Acórdão nº 243/17.8BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo, do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório ALMARGEM – Associação de Defesa do Património Cultural e Ambiental do Algarve, SCIAENA – Associação de Ciências Marinhas e Cooperação e QUERCUS – Grupo para Recuperação da Floresta e Fauna Autóctone requereram providência cautelar de suspensão de eficácia do título de utilização privativa do espaço marítimo nacional (TUPEM) e a intimação das contrainteressadas a não prosseguir com quaisquer trabalhos, sejam eles preparatórios da prospeção ou de execução da mesma, contra a Direcção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos e o Ministério do Mar, indicando como contrainteressadas a ……………………. (......), e a …………………………, SA (.............).

A 12.8.2018 foi proferida sentença que deferiu o processo cautelar e, em consequência, (i) suspendeu a eficácia do ato de emissão do TUPEM e (ii) intimou as contrainteressadas a não prosseguirem com quaisquer trabalhos, sejam eles preparatórios da prospeção ou da execução da mesma.

Inconformados, os requeridos interpuseram recurso para este TCA Sul.

O Ministério do Mar apresentou alegações com as seguintes conclusões: «A – A discussão pública não enferma de qualquer vício, não tendo a mesma sido efetuada nos termos da Diretiva 2013/13/EU ou do Decreto-Lei n.º 38/2015, de 12 de março, uma vez que este procedimento apenas é obrigatório para concessões efetuadas após 18 de julho de 2013. A área em causa foi concessionada em 2007.

B – A posição do ICNF não foi tida em conta numa primeira fase, porque apresentada extemporaneamente, pelo que não poderia ser alvo de discussão pública.

C - No entanto as observações do ICNF foram incorporadas na decisão final de emissão do TUPEM por parte da DGRM, tendo para tal sido exigido, como condição de eficácia a apresentação e validação dos programas de “Monitorização da Ocorrência de Cetáceos” e de “Monitorização de Ecossistemas Marinhos Vulneráveis”.

D – Não se verificando, portanto o vício de fumus boni iuris, critério de decisão para a adoção de providência cautelar, conforme previsto no n.º 1 do artigo 120.º in fine do CPTA Ainda que assim não se entenda, mas não claudicando, E) Não é suficiente para preencher o conceito de periculum in mora, igualmente previsto no mesmo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA a conclusão que uma determinada atuação pode, ou tem a potencialidade de, vir a criar um dano; este tem de ser efetivo, quantificável e dificilmente reparável.

F) Não ficou provada a correlação entre o furo e possíveis futuros danos irreversíveis, não se encontrando, também por isso, preenchido o pressuposto de periculum in mora.

Nestes termos, deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a sentença em recurso, com as legais consequências».

