Acórdão nº 1192/18.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelSOFIA DAVID
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO Centro Hospitalar de Lisboa Norte, EPE (Hospital de Santa Maria), interpôs recurso da sentença do TAC de Lisboa, na parte em que que julgou procedente a presente intimação e determinou ao ora Recorrente para que se obtenha de, no 5.º ano de internato, escalar os Recorridos para qualquer serviço de urgência, seja a que título for, que não esteja relacionado com a área da sua formação específica de Endocrinologia e Nutrição.

Em alegações são formuladas pelo Recorrente, as seguintes conclusões:” A. O CHULN não pode conformar-se com a decisão do Tribunal a quo, dado que a decisão quanto à matéria de facto dada como provada não está completa e comporta pontos que, no entender do Recorrente não foram provados, pelo que vem pelo presente recurso recorrer da matéria de facto.

  1. O Recorrente reforça ainda o entendimento quanto ao não preenchimento pelos Requerentes dos pressupostos legais de admissibilidade do recurso à ação de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias consagrados no n.º 1 do artigo 109.º do CPTA, por não se estar, in casu perante qualquer ameaça ou violação de um direito, liberdade ou garantia dos Requerentes por banda do CHULN.

  2. À cautela por dever de patrocínio, o Recorrente entende que não conseguiram os Recorridos provar a violação de um direito, liberdade ou garantia, nomeadamente o artigo 13.º e 47.º da CRP, pelo que deve improceder na totalidade o peticionado, devendo por isso a Sentença recorrida ser revogada, na medida em que esta errou na apreciação e interpretação das normas e substituída por uma decisão em que a ação seja declarada improcedente.

  3. Quanto ao recurso quanto à decisão da matéria de facto considera o Recorrente que o Tribunal a quo errou na apreciação da matéria de facto, pelo que devem ser aditados dois pontos aos factos provados e devem ser considerados não provados os pontos 20, 21, 22 e 26 dos factos provados na Sentença recorrida.

  4. Deve, assim, ser aditado à matéria de facto provada o seguinte ponto: “O Hospital de Santa Maria tem o melhor Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do país, com especialidades que não se encontram em mais nenhum hospital”, tendo em conta o depoimento da Testemunha M..... na sessão de julgamento, transcrito nas alegações de recurso.

  5. Com base no depoimento da mesma Testemunha, deve ser aditado à decisão da matéria de facto provada o seguinte ponto: “Os internos de especialidade de Endocrinologia e Nutrição têm a sua qualidade formativa totalmente assegurada pelo Requerido Centro Hospitalar de Lisboa Norte, EPE”. Este ponto que se pretende que seja aditado resulta também do depoimento da Testemunha M....., igualmente transcrito nas alegações, que é uma Médica especialista em Endocrinologia e Nutrição, que terminou o internato no CHULN, em 2018.

  6. Os pontos 20, 21 e 22 da decisão quando à matéria de facto provada não deverão ser considerados em pleno, pelo que deverão ser eliminados da matéria de facto dada como provada, porquanto o IPO é um hospital manifestamente diferente do HSM, na medida em que o IPO apenas trata questões do foro oncológico e o HSM trata todas as especialidades médicas. Para sustentar esta argumentação o Recorrente apoiou-se no depoimento da Testemunha D.....e ainda nas incongruências entre aquele depoimento e a declaração de parte do Requerente D....., sendo que todos os depoimentos estão transcritos nas alegações de recurso.

  7. O Recorrente entende que o ponto 26 da decisão quanto aos factos provados não deve ser considerado, na medida em que tal prova não foi efetuada nem por documentos, nem por prova testemunhal, ou outra. O Tribunal recorrido sustenta-se em testemunhos indiretos que não devem ser considerados.

    I. Por outro lado, o Recorrente entende que o Tribunal recorrido errou ao considerar estarem preenchidos os pressupostos necessários para a utilização do meio processual de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, dado que estes estão em falta, pelo que estamos perante uma exceção dilatória inominada de inidoneidade do meio processual utilizado pelos Recorridos, que obsta ao conhecimento do mérito da causa, devendo dar lugar à absolvição do Recorrente da instância, nos termos do estatuído nos n.ºs 2 e 4 do artigo 89.º do CPTA.

  8. Na intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias impõe-se a descrição de uma situação factual de ofensa ou preterição do direito fundamental que possa justificar, à partida, que o Tribunal venha a intimar a Administração Pública, através de um processo célere e expedito, a adotar uma conduta que permita assegurar o exercício, em tempo útil, desse direito, liberdade ou garantia.

  9. No caso em apreço, ao contrário do entendimento proferido pelo Tribunal a quo, não estão preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade do recurso à ação de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, consagrados no n.º 1 do artigo 109.º do CPTA.

