Acórdão nº 98/11.6BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução08 de Maio de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 03.06.2015, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de S... , na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por M...

(doravante Recorrida ou impugnante), que teve por objeto o indeferimento do recurso hierárquico que versou sobre o indeferimento da reclamação graciosa que, por seu turno, teve por objeto a liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), relativa ao ano de 2003.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “A - Vem o presente recurso reagir contra a Sentença que julgou totalmente procedente os presentes autos de Impugnação Judicial, intentados por M... , NIF 10... contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) e respectivos juros compensatórios, referente ao exercício de 2003, no montante total de € 587.539,57.

B - O acto tributário de liquidação é um acto impositivo de deveres e encargos para o particular e como tal está sujeito a fundamentação (Cfr. n.º 3 do artigo 268.º da CRP, artigos 124.º e 125.º do CPA e em especial o artigo 77.º da LGT).

C - Como tem sido plasmado na jurisprudência dos Tribunais Superiores, designadamente, do STA, a exigência legal e constitucional de fundamentação tem como objectivo, primordialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a Administração Fiscal a agir, possibilitando-lhes, desta forma, uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.

D - Assim, em ordem a ser atingido este escopo, deve a fundamentação ser capaz de proporcionar ao destinatário do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrida pela Administração Fiscal, de forma a poder saber-se, claramente, quais as razões porque decidiu num determinado sentido e não noutro; por outras palavras, a fundamentação é suficiente quando proporcione aos destinatários do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente, cfr. acórdão do STA, de 15-04-2009, proferido no âmbito do recurso n.º 065/09.

E – Ao contrário do que foi postulado pelo Douto Tribunal a quo, à Impugnante sempre foi permitido conhecer o itinerário cognoscitivo percorrido pela administração tributária tendente à emanação do acto tributário impugnado, o que se constata, ademais, mediante uma simples leitura do petitório aduzido pela Impugnante, não apenas no âmbito da p.i da impugnação judicial, mas também a nível da reclamação graciosa e recurso hierárquico anteriormente deduzidos, donde se extrai que a Impugnante sempre demonstrou saber que se tratavam de rendimentos respeitantes à categoria H do exercício de 2003 que não haviam sido declarados, tal como se lhe impunha.

F - Paralelamente, embora singela, a fundamentação utilizada mostra-se perfeitamente consentânea com as necessidades de fundamentação que a situação em apreço exigia, pois que permitiu a administração tributária saber, através da expressão utilizada, que o valor corrigido corresponde ao valor de rendimentos de categoria H – pensões - , pagos ou colocados à disposição pelo Instituto da Segurança Social e auferidos pela Impugnante no ano de 2003, os quais não foram pela mesma declarados, em virtude da sonegação da declaração modelo 3 de IRS relativa a tal período.

G - As correcções foram efectuadas pela administração tributária em virtude, apenas, da não entrega da declaração modelo 3 de IRS por parte da Impugnante, como lhe competia e onde seriam obrigatoriamente incluídos os valores que se lograram corrigir; efectivamente, não existem quaisquer adicionais razões pelas quais a administração tributária efectuou a citada correcção, tendo sido, no relatório de inspecção, devidamente enunciadas as respectivas disposições legais, bem como a qualificação e quantificação dos factos tributários relevantes.

H – Portanto, a administração tributária fez a devida ponderação fundamentadora acerca do acto tributário impugnado, sem que, a nosso ver, tenha logrado obter a justa valoração do Tribunal a quo para efeitos da boa decisão da causa.

I - Por outro lado, dispõe a alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º do CIRS, as mais-valias, desde que não sejam consideradas rendimentos de outras categorias, constituem incrementos patrimoniais sujeito a tributação em sede de IRS; postulando a alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do CIRS, na redacção em vigor à data dos factos, que as mais-valias, são constituídas pelos ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis.

J - No entanto, surge-nos o n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 42-A/88, de 30 de Novembro, diploma legal que aprovou o CIRS, a estabelecer um regime transitório, nos termos do qual os ganhos que não eram sujeitos ao Imposto de Mais-valias (IMV) criado pelo Decreto-Lei n.º 46373, de 9 de Junho de 1965, só ficam sujeitos a IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado depois da entrada em vigor do CIRS.

