Acórdão nº 00371/16.7BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | Rog |
Data da Resolução | 28 de Setembro de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: FRV Serviços, S.A. e NTG, S.A.
vieram interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 28 de Julho de 2016 pela qual foi julgada totalmente improcedente a acção de contencioso pré-contratual que as ora Recorrentes intentaram contra o Município de Espinho para anulação do acto de adjudicação à SM – Serviços Urbanos e Meio Ambiente, S.A.
do contrato designado por “Serviços de Recolha e Transporte a Destino Final de Resíduos Sólidos Urbanos”, o decretamento da exclusão da proposta apresentada pela Contra-Interessada, ora Recorrida, ou, quando assim não se entendesse, que fosse condenado o Réu Município de Espinho a proceder à reavaliação e reclassificação da proposta da SM.
Invocaram para tanto, em síntese que a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação e omissão de pronúncia; em todo o caso, sustentam, errou na interpretação e aplicação aos factos provados das normas aplicáveis, em particular o disposto, no artigo 57º, n.º1, alínea a), nas alíneas b), c) e g) do nº 2 do artigo 70º, e no artigo 146º, n.º2, alínea o), do Código de Contratos Públicos, na cláusula 14º do caderno de encargos e na cláusula 9º, n.º2, do programa do procedimento.
*Cada um dos recorridos apresentou contra-alegações, a pugnarem ambos pela total improcedência do recurso.
*Foi proferido pelo Tribunal recorrido, despacho de sustentação, defendendo inexistir qualquer nulidade na sentença recorrida.
*O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
*Foi emitido projecto de decisão no sentido de ser revogada a decisão recorrida e julgada procedente (em parte e noutra parte prejudicado o conhecimento) a acção.
As partes pronunciaram-se no essencial renovando as suas posições iniciais; o Município de Espinho veio ainda pedir o afastamento do efeito anulatório do contrato celebrado, face ao disposto no artigo 283º do Código de Contratos Públicos e à ponderação de interesses em presença.
As ora Recorrentes vieram requerer o desentranhamento do requerimento apresentado pela Recorrida SM na sequência do projecto de decisão, por entenderem que o mesmo extravasa o objecto da pronúncia que foi suscitada.
A SM, por seu turno, veio invocar a manifesta falta de fundamento deste requerimento e pedir o seu desentranhamento, com custas do incidente pela Recorrentes.
Por acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 13.01.2017 foi concedido provimento ao recurso, revogada a decisão recorrida, julgada procedente a acção quando a parte dos pedidos e prejudicado do conhecimento quanto aos restantes.
Acórdão que veio a ser revogado por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 29.06.2017, que determinou a baixa do processo para este Tribunal conhecer dos vícios cujo conhecimento julgou prejudicado e que tinham sido conhecidos pela Iª Instância.
*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. A sentença aqui em recurso incorre em manifesto erro de julgamento da matéria de facto e da qualificação jurídica da factualidade submetida à apreciação jurisdicional.
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A matéria de facto constante da sentença recorrida mais que sobeja para se concluir pela procedência da acção.
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A fundamentação de direito constante da sentença recorrida peca por não identificar todos os vícios invocados pelas aqui Recorrentes na sua petição inicial, omitindo-se qualquer referência ao vício invocado pelas Autoras quanto à violação da alínea b) do nº 2 do artigo 70º, do Código de Contratos Públicos, que se revela absolutamente essencial para o destino dos presentes autos.
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A decisão em recurso equivoca-se no enquadramento procedimental das obrigações previstas na cláusula 12º do caderno de encargos, ao qualificá-las, strictu sensu, como termos ou condições não submetidos à concorrência por aquela peça concursal.
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Na verdade, desconsidera o Tribunal a quo o que a esse respeito dispõe o programa do procedimento, que, na sua cláusula 9ª, sob a epígrafe “Documentos da Proposta”, exige, no seu nº 2, a apresentação de “Documento no qual estejam mencionados os seguintes atributos da proposta (…)”.
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Era exigível aos concorrentes que, nas suas propostas, concretizassem (1) os recursos, humanos e mecânicos a afectar ao serviço e (2) a metodologia e o programa de trabalhos proposto para a execução dos serviços concursado, devendo tais características da proposta respeitar as especificações do caderno de encargos.
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Afigura-se, pois, manifestamente equivocada a qualificação jurídica sustentada pelo Tribunal a quo quanto à inexistência, na proposta da contra-interessada SM, de qualquer referência ao modo de realização do serviço de apoio de varredura mecânica para a limpeza das Feiras da Revenda e dos Peludos.
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Na proposta da contra-interessada SM está manifestamente ausente um dos atributos exigidos no programa do procedimento, e não, como se sustenta na decisão recorrida, a omissão de um termo ou condição não submetido à concorrência pelo caderno de encargos.
