Acórdão nº 02556/17.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução01 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MGSS, residente na rua D…, Porto, instaurou acção administrativa contra a Câmara Municipal do Porto, com sede na praça General Humberto Delgado, visando a impugnação da decisão de resolução do contrato de arrendamento apoiado, formulando o seguinte pedido: a.

Ser anulado o ato administrativo de 10.08.2017 do Sr. Vereador do Pelouro da Habitação e Recursos Humanos da Câmara Municipal do porto, que ordenou a desocupação, pela autora, da casa sita na Rua D…, no Porto; b.

Ser reconhecido à autora e seu agregado familiar o direito a ocupar a referida casa: c.

Ser o réu condenado ao pagamento da indemnização para ressarcimento dos danos sofridos com a execução do ato que ora se impugna, a liquidar em execução e sentença, e respectivos juros de mora desde a data da liquidação até efectivo e integral pagamento.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

*Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões: I. A decisão a quo está errada e, por isso, deve ser revogada.

  1. A verdade é que no caso concreto estamos perante vários inocentes que serão irremediavelmente prejudicados por um acto administrativo com eficácia externa e lesivo de um dos direitos mais basilares.

  2. Existe, pois, por parte do Município do Porto uma falta de sentido de proporcionalidade e uma ponderação indevida na análise da situação vertente que coloca em causa o direito à habitação constitucionalmente consagrado no artigo 65º da C.R.P., em especial dos filhos menores da requerente que nada têm a ver com a presente situação.

  3. Pelo que a situação da recorrente impõe a busca de equilíbrio e harmonia, na ponderação de direitos e interesses à luz do caso concreto, na prossecução da melhor forma de aplicação e efectivação dos direitos fundamentais.

  4. Por isso mesmo estabelece o artigo 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa que “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé”.

  5. O ato do Município do Porto é, em nosso entender, nulo por ofender o conteúdo essencial de um direito fundamental nos termos abrigados do artigo 161º nº 2 d) do C.P.T.A. em conjugação com o disposto no artigo 32º nº2 da C.R.P..

  6. Nulidade essa, cujo decretamento foi requerido na ação administrativa especial nos termos do disposto no artigo 37º nº 1 alínea a) e 50º nº 1 e seguintes do C.P.T.A. de que a presente providência é preliminar.

  7. Há igualmente, violação do princípio da legalidade, do princípio da prossecução do interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, do princípio da proporcionalidade, dos princípios da justiça e da razoabilidade, do princípio da imparcialidade e do princípio da boa-fé previstos nos artigos 3º, 4º, 7º, 8º, 9º e 10º do C.P.T.A. e C.P.A.

Por todas estas razões deve o recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser revogada a decisão proferida.

*Não foram juntas contra-alegações.

*O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

*Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1 - A Autora é arrendatária da habitação social sita na rua D…, Bairro P…, na cidade do Porto, de que é senhorio o Município do Porto - Cfr. Alvará n.° 36203, de 31 de maio de 2012, constante a fls. 43 do Processo administrativo; 2 - Integra o agregado familiar da Autora, para além dela própria, o seu companheiro NMF, e três filhos ainda menores - Cfr. fls. 120 do Processo administrativo; 3 - No dia 24 de setembro de 2015, no âmbito do Processo Comum Coletivo n.° 16/ 13.7PFGDM, que correu termos na Comarca do Porto - Instância Central - 1ª secção criminal - J5, em que a Autora e o seu companheiro, NF, entre outros, eram arguidos, este [NR] foi condenado pelo Acórdão aí proferido, na pena efetiva de 4 anos e 6 meses de prisão, pelo crime de tráfico de estupefacientes, e quanto à Autora, foi a mesma condenada na pena, suspensa, de 2 anos de prisão, como cúmplice de um crime de tráfico de estupefacientes - Cfr. fls. 330 desse Acórdão, que faz parte integrante do Processo administrativo; 4 - Por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai parte desse Acórdão - Cfr. fls. 140, 141, 142, 143, 144, 162 e 163 desse Acórdão, que faz parte integrante do Processo administrativo -, no que é atinente à fundamentação aí vertida visando a factualidade imputada à Autora e ao seu companheiro NR, como segue: “[…] O arguido NF dedicou-se à venda de estupefacientes, desde data não concretamente apurada, mas anterior a julho de 2013. Este arguido contactava telefonicamente com diversos indivíduos que pretendiam comprar estupefacientes, combinando deste modo o local para a entrega das substâncias estupefacientes, habitualmente ria sua residência, sita na Rua P…, Porto, ou na entrada do Bloco onde vivia. [sublinhado nosso] […] Em data não concretamente apurada, mas situada por meados de 2013, o arguido NF acordou ainda com a sua companheira, a arguida MGSS, que a mesma colaborasse na atividade de venda de estupefaciente. Assim, para além de ter conhecimento de toda a atividade de tráfico desenvolvida pelo arguido, a arguida MS também colaborava na mesma, alertando-o para qualquer presença policial nas proximidades do local de venda e da sua residência [...] [sublinhado nosso] [...] No dia 1 de dezembro de 2013, pelas 10h00, no interior da residência dos arguidos de NMRF e de MGSS, sita no B.° P…, porto, foi encontrado: - na sala, em cima da mesa: . Um telemóvel Samsung, de cor branca, modelo GTS5660, com o IMEI 35xxx68, com o cartão da operadora Vodafone com o n° 81xxx81, a funcionar com o n° 91xxx78, com um cartão de memória de 2 Gb, pertencente à arguida. MS; . um telemóvel, marca Samsung, modelo GT-E1180, de cor preta, com o IMEI 357xxx78, com o cartão da Vodafone com o n° 811xxx37, pertencente ao arguido NF; . a quantia monetária de 35€ [...] em notas do BCE; .