    L. Primeiramente, porque a factualidade nos termos dados como provados (e especialmente tendo em conta a alteração à matéria factual, objeto do presente recurso) não constitui nenhuma violação constitucional dado que, no caso em apreço, não se está perante qualquer ameaça ou violação de um direito, liberdade ou garantia dos Requerentes por banda do Recorrente, que justifique a utilização do presente meio processual. E segundo por o Recorrente não ter prejudicado, de forma alguma, a formação dos médicos internos visados, tendo tal resultado, de forma cabal, da produção de prova efetuada.

  10. Ademais, nestes autos não se está diante de uma situação em que a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha ao Recorrente a adoção de uma conduta negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, nem perante uma situação em que não seja possível ou suficiente, atendendo às circunstâncias concretas, o decretamento provisório de uma providência cautelar (associada a uma ação ordinária principal).

  11. A Sentença recorrida não consegue explicitar porque é que uma providência cautelar – com natureza naturalmente provisória – não seria capaz de suprir a urgência do caso, tendo em conta o previsto no artigo 121.º, n.º 1 do CPTA.

  12. Por fim, reiteramos que não faz sentido que o processo de intimação ora em questão possa ser utilizado quando esteja em causa uma violação continuada ou já concretizada de um direito fundamental, como abundantemente alegado, aliás, pelos Recorridos, no seu articulado inicial.

  13. Mesmo que assim não se entenda, o que não se concebe, nem concede, diga- se que tendo subjacente a alteração da matéria de facto, com o aditamento dos factos, não cumpriram os Requerentes o intento de provar os factos que lhes competiam, ou seja não conseguiram os Recorridos fazer prova quanto à violação de um direito, uma liberdade ou uma garantia, sendo tal exigido tendo em conta o meio processual utilizado, pelo que deve a Sentença recorrida ser revogada e deve a presente ação ser declarada totalmente improcedente, com as demais consequências legais.

    Q Segundo a matéria de facto provada, está totalmente garantido aos Recorridos o direito de acesso à carreira especial médica, acolhido, no essencial, no texto do artigo 47.º da CRP, em situação de igualdade de tratamento, em estrita observância do artigo 13.º da CRP.

  14. O CHULN providencia todas as condições necessárias à “liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública” (artigo 47.º do CRP), na medida em que os Recorridos têm todas as condições para a conclusão com sucesso o seu internato médico.

  15. Quanto à invocada violação do princípio da igualdade, os Recorridos ignoraram que o HSM é um Hospital de “fim de linha” (ponto 27 da decisão da matéria de facto provada) e que por isso é um Hospital necessariamente diferente, com necessidades desiguais. Ficou ainda provado que o HSM é ainda o hospital com o maior número de urgências, o maior número de patologias tratadas e de serviços do país e por isso é inequívoco que este Hospital não pode ser alvo de comparações com outros.

  16. Sublinhe-se que não são possíveis comparações entre Hospitais, mas que caso se queira fazer essa comparação, o HSM deve ser analisado com as características reais, isto é, tendo em conta o facto de ser um Hospital de “fim de linha”, com serviços que mais nenhum dispõe.

  17. Os Recorridos, enquanto médicos internos, ficam sujeitos, segundo reza o n.º 3 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 13/2018, “(…) à organização de trabalho da entidade titular do serviço ou do estabelecimento responsável pela administração da formação”, não sendo lícito aos Requerentes tentar obter a não sujeição à organização de trabalho do Recorrente, enquanto estabelecimento da sua formação quando ficou provado pelo ponto 19 da decisão da matéria de facto provado que os internos eram escalados para efetuar serviço de urgência “mediante necessidade de serviço”.

    V. Por fim, os Recorridos, antes de serem internos são médicos e nos termos do artigo 92.º, n.º 1 do Regulamento de Deontologia Médica (Regulamento n.º 707/2016) estão sujeitos a um princípio geral de colaboração e por isso existindo uma necessidade de serviço para a escala na urgência, tal como está considerado provado na Sentença recorrida, é evidente que tal deve ser respeitado.

  18. Por tudo isto, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a Sentença recorrida, e julgando-se improcedente esta ação.” Os Recorridos nas contra-alegações formularam as seguintes conclusões: “Quanto à Matéria de Facto Factos a aditar: A. O recorrente pretende ver aditados os seguintes factos, tendo em atenção os respectivos fundamentos infra transcritos: B. “Hospital de Santa Maria tem o melhor Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo do país, com especialidades que não se encontram em mais nenhum hospital.” C. E o Recorrente fundamenta tal pedido no depoimento da Testemunha M....., na sessão de julgamento de 20-12-2018...

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