Acórdão nº 00040/17.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução12 de Abril de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: PACG veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal, de 19.06.2017 que julgou totalmente improcedente a acção movida contra o Fundo de Garantia Salarial para declaração de nulidade ou anulação do acto de 04.08.2016, de indeferimento do pagamento de créditos laborais sobre sua ex-entidade patronal, a sociedade VDA L.da, vencidos e reconhecidos por sentença proferida no Tribunal de Trabalho.

Invocou para tanto e em síntese que o acto impugnado padece do vício de violação de lei, por ofensa do disposto no nº 8 do artigo 2º do Decreto-Lei 59/2015, de 21.04, e, em todo o caso, este preceito na interpretação colhida no acto impugnado viola o direito económico à retribuição do trabalho, consagrado na alínea a), do nº 1 do artigo 59º, o princípio da Igualdade, previsto no artigo 13º daquele diploma constitucional, bem como o disposto no n.º 2 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, designadamente no respeitante ao direito de acesso ao Direito e à Justiça, de forma equitativa e em condições de igualdade, assim como constitui uma violação do princípio da segurança jurídica, na vertente da protecção da confiança dos administrados, uma vez que obsta de forma desigual e arbitrária aos mínimos de certeza e segurança que à comunidade o Direito tem de garantir e fazer respeitar, como dimensões estruturais do Estado de Direito Democrático.

*O Recorrido não contra-alegou.

*O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*O Recorrente veio responder a este parecer mantendo no essencial a sua posição inicial.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: A. Em 17.02.2014, cessou por caducidade o contrato de trabalho celebrado entre o Recorrente e a sociedade VDA & Associados.

  1. Não tendo a entidade empregadora procedido ao pagamento dos respectivos créditos salariais e compensação, ou sequer reconhecido como devidos, recorreu aquele aos meios legais à sua disposição para o efeito, designadamente propondo acção emergente de contrato de trabalho, cujos termos correram no Tribunal do Trabalho de Coimbra, com o nº 6775/14.2TBCBR.

  2. Fê-lo na convicção de que a instauração daquela acção configuraria o passo necessário para, em tempo útil, ver reconhecidos e satisfeitos os seus direitos de crédito.

  3. Ignorava, em toda a sua extensão, a real situação financeira da sua entidade empregadora, não tendo conhecimento de qualquer intenção por parte daquela em se apresentar à insolvência.

  4. Por sentença do Tribunal do Trabalho de Coimbra, proferida em 09.03.2015 e transitada em julgado em 09 de Abril seguinte, foi a entidade empregadora condenada no pagamento dos créditos laborais devidos ao Recorrente, os quais determinados em 11.602,81€ (onze mil seiscentos e dois euros e oitenta e um cêntimo), acrescidos de juros de mora à taxa legal.

  5. Na data de 12.05.2015, a sociedade VDA & Associados foi declarada insolvente, por sentença proferida pelo 3º Juízo da Secção de Comércio da Instância Central de Coimbra.

  6. Uma vez inteirado de que aquela sociedade se encontrava insolvente, o Recorrente avançou com a reclamação dos seus créditos laborais junto dos respectivos autos, de tal facto tendo sido emitida declaração comprovativa.

  7. Na posse desta, requereu a intervenção do Recorrido, a fim de ver garantido o pagamento dos referidos créditos salariais.

    I. Contudo, viria a ser notificado de decisão de indeferimento, com fundamento no facto de, alegadamente, «não ter apresentado o seu requerimento no prazo de um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do nº 8 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 59 /2015, de 21.04», e o mencionando tratar-se “de um prazo de caducidade pelo que, findo o mesmo, o exercício do direito a requerer créditos ao Fundo caduca. Ademais, de acordo com o disposto no artigo 328º do Código Civil, o prazo de caducidade não admite suspensões ou interrupções, salvo situações em que a lei o determine, não sendo esse o caso em apreço”.

