Acórdão nº 02223/15.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução23 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Dr.

AMB, médico, residente na Rua O…, 4050, Porto, portador do NIF 2xxx69, instaurou acção administrativa comum contra o Centro Hospitalar do Porto, E. P. E.

, com sede no Largo Professor Abel Salazar, 4099-001 Porto, e a Administração Regional de Saúde do Norte, I. P., com sede na Rua de Santa Catarina, nº 1288, 4000-447 Porto, pedindo a condenação destes no pagamento da soma de € 14.584,84 (catorze mil quinhentos e oitenta e quatro euros e oitenta e quatro cêntimos), acrescida dos respectivos juros de mora vencidos desde a citação até integral e efectivo pagamento, além das custas.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção e absolvidos os Réus dos pedidos.

Desta vem interposto recurso.

*Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: 1 – O contrato administrativo de provimento celebrado pelo recorrente converteu-se num contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto, por via do disposto na alínea d) do nº 1 do artº 91º da Lei nº 12-A/2008.

2 – Tal contrato teve em vista a realização do internato complementar de pediatria médica que se iniciou em 27 de Março de 2006 e terminou em 15 de Julho de 2011.

3 – O recorrente manteve-se ao serviço após o dia 15 de Julho de 2011, tendo o recorrido Centro Hospitalar do Porto, dois anos depois, em 12 de Julho de 2013, declarado a caducidade do contrato, a qual produziu efeitos reportados a 15 de Setembro de 2013.

4 – Nesse período, já habilitado como especialista, o recorrente continuou a ser pago como interno.

5 - A cessação do contrato do recorrente confere-lhe o direito à compensação prevista no artº 253º do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.

6 – A atribuição pecuniária correspondente a tal direito visa compensar o trabalhador pela natureza precária do vínculo, visando igualmente tornar mais oneroso este tipo de contratação.

7 – A sentença sob recurso ao considerar que o caso “sub judice”, no que à cessação respeita, estava, por força da lei, subtraído à vontade da empregadora, obrigada que estava a fazer cessar o contrato logo que o internato cessasse, contraria os factos e contradiz-se.

8 – Os factos demonstram que o contrato se manteve mais de dois anos após o termo do internato e que a empregadora se arrependeu de o ter cessado e pretendia o regresso do recorrente.

9 – A própria sentença considerou, erradamente, que só por vontade do recorrente a relação contratual não se manteve, admitindo, portanto, que a mesma permanecesse no tempo, incerta, com os constrangimentos inerentes, nomeadamente de precariedade.

10 – Também erradamente, e com todo o respeito se expressa, escreveu-se nos factos provados que o A. recusou permanecer nas suas funções, quando verdade é que recusou retomar as suas funções.

11 - Não é exacto que a caducidade só se tivesse concretizado porque o recorrente assim o quis.

12 – O recorrido comunicou em 17 de Julho de 2013 ao recorrente que o seu contrato cessaria por caducidade 60 dias depois, ou seja, em 15 de Setembro de 2013, sendo certo que essa declaração de vontade tão pouco foi revogada até esta última data.

13 – A declaração de vontade que tem um destinatário torna-se irrevogável logo que chega ao seu poder, como decorre dos artigos 224º nº 1 e 230º nº 1 do C. Civil.

14 – Está demonstrado que só após o dia 15 de Setembro de 2013, e em data incerta, é que o recorrente foi contactado oralmente para retomar as suas funções e assinar uma declaração tendo isso em vista, o que recusou.

15 – A caducidade já se tinha concretizado, por iniciativa da empregadora, e não descaracteriza a involuntariedade da situação de desemprego a recusa do recorrente em aceitar que a empregadora revogasse a sua decisão (para além da lei, há também outros limites à admissão destas situações...).

16 – Assim, forçoso é concluir que o recorrente é totalmente estranho à caducidade do seu contrato, tendo o vínculo contratual sido quebrado pelo empregador.

17 – Deverá, pois, a sentença proferida ser revogada, reconhecendo-se o direito do recorrente ao recebimento da compensação por caducidade do contrato e julgando a acção procedente.

Nestes termos e nos mais de Direito que suprirão deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogada a sentença proferida, julgada a acção procedente e reconhecido o direito do recorrente ao recebimento da compensação por caducidade do contrato, com o que se fará Justiça.

