Acórdão nº 585/07.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO O I... – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP (doravante I... ou Recorrente) veio apresentar recurso da sentença proferida a 14.05.2012, no Tribunal Tributário de Lisboa (TTL), na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por A...& ...A, SL – sucursal em Portugal (doravante Recorrida), que teve por objeto as liquidações de taxa de comercialização de produtos de saúde, relativas aos anos de 2000, 2001, 2002, 2003 e 2004, no valor global de 1.679.871,32 Eur.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, o Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “1.ª O tribunal "a quo" considerou-se competente para conhecer da presente impugnação e não considerou competente o tribunal do domicílio da sociedade impugnante, por entender que o I... é um serviço periférico local, por cobrar um tributo parafiscal, regendo o disposto no n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, e o n.º 1 do artigo 12.º do CPPT

  1. Tal decisão é desconforme com o direito positivo nesta matéria, bem como é contrária ao princípio que norteia a atribuição de competências no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal e à jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo

  2. Desde logo, a situação dos autos não se enquadra na previsão do n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, porque, ao contrário do que se entendeu na sentença recorrida, para o preenchimento da previsão desta norma, o facto relevante não é a natureza do tributo, porque a mesma se aplica a todos os tributos, incluindo os parafiscais, mas sim o facto de a entidade que administra o tributo não ser nenhuma das previstas nos n.ºs 1 e 3 do mesmo artigo e de essa entidade dispor de órgãos territorialmente competentes

  3. Se a entidade que administra o tributo dispuser de serviços desconcentrados, esses órgãos desconcentrados são, pelo n.º 4 do mesmo artigo 6.º, considerados órgãos periféricos locais; se não dispuser, o preceito não se aplica

  4. O I... não dispõe de órgãos territorialmente competentes para a liquidação e cobrança dos tributos, sendo esta actividade efectuada a nível central na sua sede

  5. Pelo que, também ao contrário do defendido na douta sentença recorrida, o I... é considerado um dos "outros serviços" (por oposição aos previstos no n.º 1 do artigo 12.º do CPPT), pelo que lhe é aplicável o n.º 2 do mesmo artigo 12.º do CPPT

  6. A douta decisão recorrida é ainda desconforme com a jurisprudência constante do Supremo Tribunal Administrativo, designadamente com o Acórdão proferido em 24 de Setembro de 2008 no Processo n.º 068/08 e com o Acórdão proferido em 2 de Fevereiro de 2003 no Processo n.º 01782/02

  7. A douta sentença recorrida é igualmente desconforme com o princípio subjacente à atribuição de competência territorial na jurisdição administrativa e fiscal, segundo o qual é competente o tribunal da residência habitual ou sede do particular/autor, salvo no caso de órgãos com competência territorial limitada, em que é competente o tribunal da sede do órgão, o qual visa assegurar uma distribuição equilibrada dos processos judiciais pelo território nacional

  8. Pelo que, também à luz deste princípio, a douta decisão recorrida andou mal, violando os já referidos preceitos legais - n.º 4 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, e com o n.º 2 do artigo 12.º do CPPT - bem como os artigos 103.º, n.º 1, e 17.º, nºs 1 e 2, a), na medida em que a excepção da incompetência relativa em razão do território foi tempestivamente arguida, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que considere competente o foro da sede da sociedade Impugnante, que é o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra

  9. Decorre da questão da incompetência relativa supra suscitada que o tribunal recorrido tomou conhecimento do mérito de uma causa para a qual não dispunha de competência em razão do território, conhecendo de questões de que não podia conhecer, porque para o efeito não dispunha de competência

  10. Assim, a douta sentença recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do Código do Procedimento e Processo Tributário, facto que para os devidos efeitos aqui se invoca

  11. Além disso, a douta sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia, por não se ter pronunciado, como devia, sobre matéria de facto relevante para a boa decisão da causa, violando, assim, o n.º 1 do artigo 125.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, bem como o n.º 2 do artigo 660.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 2.º daquele Código

  12. Com efeito, a douta sentença recorrida não considerou provados os factos constantes da decisão quanto à reclamação graciosa - transcritos no ponto 86, desta peça – apesar de os mesmos constarem do processo administrativo tributário e ser serem factos notórios, bem como apesar de os mesmos relevarem para a boa decisão da causa