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Ao exigir aos concorrentes que, nas feiras de “peludos” e de “revenda” o serviço integre o apoio de varredura mecânica, a cláusula 12ª do caderno de encargos assume um carácter programático no quadro do procedimento, simultaneamente vinculando os concorrentes à prestação daquele serviço de apoio, e, como resulta da cláusula 9ª do programa do procedimento, estando os concorrentes obrigados a concretizar, quer ao nível do número de meios mecânicos quer da metodologia proposta, o modo de prestação do serviço de apoio de varredura mecânica nos atributos das suas propostas.
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Bastará, aliás, analisar a factualidade constante da alínea G) da matéria assente para se concluir que a contra-interessada SM expressamente se prevê e concretiza o modo de prestação do serviço de apoio de varredura mecânica para a feira semanal e nada prevê quanto ao mesmo serviço para as feiras de “peludos” e de “revenda” (cfr. ponto 6.6.7. da memória descritiva – págs. 19 e 20 da sentença).
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A cláusula 12ª do caderno de encargos é assaz explícita quanto à obrigação de propor as condições de prestação do referido serviço para as três feiras, sem qualquer distinção e em condições manifestamente equivalentes – cfr. alínea C do probatório.
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A acolher-se a interpretação do Tribunal a quo quando defende uma putativa irrelevância jus-normativa do facto de a contra-interessada SM nada propor quanto ao apoio de varredura mecânica nas feiras de “peludos” e de “revenda”, então permitir-se-ia que cada concorrente escolhesse, segundo o seu arbítrio, quais os serviços que pretende propor e quais os que não pretende propor - solução que, com meridiana clareza, seria contrária aos mais elementares princípios do Direito e, em particular, aos princípios da concorrência e da igualdade que estruturam a contratação pública.
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Nada propondo quanto àquele serviço, a SM pôde apresentar um preço mais baixo do que os concorrentes que o propuseram, o que manifestamente revela uma prática restritiva da concorrência proibida pelo artigo 70º, nº 2, alínea g) do Código de Contratos Públicos – previsão que consubstancia um dos diversos desdobramentos do princípio da concorrência que transversalmente informa este Código, pelo que, ainda que se pudesse entender não estar ausente um atributo da proposta – o que não se concede -, sempre a descrita situação se revelaria ofensiva dos princípios da concorrência e da igualdade.
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A posição sufragada na decisão recorrida ofende, pois, de modo ostensivo o princípio da concorrência e traduz-se na inadmissível supressão da força vinculativa das exigências procedimentais atinentes aos atributos da proposta.
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Bastará atentar no facto provado B) para se perceber que a desconsideração do apoio de varredura mecânica na limpeza do recinto das feiras dos “peludos” e de “revenda” tem implicações directas na avaliação das propostas no âmbito do subfactor “ SF2 – memória descritiva e justificativa da execução dos trabalhos a realizar “ do factor “ F2 – Valia Técnica da Proposta“.
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É absolutamente linear a conclusão de que, não prevendo a Contra-Interessada SM proceder à limpeza dos recintos das feiras de “revenda” e de “peludos“ com apoio de varredura mecânica, a sua proposta não está em condições de ser avaliada, face ao critério de adjudicação, no factor “Valia Técnica da Proposta”.
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Qualquer que seja o enquadramento normativo que este Venerando Tribunal venha a acolher quanto à matéria sub specie – seja a da ausência de um atributo, seja a da impossibilidade de avaliação da proposta pela forma da apresentação dos atributos seja, finalmente, pela apresentação de atributos que violam parâmetros base fixados no caderno de encargos – certo é que a proposta em análise não poderia deixar de ser excluída, em conformidade com o disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 2 do artigo 70º do Código de Contratos Públicos.
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Para além da declaração expressa de aceitação do caderno de encargos que resulta do nº 1 do modelo constante do Anexo I ao Código de Contratos Públicos, tal anexo estabelece, no seu nº 2, a obrigação da declaração solene, pelo concorrente, de que “executará o referido contrato nos termos previstos nos seguintes documentos, que junta em anexo (…)”.
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Tais declarações – a que resulta do nº 1 daquele anexo e respeitante à declaração de aceitação do caderno de encargos, por um lado, e a que resulta do seu nº 2, relativa ao compromisso de executar o contrato de acordo com os documentos que integram a proposta, por outro – revestem idêntica força vinculativa no seio daquele documento, que contém declarações formais e solenes quanto ao modo como o concorrente se dispõe a contratar.
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Ao elencar, no nº 2 da declaração a que se refere o artigo 57º, nº 1, alínea a) do Código de Contratos Públicos (alínea F) do probatório), os documentos que constituem a...
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