Acórdão nº 00457/17.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 12 de Abril de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório O Instituto da Segurança Social IP/Centro Distrital de Coimbra, no âmbito da Ação Administrativa intentada contra si por TIJI, tendente, à impugnação da deliberação de 13/04/2017 que ordenou o encerramento da identificada Estrutura de Apoio Social Residencial para Pessoas Idosas (ERPI), a funcionar numa habitação unifamiliar, mais peticionando a emissão de autorização provisória de funcionamento, inconformado com a Sentença proferida no TAF de Coimbra, em 31 de janeiro de 2018 que julgou a ação parcialmente procedente, veio interpor recurso jurisdicional do mesmo, concluindo: “A. O Recorrente não se conforma com a sentença do juiz "a quo" que anulou, por insuficiência de fundamentação, a deliberação do Conselho Diretivo do mesmo, de 13.04.2017, que ordenou o encerramento do estabelecimento de apoio social da espécie Estrutura Residencial para Pessoas Idosas (ERPI) que a Recorrida, então Autora, mantém a funcionar numa habitação unifamiliar sita na Rua S..., n.° 35, em Almalaguês.
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A sentença, ora em crise, padece de vícios que se retiram de violação de lei, de erros de julgamento - na medida em que os respetivos fundamentos estão em oposição com a decisão, ocorrendo, também, ambiguidade quer no "iter" cognoscitivo, quer nas conclusões que retira, o que a torna ininteligível - e de falta de fundamentação, devendo, assim, ser declarada nula pelo douto tribunal "ad quem", nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.° e n.° 3, do artigo 140.° do CPTA.
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Com efeito, logo no início e no Relatório, onde é identificado o objeto do litígio, a sentença contém as seguintes contradições: "Processo nº 457/17.0BECBR Processo Cautelar"; "O Réu apresentou contestação pugnando pela improcedência da ação cautelar (...)".
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Ora, a presente ação administrativa tem o n.° de processo 457/17.0BECBR. Sendo que processo cautelar, intentado como preliminar da presente ação, obteve o n.° 261/17.6BECBR, E. O Réu, enquanto entidade Requerida nos autos cautelares, de facto, na sua Oposição, pugnou "pela improcedência da ação cautelar".
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No entanto, não se pode confundir a ação administrativa com a ação cautelar, as quais são diferentes, quer quanto à respetiva natureza, o processo cautelar é um processo urgente e assume urna natureza acessória da ação administrativa, dita principal, quer quanto aos objetivos que visam assegurar, que são diversos. Prosseguindo, G. O juiz "a quo" refere como sendo um dos "fundamentos" da contestação do ora Recorrente, nos presentes autos, "o juízo valorativo sobre a validade do ato sindicado deverá ser leito no âmbito do processo principal", matéria que consta, sim, da Oposição que fez aos pedidos cautelares requeridos pela ora Recorrida — cfr. a Oposição oferecida nos autos cautelares - Doc. 1.
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Quanto a outro dos pretensos fundamentos da contestação do R. a "alegada contradição", importa dizer que a mesma foi alegada pela Autora e não pelo Réu - cfr. a PI da A. junta aos autos.
I. O dito "fundamento" da contestação do R. foi, aliás, depois referido pelo juiz "a quo" como tendo sido alegado pela Autora, na parte da sentença referente ao Direito que aprecia o "pedido enunciado sob a alínea a)".
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Para além destas contradições, a sentença, decidiu ilegalmente, concluindo do seguinte modo: "Pelo exposto, julgando parcialmente procedente a ação cautelar, anulo (...)" K. Ora, o Recorrente não pode aceitar uma decisão que se funda no julgamento do pedido cautelar "julgando parcialmente procedente a acção cautelar".
L. A ação cautelar correu os seus termos em sede própria e, atendendo aos objetivos e pressupostos/requisitos da mesma, não poderá servir para fundamentar a decisão da presente ação administrativa.
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Sobre esta questão é de atentar no disposto no n.° 4, do artigo 364.° do CPC, aplicável ex vi artigo 1.° do CPTA, que, expressamente, refere que "Nem o julgamento da matéria de facto, nem a decisão final proferida no procedimento cautelar, têm qualquer influência no julgamento da ação principal" N. Entende, deste modo, o Recorrente, estar a sentença ferida de ilegalidade, por violação da citada norma, o que se invoca.
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Padece, ainda, a sentença do tribunal "a quo" de oposição entre os factos "relevantes" provados e a decisão final. Vejamos: P. Constam dos factos provados sob o n.° 3, os mencionados nos pontos 3 a 6 do "relatório inicial", ou seja, do Projeto de Relatório dos serviços de fiscalização do Recorrente, constante do processo administrativo (PA) junto aos autos, designadamente que a ERPI em questão se encontra "a funcionar sem licença de funcionamento". - o negrito e o sublinhado são os nossos.
