teor da proposta de...

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