Acórdão nº 1451/04.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução14 de Março de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I- Relatório Z.... – ......, S.A, melhor identificada nos autos, veio deduzir impugnação do acto de indeferimento da reclamação graciosa, por si apresentada contra os actos de liquidação adicional de IRC do exercício de 1998, com os n.ºs 8310034275 e 6420002723, de 2 de Outubro de 2002, no montante respectivamente de € 167.036,73 e de € 582.264,49, no total de € 749.301,22.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 204 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), datada de 23 de Fevereiro de 2018, julgou extinta parcialmente a instância por inutilidade superveniente da lide por anulação parcial do acto efectuada pela ATA no valor de € 24.395,86 e julgou parcialmente procedente a presente impugnação, determinando a anulação parcial, no montante de € 8.711,32, relativamente ao acto de liquidação adicional n.º 8310034275 e a anulação do acto de liquidação adicional n.ºs 6420002723.

Nas alegações de fls. 250 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente, FAZENDA PÚBLICA, formula as conclusões seguintes: «I. No que respeita à liquidação nº 8310034275, decidiu o tribunal apreciar o vício a falta de fundamentação quanto à existência de uma diferença de €8.711,32.

II. Conforme ficou sobejamente demonstrado nos autos, a referida alteração de valores era conhecida da impugnante, nomeadamente por efeito da liquidação adicional de IRC nº 8910008057, referente a 1997, que corrigiu o valor dos prejuízos para €946.494,79.

III. Pelo que, não tendo ficado prejudicados qualquer direito de defesa e tendo sido permitido à impugnante conhecer o iter cognitivo e valorativo do acto de liquidação, é entendimento da Fazenda Pública que se encontra respeitado o dever de fundamentação previsto no art. 77º da LGT.

IV. No que respeita à liquidação nº 6420002723, tomando em consideração a distinção entre contrato de “k….” e contrato de prestação de serviços de "e…." e os factos apurados em sede de inspecção verifica-se que estamos perante rendimentos derivados de transferência de tecnologia.

V. Nos termos do art. 69º, nº 2 do CIRC, na redacção à data dos factos, esses rendimentos estão sujeitos a retenção na fonte aquando do apuramento do respectivo quantitativo, nos termos do nº 6 do art. 75º do CIRC, conjugado com o art. 91º do CIRS.

VI. Nestes termos e atento às disposições legais em apreço, os pagamentos efectuados à “C…., SA” e à “T….”, estão sujeitos a retenção na fonte aquando do respectivo apuramento, ou seja, pela facturação semestral emitida, conforme art. 69º e 75º do CIRC.

VII. De referir, ainda, contrariamente ao decidido na douta sentença, a prova apresentada pela impugnante não comprova de forma evidente que os pagamentos não estão sujeitos a retenção na fonte.

VIII. Pelo exposto, ao decidir como decidiu, violou a douta sentença o disposto nos art. 69º e 75º do CIRC, na redacção à data dos factos.

XNas contra-alegações de fls. 256 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrida, Z.... – ......, S.A, formula as conclusões seguintes: «A. Por se entender que não assiste à Fazenda Pública razão, refuta-se desde já a alegação apresentada, que não deverá merecer vencimento pelas razões que se aduzem infra: Liquidação n.º 8310034275 B. Neste ponto discute-se a questão da fundamentação do diferencial de € 8.711,32, resultante da correção da matéria coletável, existente entre o valor apontado na nota de liquidação (€2.589.254,73) e o resultante do projeto do relatório de inspeção (€ 2.580.543,41).

  1. A Fazenda Pública alega, como já o tinha feito nestes autos, que foi permitido à Impugnante, ora Recorrida, "conhecer o iter cognitivo e valorativo do acto de liquidação".

  2. Certo é que o douto Tribunal a quo entendeu, com todo o mérito, que "(...) esta explicitação das razões que está subjacente à apontado discrepância nos valores em causa foi efectuada já depois da propositura da acção de impugnação judicial, constituindo fundamentação a posterior, não contemporâneo do acto".

  3. O douto Tribunal a quo atendeu, como não podia deixar de ser, ao princípio da obrigatoriedade de fundamentação dos atos administrativos (art.º 152.º do CPA e art.º 77º da LGT), obrigação "que constitui um importante sustentáculo da legalidade administrativa, e o direito à fundamentação constitui instrumento fundamental da garantia contencioso, pois que é elemento indispensável na interpretação do acto administrativo." in acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido em 11- 01-2013 no âmbito do proc. 01772/07.7BEPRT.

  4. Logo, partir do pressuposto de que a composição dos valores presentes na nota de liquidação é conhecida da ora Recorrida - como resulta da alegação da Fazenda Pública - olvidando por completo o dever da prévia fundamentação dos mesmos, é simplesmente violador dos preceitos em cima enunciados.