*O co-Réu CHP, EPE juntou contra-alegações, concluindo: 1ª Não é devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade, de contrato de trabalho a termo resolutivo sob o qual actualmente se titulam os "internatos médicos" dada a natureza jurídica destes enquanto período de formação especializada e «tendo na sua base necessidades formativas do contratado» (Acórdão do TCAN); 2ª Essa natureza jurídica não tem qualquer paralelo com a contratação a termo resolutivo amplamente prevista no Código do Trabalho e admitida na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei nº 35/2014, de 20-6) e está claramente expressa no regime jurídico do internato médico, a constante do Dec-Lei nº 203/2004, de 18-8 aplicável ao caso dos autos; 3ª Não se verificando, como a jurisprudência assinala, nenhuma similitude entre a contratação precária e a razão de ser da consagração da compensação atribuída pela caducidade e a caducidade do título de vinculação sob o qual se desenvolvem os internatos médicos; 4ª Acresce que os internatos médicos, como processos de formação especializada tendentes à obtenção de uma habilitação profissional, promovida pela Administração da Saúde, têm as suas vicissitudes - geradoras de eventual caducidade - associadas ao próprio desempenho do formando, que pode lograr uma avaliação positiva ou não e, naquele caso, pode lograr elegibilidade em concurso de recrutamento associado ao seu ciclo de formação ou a outros; 5ª E não estão relacionados com qualquer processo de formação de vontade para a denúncia e consequente caducidade do vínculo por parte da Administração Pública; 6ª O recorrente foi "informado" da caducidade do vínculo, por ter ocorrido o facto correspondente - a não elegibilidade do médico no concurso a que se candidatara - sem qualquer protagonismo ou contributo do Hospital, mas igualmente informado, logo de seguida, que por despacho ministerial havia sido concedida autorização para o seu recrutamento nominativo, tendo recusado a contratação; 7ª É inquestionável a vontade expressa do recorrente em recusar a contratação, resultante da instrução e prova e da sua própria posição dos autos; 8ª Tudo o que dá sentido e densidade ao acerto da sentença recorrida! Termos em que, e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado não provado e improcedente, com as legais consequências, vg de confirmação da sentença recorrida, Assim se fazendo JUSTIÇA!*O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

*Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1.

Em 27.03.2006, entre o Autor e o então Hospital Central Especializado de Crianças Maria Pia foi firmado um contrato designado “contrato administrativo de provimento”, do qual consta: “(…) É celebrado ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art.º 14.º e alínea b) do n.º 2 do art.º 15.º do Dec-Lei nº 427/89, de 07.12 com a nova redação dada pelo Dec-Lei nº 218/98, de 17.07 e artº 13º do Dec-Lei 203/2004, de 18.08, o presente contrato administrativo de provimento, que se rege pelas seguintes cláusulas: 1ª O primeiro outorgante admite ao seu serviço o (a) segundo (a) outorgante, com a categoria profissional de médico interno do internato complementar de pediatria médica, escalão 1, índice 90 a que corresponde actualmente a remuneração mensal de 1.721,19€, bem como subsídio de refeição, actualizável nos termos do Estatuto Remuneratório dos Funcionários e Agentes da Administração Pública.

  1. O presente contrato é celebrado por um ano com início em 27.03.2006, de acordo com o despacho de Sua Excelência o Secretário Geral do Ministério da Saúde de 21.03.2006.

  2. Sem prejuízo do estipulado na cláusula seguinte, o presente contrato considera-se tácito e sucessivamente renovável por iguais períodos se não for oportunamente denunciado ou rescindido nos termos do n.º 2, do art.º 30º, do Dec-Lei nº 427/89 de 07.12.

  3. A renovação do presente contrato administrativo de provimento tem como limite o termo do Internato Complementar de Pediatria Médica.

(…)” Cf. documento de fls. 9 e 10 dos autos em suporte físico; 2.

Em 15.07.2011, o Autor concluiu o internato médico, tendo obtido a especialidade na área de pediatria médica – cf. documentos de fls. 14/15 dos autos em suporte físico; 3.

Por missiva datada de 12.07.2013, o réu Centro Hospitalar do Porto comunicou ao Autor o seguinte: “(…) Fica V. Ex.ª notificado, pela presente comunicação, de que, nos termos do n.º 1 do art.º 253º da Lei n.º59/2008, cessará, no prazo de sessenta dias, o contrato a termo resolutivo incerto celebrado para efeitos de realização do internato médico.

Caso esteja a aguardar a celebração de contrato, consequente à seleção resultante dos procedimentos simplificados, atinentes ao recrutamento de pessoal médico, deverá declará-lo junto deste Centro Hospitalar.

(…)”; Cf. documentos de fls. 13 dos autos em suporte físico, e de fls. 5 e 6 do PA apenso; 4.

A missiva referida no ponto anterior foi recebida pelo Autor em 17.07.2013 – cf. documento de fls. 6 do PA apenso; 5.

O Autor continuou a exercer as funções que vinha exercendo até 15.09.2013; 6.

Após o referido dia 15.09.2013, o Autor foi chamado a apresentar-se nos serviços de pessoal do réu Centro Hospitalar do Porto; 7.

E foi-lhe aí proposta a assinatura de uma declaração tendo em vista a sua permanência nas funções que exercera até 15.09.2013; 8.

O que o Autor recusou; 9.

Não foi paga ao Autor qualquer quantia a...

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