Acórdão nº 00616/17.6BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução29 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório APSM, devidamente identificada nos autos, no âmbito de Ação Administrativa que intentou contra o ISS/Fundo de Garantia Salarial, tendente à impugnação do Despacho do Presidente do Conselho de Gestão do FGS que indeferiu o pedido que havia formulado, no sentido de lhe serem pagos os créditos laborais que entendia ter direito, inconformado com a decisão proferida no TAF de Penafiel que em 10 de julho de 2018 julgou improcedente a Ação, veio recorrer jurisdicionalmente para esta instância em 2 de outubro de 2018, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1.) Nos presentes autos, coloca-se a questão de saber se o requerimento apresentado pelo Apelante à Apelada, solicitando o pagamento dos seus créditos salariais, através do FGS, foi ou não apresentado tempestivamente considerando que o seu contrato de trabalho cessou em 04.03.2014, altura em que vigorava a Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, e o requerimento foi apresentado em 26.08.2016, já na vigência do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, que veio fixar o prazo de um ano para esta apresentação.

  1. ) A decisão recorrida, ao considerar aplicável o regime do FGS previsto no Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, viola as regras de aplicação das leis no tempo estabelecidas no artigo 12.º do Código Civil.

  2. ) Nos termos do artigo 12.º do Código Civil, ao requerimento apresentado pelo Apelante deve ser aplicado o regime de acesso ao FGS aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho, nos termos do qual (artigo 323.º do referido regime) a apresentação de requerimento ao FGS ao prazo de nove meses, a contar da cessação, ou seja, três meses antes do prazo de um ano fixado como prescrição do crédito laboral – cfr. artigo 319º, n.º 3 da Lei n.º 35/2004 e art. 337, do Código do Trabalho.

  3. ) O Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, prevê que o regime do Fundo de Garantia Salarial, antes fixado nos arts. 317º a 326º do Regulamento do Código de Trabalho, aprovado pela Lei n.º 35/2004, de 29.07, se mantivesse em vigor até à entrada em vigor do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, por via do DL n.º 59/2015, de 21.04, em 04.05.2015 – cfr. alínea o), do artigo 12º da Lei 7/2009, de 12.02.

    5) O artigo 319º, n.º 3, da Lei n.º 35/2004, de 29.07, estabelece que “o Fundo de Garantia Salarial só assegura o pagamento dos créditos que lhe sejam reclamados até três meses antes da respetiva prescrição.” 6) O prazo de prescrição previsto na aludida Lei encontra-se vertido sob o artigo 337º, n.º 1, estabelecendo o prazo de um ano a contar do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.

    7) Por outro lado, o art. 2º, n.º 8, do Decreto-lei n.º 59/2015, de 21.05, dispõe que “o fundo só assegura o pagamento dos créditos salariais quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.” 8) O regime transitório estabelecido neste Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.05 estabelece que ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor – cfr. art. 3º, n.º 1 9) Ora, o contrato de trabalho do Apelante cessou em 04.02.2014, altura em que vigorava a Lei n.º 35/2004, de29 de Julho, que dispunha quanto à apresentação do requerimento, no seu artigo 323.º, o seguinte. “1 - O Fundo de Garantia Salarial efetua o pagamento dos créditos garantidos mediante requerimento do trabalhador, do qual consta, designadamente, a identificação do requerente e do respetivo empregador, bem como a discriminação dos créditos objeto do pedido. 2 - O requerimento é apresentado em modelo próprio, fixado por portaria do ministro responsável pela área laboral. 3 - O requerimento, devidamente instruído, é apresentado em qualquer serviço ou delegação do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.” 10) O regime aqui previsto, juntamente com os artigos 316.º a 326.º, regulava o artigo 380.º do Código do Trabalho, definindo as condições de acesso ao FGS.

    11) Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril veio estabelecer novas regras de acesso ao FGS, nomeadamente pela introdução de um prazo para o fazer.

    12) Assim, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 8 do regime anexo à referida Lei: “8 - O Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.” 13) O referido prazo é um prazo de caducidade, findo o qual a possibilidade do trabalhador aceder ao FGS deixa de existir. E, por isso, altera substancialmente as condições anteriormente estabelecidas.