  8. Por discordar desta decisão, veio o Recorrido a instaurar no Tribunal a quo acção administrativa especial, peticionando que aquele acto administrativo de indeferimento fosse anulado, por violação do dever de fundamentação, nos termos da alínea a) do artigo 152º e nº 2 do artigo 153º do Código de Procedimento Administrativo, bem como por vício de forma por preterição de formalidades essenciais; ou, em alternativa declarado nulo, nos termos da alínea d), do artigo 161º do Código de Procedimento Administrativo, por ofender o conteúdo essencial de princípios e direitos fundamentais, acolhidos constitucionalmente e na lei administrativa, designadamente o princípio da decisão, previsto no artigo 13º do Código de Procedimento Administrativo, e o modelo de administração participada, expresso nos artigos 12º do Código de Procedimento Administrativo e nº 1 e 5 do artigo 267º da Constituição da República Portuguesa, bem como o princípio da confiança, ínsito ao nº 2 do artigo 10º do Código de Procedimento Administrativo, in fine , decorrente do principio de Segurança Jurídica e da Protecção da Confiança dos Cidadãos, previsto igualmente no nº 2 daquele diploma constitucional.

  9. Proferida a sentença a quo, concluiu o Tribunal a quo que o vencimento dos créditos laborais veio a verificar-se em momento prévio ao período de 6 (seis) meses que antecedeu a data de proposição da acção de insolvência, pelo que se encontram aqueles créditos laborais «fora do período assegurado pelo Réu, conforme dispõe o artigo 2º, nº 4, do DL nº 59/2015, de 21 de Abril».

    L. Acrescenta o MMº. Juiz que «melhor andaria o Autor [Recorrente] se tivesse ele mesmo pedido a insolvência da entidade patronal antes de passarem os fatais seis meses sobre a cessação da relação laboral, par a o que tinha motivos bastantes e legitimidade, atentos os salários e outros créditos laborais já em tanto atraso».

  10. Discorda o Recorrente da posição ali assumida pelo Tribunal a quo, desde logo considerando que este não valorou a recusa, por parte da entidade empregadora, em reconhecer e liquidar os valores reclamados pelo Recorrente a título de créditos laborais.

  11. Ao não integrar na sentença qualquer referência à natureza não consolidada daqueles créditos, o Tribunal a quo assume como irrelevante o facto de o Recorrente, até à obtenção de sentença condenatória da sua entidade empregadora em sede do Tribunal do Trabalho, não ser o titular de quaisquer créditos, porquanto até aí não consolidados.

  12. Mais, à altura, o Recorrente não possuía informações ou indícios, relativos à situação financeira da sua entidade empregadora, que lhe permitissem perspectivar o estado de insolvência desta e, consequentemente, avançar com a proposição de uma acção de insolvência. P. Ao assinalar a indispensabilidade da instauração de acção de insolvência imediatamente após a cessação do contrato de trabalho, o Tribunal a quo, ainda que involuntariamente, reconduz este tipo de acção a um mero mecanismo judicial de cobrança, de natureza executiva.

  13. Fá-lo sem elucubrar de um modo suficientemente fundamentado as reais possibilidades de tal opção, escusando-se a apresentar sustento doutrinal ou jurisprudencial, e tão só referenciando a existência de «motivos bastantes e legitimidade, atentos os salários e outros créditos laborais já em tanto atraso».

  14. Salvo melhor entendimento, não se deverá exigir a um trabalhador, colocado perante a falta de pagamento dos créditos laborais, que de imediato venha requerer a insolvência da sua entidade empregadora, sob pena de não poder recorrer posteriormente ao Recorrido.

  15. Ademais, admitindo que os créditos se venceram até à data da cessação do contrato de trabalho, correndo então contra o Recorrente o prazo de instauração de acção de insolvência contra a respectiva entidade empregadora, salvo melhor opinião, o momento de referência para a cobertura pelo Recorrido dos créditos salariais sempre se prenderia com a data em que vem a ser proferida a decisão de declaração de insolvência da entidade empregadora, ao invés da data de propositura daquela acção, porquanto tal como se vê interrompido o prazo de prescrição de créditos, em similitude se deverá ver interrompido o prazo no que contende com o prazo de garantia do Fundo de Garantia Salarial.

  16. Neste sentido, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 16.02.2012, relativo a processo nº 08482112, consultável em www.dgsi.pt, quando ali é feito notar que «(...) a finalidade para que foi criado o FGS de, em caso de falência ou insolvência do empregador, assegurar ao trabalhador uma indemnização pelo Estado, ficaria na maioria dos casos sem qualquer efeito prático. E isto porque, quando a insolvência fosse decretada e os créditos vencidos e reconhecidos, já o trabalhador não teria direito ao respectivo pagamento, nem pela empregadora, nem pelo FGS, o que nos parece um contrassenso, dada a manifesta in utilidade que teriam esse vencimento [cfr. Art. 91º/1 CIRE] e reconhecimento [cfr...

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