Acórdão nº 2240/18.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo, do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório O Ministério da Administração Interna/ Serviço de Estrangeiros e Fronteiras recorre da sentença proferida na presente instância, a 31.1.2019, que julgou procedente a ação especial urgente de pedido de asilo e condenou a entidade demandada a reconstituir o procedimento relativo ao pedido de proteção internacional formulado pelo autor B..............

, em 23.7.2018, instruindo o pedido com informação atualizada sobre as condições de acolhimento dos refugiados e requerente de proteção internacional em Itália.

O recorrente pede seja revogada a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, por, nas alegações que apresentou, concluir: «1ª - A autoridade recorrida não concorda com os termos da sentença ora recorrida; 2ª- De harmonia com o art.º 18,º nº 1, b) do Regulamento (UE) 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, e o art.º 37º, nº 1 da Lei de Asilo, o ora recorrente procedeu à determinação do Estado-Membro responsável pela análise do pedido de asilo, procedimento regido pelo art.º 36º e seguintes da Lei 27/2008, de 30 de junho (Lei de Asilo), tendo, no âmbito do mesmo sido apresentado, aos 27/07/2018, pedido de retoma a cargo às autoridades italianas, tendo o Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF aos 22/08/2018, comunicado às autoridades italianas que, ao abrigo do nº 2, do artigo 25º do mesmo Regulamento, a falta de uma decisão equivale à aceitação do pedido.

3ª - Consequente e vinculadamente, por despacho do Diretor Nacional do ora recorrente proferido aos 23/08/2018, nos termos dos arts 19º-A, nº 1, a) e 37º nº 2 da citada lei, foi o pedido considerado inadmissível e determinada a transferência do requerente para Itália, Estado-Membro responsável pela análise do pedido de Asilo nos termos do citado regulamento, motivo pelo qual o Estado português se torna apenas responsável pela execução da transferência nos termos dos arts 29º e 30º do Regulamento de Dublin; 4ª – O ora recorrente deu início ao procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de asilo, que culminou com o apuramento de que essa responsabilidade pertencia à Itália (cf. art.º 13º, n.º 2 do citado Regulamento (UE) 604/2013 e art.º 37º, nº 1 da Lei n.º 27/2008 (Lei de Asilo)), impondo a lei como consequência imediata (vinculada) que fosse proferido o ato de inadmissibilidade e de transferência; 5ª - “Estamos, portanto, perante um ato estritamente vinculado, sendo que a validade dos atos praticados no exercício de poderes vinculados tem de ser feita em função dos pressupostos de facto e de direito fixados por lei, ou seja pela confrontação da factualidade dada como provada com a consequência jurídica imediatamente derivada da lei (…) é a própria Lei nº 27/2008, de 30 de Junho, que no seu artigo 37.º, n.º 2, lhe impunha a atuação levada a efeito “ (cf. Acórdão do TCA SUL de 19/01/2012, proc. nº 08319/11); 6ª - Resulta, pois, incompreensível o entendimento ora sufragado na douta sentença ora recorrida por se considerar que “ (…) o ato impugnado - ao não apurar a situação concretamente alegada pelo Autor, na entrevista - incorre em deficit de instrução quanto aos factos essenciais à decisão de transferência e, por conseguinte, à decisão de (in)admissibilidade do pedido de proteção internacional formulado, em violação do disposto no artigo 58º do CPA, devendo ser anulado nos termos do artigo 163º, nº , do mesmo Código.”; 7ª - Pelo contrário, a alegação do Requerente., desacompanhada da apresentação de um mínimo de elementos objetivos, é insuficiente para considerar demonstrada a existência de falhas sistémicas no procedimento de asilo italiano que impliquem o risco de tratamento desumano ou degradante; ou que, dadas as particulares condições do A a transferência implica um risco sério e verosímil de exposição do A, a um tratamento contrário ao artigo 4º da CDFUE.

8ª – Nos presente autos inexiste qualquer indicio que permita concluir pela existência de falhas sistémicas no procedimento de Asilo, único óbice para que Portugal não proferisse a decisão de transferência ora impugnada; 9ª – Ao contrário do pugnado pela douta sentença recorrida, o procedimento de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional (que culminou com o apuramento de que essa responsabilidade pertencia à Itália) antecede e fundamenta que o pedido apresentado seja considerado inadmissível e seja determinada a transferência da análise do pedido; 10ª - Contrariamente ao que a sentença refere, ao ora recorrente outra solução não restava que não fosse propalar a competente decisão de inadmissibilidade e de transferência, a qual não padece de qualquer vicio de facto ou de direito.» O recorrido contra-alegou o recurso, concluindo nos termos que seguem: 1ª – O autor concorda com os termos da sentença que foi agora recorrida. 2ª - Efetivamente incumbia à Entidade Demandada, antes de ter tomado a decisão ora impugnada, instruir oficiosamente o procedimento, com informação fidedigna atualizada sobre o funcionamento do procedimento de asilo italiano e as condições de acolhimento dos requerentes de proteção internacional naquele país, recorrendo a fontes credíveis e consolidadas, dada a dificuldade de prova que assiste ao autor, mas que é notória tendo em conta todas as noticias que vêm a público e que fizeram do prova do processo em apreço.

