Acórdão nº 02408/04.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelPedro Vergueiro
Data da Resolução13 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO ENI, SGPS, S.A.

, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do P..., datada de 24-10-2011, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida, no âmbito da presente ACÇÃO PARA RECONHECIMENTO DE UM DIREITO relacionada com a decisão de indeferimento tácito da Reclamação Graciosa n° 3182044000331, que correu termos na Direcção de Finanças do P..., onde se peticionava (no domínio da liquidação de IRC) a liquidação de juros indemnizatórios a favor do contribuinte no montante de Euro 130.273,97, acrescido de juros de mora à taxa legal de 1% ao mês sobre esta importância, desde 13.01.2004 e até integral e efectivo pagamento, e com as demais consequências legais.

*Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 137-153), as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) A. A douta Sentença, salvo o devido respeito, padece de errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 82º nº 3 do CIRC.

  1. Com efeito, aplica expressamente aquele preceito na redacção que lhe foi conferida e renumerada pela Lei nº 30-G/2000, de 29/12.

  2. A qual, segundo o seu artigo 21º nº 2, apenas entrou em vigor em 01.01.2001 e é aplicável apenas aos períodos tributários iniciados a partir desta data.

  3. Só com a entrada em vigor dessa lei é que a concessão do reembolso no prazo de 3 meses passou a estar condicionada ao facto da declaração de rendimentos não conter erros de preenchimento.

  4. De modo que também aquele artigo 21º nº 2 foi violado pelo douto aresto em apreço, já que, segundo a factualidade provada, está em causa uma declaração de rendimentos entregue em 2000 com respeito ao exercício de 1999 (cfr. 1) dos factos provados).

  5. Nessa medida, deveria ter sido aplicado o artigo 82º nº 3 do CIRC, na redacção do DL 138/92, de 17/6, segundo o qual “o reembolso será efectuado, quando a declaração periódica de rendimentos for apresentada no prazo legal, até ao fim do 3 mês imediato ao da sua apresentação” -— independentemente da declaração padecer ou não de quaisquer erros de preenchimento.

  6. Não tendo sido o caso, a douta Sentença violou aquele preceito, bem como o nº 6 do mesmo normativo, segundo o qual, e não sendo o reembolso efectuado naquele prazo, acrescerão juros à quantia a restituir ao contribuinte.

  7. Concomitantemente, a douta Sentença recorrida viola o princípio geral da irretroactividade das leis fiscais, consagrado nos artigos 103º nº 3 da CRP e 12º nº 1 da LGT.

    I. Sendo certo que o direito do contribuinte a juros indemnizatórios ou de mora constitui questão de direito tributário material ou substancial, incluída nas “garantias” do contribuinte (cfr. artigo 30º nº 1 e) da LGT) - e não mera questão processual ou procedimental.

  8. Integrando as “garantias” do contribuinte, o direito a juros a favor do contribuinte está incluído no “princípio da legalidade”, conforme decorre do nº 2 do artigo 103º da CRP - de modo que tais juros não podem ser coarctados ao contribuinte tendo por base lei inexistente à data a que os mesmos se reportam.

  9. A douta Sentença recorrida omitiu ainda o disposto no artigo 43º nº 3 a) da LGT, em vigor desde 01.01.1999, segundo o qual “são também devidos juros indemnizatórios (...) quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos” - mais uma vez, independentemente de quaisquer lapsos de preenchimento declarativo.

    L. Deste modo, e contrariamente ao entendimento propugnado na douta Sentença recorrida, a AF deveria ter efectivado o reembolso de imposto até ao fim do 3º mês seguinte ao da apresentação da declaração de rendimentos, independentemente desta conter ou não quaisquer lapsos de preenchimento.

  10. Esse prazo de 3 meses é mais do que suficiente para que a AF efectue as análises e fiscalizações que muito bem entenda, efectuando oficiosamente as correcções de quaisquer erros cometidos pelo contribuinte, designadamente de preenchimento declarativo.

  11. Aliás, esse prazo era mais do que bastante para que a AF pudesse aferir se o contribuinte, no exercício em questão, deveria ou não ser tributado segundo o regime especial da tributação do lucro consolidado, então consagrado nos artigos 59º e ss do CIRC (redacção de 1999), pois seriam elementos que necessariamente estariam “ex officio” ao seu inteiro dispor (cfr. artigo 74º nº 2 da LGT).

  12. Por força do disposto no artigo 87º do CPA, a AF deve oficiosamente averiguar todos os factos, P. não carecendo de prova ou alegação, pelo contribuinte, os factos “que o órgão competente tenha conhecimento em virtude do exercício das suas funções”.

  13. Incumbe à AF, por força do disposto no artigo 58º da LGT, um especial dever de inquisitório e descoberta da verdade material, “não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido”.

  14. No mesmo sentido, podem ver-se os artigos 56º e 87º nº 1 do CPA.

  15. E a AF deve actuar segundo um princípio da celeridade e diligência, conforme consagra o artigo 57º da LGT e 57º do CPA.