Também as contrainteressadas ………………….. (......) e ……………………., SA recorreram da sentença, concluindo as alegações nos termos que seguem: 1.ª A sentença recorrida errou ao dar como provados os pretensos “factos” constantes das alíneas JJJ), KKK), LLL) e MMM) da Fundamentação de facto da sentença, os quais foram incorretamente julgados; 2.ª No que se refere ao “facto” da alínea JJJ), apesar da sua natureza eminentemente vaga, genérica e conclusiva, o depoimento da testemunha Manuel …………. (cfr. passagens da gravação 03:48 em diante do dia 01/08/2018), conjugado com os depoimentos das testemunhas António ………………. (cfr. passagens da gravação 02:13 em diante do dia 09/07/2018), André…………….. (cfr. passagens da gravação 01:15 em diante do dia 09/07/2018), Pedro………….. (cfr. passagens da gravação 03:34 em diante do dia 09/07/2018), Michele………… (cfr. passagens da gravação 04:42 em diante do dia 09/07/2018) e António…………… (cfr. passagens da gravação min28:35 em diante do dia 01/08/2018) e, bem assim, o teor do Doc. 1 junto com o requerimento das Contrainteressadas de 05/06/2018 (cfr. alínea HHH) dos factos provados) impunham decisão diversa, justamente no sentido de considerar aquele “facto” como não provado; 3.ª Já no que respeita ao “facto” da alínea KKK), apesar da sua natureza eminentemente vaga, genérica e conclusiva, os depoimentos da testemunha Luís…………. (cfr. passagens da gravação 01:58 em diante do dia 01/08/2018) e da testemunha Manuel……… (cfr. passagens da gravação 03:46 em diante do dia 01/08/2018), conjugados com os depoimentos das testemunhas Pedro……….. (cfr. passagens da gravação 03:41 em diante do dia 09/07/2018), Michele………… (cfr. passagens da gravação 05:05 em diante do dia 09/07/2018) e António………… (cfr. passagens da gravação min37:18 em diante do dia 01/08/2018), e, bem assim, o teor do Doc. 1 junto com o requerimento das Contrainteressadas de 05/06/2018 (cfr. alínea HHH) dos factos provados) impunham decisão diversa, justamente no sentido de considerar aquele facto como não provado; 4.ª No que alude ao “facto” da alínea LLL), apesar de se tratar de facto não alegado, e, por isso, processualmente irrelevante, o depoimento da testemunha Joana………… (cfr. passagens da gravação 01:17 em diante do dia 01/08/2018), que foi o único que abordou tal temática, mostra-se manifestamente insuficiente, quer pela sua reconhecida parcialidade, quer porque a reduzida dimensão da área abrangida pelo TUPEM, impede, em termos de juízo de experiência comum, que se tenha como provado: i) que seria, justamente, naquela área que as aves migratórias iriam fazer períodos de descanso ii) que a atividade permitida obrigue as mesmas a fazer muitos mais Kms e iii) que tal tenha por consequência direta e imediata o cansaço extremo das referidas aves; 5.ª Por fim, no que se refere ao “facto” da alínea MMM), o Tribunal errou manifestamente ao dá-lo como provado, porquanto, além de não ter sido alegado nos termos em que é apresentado na sentença, os depoimentos prestados pelas parciais testemunhas das Requerentes assentam em opiniões pessoais, sem qualquer rigor científico ou técnico, pautadas pela militância associativa anti- petróleo, já que inexistem, de facto, quaisquer dados minimamente credíveis do ponto de vista científico que sustentem qualquer risco ou perigo relacionado com a atividade sísmica que possa ser associado à operação de prospeção consentida pelo TUPEM (cfr. passagens da gravação 01:57 em diante do dia 01/08/2018); 6.ª A primeira premissa em que assenta o juízo do Tribunal “a quo” sobre o periculum in mora – a de que “a existirem alguns dos prejuízos invocados, nomeadamente, nos cetáceos e fauna marinha (…) os mesmos serão, perfunctória e sumariamente, irreparáveis” – padece de diversos vícios; 7.ª Desde logo porque em face da prova documental e testemunhal produzida pela Entidade Demandada e Contrainteressadas e da que foi apresentada pelos Requerentes, não ficou demonstrado que a operação em causa seja suscetível de provocar danos efetivos no ambiente e na fauna marinha, sendo errada a convicção formada pelo Tribunal, mesmo que construída numa base totalmente hipotética (a de que a operação em causa “pode” produzir certo tipo de danos – cfr. alíneas JJJ) a LLL) da “Fundamentação de facto”); 8.ª Mesmo que assim não fosse, a verdade é que nessas alíneas, o Tribunal “a quo” se limita a afirmar que a realização da sondagem “pode” produzir danos em espécies marinhas – designadamente cetáceos – sem nunca concretizar, minimamente, qual a medida dessa “probabilidade”; 9.ª Ora, como decorre da doutrina e da jurisprudência administrativa, uma providência cautelar não pode ser decretada com base na invocação de um risco potencial, não qualificado como certo ou minimamente sério, da ocorrência de uma situação de facto consumado ou de um prejuízo de difícil reparação; esse decretamento tem sempre de se basear – mesmo quando estejam em causa danos ambientais, que estão sujeitos à mesma ponderação normativamente imposta – na formulação de um juízo de prognose sobre o grau de probabilidade da ocorrência do evento danoso que revele uma suficiente consistência dessa probabilidade; 10.ª Assim, ao considerar que um prejuízo meramente hipotético e eventual – que foi o dado como provado, ainda que erradamente, nas alíneas JJJ), LLL) e KKK) da motivação de facto da sentença – é suficiente para justificar o decretamento da providência cautelar, o Tribunal “a quo” incorreu num manifesto erro de julgamento, na medida em que, nos termos do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, uma providência cautelar só pode ser decretada perante uma situação de risco efetiva e não uma mera conjetura, de verificação eventual; 11.ª Por fim, ainda em relação à primeira premissa, o Tribunal “a quo” erra ao considerar que os prejuízos invocados “nos cetáceos e fauna marinha”, “a existirem”, “serão, perfunctória e sumariamente, irreparáveis”, uma vez que inexiste qualquer facto (ou suporte probatório) que permita concluir pela irreparabilidade (isto é, pela insuscetibilidade de reversão) dos danos “eventualmente” decorrentes da execução da sondagem; 12.ª Também na formulação da segunda premissa em que assenta o juízo do Tribunal a propósito do periculum in mora – a de que “não ficou demonstrado que os prejuízos invocados, principalmente, ao nível do ruído provocado pela operação, nomeadamente, nos cetáceos que possam aparecer na zona onde se pretende o furo de prospeção, sejam mitigados pelas medidas previstas executar pelas Contrainteressadas, como é exemplo, o Programa de Monitorização” – a decisão recorrida padece de um manifesto erro de julgamento, por violação do princípio da separação de poderes e dos limites funcionais de intervenção dos tribunais, impostos pelo artigo 3.º, n.º 1 do CPTA; 13.ª Com efeito, a questão dos efeitos decorrentes do ruído produzido pela sondagem para os cetáceos (e da possibilidade de mitigação desse ruído) foi analisada no parecer sobre a sujeição a avaliação de impacte ambiental do “projeto de sondagem de pesquisa Santola 1X”, emitido pela APA, tendo esta Agência concluído que a “implementação das medidas previstas no «Plano de Monitorização da Ocorrência de Cetáceos» permite...

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