3ª - No caso em apreço, a decisão impugnada nada refere a propósito do funcionamento do procedimento de asilo italiano e das condições de acolhimento dos requerentes de proteção internacional nesse Estado-Membro, não se mostrando possível, através da sua leitura, aferir da existência ou não de um risco atual, direto ou indireto, de o Autor ser sujeito a tratamento desumano ou degradante, na aceção dos artigos 3.º da CEDH e 4.º da CDFUE.

4ª – Verifica-se por isso que há indícios que permitem concluir pela probabilidade séria de o Autor, ao ser transferido para aquele Estado, correr um risco real de ser sujeito a tratos desumanos ou degradantes, na aceção do artigo 4. da CDFUE, como o mesmo referiu, não se sente em segurança em Itália, estava num campo de refugiados e não tinha acesso aos cuidados mais básicos como saúde e higiene.

5ª - Verifica-se que o ato impugnado – ao não apurar a situação concretamente alegada pelo Autor, na entrevista – incorre em deficit de instrução quanto aos factos essenciais à decisão de transferência e, por conseguinte, à decisão de (in)admissibilidade do pedido de proteção internacional formulado, em violação do disposto no artigo 58.º do CPA, devendo ser anulado nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do mesmo Código”.

Nestes termos e nos melhores de direito, requer-se que seja mantida a douta sentença que condena o recorrente a reconstituir o procedimento relativo ao pedido de proteção internacional formulado pelo Autor, em 23.07.2018, instruindo o pedido com informação atualizada sobre as condições de acolhimento dos refugiados e requerentes de proteção internacional em Itália».

O Exmo. Procurador Geral Adjunto, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º, ambos do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, determinando-se a transferência da análise do pedido às autoridades italianas, de acordo com o estabelecido no regulamento de Dublin.

Sem vistos, vem o processo submetido à conferência para julgamento.

Fundamentação de facto O Tribunal a quo deu como provados os factos que seguem: A) «Em 20.07.2018, um agente da Polícia de Segurança Pública constatou que o Autor encontrava-se a pernoitar na via pública, na Rua Mãe D’Agua, em Lisboa, tendo o mesmo afirmado que aguardava a abertura do Centro de Acolhimento Temporário, existente naquele local, a fim de solicitar asilo político. – Cfr. fls. 7-8 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; B) Antes da data referida na alínea anterior, o Autor esteve em Itália, onde requereu proteção internacional. – Admitido por acordo; cfr. fls. 3-4 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; C) Em 23.09.2016, as impressões digitais do Autor foram registadas, na base de dados do Sistema Eurodac, sob a referência IT.............., em Cagliari, Itália. – Cfr. fls. 3 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; D) Em 04.06.2018, as impressões digitais do Autor foram registadas na base de dados do Sistema Eurodac, sob a referência IT.............., em Cagliari, Itália. – Cfr. fls. 4 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; E) Em 20.07.2018, foi emitido, pela Esquadra de Turismo da Polícia de Segurança Pública de Santa Apolónia o instrumento intitulado “PEDIDO DE INFORMAÇÃO SOBRE CIDADÃO ESTRANGEIRO”, relativo ao Autor, de cujo teor, que aqui se dá por integralmente reproduzido, se extrai o seguinte: “Afirmou que se encontrava em Itália, onde entrou por barco, desde 02/09/2016, sem autorização de residência ou com visto, entrou de seguida em França no dia 13 de julho de 2018, em Espanha dia 16 de julho de 2018, e entrou em território nacional em 19-072018, deslocou por via terrestre (autocarro). Pretende Asilo Político em virtude de alegar que é perseguido no seu país.” – Cfr. fls. 6 do PA; F) Em 23.07.2018, o Autor requereu proteção internacional, junto do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, em Lisboa, data em que foram registadas as suas impressões digitais, na base de dados do Sistema Eurodac. – Cfr. fls. 2 e 19 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; G) A 27.07.2018, os serviços do Gabinete de Asilo e Refugiados enviaram, às autoridades italianas, um pedido de retoma a cargo do Autor, invocando o artigo 18.º, n.º 1, alínea b), do Regulamento (UE) 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho, e as ocorrências registadas no Sistema Eurodac, sob as referências IT................ e...

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