K - Por sua vez, preceituava o artigo 1.º do revogado CIMV que o imposto incidia sobre os ganhos realizados através de, entre outros actos, transmissão onerosa de terreno para construção, qualquer que fosse o título por que se operasse, quando dela resultassem ganhos não sujeitos aos encargos de mais valia previstos no artigo 17.º da Lei n.º 2030, de 22 de Junho de 1948, ou no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 41616, de 10 de Maio de 1958, e que não tivessem a natureza de rendimentos tributáveis em contribuição industrial e, em conformidade com o n.º 2 desta mesma disposição legal, eram considerados terrenos para construção os que se situassem em zonas urbanizadas ou compreendidos em planos de urbanização já aprovados e os assim declarados no título aquisitivo.

L - Para que possamos qualificar um prédio como terreno para construção e socorrendo-nos da jurisprudência emanada pelo acórdão do TCA Norte de 23-06-2005, proc. n.º 0149/04, segundo o qual a natureza do prédio “tem de ser vista em função das circunstâncias, qualidades e propriedades que o bem detém à data do acto translativo gerador dos rendimentos (…)pois que aí radica o facto tributário na sua dimensão temporal”, não podemos fazer uso um conceito meramente formal, mas antes material, dirigido às realidades para que foi formulado, ou seja, no caso em apreço, na imputação específica do terreno a fins construtivos.

M - Atente-se, ainda, ao entendimento veiculado pelo acórdão do TCA Sul de 15-10-2002, proc. n.º 6380/02, onde se sumariza que “Terrenos para construção são aqueles que ainda que no título de aquisição assim não hajam sido declarados, desde que a sua situação seja em zona urbanizada, se localize em locais abrangidos por planos de urbanização e a destinação seja declarada como tal pelos intervenientes na transmissão, ainda que tudo seja revelado por indícios objectivos”.

N - Efectivamente, no caso em apreço, tudo aponta para que o prédio em apreço tinha apetência para construção, em face de todos os indícios objectivos e subjectivos recolhidos, designadamente através da sua inclusão em zona urbanizável no respectivo Plano Director Municipal, bem como pelo facto de ter sido objecto de um contrato de urbanização, sendo, ainda de relevar o facto de a sua alienação visar, entre outros, estudos de operações urbanísticas sobre o imóvel objecto deste contrato e prédios contíguos.

O - Da mesma forma, todo o circunstancialismo descrito indicia que a Impugnante destinava o prédio à construção, o que é revelado, ademais, pela sua intervenção na acção de intimação judicial para a emissão de alvará de loteamento e de obras de urbanização, já junta aos autos; sendo que a Impugnante, já por diversas ocasiões, teve oportunidade de abordar a natureza do prédio em causa, nunca se coibindo de actuar como se de um terreno para construção se tratasse, apesar de se ora se pretender eximir à tributação inerente ao mesmo.

P - Desta forma, no caso em apreço, em face de toda a factualidade relevante, outra conclusão não subsiste que não a de estarmos perante um terreno para construção, cujos ganhos obtidos pela Impugnante com a respectiva alienação são sujeitas a tributação como rendimentos da categoria G de IRS (mais-valias), contrariamente àquilo que foi decidido na Sentença, ora recorrida.

Q - O Douto Tribunal a quo, ao decidir como efectivamente o fez, estribou-se numa errónea apreciação da matéria de facto relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto no artigo 125.º do CPA, no artigo 77.º da LGT e na alínea i) do n.º 3 do artigo 62.º e n.º 1 do artigo 63.º, ambos do RCPIT, na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º, na alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do CIRS e no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro”.

A Recorrida apresentou contra-alegações, onde formulou pedido subsidiário de ampliação do objeto do recurso, tendo concluído nos seguintes termos: “ A) Não se pode considerar fundamentado o acto tributário que apenas identifica o montante de € 4.483,00 (alegadamente enquadrado como rendimento da categoria H - pensões) e a “entidade pagadora”; B) Conforme entendido pela doutrina e jurisprudência a fundamentação deve ser expressa...

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