Acórdão nº 00156/10.4BECBR-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução14 de Setembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório MCMVGM e JCAM, contrainteressados na presente Ação, devidamente identificados nos autos, intentada pelo Ministério Público contra o Município da Figueira da Foz, não se conformando com o Despacho Saneador proferido em 14 de janeiro de 2018, mormente em virtude de no mesmo terem sido julgadas improcedentes as suscitadas exceções de inimpugnabilidade, de intempestividade e/ou caducidade do direito de Ação, vieram interpor Recurso no qual, a final, concluíram: “1) Liminarmente, parece-nos claro que, ao contrário do que, em erro de julgamento, foi decidido, a questão nada tem a ver com a forma como o A. configura a ação, como seria no caso da exceção de ilegitimidade ou de incompetência, nem o mérito está aqui em causa ou o julgamento convoca assim a apreciação de uma questão desta natureza — trata-se de uma exceção perentória, cujo conhecimento pleno pode e deve ser feito no despacho saneador nos termos do estatuído no art. 595.°, n.º 1, al. b) do CPC e arts. 87.°, n° 1, al. a) e 89.°, n.º 1, al. h) do CPTA e que, aliás e ao contrário daquelas outras exceções, até determina a absolvição do pedido (cfr. Ac. STA de 22/05/2013, no proc. 0340/13).

2) A interpretação seguida pelo Tribunal a quo e pelo Ministério Público, ao julgarem que o prazo de caducidade de interposição da ação se conta a partir do momento em que esta caducidade foi legalmente prevista e não do momento em que a deliberação foi tomada ou da data em que os factos foram participados, 3) não se refere a um só momento de materialidade, resultando singelamente de um jogo formal de interpretação da lei - no caso do estatuído no art. 69.°, n.º 4 do RJUE - que, aliás não tem nessa lei geral, que serve de suporte a tal interpretação, no art. 12.° e no art. 297.° do CC, sequer previsão expressa; 4) A interpretação seguida pelo Tribunal recorrido e pelo Ministério Público, eminentemente vista numa lógica em que os interesses privados são modelados pela nova lei, não pondera as razões de aplicação imediata das soluções legais que o Estado implementa, naturalmente com fundamento no interesse público que está na base de qualquer norma de direito administrativo, soluções essas cujo único limite é a Constituição da República, a qual não se vê minimamente, ou pode racionalmente ver-se, minimamente ofendida, quanto mais porque a interpretação que se sustenta defende aqueles interesses privados - o Ministério público age aqui num prazo alargado e só, mas apenas só, para defender o interesse público que, quanto mais proporcionalmente, não se vislumbra afrontado; 5) A interpretação recorrida, ao contrário da nossa, não convoca sequer um só princípio jurídico, mormente de direito administrativo ou de direito público, que a suporte; 6) A interpretação seguida pelo Tribunal a quo e pelo Ministério Público afronta a principiologia que mais protege qualquer cidadão que viva num Estado-de-Direito democrático, mormente os valores fundamentais da segurança, da confiança, e da boa-fé (cfr. arts. 2.°, 18.° e 266.°, n.º 2 da CRP), ao permitir que cidadãos que tenham adquirido parcelas em resultado de um loteamento, ao terem investido nessa confiança ao ponto de nesses bens, nesses lotes, que julgaram constituídos e lícitos, terem edificado as suas (e de suas famílias) casas de habitação - o maior esforço financeiro que qualquer cidadão faz na sua vida.

7) A interpretação seguida pelo Tribunal a quo e pelo Ministério Público desconsidera a principiologia, já referida, que está na base do estatuído, hoje, no art. 162.°, n.º 3 do CPA e antes no art. 134.° da lei procedimental portuguesa, ao conferirem, estes normativos, como o preceito interpretando, efeitos a situações de facto duradouras, consolidadas, erguidas em boa-fé e em confiança nas atuações do Estado, como é o caso.

8) O próprio Estado, através das CCDR, sustenta, como está provado nos autos, a interpretação que levamos a efeito, tendo aliás este, a bem da coletividade, definido um único limite à caducidade - "exceto relativamente a monumentos nacionais e respetiva zona de proteção".

9) A interpretação seguida no despacho recorrido, como se vê, em erro de julgamento e em afronta ao estatuído no art. 69.°, n.º 4 do RJUE, arts. 12.° e 297.° do CC, e arts. 2.°, 18.° e 266.°, n.º 2 da Constituição da República, invalida materialmente e em ilegalidade agravada o normativo de que cuidamos (e ou é inconstitucional a interpretação que o despacho recorrido sustenta desse mesmo normativo); 10) Sendo aliás que, na dúvida, mais do que legítima — porque não existe excerto literal que sustente a interpretação feita pelo Tribunal a quo e porque, ao invés, existem boas e sólidas razões principiológicas para sustentar o inverso -, devia ter sido objeto de uma interpretação em conformidade com a Constituição da República, e, assim, no sentido de que o prazo de caducidade para o Ministério Público interpor a ação sempre deveria ter o seu dies a quo contado do...

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