  16. Pelo contrário, da factualidade provada e dos demais sinais dos autos resulta que só em 2002 é que a AF começou por fazer uma inspecção interna, à qual se seguiu, em 2003, uma inspecção externa, sempre tendo por preocupação tratar-se de um reembolso de elevado valor, U. e não qualquer preocupação de averiguar do correcto enquadramento tributário do contribuinte - que sempre seria do seu conhecimento oficioso interno - muito menos de qualquer erro de preenchimento declarativo.

    V. Com efeito, e como resulta dos sinais dos autos, o inusitado atraso na concessão do reembolso não advém do mero lapso de preenchimento da declaração de rendimentos - foi posta um “x” na quadrícula “lucro consolidado”, quando deveria ter sido aposto um “x” na quadrícula “regime geral”.

  17. Muito pelo contrário, ficou provado, e resulta dos sinais dos autos, que o contribuinte diligenciou várias vezes, pessoalmente e por escrito, junto da AF, no sentido de questionar as razões do atraso no reembolso, informando a AF daquilo que já deveria ser do seu conhecimento - que o contribuinte, no exercício em causa, não estava integrado no regime da tributação pelo lucro consolidado.

    X. O que deveria ter sido objecto de produção da prova testemunhal oportuna mente requerida - designadamente, dos depoimentos das pessoas que efectuaram essas diligências, oportunamente indicadas pela Recorrente na p.i., a final.

  18. Sendo certo que, por força do disposto no artigo 392º do CC, a prova testemunhal deve ser admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada.

  19. E trata-se de matéria que poderá ser relevante para a apreciação de mérito já que, conforme estipula o artigo 57º nº 4 da LGT, o prazo do reembolso, na pior das hipóteses, poderia ter-se suspenso - se bem que apenas pelo período de dilação do procedimento imputável ao sujeito passivo por incumprimento dos seus deveres de cooperação.

    AA. Ora, para além do mero lapso inicial de preenchimento da declaração de rendimentos que veio a ficar registada e arquivada no seio da AF, nada mais se provou no sentido de que o contribuinte haja incumprido os seus deveres de cooperação com a AF; muito pelo contrário.

    BB. A Recorrente só foi reembolsada em 12.01.2004, como se comprova pelo documento 3 junto à p.i. - facto que deve ser levado ao probatório, tendo por base, precisamente, esse documento.

    CC. Note-se que não está em causa qualquer correcção substancial, de fundo, aos valores autoliquidados pelo contribuinte.

    DD. Outrossim, o valor que veio a ser liquidado e restituído pela AF, em 2004, foi a exacta reprodução dos valores que haviam sido oportunamente autoliquidados pelo contribuinte, conforme resulta dos sinais dos autos.

    EE. Assim, a douta Sentença recorrida, salvo o devido respeito, padece de erro de julgamento, designadamente da matéria de facto, bem como de violação e/ou omissão das sobreditas disposições legais.

    Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., concedendo provimento ao presente recurso, revogando a douta Sentença recorrida e, consequentemente, julgando a acção procedente, com o reconhecimento, à A., do direito aos juros peticionados, V. Exas. farão, como sempre, inteira JUSTIÇA.”*O Director-Geral dos Impostos apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma (cfr. fls. 207-213): “(…) I. A Autora sustenta o seu recurso afirmando que a Douta sentença padece de erro na interpretação e aplicação do art° 82°n°3 do CIRC e art° 21° n.° 2 da Lei 30-G2000, de 29/12, e que viola o princípio da Irretroactividade da lei fiscal, cfr. art° 103° n.°3 da CRP e 12° n.° 1 da LGT.

    II. O recurso agora interposto, incide sobretudo no erro na interpretação a aplicação do art° 82°n°3 do CIRC e art° 21° n.° 2 da Lei 30-G2000, de 29/12 por entender que a sentença recorrida aplicou uma disposição legal que só entrou em vigor no período de tributação seguinte ao do exercício em causa nos presentes autos.

    III. Mas não tem a Recorrente, razão como se verá: desde logo porque parte de um pressuposto salvo o devido respeito errado, de que já está constituído a seu favor o dever de liquidar juros indemnizatórios, e que por isso deviam ter sido ser oficiosamente calculados e pagos, juntamente com o reembolso efectuado.

    IV. E não é possível, nem exigível que a AT cumpra o prazo de reembolso estabelecido na lei, quando, por causa de erros nas declarações cometidos pelos contribuintes, os dados declarados carecerem de correcções e até de inspecções tributárias para os resolver, antes que seja possível liquidar o imposto.

    V. Ora, é um facto que a então A. prestou uma informação errada, na declaração mod. 22 entregue em 31/05/2000, ao assinar os campos 1 e 8 do Quadro 4, que indicam a tributação pelo regime do lucro consolidado, nos termos do então art. 59º do Código do IRC (CIRC). (Cfr. fls 43 a 45 do P e ponto 6 do probatório).

    VI. Perante a indicação, pelo SP, da...

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