Acórdão nº 51/04.6BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução19 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Relatório J.... (recorrente) instaurou ação administrativa especial de impugnação dos despachos de 26.5.2003 e de 28.9.2006, que aprovaram o pedido de licenciamento da remodelação de posto de abastecimento de combustíveis, ao abrigo da Portaria nº 131/02, de 9.2, contra o Município de Leiria e O.... – S...., Lda (recorridos).

A 26.4.2012 foi proferido acórdão que julgou a ação improcedente e absolveu a entidade demandada e a contrainteressada do pedido.

Inconformado com a decisão o autor recorreu por considerar que ela padece de erro na interpretação dos pressupostos de facto e de direito e concluiu as suas alegações do modo seguinte: 1) Em 29 de novembro de 2002 a contrainteressada requereu a concessão de licença para a "operação urbanística que consta de demolição e construção ao abrigo da Portaria nº 131/02 de 2002"; 2) Em 26 de Maio de 2003 a Câmara Municipal de Leiria deliberou aprovar o projeto de arquitetura; 3) Em 26 de fevereiro de 2004 a contrainteressada apresentou nos serviços da entidade demandada uma reformulação do projeto de arquitetura aprovado em 26 de maio de 2003 (...); 4) Por deliberação de 28 de setembro de 2006, a Câmara Municipal de Leiria decidiu aprovar por unanimidade o projeto de arquitetura e autorizar o licenciamento da operação urbanística referente ao processo de obras n.º 149….; 5) Foi junta ao processo planta geral do projeto em análise, onde se verifica que a distância entre o reservatório n.º 6 e o centro comercial Galerias Mouzinho de Albuquerque é de 17 metros e que a distância entre o reservatório n.º 5 e o passeio pedonal da Rua Mouzinho de Albuquerque é de 2,52 metros; 6) Nas Galerias Mouzinho de Albuquerque há garagens de uso privado para 30 a 37 lugares de estacionamento; 7) O âmbito do presente recurso resume-se às seguintes questões: Primeira: Um passeio pedonal contíguo a um posto de abastecimento de combustíveis, situado em pleno centro urbano e em área consolidada, através do qual os veículos automóveis acedem ao posto de combustível, deverá ser considerado, para efeitos de aplicação do RCEPAC, como «área sensível»? Segunda: Um parque de estacionamento subterrâneo, adjacente a uma superfície comercial composta por diversos estabelecimentos comerciais, deverá ser considerado, para efeitos de aplicação do RCEPAC, como «área sensível», independentemente da sua capacidade e do tipo de uso que lhe é dado? 8) A norma em apreço (artigo 2º, al d) do Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis aprovado pela Portaria 130/ 2002, de 09 de fevereiro) dispõe que para efeitos do presente diploma, entende-se por «Área sensível» a área que pela sua dimensão ou utilização possa originar embaraços ou perigos para a circulação, tal como parques de estacionamento contíguos ou adjacentes a recintos desportivos, de espetáculos e culturais, superfícies comerciais, centros comerciais e afins, incluindo os acessos exclusivos de todas as estruturas atrás referidas, bem como parques de estacionamento públicos ou privado para mais de 50 veículos, excluindo o estacionamento em via pública.

9) Quanto à primeira questão, respeitante ao passeio pedonal, entendeu o Tribunal a quo que a norma do artigo 2º, al d) do RCEPAC visa proteger a "circulação" em si mesma considerada, e indiretamente a segurança rodoviária, face aos riscos inerentes ao movimento de veículos, i.e., ao tráfego rodoviário.» 10) Com todo o respeito, discorda o recorrente deste entendimento, pois parece que a circulação pedonal também deverá ser considerada no âmbito da proteção que a norma pretende salvaguardar.

11) Com efeito, a par da circulação de veículos, também a circulação pedonal na via pública também está sujeita a direitos e a obrigações, sendo inúmeras as disposições do Código da Estrada que impõem condutas de circulação aos peões, e bem assim são inúmeras as normas do mesmo Código que visam a salvaguarda da segurança dos peões que circulem em passeios pedonais e na via pública.

