Acórdão nº 00618/18.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução12 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO NMSMCB instaurou acção administrativa contra a Câmara Municipal P…, ambos melhor identificados nos autos, pedindo que se declare nulo o acto administrativo praticado por esta e que se reconheça o seu direito a habitar o imóvel sito na Rua A…, Bloco 1x, entrada xx5, casa 4x, Bairro do R..., 4250-069 P….

O TAF do Porto proferiu saneador sentença julgando procedente a excepção de caducidade do direito de acção e absolvendo o Réu da instância.

Deste vem interposto recurso.

Alegando, o Autor concluiu:

  1. A sentença ora em recurso entendeu que os vícios imputados pelo autor ao ato impugnado são geradores de mera anulabilidade, estando, portanto, a sua impugnação sujeita ao prazo de três meses.

  2. No entanto, os vícios expressamente imputados na P.I. ao ato administrativo são geradores de nulidade, e não apenas anulabilidade, o que determina que o direito de ação do autor, aqui recorrente, possa ser exercido a todo o tempo.

  3. E, assim, beneficia do prazo para as ações fundadas em nulidade.

  4. O direito à habitação constitui um direito fundamental constitucionalmente consagrado.

  5. Em abstrato, e sendo o direito à habitação um direito fundamental, a verdade é que a sua violação comporta a nulidade do ato administrativo que o ofende, conforme estabelece o art. 161.° do Código do Procedimento Administrativo.

  6. Tendo a P.I. da ação interposta pelo autor invocado expressamente a violação do conteúdo essencial de um direito fundamental, cuja sanção é a nulidade do ato, e tendo fundamentado de forma adequada o referido vicio, o direito de interposição da ação não está sujeito a prazo.

  7. Quando o autor invoque vícios a que a lei impute a nulidade, beneficiará do prazo para as ações fundadas em nulidade, desde que essa invocação esteja devidamente fundamentada, o que aconteceu.

  8. Nestes termos, como o autor invocou e fundamentou devidamente a nulidade do ato praticado - nulidade essa que pode ser invocada a todo o tempo, nos termos do art.° 162.°, n.° 2 do Código de Procedimento Administrativo e art.° 58.° CPTA - não caducou o respetivo direito de ação.

Temos em que deve ser revogada a sentença de que se recorre, e em sua substituição ser proferida nova decisão noz termos supra referidos.

Conforme é de justiça*A Ré juntou contra-alegações sem conclusões, finalizando assim: NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE E, CONSEQUENTEMENTE, SER MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA.

*O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

*Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1. Pelo Município P…, foi atribuída ao Autor a casa 4x, da entrada xx5, do Bloco 1x da Rua de A…, Bairro do R... (vide “Notificação – Decisão de resolução do arrendamento apoiado”, a fls. 14 a 17 vº do suporte físico dos autos) 2. Por despacho de 6 de setembro de 2017, do Presidente do Conselho de Administração da «DomusSocial, EM», foi determinada a “resolução do arrendamento apoiado correspondente à casa 4x, da entrada xx5, do bloco 1x da Rua A…, R...”. (vide “Notificação – Decisão de resolução do arrendamento apoiado”, a fls. 14 a 17 vº do suporte físico dos autos; idem a fls. 261 a 257 do PA) 3. No dia 19 de outubro de 2017 o Autor assinou declaração em como havia tomado conhecimento da decisão de resolução do arrendamento apoiado. (fls. 257 vº do PA) 4. No dia 5 de dezembro de 2017, o Autor requereu à «DomusSocial, EM», a concessão da prorrogação do prazo de entrega da habitação, até ao fevereiro de 2018. (vide fls. 265 do PA) 5. No dia 14 de março de 2018, foi intentada via correio eletrónico a presente Ação Administrativa. (fls. 3 do suporte físico dos autos)XDE DIREITO Está posta em causa a decisão que julgou procedente a arguida excepção de caducidade do direito de acção.

Na óptica do Recorrente não é sustentável, antes é ofensivo do princípio da tutela jurisdicional efectiva, de consagração constitucional e de legislação infraconstitucional, que uma decisão punitiva afectada de nulidade, não possa ser submetida ao escrutínio do órgão de soberania tribunal.

Cremos que carece de razão.

Antes, atente-se no discurso fundamentador da decisão: Cumpre começar por analisar a invocada caducidade do direito de ação, por estarem ultrapassados mais de três meses após a data da notificação da decisão.

No seguimento do que acima se deu por assente, verifica-se que o Autor foi notificado no dia 19 de outubro de 2017 da decisão de resolução do contrato de arrendamento; e que intentou a presente ação no dia 14 de março de 2018.

Ora, entre estas datas medeiam quase cinco meses, pelo que se mostra ultrapassado o prazo de três meses previsto no artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do Código de processo nos Tribunais Administrativos (CPTA). Prazo, esse que é o disponível para impugnação de atos anuláveis.

Não obstante, o Autor alega que se está diante de um ato nulo, por isso a ação está em tempo.

Conforme é sabido, o prazo de impugnação judicial de um ato administrativo anulável é de três meses – vide artigo 58.º, n.º 1, alínea b) do CPTA – Código de Processo nos Tribunais Administrativos. O prazo de três meses é o aplicável mesmo nas situações de resolução de contrato de arrendamento de habitação social, ainda que invocada a nulidade da resolução (ato impugnado).

Veja-se sobre o assunto o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 06 de Março de 2015, proc. 01064/13.2BEPRT, que a dado passo refere: “Como se salienta, entre outros, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 374/2002, o direito à habitação, enquanto direito a ter uma morada decente ou condigna (65.º da CRP), assume essencialmente uma dimensão social de “um direito a prestações, de conteúdo não determinável ao nível das opções constitucionais, a pressupor, antes, uma tarefa de concretização e de mediação do legislador ordinário, cuja efetividade está dependente da reserva do possível, em termos políticos, económicos e sociais”. Ou seja, o direito à habitação, enquanto direito fundamental de natureza social, “pressupõe a mediação do legislador ordinário destinada a concretizar o respetivo conteúdo” (Acórdão do TC n.º 829/96), dele não se retirando um “direito imediato a uma prestação efetiva” (Acórdão do TC n.º 280/93.” A partir do momento em que não existe um direito imediato à atribuição de uma habitação, o ato impugnado não pode ser passível de nulidade, pelo facto de se ter resolvido o contrato de arrendamento social. Isto porque, o direito à habitação social carece de preencher determinados pressupostos de facto e de direito, os quais não se encontrando satisfeitos, não importam qualquer direito para o interessado.

Ora, o direito à habitação consagrado no artigo 65.º da Constituição corresponde a uma norma...

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