um pedaço de canábis (resina), com o peso líquido de 2,111g; - no quarto dos arguidos, no interior do roupeiro, no bolso de um blusão do arguido N…, a quantia monetária de 380€ [...], fracionada numa nota de cinquenta euros, sete notas de vinte euros, catorze notas de dez euros e dez notas de cinco euros. [...] O estupefaciente pertencia ao arguido NF e MS, que o destinava à venda a terceiros, com o auxílio da arguida MS. [sublinhado nosso] O dinheiro também pertencia ao arguido NF e era proveniente da atividade de venda de estupefacientes a que se dedicava, com o auxílio da arguida M…. [sublinhado nosso] Os telemóveis eram utilizados pelos arguidos N… e M… nos contactos que estabeleciam entre si, com os demais arguidos e com compradores dos produtos estupefacientes, a cuja venda procediam, O veículo marca Audi, modelo A4, com a matrícula xx-xx-UU, pertencia ao arguido NF, tendo sido por este adquirido com o dinheiro proveniente da atividade de venda de estupefacientes e era por este utilizado nessa mesma atividade.

[…]”.

5 - Na fase da instrução e averiguação no âmbito do procedimento instaurado pelo Réu, foi colhida informação pelos seus Serviços, no sentido de que à Autora tinha sido imputada a prática de actos ilícitos, contrários à lei, aos bons costumes e à ordem pública, após o que foi elaborado projeto de decisão de resolução do contrato de arrendamento apoiado, da autoria do Vereador do Pelouro da Habitação e Ação Social, datado de 14 de março de 2017, do que foi a Autora notificada em 20 de março de 2017 - Cfr. fls. 125 a 127 do Processo administrativo; 6 - A Autora exerceu o seu direito de pronúncia, no âmbito da qual, entre o mais, negou a prática de atos ilícitos a partir da sua habitação, e também, de outros que pudessem por em causa a ordem pública e os bons costumes - Cfr. fls. 140 a 147 do Processo administrativo; 7 - No dia 28 de julho de 2017, veio a ser proferida decisão final - acto sob impugnação -, pela qual, entre o mais, foi decidida a resolução do contrato de arrendamento com fundamento no artigo 1083.° n.° 2 alínea b) do Código Civil, do que a Autora foi notificada em 10 de agosto de 2017 - Cfr. fls. 156 a 159 do Processo administrativo; 8 - Por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai o teor da notificação enviada à Autora, como segue: NOTIFICAÇÃO CE-GPH-4325-2017 A casa 32 da entrada 525, do bloco 6, da Rua D…, em P…, propriedade do Município do Porto e sob gestão da DomusSocial, EM, foi atribuída à arrendatária MGSS, e respetivo agregado autorizado, constituído por GLSF, NMRF, NMSF e GMS.

No âmbito do processo administrativo, segundo o que se apurou na fase de instrução e averiguação pelos serviços da Direção da Gestão do Parque Habitacional (PRC_CINS-2017-4065), verifica-se a utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes e à ordem pública. No interior da habitação atribuída à arrendatária foram apreendidos dois telemóveis e quantias em dinheiro, conforme consta das páginas 162 e 163 do acórdão condenatório, no âmbito das buscas policiais (transcreve-se a sentença curo teor se dá por reproduzido): «No dia (...), no interior da residência dos arguidos de NMRF e de MGSS, sita no Bairro P…,(…) foi encontrado: um telemóvel, marca Samsung de cor branca, modelo GTS5660, com o IMEI 35xxx68, com o cartão da operadora Vodafone com o n° 81xxx81, a funcionar com o n° 9xxx78, com um cartão de memória de 2 Gb, pertencente à arguida MS; um telemóvel, marca Samsung,(…) com o cartão da operadora Vodafone (…) com um cartão de memória de 2Gb, pertencente à arguida MS; um telemóvel, marca Samsung,(…) com o cartão da operadora Vodafone (…) de NF; a quantia monetária de 35€ (tinta e cinco euros)...] em notas do BCE; um pedaço de canábis (resina), com o peso líquido de 2,111g...

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