Acórdão nº 2143/05.5BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão l – RELATÓRIO O Digno Representante da Fazenda Pública interpôs recurso dirigido a este Tribunal tendo por objeto a sentença proferida pela Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 29 de abril de 2013, exarada a fls. 661 a 698 do presente processo, através da qual julgou procedente a impugnação judicial deduzida por “M... - C... & C... IHolding GmbH” do indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada contra o ato de retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), do exercício de 2002, no montante global de €2.651.737,37, efetuada em virtude da colocação à disposição dos dividendos que auferiu da sua participação na sociedade comercial anónima “M... - C... & C... Portugal, S.A, Portugal”, a qual foi elaborada na sequência da prolação do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 12 de março de 2013, no âmbito do processo nº 06330/13 que decidiu: “[e]ncontrar-se o julgamento da matéria de facto inscrito na sentença, inquinado por défice instrutório, determinando, por isso, a baixa dos “autos à 1ª instância para a realização das diligências tendentes a apurar se os rendimentos estão ou não sujeitos a imposto na Alemanha e, em caso positivo, se o imposto pago em Portugal pode ser recuperado através de dedução no imposto devido na Alemanha, sendo de notar que o elemento junto com as presentes alegações não é suficiente para o efeito, nomeadamente com referência à primeira questão descrita, além de que a sua consideração depende ainda do exercício do competente contraditório”.

*** A Recorrente, a fls. 719 a 760 dos autos, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “I - O douto tribunal a quo considerou na sentença, aqui em apreço, que por força do regime que lhe foi aplicado a ora Impugnante foi objeto de um tratamento menos favorável tão só pelo facto de não ser residente em Portugal, não se vislumbrando qualquer diferença objetiva entre a Impugnante e uma sociedade mãe residente ou a ocorrência de qualquer "razão imperiosa de interesse geral" no sentido que lhe é dado pela supracitada jurisprudência do TJ que justifique tal tratamento à luz do Tratado, concluindo que as liquidações de imposto impugnadas padecem de vício de violação de lei, consubstanciado na violação dos princípios da livre circulação de capitais previsto no art.56° TCE (remunerado 63° TFUE) e da liberdade de estabelecimento previsto nos artigos 43°, 46° e 48° do TCE (renumerados 49°, 52° e 54° no TFUE), e consequentemente do artigo 8°, n°4 da CRP, em conformidade com o disposto no artigo 135° do CPA, pelo que devem ser anuladas e a Administração tributária condenada a devolver o imposto indevidamente retido (cf. art.100°, da LGT).

II - Cabe-nos discordar desta decisão do tribunal "a quo", com os fundamentos que se seguem: III - A impugnante, M… C… & C… International Holding GMBH, veio deduzir impugnação judicial, contra o acto de retenção na fonte, no montante total de € 2.651.737,37, que incidiu sobre lucros colocados à disposição pela M... - C... & C... Portugal, SA.

IV - A impugnante alega, em síntese, que o regime fiscal consagrado nos artigos 14°, n°3 e 89°, por um lado, e nos artigos 46°, n°1 e 90°, n°1, alínea c), todos do CIRC na redação à data da distribuição e tributação dos dividendos em causa (exercício de 2002) comporta uma discriminação negativa em função da (não) residência motivo pelo qual contraria o direito de estabelecimento consagrado no (então) Tratado da União Europeia e a proibição de discriminação em matéria fiscal que resulta do mesmo e da jurisprudência do Tribunal de Justiça, do Tribunal de Justiça da União Europeia, assim como a própria Diretiva 90/435/CEE, concretamente no seu artigo 3°, n°2, pois a possibilidade que dali resulta para os Estados Membros de exigirem a detenção da participação social pelo período de dois anos ininterruptos tem de ser interpretada de acordo com os direitos fundamentais decorrentes dos princípios de direito comunitário, não podendo servir de justificação para uma discriminação em função da nacionalidade proibida pelo Tratado.

V - A impugnante é uma sociedade não residente para efeitos de tributação em Portugal e, nos termos do art.°4° n°2 do CIRC, só estão sujeitos a IRC quanto aos rendimentos obtidos em território português, não podem estar em causa a tributação ou não pelo lucro real, porque será apenas apurado no Estado da sua residência e de acordo com as regras contabilísticas e fiscais aí definidas.

VI - Por outro lado, a Constituição da República Portuguesa, consagra um regime de recepção automática das normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas (cfr. Ac. STA de 08/07/2009, proc. n°0382/09, in http: / /www. dgsi.pt /).

VII- Por força da cláusula de recepção automática do direito internacional, consagrada no art°8° nº2 da CRP e do art.°1° nº1 da LGT, uma norma de direito comunitário com efeito directo prevalece sempre sobre uma norma de Direito nacional, tendo como efeito tornar inaplicáveis de pleno direito as normas de direito interno que lhe sejam contrárias.