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Fixou, ainda, o juiz "a quo" como provado, sob o n.° 4, o facto "verificado" pela equipa inspetiva do Recorrente, que "o estabelecimento não dispunha de: a) Licença municipal de utilização do sobredito imóvel (cf. artigo 62° do RJUE e 9° e 10º do DL nº 64/2007 na redacção republicada do DL 33/2014 de -3/1).
b) Licença de funcionamento do estabelecimento de apoio a idosos, designadamente na espécie legalmente denominada como "Estrutura Residencial Para Pessoas Idosas" (ERPI) emitida pelo Réu -- cf artigos 3°,4° al" b) e 11° do DL n° 64/2007, alterado e republicado pelo DL n° 33/2014 de 4/3; c) Certificado de segurança, emitido pela Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC); d) Certificado higio-sanitário, emitido pela Autoridade de Saúde; e) Quartos individuais (...) l) Atividades ocupacionais (…) g) Regulamento interno (...) h) Processos individuais dos utentes i) Adequação do edifício e do equipamento de prevenção contra incêndios às normas técnicas (...)" – R. Consta como facto provado sob o n.° 5, um excerto do mesmo Relatório, que refere que a equipa inspetiva "(...) aferiu[-se] que a actividade estava a ser desenvolvida sem licenciamento ou autorização provisória de funcionamento (...)" - o negrito e o sublinhado são os nossos.
S.
Resultou como facto provado sob o n.° 6 que "(…) na avaliação dos cuidados prestados aos residentes e apreciação das suas condições de saúde, conforto e qualidade de vida, cumpre salientar que a situação encontrada revelou deficiências graves que representam um perigo para os direitos e para a qualidade de vida dos utentes. (...) o estabelecimento de apoio social apresenta deficientes condições de instalação nos termos da legislação em vigor, referindo a esse propósito que não foi emitida pela Câmara Municipal competente licença ou autorização de utilização do edifício (...) título esse que visa precisamente verificar a adequação do edifício ao desenvolvimento dos respectivos serviços de apoio social." - o negrito é o nosso.
T.
Do mesmo modo, considerou-se facto provado sob o n.° 8 que "A ausência de Licença de Funcionamento, de Licença de Utilização, de Certificado de Segurança contra Incêndios; a inadequação das instalações face aos requisitos legais; a insuficiência de meios de combate a incêndios e a inexistência de condições de acesso e de evacuação, são factores que assumem especial gravidade na situação encontrada e representam um perigo potencial para os direitos dos utentes e para a sua segurança. A constatação destas situações irregulares assume maior relevância, tendo em conta o grupo de pessoas em causa, (...)" - o negrito é o nosso.
U.
Resultou provado, sob o n.° 14, o facto que "Do exposto, [procedimento para licenciamento de um edifício a construir no terreno adjacente ao estabelecimento em apreço nos presentes autos] cumpre referir que, no que respeita à concessão da autorização provisória de funcionamento, esta possibilidade encontra-se afastada. É que a autorização em causa poderá ser emitida, eventualmente, no âmbito de um processo de licenciamento, processo esse que nunca foi encetado para o estabelecimento em análise.
Em relação ao equipamento onde está a ser promovida a resposta social de (...) (ERPI) não foi solicitado ao Instituto da Segurança Social, I.P. o respectivo licenciamento do funcionamento, nos termos do artigo 15.º do DL n° 64/2007 (...) pedido esse que, de qualquer modo, teria que ser instruído com a autorização de utilização emitida pela Câmara (...), documento que não existe (...).
(...) não ter dado entrada até à data - 30.03.2017 - nenhum pedido de Titula I… com vista ao licenciamento de equipamento sito na Rua S..., 35 — 3040-457 Almalaguês, distrito de Coimbra" - o negrito e o sublinhado são os nossos.
V. Ora, do acervo dos factos provados, designadamente dos que se transcreveram supra, não podia decorrer a conclusão retirada, que decidiu a causa dos presentes autos, nos termos formulados: "Pelo exposto, julgando parcialmente procedente a ação cautelar, anulo, por insuficiência de fundamentação, a deliberação do Conselho Diretivo do Réu ISS, de 13/4/2017 que ordenou que a Autora procedesse ao encerramento do estabelecimento de apoio social da espécie de Estrutura Residencial para Pessoas Idosas que a mesma mantém a funcionar numa habitação unifamiliar sita à Rua S..., n° 35, em Almalaguês. No mais, julgo a ação improcedente." W.
Na verdade, a sentença recorrida, por erro de julgamento, não foi consequente tendo em consideração os factos dados como provados, designadamente os supracitados, que se reportam às condições em que o estabelecimento funciona, i.e., de forma ilegal: - sem licença de funcionamento (emitida pelo Recorrente); - sem licença municipal de utilização; - sem certificado de segurança (emitido pela Autoridade Nacional de Proteção Civil); - sem certificado higio-sanitário (emitido pela Autoridade de Saúde); - sem adequação do edifício e do equipamento de prevenção contra incêndios às normas técnicas; - sem quartos individuais; - sem atividades ocupacionais; - sem regulamento interno; - sem processos individuais dos utentes; - com deficiências graves para as condições de saúde, conforto e qualidade de vida dos utentes; - com deficientes...
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