Acórdão nº 00028/15.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução12 de Abril de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: OSPD veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 04.07.2018, que julgou a presente acção administrativa especial instaurada pelo Recorrente contra o Instituto da Segurança Social, IP, totalmente improcedente, e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada dos pedidos formulados, o principal, de ser declarado nulo ou anulado o despacho de deferimento do pedido de pensão de velhice, na parte em que fixou em apenas 4.613,42 € tal pensão, e o subsidiário, ser a Entidade Demandada condenada a restituir ao Autor todas as contribuições por ele efectuadas que excederam as que teria de efectuar para alcançar uma P1, no valor correspondente a 12 vezes o IAS, decorrendo tal obrigação restitutiva do enriquecimento sem causa, consagrado no art. 473º do Código Civil.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento por violação do regime da pensão unificada e por aplicação de norma materialmente inconstitucional.

*O Recorrido não contra-alegou.

*O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1° O aresto em recurso incorreu em erro de julgamento ao não anular o acto impugnado por violação do regime da pensão unificada e do disposto no n° 5 do artigo 4° do Decreto-Lei n° 361/98, uma vez que resulta claramente do acto impugnado que a Segurança Social calculou a pensão apenas com base nos períodos de contribuição para o regime geral (e não com base em todas as contribuições para ambos os regimes), limitando-se a acrescentar a este valor o valor correspondente à pensão calculada pela CGA, quando a nossa jurisprudência já deixou bem claro que a pensão unificada deve ser calculada "por aplicação das regras do último regime contributivo" (v., neste sentido, o acórdão do STJ de 29 de Novembro de 2006, Proc. n° 0651733, e o acórdão do TCASUL de 22/6/2017, Proc. n° 2/2014.4BELSB), o que determinava que in casu a Segurança Social tivesse de calcular a pensão de velhice com base em todos os períodos contributivos para ambos os regimes à luz das regras consagradas no Decreto-Lei n° 187/2007.

Por outro lado, 2º O aresto em recurso incorreu ainda em erro de julgamento ao legitimar a aplicação da regra consagrada no n° 1 do artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007 - que limita o montante da P1 a um máximo de 12 vezes o IAS - e, por essa via, reduzir a pensão devida ao Autor em mais de 45% daquela que lhe seria devida sem a aplicação de tal factor limitativo.

Na verdade, 3° É pacífico e resulta da factologia dada por provada no n° 6 pelo Tribunal a quo que o valor da P1 devida ao Autor era de 9.107 € (11.675,73 x 78%) e que foi limitada a 5.030,64 € por força do tecto máximo de 12 vezes o IAS imposto pelo n° 1 do artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007.

Sucede, porém, que, 4º Não obstante o Tribunal Constitucional já se ter pronunciado no sentido de que do princípio da contributividade (consagrado no artigo 54° da Lei n° 4/2007) não decorre uma necessária directa correlação entre a contribuição paga e o valor da pensão a atribuir (v., neste sentido, o acórdão n° 188/2009), a verdade é que desse princípio também resulta necessariamente a proibição de as contribuições efectuadas serem de todo irrelevantes e absolutamente desconsideradas para efeitos de cálculo da pensão, justamente por do princípio da contributividade resultar uma relação sinalagmática entre a obrigação de contribuir e a atribuição de uma dada pensão (v., neste sentido, o citado Acórdão do Tribunal Constitucional).

  1. Aliás, se uma parte significativa das contribuições for desconsiderada para efeitos de cálculo do valor da pensão de aposentação, então muito naturalmente o Estado estará a cobrar um imposto no segmento relativo às contribuições que são absolutamente desconsideradas para cálculo da pensão, locupletando-se à custa alheia com essas mesmas contribuições sem que haja causa justificativa.

  2. Consequentemente, no segmento em que desconsidera e confere uma total irrelevância às contribuições que excederam o limite máximo da base de incidência e que excederam o que era suficiente para se alcançar uma pensão correspondente ao valor de 12 vezes o IAS, o artigo 101° do Decreto-Lei n.º 187/2007 é ilegal por violar uma lei de valor reforçado - a lei de bases e o princípio da contributividade nela assegurado, do qual resulta a proibição de se desconsiderarem e tomarem absolutamente irrelevantes quaisquer contribuições efectuadas pelos trabalhadores - e materialmente inconstitucional por, de forma encapotada, representar a consagração de um imposto no segmento das contribuições que são absolutamente desconsideradas, ao arrepio do disposto no n° 2 do artigo 103° da Constituição, razão pela qual incorreu em erro o aresto em recurso ao aplicar uma norma ilegal e materialmente Inconstitucional. Por fim, 7° O aresto em recurso incorreu ainda em erro de Julgamento ao considerar legal um acto que aplicara uma norma - o artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007- materialmente inconstitucional por violação do princípio da igualdade, na dimensão de proibição de arbítrio, consagrado no artigo 13° da Constituição.