12) Mais, são inquestionáveis as preocupações evidenciadas pelo RCEPAC na salvaguarda da segurança de pessoas e bens e do correto ordenamento do território, sendo que os preâmbulos da Portaria n.º 131/ 2002, de 09 de fevereiro (que o aprovou) e do DL nº 302/2001, de 23 de novembro (que estabeleceu o quadro legal para a sua aplicação) refletem bem tais preocupações, quando se ferem a «introdução de padrões de segurança mais rigorosos e eficazes, quer quanto à qualidade dos materiais a utilizar quer quanto às condições dos locais destinados à implantação e exploração dos postos».

13) Está, pois, subjacente ao RCEPAC, o afastamento dos postos de abastecimento de combustíveis dos centros urbanos e de aglomerados populacionais.

14) Ora, o passeio pedonal em crise não é um qualquer passeio pedonal, pois trata-se de um passeio situado num centro urbano, utilizado diariamente por largas centenas de pessoas e através do qual os veículos acedem ao posto de abastecimento em apreço.

15) Daí que, uma interpretação da norma constante da alínea d) do artigo 2º do RCEPAC, ao encontro do pensamento legislativo subjacente ( cfr. artigo 9º do Código Civil) - relacionado quer com a segurança de pessoas e bens, quer com o direito a um ambiente e qualidade de vida humanos, sadios e ecologicamente equilibrados, assegurados, além do mais, pela promoção do ordenamento do território com uma correta localização das atividades ( cfr. artigo 66.º da Constituição da República Portuguesa ) - conduz-nos a considerar, in casu, este passeio pedonal como uma «Área sensível».

16) Dito de outro modo, na dúvida, a norma deve ser interpretada ao encontro dos interesses que a mesma pretende proteger, in casu, de forma inquestionável, a segurança de pessoas e bens.

17) Aliás, o próprio Município réu já havia reconhecido a bondade desta solução, por ocasião da apreciação de um anterior projeto de remodelação do mesmo posto, apresentado pela contrainteressada O.... em 1997, indeferindo tal pretensão por considerar que «a localização do posto não é adequada no que se refere à segurança rodoviária e pedonal».

18) Em suma, o passeio pedonal contíguo ao posto e através do qual os veículos acedem ao posto deverá ser considerado, nos termos do artigo 2º, al d) do RCEPAC, como uma área sensível. Daí decorre que o afastamento do reservatório nº 5 ao dito passeio pedonal, de 2,52 metros (cfr. alínea Q) dos factos provados), não cumpre o distanciamento mínimo de 25 metros imposto pelo artigo 19.º, n.º 5 do RCEPAC.

19) No que respeita à segunda questão, relacionada com o parque de estacionamento existente no edifício do Centro Comercial GALERIAS MOUZINHO DE ALBUQUERQUE, parece-nos, com o devido respeito, que o Tribunal a quo procedeu a uma incorreta subsunção dos factos ao direito.

20) Em causa está novamente a interpretação da norma do artigo 2º, al d) do Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis aprovado pela Portaria 131/2002, de 09 de fevereiro.

21) O Tribunal a quo, a partir da circunstância de no dito parque apenas existirem garagens de uso privado (conforme resultou da inquirição das testemunhas na audiência de julgamento, as garagens são utilizadas por lojistas e moradores em regime de avença), entendeu que o mesmo parque apenas seria considerado como área sensível caso tivesse capacidade para mais de cinquenta lugares de estacionamento, sendo que se provou que o mesmo tem capacidade para trinta a trinta e sete lugares.

22) Ou seja, o Tribunal a quo considerou este parque como um parque de estacionamento autónomo; sem qualquer ligação a qualquer outra infraestrutura (cfr. artigo 2º, al d) do RCEPAC in fine).

23) Não partilha o recorrente deste entendimento, pois a norma reporta-se a parques de estacionamento inseridos, contíguos ou adjacentes a superfícies comerciais, independentemente do tipo de uso que lhe são dados, não restando dúvidas que no dito Centro Comercial há garagens para 30 a 37 lugares de estacionamento (cfr. Alínea R) dos factos provados) independentemente do uso que presentemente (ou há data da realização do julgamento!) lhe é dado, parece-nos evidente que nada impedirá que o mesmo possa vir no futuro a ser utilizado como parque público.

24) Mas ainda que assim não fosse - repete-se - a norma do artigo 2º, al d) do RCEPAC não faz qualquer referência ao tipo de utilização que é dado aos parques inseridos, contíguos ou adjacentes a determinados tipos de edifícios.

25) Esta amplitude da norma entende-se face ao claro objetivo da salvaguarda da segurança de pessoas e bens - transversal neste diploma - e daí - tal...

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