Acórdão nº 2703/16.9BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

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Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO intentou ação administrativa de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra C………, de nacionalidade guineense, melhor identificado nos autos.

Após a discussão da causa, o T.A.C. decidiu “julgar procedente a oposição deduzida à aquisição da nacionalidade portuguesa e ordenar o arquivamento do processo conducente ao registo, pendente na Conservatória dos Registos Centrais”.

* Inconformado, o réu interpôs o presente recurso de apelação contra aquela decisão, formulando na sua alegação as seguintes conclusões: 1.O Recorrente é nacional guineense, nascido em Bissau, filho de nacionais guineenses à data do seu nascimento.

  1. Encontra-se provado que o Recorrente é filho de nacional português desde os 10 (dez) anos de idade; 3.Encontra-se também provado que os progenitores do Recorrente, em sua representação, declararam a vontade de aquisição da nacionalidade portuguesa, e, com base em tal declaração, foi instaurado o devido processo na Conservatória dos Registos Centrais; 4.Foram, assim, cumpridos quer o pressuposto de facto, ser filho de nacional português, quer o elemento essencial, a apresentação de declaração de vontade feita, necessários à aquisição da nacionalidade por efeito de vontade; 5.É verdade que a aquisição da nacionalidade portuguesa por esta via não é automática, mediante o preenchimento dos requisitos supra referenciados; 6.Incumbe ao Recorrente pronunciar-se quanto à existência de ligação efetiva à comunidade nacional, nos termos do disposto no nº 1 do art. 57.º do Decreto-Lei n.º 237-A/2006, de 14 de dezembro (Regulamento da Nacionalidade Portuguesa[1]); 7.A obrigação do Requerente se pronunciar sobre a efetiva ligação à comunidade nacional resume-se, por força do modelo aprovado, à escolha de um "SIM" ou de um "NÃO" no impresso de modelo aprovado; 8.Compete ao Ministério Público provar a inexistência da suprarreferida ligação; 9.A "ligação efetiva à comunidade nacional" pressupõe a existência de laços concretos que abonem a ideia de um sentimento de pertença a uma das comunidades portuguesas; 10.A prova da ligação efetiva à comunidade portuguesa deve ser apreciada em função dos valores dominantes naquela em que o estrangeiro se pretende integrar; 11.Esta integração tem que assentar num complexo de laços expressos pelo domicílio, pela língua, pela comunhão cultural, pela integração social (que não meramente familiar), e até por factos económico-profissionais; 12.Assim, mesmo que se considerasse não provada a residência em território nacional, tal não poderia ser invocado contra o Recorrente, uma vez que tal ausência não é - e nunca foi - um pressuposto necessário à aquisição da nacionalidade portuguesa ao abrigo do art. 2 da Lei n.º 37/81, de 03 de outubro[2]; 13.A localização da residência é, de per se, insuficiente para aferir da existência de uma ligação efetiva à comunidade nacional; 14.Tendo nascido na Guiné-Bissau e sendo um cidadão guineense, país pertencente à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, fala e escreve correta e fluentemente português (al. c) do art.º 19.º do Regulamento da Nacionalidade[3]); 15.Possui uma forte ligação com familiares residentes em Portugal; 16.Além dessa forte ligação familiar, possui um vasto leque de amigos em Portugal, mais concretamente em Castelo Branco e Lisboa; 17.O Recorrente identifica-se com a cultura, religião e História portuguesas; 18.O Recorrente possui um número de identificação fiscal e é utente do Sistema Nacional de Saúde Português; 19.Foram alegados e provados pelo Recorrente diversos fatores, como a família, a língua, os aspetos culturais, sociais, económico-profissionais que, no seu conjunto, comprovam o seu sentimento de pertença à comunidade portuguesa; 20.Os documentos juntos pelo Recorrente não foram impugnados pelo Ministério Público, tendo sido aceites quer quanto à sua autenticidade quer quanto ao seu conteúdo; 21.Não se verifica nenhum dos fundamentos de oposição aquisição da nacionalidade constantes das alíneas b) e c) do art. 9 da Lei da Nacionalidade[4]; 22.O Ministério Público fundou a sua oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa pelo Recorrente em bases erróneas, nomeadamente a falta de residência em Portugal como fundamento da inexistência de ligação efetiva à comunidade portuguesa, posição seguida pelo Tribunal a quo; 23.A lei não exige que o candidato à aquisição da nacionalidade nos termos do art.º 2. da Lei da Nacionalidade demonstre perante o conservador ou o Tribunal que se encontra inserido na comunidade nacional; 24.Ao pressupor essa exigência, a douta sentença recorrida ofende o disposto no n.º 3 do art.º 57.º do Regulamento da Nacionalidade, em que tal exigência não se encontra prevista[5]; 25.A partir da reforma da Lei da Nacionalidade introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de abril, complementada pelo Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, deixou de ser exigível ao Requerente da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a demonstração de que se encontra inserido na comunidade nacional; 26.Em consonância com as obrigações assumidas no quadro da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, a Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de abril, veio estabelecer a presunção de que os filhos menores dos que adquirem a nacionalidade portuguesa têm uma ligação efetiva à comunidade nacional, porém ilidível mediante a alegação e prova de factos que comprovem a inexistência de tal ligação[6]; 27.Tal ónus da prova compete ao Ministério Público, que a não logrou produzir; 28.A ligação efetiva à comunidade nacional tem que ser aferida à luz dos princípios da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, não podendo ser discriminatória em razão de raça ou origem nacional ou étnica, em conformidade com o art. 5 da referida Convenção[7]; 29.A douta decisão recorrida, ao pressupor que o requerente tinha que apresentar provas adicionais ou prestar declarações não contidas no impresso de modelo aprovado, ofende, ainda, o disposto no n.º 2 do art.º 32.º, do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa; 30.A inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional não pode provar-se por documentos registrais ou por declarações dos interessados que não a indiciem; 31.Para que possa ser promovida a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa com fundamento na falta de ligação à comunidade nacional, é indispensável que o conservador dos Registos Centrais apresente factos e provas concretos que...

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