    Com efeito, 8° Ao contrário da questão que foi colocada à apreciação do Tribunal Constitucional no acórdão n° 188/2009 - onde a questão da inconstitucionalidade do artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007 por violação do principio da igualdade se fundamentou na diferenciação de tratamento entre os trabalhadores a quem a limitação era aplicável (os inscritos até 31.12.2001) e aqueles a quem não era aplicável (os inscritos posteriormente) - a questão que foi colocada pelo ora Autor e em que fundou a inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade não se prende com a desigualdade de tratamento entre quem é abrangido pelo artigo 101° do Decreto-Lei n° 188/2007 e quem o não é, mas, pelo contrário, prende-se antes com a própria desigualdade de tratamento entre todos os trabalhadores que são abrangidos pelo tecto imposto pela referida norma, os quais, apesar de estarem na mesma situação, são vítima de um tratamento completamente diferenciado e totalmente arbitrário.

  3. Neste sentido, veja-se que apesar de todos esses trabalhadores se terem inscrito até 31.12.2001 e de, portanto, estarem exactamente na mesma situação, a verdade é que aqueles cujas contribuições excederam o limite máximo da base de incidência e que, portanto, excederam o que seria suficiente para se alcançar uma pensão correspondente ao valor de 12 vezes o IAS acabam por ter uma pensão de velhice exactamente idêntica à daqueles outros trabalhadores que descontaram muito menos, que não ultrapassaram o limite máximo da base da incidência e cujos descontos apenas lhe permitiriam ter uma pensão correspondente ao valor de 12 vezes o IAS.

    Ora, 10° Se a diferenciação de tratamento entre os inscritos antes e depois de 31.12.2001 ainda encontra uma justificação objectiva e razoável em considerações de justiça social e de equidade contributiva (como assinalou o Tribunal Constitucional no citado acórdão n° 188/2009), a verdade é que a diferenciação entre os inscritos até aquela data introduzida pelo artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007 é claramente arbitrária e irrazoável, justamente por não haver qualquer razão de equidade que justifique que aqueles a quem a lei permitiu que descontassem acima do limite máximo de base de incidência acabem por ter exactamente a mesma pensão de velhice daqueles que estando na mesma situação, optaram por descontar muito menos e agora têm exactamente a mesma pensão.

  4. Consequentemente, com a imposição do limite máximo constante do artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007 o Estado ludibriou os seus cidadãos - por lhes ter permitido que descontassem acima do limite máximo de base de incidência e depois lhes dizer que esses descontos são absolutamente irrelevantes e que terão a mesma pensão de velhice do que todos aqueles que na mesma altura descontaram por um valor claramente inferior - e trata de forma diferenciada e completamente arbitrária cidadãos que estavam exactamente na mesma situação - todos os que se haviam inscrito até 31.12.2001 - razão pela qual o artigo 101° do Decreto-Lei n° 187/2007 é materialmente inconstitucional por violação do princípio da proibição do arbítrio e, portanto, a sua aplicação teria de ser recusada pelo Tribunal a quo, com a consequente anulação do acto impugnado.

    *II –Matéria de facto.

    1. O Autor trabalhou por conta de outrem entre Outubro de 1971 e 31 de Agosto de 2012 – acordo.

    2. Efectuou descontos para a Caixa Geral de Aposentações entre Outubro de 1971 e Setembro de 1976 – cfr. documento 1 junto à petição inicial.

    3. Para a Segurança Social descontou entre Setembro de 1976 e 31 de Agosto de 2012 – acordo e processo administrativo.

    4. Durante 1 de Setembro de 2012 e 31 de Julho de 2014 – período em que esteve numa situação de desemprego involuntário – o registo de remunerações do Autor foi feito por equivalência à entrada de contribuições - cfr. documento 3 junto à petição inicial.

    5. Por ofício datado de 14 de Outubro de 2014, foi o ora Autor notificado que havia sido deferido o seu pedido de pensão de velhice, com início a 31.07.2014, no valor de 4.613,42 € – cfr. documento 1 junto à petição inicial.

    6. A pensão foi calculada nos termos do documento 1 junto à petição inicial, destacando-se, na parte relevante para os presentes autos o seguinte:[imagem que aqui se dá por reproduzida]7. Em Fevereiro de 2015, por ocasião do processamento das pensões para o mês de março, foi efectuada pela Entidade Demandada a revisão da pensão de velhice precedente, tendo em conta a revalorização das remunerações, com pagamento de retroactivos (diferença) desde 31.07.2014...

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