    14) Assim, se no regime anterior o prazo de caducidade para reclamar o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho dependia da data da prescrição do crédito ( até três meses antes da prescrição), no novo regime aquele prazo depende apenas da data da cessação co contrato de trabalho.

    15) Desta forma, dependendo a caducidade do direito ao pagamento dos créditos da data da prescrição dos mesmos, encontra-se a prescrição sujeita às causas interruptivas e suspensivas dos artigos 18º a 327º do Código Civil, pelo que a caducidade daquele direito tanto pode ocorrer quando perfizer nove meses após a data da cessação do contrato, como pode ocorrer muito para lá da data de um ano a contar desta data – tudo dependendo da ocorrência de causas interruptivas e suspensivas e sua duração.

    16) Significa isto que o Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.05 procedeu a uma alteração do prazo antes estabelecido no artigo 319º, n.º 3 da Lei n.º 35/2004, de 29.07, pelo que torna-se importante chamar à colação o disposto no artigo 297º do Código Civil, que rege a sucessão de leis quanto à matéria de fixação de prazos.

    17) Ora, na interpretação que a Douta sentença recorrida faz da aplicação do novo Regime do FGS ao caso concreto, tendo este regime criado um prazo mais curto que o anteriormente existente, isso imporia ao Apelante a obrigação de, no prazo de um ano a contar da data em entrada em vigor do novo regime, requeresse os seus créditos salariais, nos termos do disposto no artigo 297.º do Código Civil.

    18) Interpretação com a qual o Apelante não pode concordar desde logo porque o artigo 297.º do Código Civil é uma norma que dispõe sobre a sucessão de prazos e pressupõe a existência de um prazo mais longo a que sucede um prazo mais curto e vice-versa: “1. A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar. 2. A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estejam em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu momento inicial. 3. A doutrina dos números anteriores é extensiva, na parte aplicável, aos prazos fixados pelos tribunais ou por qualquer autoridade.” 19) A Douta sentença recorrida aplicou uma norma constante do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, em violação do disposto no artigo 12.º do Código Civil, porque a aplicou retroativamente.

    20) Nos termos do artigo 12.º do Código Civil: “1. A lei só dispõe para o futuro; ainda que, lhe seja atribuída eficácia retractiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. 2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas, quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.” 21) Ou seja, a norma do artigo 2.º, n.º 8 do Regime anexo ao Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, que cria um prazo de caducidade, é uma “lei que dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos” e, por isso, só visa os factos novos, que ocorram após a sua entrada em vigor.

    22) E, por essa razão, não poderá ser aplicada à situação concreta do Apelante que, à data da cessação do seu contrato, 04.03.2014, o prazo de prescrição encontrava-se interrompido por força da apresentação da entidade patronal a um PER, o qual com o n.º 1377/13.3 TBMCM, correu os seus termos pelo 1º Juízo do Tribunal do Marco de Canaveses, tendo sido nomeado em 18/10/2013 Administrador Judicial Provisório, cfr. cfr. facto provado sob n.º 3 da fundamentação de facto 23) O PER acima referido transitou em julgado, apenas em 17/02/2015, cfr. factos provados sob n.ºs 4 e 5 da fundamentação de facto 24) Desta forma, só a partir deste momento é que a prazo prescricional se iniciou relativamente ao aqui Apelante.

    25) Contudo, em 20 de Março de 2015 o aqui Apelante, juntamente com outros trabalhadores apresentou junto do Tribunal do Comércio de Amarante processo de insolvência, o qual com o n.º 417/15.6T8AMT, correu os seus termos pelo Juízo do Comércio de Amarante – Juiz 2, cfr. facto provado sob n.º 6 da fundamentação de facto 26) Em 16/06/2016 foi declarada a insolvência da entidade patronal, cfr. facto provado sob n.º 7 da fundamentação de facto 27) Entretanto, conforme se encontra dado como facto provado pelo Tribunal a quo a entidade patronal do Apelante apresentou um novo PER, o qual foi admitido liminarmente em 17/12/2015, cfr. facto provado sob n.º 9 da fundamentação de facto 28) No âmbito de tal processo que com o n.º 1513/15.5T8AMT correu os seus termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Porto Este – Juízo de Comércio de Amarante – Juiz 1 foi proferido Despacho Judicial de não homologação do Plano de Revitalização apresentado pela Devedora, cfr.. facto provado sob n.º 11 da...

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