Acórdão nº 1168/17.2 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 17 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução17 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Processo nº 1168/17.2 BELRS Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul * Vem a Fazenda Pública, ao abrigo do disposto no artigo 652º, nº2 do CPC, reclamar para a conferência da decisão da Relatora, de 19/11/18, proferida no âmbito do recurso jurisdicional interposto por A……..

, contra a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em processo de reclamação apresentada nos termos do artigo 276º do CPPT.

A decisão ora reclamada determinou, em síntese, a revogação da sentença recorrida, ordenando a baixa dos autos aos competentes Serviços da ATA, a fim de aí passarem a ser tramitados (e decididos), se a nada mais obstar, como pedido de anulação de venda.

A Reclamante, Fazenda Pública, formulou as seguintes conclusões: I.

Como facilmente se pode constatar pelo exposto em A), o processado já vai longo, com múltiplos incidentes processuais de natureza muito diversa, incluindo intervenções de três tribunais diferentes.

II.

Pelo que a presente decisão de inutilizar todo o processado e fazer retornar a apreciação da questão aqui em causa ao órgão de execução fiscal como se de uma nova reclamação se tratasse, encerra uma radicalidade evidente que merece, na nossa opinião, ser reavaliada pelo colectivo de juízes.

III.

Acresce que as consequências que uma decisão deste género acarreta no âmbito de um processo urgente como o presente, uma reclamação de acto do órgão de execução fiscal interposta ao abrigo do artigo 276.º do CPPT, têm uma relevância especial pela demora que certamente vai provocar.

IV.

Na nossa opinião, parece-nos ter ficado perfeitamente estabelecido que a causa de pedir é a nulidade da citação da Reclamante no processo de execução fiscal e o pedido é a anulação de todo o processado na execução fiscal posterior a esse acto como consequência legal normal dessa situação, uma vez verificada.

V.

Evidentemente que, se assim fosse entendido, a venda do imóvel, como todos os outros actos subsequentes à citação declarada nula, teriam de desaparecer da ordem jurídica.

VI.

Mas foi esta efectivamente a posição da Reclamante, consecutivamente renovada ao longo de todo o processado, que nunca, em nenhuma das múltiplas ocasiões que teve para o fazer ao longo da marcha do presente processo, pediu a anulação da venda, nem invocou o artigo 257.º do CPPT onde esse procedimento está previsto.

VII.

Basta conferir o que já se apontou nos pontos 8, 11, 18, 20, 22, 23, 24, 25 e 26.

VIII.

Incluindo nas conclusões apresentadas no presente recurso, em que não há qualquer referência a um eventual pedido de anulação da venda, nem é citada qualquer norma que o regule, o que, como se sabe, tem o efeito processual de também delimitar objectivamente o âmbito do próprio recurso (cfr. artigos 635.° n° 4, 637.° n° 2 e 639.° n°s 1 e 2 do C.P.C.) IX.

Lembramos que a Fazenda Pública nem sequer apresentou contra-alegações uma vez que se conformou perfeitamente com a decisão da primeira instancia e que, no nosso entendimento, a Reclamante se limitou a renovar a sua posição já anteriormente conhecida o que tornou desnecessária qualquer intervenção.

X.

Assim sendo, parece-nos, ter-se-á de concluir que a presente decisão constitui um excesso de pronúncia uma vez que nunca foi pedida qualquer anulação de venda, incluindo nas conclusões do recurso apresentado, pelo que o decidido não se inclui no objecto do presente processo, nem, especificamente, na apreciação do presente recurso.

XI.

Sendo certo que à Reclamante cabe o direito de pedir o que entender, de definir a sua estratégia processual da forma que considere adequada, e, por consequência, circunscrever o thema decidedum da causa.

XII.

E embora os tribunais tributários tenham poderes de uma natureza mais inquisitória que a jurisdição cível, salvo melhor opinião, estes limitam-se à busca da verdade “dos factos que lhes seja lícito conhecer” (artigo 13, n.º 1 do CPPT) e não abrange o próprio pedido.

XIII.

E, pensamos, o Tribunal não pode suprir o que considera eventuais deficiências no pedido pelas partes, sendo certo que já foi por iniciativa do Tribunal da primeira instância que se abriu a possibilidade que conduziu ao aperfeiçoamento da petição inicial nos presentes autos (cfr. ponto 13).

XIV.

Muito menos, como foi aqui o caso, numa fase muito adiantada em que se encontra o presente processo, já em sede de apreciação de tribunal superior e completamente ao arrepio da vontade da própria parte.

XV.

Por isso, pensamos, foi claramente posto em causa o princípio do dispositivo das partes e da estabilidade da instância (artigo 260.º do CPC).