VIII - Assim sendo, relativamente aos lucros distribuídos por sociedade residentes em Portugal a não residentes, importa ter presente o regime constante da Directiva nº 90/435/CEE, transposto para a ordem jurídica portuguesa pelo Dec-Lei 123/92, de 2 de Julho, relativo ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mães e sociedades afiliadas de Estados membros diferentes.

IX - Em 15/07/1980, foi assinada a Convenção entre Portugal e Alemanha para Evitar a Dupla Tributação, aprovada pela Lei n°12/82, de 3 de Junho.

X - O n°1 e 2 do artigo 10° da Convenção celebrada entre a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e sobre o Capital, aprovada para ratificação pela Lei n°12/82, de 3 de Junho, preceituam «1 - Os dividendos pagos por uma sociedade residente de um Estado contratante a um residente do outro Estado contratante podem ser tributados nesse outro Estado.

2- Esses dividendos podem, no entanto, ser igualmente tributados no Estado contratante de que é residente a sociedade que paga os dividendos e de acordo com a legislação desse Estado, mas se a pessoa que recebe os dividendos for o seu beneficiário efectivo, o imposto assim estabelecido não excederá 15% do montante bruto desses dividendos.

As autoridades competentes dos Estados contratantes estabelecerão, de comum acordo, a forma de aplicar este limite.

Este número não afecta a tributação da sociedade pelos lucros dos quais os dividendos são pagos.» XI - A impugnante auferiu dividendos colocados à disposição, em 16/07/2002, por um sujeitos passivo residente em território nacional, a M... - C... & C... Portugal, SA.

XII - Estes dividendos colocados à disposição pelo sujeito passivo residente, M... - C... & C... Portugal, S.A., foram sujeitos a tributação em sede de IRC, por retenção na fonte a título definitivo, à taxa reduzida de 15% ao abrigo da CDT, celebrada entre Portugal e a Alemanha, (cfr. artigos 2°, n°1, alínea c), 3°, n°1, alínea d), 4°, n°2 e 88°, n°s 1, alínea c), 3, alínea b) e 5, todos do CIRC).

XIII - Na data da colocação dos dividendos à disposição da impugnante não estava cumprido o período de dois anos exigido para aplicação da Directiva n°90/435/CEE, ou seja, um dos requisitos para dispensa de retenção na fonte sobre a distribuição de dividendos feita pela sociedade residente à impugnante, nem tal período se veio a completar -posteriormente, visto que a impugnante procedeu à alienação da sua participação em data anterior a ser ter completado o período de dois anos, para efeitos de eventual reembolso (cfr. alínea k) do probatório e artigo 89°, n°2 do CIRC).

XIV - Contudo, alega a impugnante, se tanto a sociedade-mãe como a sociedade afiliada fossem residentes em Portugal, o regime a aplicar seria diferente, encontrando-se a impugnante isenta da tributação e dispensada de retenção na fonte, uma vez que, à data da colocação dos dividendos à disposição - 16/07/2002, detinha 100% do capital social da M... - C... & C... Portugal, SA., desde 01/01/2001, qualificando-se para a aplicação do regime conjugado dos artigos 46° e 90° do CIRC.

XV - Com efeito o artigo 46°, n°1 do CIRC, na redacção dada pela Lei n°109-B/2001, de 27 de Dezembro, dispõe que são deduzidos ao imposto da sociedade-mãe os lucros distribuídos por afiliadas, desde que a sua participação no capital social destas seja de, pelo menos, 10%, e que tenha permanecido na sua titularidade durante o ano anterior à data da colocação ã disposição dos dividendos XVI - Por sua vez, o artigo 90°, n°1, alínea c) do CIRC estatui que não existe obrigação de efectuar retenção na fonte de IRC nos lucros distribuídos a entidades a que seja aplicável o regime do artigo 46°, desde que a participação financeira tenha permanecido na titularidade da mesma entidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição.

XVII - Assim, se a impugnante fosse uma sociedade residente em Portugal, ser-lhe-ia aplicável a dispensa de retenção prevista na alínea c), do n°1, do artigo 90° do CIRC, uma vez que preenche os requisitos exigidos pelo artigo 46°, n°1 do CIRC, pelo que poderia deduzir integralmente os dividendos distribuídos no apuramento do seu lucro tributável.

XVIII - No entanto, o artigo 58°, n°1, alínea a) do Tratado CEE prevê que os Estados-membros possam estabelecer uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que respeita ao lugar de residência (vide neste sentido douto Ac. do S.T.A. de 29/02/2012, processo n° 01017/11, in http://www.dgsi.pt/).

XIX - Por outro lado, é inequívoco que a retenção na fonte efectuada à impugnante respeita a Convenção celebrada entre a República Portuguesa e a República Federal da Alemanha para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos...

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