  13. A douta sentença recorrida enferma de insuficiência, quanto à decisão sobre a matéria de facto, por não considerar provados factos relevantes para a boa decisão da causa - os referidos na conclusão anterior - violando, deste modo, a alínea a) do n.º 2 do artigo 46.º da Lei Geral Tributária, os artigos 514.º e 535.º e o n.º 3 do artigo 659.º do Código de Processo Civil, o n.º 2 do artigo 123.º do Código de Procedimento e Processo Tributário; deve, por isso, tal decisão ser revista, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 712.º do Código de Processo Civil, ou anulada e ordenada a baixa do processo à primeira instância, nos termos do n.º 4 do mesmo preceito

  14. A douta sentença recorrida fez errada aplicação do direito, no que se refere à questão da caducidade do direito de liquidação, porque não considerou as causas de suspensão do prazo legal de caducidade

  15. A douta sentença recorrida considerou erradamente as hipóteses de suspensão do prazo de caducidade que já lhe haviam sido invocadas na decisão da reclamação graciosa, quando devia ter considerado ter ocorrido essa suspensão e julgado totalmente improcedente a impugnação judicial da liquidação efectuada, pelo que violou, assim, o preceituado nas alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo 46.º da Lei Geral Tributária

  16. Com efeito, a mesma sentença fez uma interpretação demasiado restritiva do preceituado nas alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo 46.º da Lei Geral Tributária, em termos que colidem com o princípio da legalidade tributária, na medida em que os referidos preceitos não exigem que esteja em causa uma reclamação graciosa ou uma impugnação judicial - as quais poderiam ser interpretadas como dizendo apenas respeito ao litígio em causa - antes tendo optado por uma redacção aberta que permite abarcar qualquer tipo de reclamação ou impugnação, sejam elas procedimentais ou judiciais ou extraprocedimentais ou extrajudiciais

  17. O tribunal recorrido deveria, por isso, ter considerado improcedente a alegada caducidade do direito de liquidação e julgado válidos os actos de liquidação de tributos e juros compensatórios referentes ao período de Abril de 2000 a Novembro de 2001

  18. Ao decidir diferentemente, o tribunal recorrido violou o n.º 1 do artigo 125.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, bem como o n.º 2 do artigo 660.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 2.º daquele Código; a alínea a) do n.º 2 do artigo 46.º da Lei Geral Tributária, os artigos 514.º e 535.º e o n.º 3 do artigo 659.º do Código de Processo Civil, o n.º 2 do artigo 123.º do Código de Procedimento e Processo Tributário; e as alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo 46.º da Lei Geral Tributária e os mencionados princípios (artigos 267.º, n.º 1, da Constituição, 10.º do Código do Procedimento Administrativo, e 59.º e 60.º da Lei Geral Tributária), 20.ª Por último, a douta sentença recorrida considerou que os actos tributários impugnados enfermam de falta de audição prévia, quando a mesma, pelo facto de esses actos terem assentado, sem alterações da iniciativa do I..., em elementos contabilísticos fornecidos pela Impugnante, devidamente certificados pelo respectivo técnico oficial de contas, estava dispensada, nos termos do artigo 60.º da Lei Geral Tributária

  19. Ainda que se entendesse que esta dispensa não ocorre, teria de considerar-se que se está perante uma formalidade que se degrada em não essencial, visto que apenas está em causa a prática de um acto essencialmente vinculado, que consiste a aplicação de uma taxa a certo volume de vendas resultante de documentos fornecidos pela própria Impugnante, 22.ª Estes elementos constam de documentos fiscalmente relevantes que a Impugnante não poderia alterar ou que, no máximo, só poderia rectificar mediante a adopção dos procedimentos estabelecidos na lei, não existindo qualquer indício de que, promovida a audição, o tributo liquidado seria diferente

  20. Além disso, a Impugnante não questiona sequer o valor do tributo liquidado nem a sentença recorrida demonstra que a decisão poderia ter sido diferente no que respeita ao quantum do tributo, se tivesse sido promovida essa audição

  21. A sentença recorrida reconhece que, embora a Impugnante se tenha oposto a alguma factualidade, não teve razão nessa invocação, donde flui que, quanto a este aspecto factual, a audição prévia nenhuma utilidade teria

  22. No entanto, a mesma sentença afirma que a Impugnante alegou com sucesso a questão da irretroactividade da lei fiscal no que respeita às liquidações referentes aos meses de Janeiro a Março de 2000 e a caducidade do direito de liquidação no que respeita às liquidações dos meses de Abril de 2000 a Novembro de 2001

  23. Sucede que este facto não demonstra só por si a utilidade da audição prévia, segundo um juízo de prognose, porque a factualidade considerada assente pela douta sentença recorrida (alíneas R. e S. dos factos assentes) desmente cabalmente esse juízo de prognose, porque a Impugnante invocou essas duas questões...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT