Acórdão nº 727/14.0BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 05 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução05 de Junho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XO DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Loulé, exarada a fls.124 a 130 do presente processo que julgou totalmente procedentes os embargos de terceiro deduzidos pelo recorrido, D……….., opondo-se a penhora de imóvel realizada no âmbito dos autos de execução fiscal nº……-2013/106….. e apensos, a qual corre seus termos no Serviço de Finanças de Albufeira.

XO recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.140 a 149 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: 1-Os presentes embargos foram interpostos contra a penhora do prédio urbano, inscrito na matriz predial da freguesia de A……. e O……., sob o artigo 12….., fracção ..., invocando-se a existência de contrato promessa de compra e venda e a tradição do bem; 2-Por douta sentença de 10/07/2015, os referidos embargos foram julgados procedentes e anulada a penhora. Não pode, no entanto, a FP concordar com a douta decisão, pelas seguintes razões; 3-De acordo com os artigos 1251º e 1253º do CC, a figura da posse caracteriza-se por dois elementos: a actuação de facto correspondente ao exercício de um direito real, o corpus, e a intenção de o exercer como seu titular, o animus possidendi, sendo este segundo factor que a distingue da simples detenção ou posse precária; 4-Tanto a Doutrina como a Jurisprudência sustentam que o contrato promessa com traditio da coisa, por si só, não transmite a posse ao promitente comprador; 5-Isto é, o promitente comprador apenas adquire o corpus (a detenção da coisa), mas não o animus possidendi, é um detentor ou possuidor em nome alheio que prossegue a posse do promitente vendedor; 6-No caso em análise, o contrato promessa foi celebrado sem eficácia real, o que gera apenas efeitos obrigacionais entre as partes (cfr. arts. 410º e 413º do CC); 7-O preço de € 195.000,00 prometido não foi pago na sua totalidade. O recorrido apenas pagou à promitente vendedora o sinal no valor de € 119.000,00 (cfr. ponto 3 do probatório). Ou seja, ficou por pagar cerca de 39% do preço; 8-Consta dos autos um termo de entrega das chaves, o qual não se encontra datado; 9-Assim, no entender da Fazenda Pública, deveria ter sido considerado pelo Tribunal a quo que o recorrido apenas ocupou o imóvel por mera tolerância do seu proprietário e que os actos por si praticados são meros actos materiais (corpus) próprios de um possuidor em nome alheio, se não vejamos; 10-“(…) O promitente comprador investido prematuramente no gozo da coisa, que lhe é concedido na pura expectativa da futura celebração do contrato prometido, não é possuidor dela, precisamente porque, sabendo ele como ninguém, que a coisa pertence ainda ao promitente vendedor e só lhe pertencerá a ele depois de realizado o contrato translativo prometido, não pode agir seriamente com a intenção de um titular da propriedade ou de qualquer outro direito real sobre a coisa.” (Antunes Varela in RLJ, ano 128, pág 146); 11-No mesmo sentido Acórdão do TCA do Sul, de 09/09/2008, proferido no Proc. n.º 02597/08: “(…) como resulta do nº 1 do art. 410 do Ccivil, pelo contrato promessa em causa e invocado só se criou a obrigação de emitir a declaração de vontade correspondente ao contrato prometido, sendo o promitente comprador apenas titular de um direito de crédito e não de um direito real. O contrato promessa em causa produz meros efeitos obrigacionais como refere Mário Júlio de Almeida Costa in Direito das Obrigações, 4ª edição a pág. 269.”; 12-E também Acórdão do mesmo Tribunal Superior, proferido em 21/03/2006, no Proc. n.º 00613/03: “O promitente comprador tem uma posse precária e não uma posse legítima, pelo que a tradição da coisa ao promitente comprador apenas lhe confere um direito pessoal de gozo sobre a coisa, não o investindo na qualidade de possuidor da coisa, ou seja não lhe conferindo uma posse em sentido rigoroso e próprio. Não sendo o embargante titular do direito de propriedade sobre o bem penhorado, não havia animus, ele não detinha posse defensável por embargos.”; 13-Só em situações excepcionais, nas quais não se enquadra o caso concreto, o promitente comprador adquire a posse do imóvel prometido; 14-Como apontam Pires de Lima e Antunes Varela, doutrina esta referida no Acórdão do TCA do Sul, de 28/05/2013, proferido no Proc. n.º 06516/13, “o promitente comprador pode preencher todos os requisitos de uma verdadeira posse, quando por exemplo, tendo sido paga a totalidade do preço, ou em que as partes não tenham o propósito de realizar o contrato definitivo (…) a coisa é entregue ao promitente comprador como se sua fosse já e que, neste estado de espírito, ele pratica sobre ela diversos actos materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade.”; 15-Na presente acção, o recorrido não alegou nem provou quaisquer actos materiais que permitam concluir ter ocorrido a inversão do título, como lhe cabia por força das regras gerais de repartição do ónus da prova (art. 74º n.º 1 da LGT e 342º do CC e Acórdão do TCA do Sul, de 30/04/2013, proferido no Proc. n.º 06544/13); 16-O pagamento das contas da água e luz apenas provam que o recorrido usa o imóvel (corpus); 17-À semelhança do que acontece com a figura do arrendatário, o pagamento ou a celebração de contrato de fornecimento de água ou luz não conduz à conclusão de que os mesmos estão a agir como se de proprietários se tratassem. Para o fornecimento destes serviços basta a prova da mera detenção, ou seja, da legitimidade para o uso do imóvel em causa; 18-Também a prova testemunhal não foi apta a levar o julgador a concluir pela inversão do título da posse: As testemunhas A……… e L……. declararam não saber a razão pela qual ainda não foi celebrado o contrato definitivo de compra e venda entre o recorrido e o executado, esclarecendo, ainda, o Tribunal que várias fracções do mesmo prédio já têm escritura; A testemunha D….., filho do recorrido, declarou que a...

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