  5. Acresce que "A obscuridade e insuficiência da fundamentação do acto valem como falta de fundamentação. A falta de fundamentação inquina o acto de ilegalidade que determina a sua anulabilidade." - acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido em 06-01-2005 no âmbito do proc. 00439/04.

  6. Conclui-se assim que o ato de liquidação adicional de IRC n.º 8310034275 foi praticado ofendendo o princípio e os preceitos supra referidos, sendo por isso anulável nos termos do art.º 163.º, n. º1do CPA.

    Liquidação n.º 6420002723 I. Está essencialmente em causa a qualificação dos rendimentos pagos pela Recorrida no âmbito dos contratos de prestação de serviços celebrados com a construtora A…., S.A e com a empresa Telex R…., e a sujeição dos mesmos a retenção na fonte para efeitos de IRC.

  7. Na leitura da Fazenda Pública, nos contratos em questão resulta não uma aplicação de tecnologia, mas antes uma transferência de tecnologia o que faz deles, no seu entender, contratos de "k...." e não simples contratos de prestação de serviços, e por isso conclui que os rendimentos estão sujeitos a retenção na fonte (art.º 69.º, n.º 2 do CIRC na redação à data dos factos) aquando do seu apuramento.

  8. Quanto aos contratos celebrados com a A......, para verdadeiramente se compreender o seu objeto é necessária uma leitura dos mesmos no seu todo, não bastando uma interpretação dos considerandos para concluir sobre o âmbito dos serviços prestados.

    L. Daqueles contratos resulta de forma clara que a A...... presta à Recorrida serviços de consultoria na área da construção civil, incluindo organização e elaboração de projetos, preparação de propostas, execução e fiscalização de empreitadas de obras públicas e particulares, etc..

  9. Ora, os rendimentos pagos pela Recorrida no âmbito destes contratos traduzem-se na contraprestação daqueles serviços, que nada têm a ver com transferência temporária ou definitiva de direitos sobre tecnologia a favor da Recorrida.

  10. Munido destes factos, e alicerçado na fundamentação do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido em 18-03-2009 no âmbito do processo 02628/08 - cuja decisão versou exatamente sobre os mesmos contratos - conclui o Tribunal a quo "pela qualificação dos pagamentos efectuados pela Impugnante à Construtora A......, S.A., como prestação de serviços".

  11. Naquele acórdão concluiu-se que "O contrato celebrado entre aquelas duas entidades através do qual a entidade não residente presta serviços em território português através de «intervenção dos seus departamentos técnico, jurídico e informático nas propostas para a construção das obras apresentadas pela Z........... em concursos públicos, e pela intervenção dos departamentos de planeamento e controle de gestão, contabilidade e gestão da qualidade em tarefas de carácter geral» não pode ser qualificado como de transmissão de k.... e assistência técnica associada, por nenhuma tecnologia ter sido, ao seu abrigo, transferida;" (negrito nosso) P. Acresce que também o Tribunal Tributário de Lisboa, em sentença proferida em 26-04- 2018 no âmbito do proc. 34/07.4BELSB - ainda não disponível no site da DGSI - decidiu exatamente da mesma forma, fundamentando também a sua posição nos ensinamentos do acórdão do Tribuna l Central Administrativo Sul proferido em 18-03- 2009 no âmbito do processo 02628/08.

  12. É assim evidente a unanimidade da jurisprudência na interpretação desta mesma questão jurídica - no sentido de considerar que os contratos celebrados entre a Z...... e a A...... não envolvem transmissão de k.... - circunstância que deve relevar na decisão do presente recurso, conforme impõe o art.º 8.º, n.º 3 do CC.

  13. Logo, conclui-se que os pagamentos efetuados à A...... devem ser qualificados como derivados de prestação de serviços, e como tal não estão sujeitos a retenção na fonte ao abrigo do regime convencional para evitar a dupla tributação celebrado entre Portugal e o Brasil, aplicável à data dos factos.

  14. No que toca ao contrato celebrado com a Telex a Fazenda Pública não aborda nem faz qualquer menção à norma jurídica aplicável - a referida CDT, em especial o seu art.º 13.º - o que torna a sua alegação de recurso desprovida de fundamentação e base legal.

  15. Nos termos daquele artigo, royalties "significa as retribuições de qualquer natureza atribuídas pelo uso ou pela concessão do uso de um direito de autor sobre uma obra literária, artística ou científica (...) bem como pelo uso ou pela concessão do uso de um equipamento industrial, comercial ou científico ou por informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial comercial ou científico".

  16. Mas os rendimentos em questão - derivados do contrato cujo objeto era o desenvolvimento e implementação de...

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