XVI.

E dada a fase em que o pleito se encontra também põe problemas de proporcionalidade dada a extensão do processado que agora se decidiu inutilizar.

XVII.

Além disso, constitui uma autêntica surpresa uma vez que a questão nunca foi abordada nestes termos por qualquer das partes o que põe em causa o princípio do contraditório na presente decisão (cfr. artigo 3.º, n.º 3 do CPC).

XVIII.

E na medida em que inutiliza todo o processado, remetendo para a “estaca zero” o presente procedimento, a decisão põe directamente em causa o princípio do aproveitamento dos actos processuais, o princípio da economia e da o celeridade processual. Além disso, com todo o respeito, não entendemos qual o foi itinerário cognoscitivo da decisão, que afastou os sucessivos pedidos expressos pela Reclamante de declaração de nulidade da citação para uma qualificação jurídica completamente inédita no processo, um pedido de anulação de venda, ficando por conhecer o porquê dessa mudança radical do entendimento.

XX.

Pelo que, salvo melhor opinião, nos parece insuficiente a fundamentação apresentada pelo que, igualmente por esta razão, se pede o reexame da questão.

Termos pelos quais se requer que seja deferida a presente reclamação e, consequentemente, ser proferido acórdão que julgue o recurso apresentado pela Reclamante.

* Notificada a Recorrente, ora Reclamada, veio a mesma emitir pronúncia, concluindo nos termos seguintes: 1.

Tal como decorre do artigo 196.º do CPC, o erro na forma de processo é uma nulidade de conhecimento oficioso que imporá unicamente a anulação do que não puder ser aproveitado, devendo praticar-se os actos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida na lei; 2.

Cotejado o dispositivo do artigo 98.º, n.º4 do CPPT com o artigo 97.º, n.º3 da LGT, que determina que se ordenará a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei, pode extrair-se a regra de que a convolação, quando se verifique um erro na forma do processo, é obrigatória; 3.

A possibilidade de convolação da forma de processo pressupõe que todo o processo passe a seguir a tramitação adequada, sendo que os pedidos formulados no final do articulado inicial constituem um dos elementos que se deve adequar à nova forma processual a seguir; 4.

Assim e atento o princípio da economia processual, o meio processual deverá ser convolado no meio processual adequado, salvaguardando-se os interesses da Recorrente e criando uma proporcionalidade na relação jurídico tributária; 5.

Como constitui jurisprudência firmada do STA, "O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido e não pela causa de pedir, conquanto esta possa ser utilizada como elemento de interpretação daquele, quando a esse respeito existam dúvidas" (cfr. Ac. daquele alto tribunal de 28/05/2014, proc.1086/13); 6.

Revertendo aos autos a doutrina exposta, no sentido de que a adequabilidade do processo se afere pelo pedido e não pela causa de pedir ou fundamentos do pedido, analisada a petição inicial de reclamação a fls. 2 e ss. e corrigida a fls. 51 e ss. dos autos, constata-se que a Reclamante e ora Recorrente formula expressamente pedido de anulação da venda executiva: "Nos termos e nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exa., deve a presente reclamação ser considerada procedente, por provada e, em consequência, ser anulado o despacho reclamado, emitido pela Exma. Senhora Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3 e, decretada a ANULAÇÃO dos atos subsequentes que dependiam da citação prévia da ora Reclamante, nestes se incluindo a VENDA realizada no passado dia 05/05/2017, com todas as consequências legais."; 7.

Assim e tendo a Recorrente dirigido o pedido de anulação da venda directamente ao tribunal ocorre um erro no meio processual utilizado (em lugar de requerer ao órgão periférico regional da administração tributária a anulação da venda, a parte reclamou para o tribunal) - artigo 193.º do CPC ex vi do 2.º, alínea e), do CPPT e 97.º, n.º3 da LGT; 8.

Nessas situações, o juiz deve corrigir oficiosamente o erro, convolando o meio impróprio no meio processual adequado à concreta situação e mandando seguir os termos processuais adequados; 9.

A talho de foice, no estrito respeito pelo princípio do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares, onde estão em causa os direitos e interesses legítimos de todos os sujeitos de direito, deveremos observar o n.º1, do artigo 266.º da CRP, no qual se consagra que a Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos; 10.

Pelo que, existindo a possibilidade de convolação da petição da presente reclamação em requerimento de pedido de anulação de venda dirigido ao órgão ad quem, nos termos do artigo 257.º, n.º4 do CPPT, deve o mesmo ser-lhe dirigido, conforme decidiu este Tribunal; 11.

Pois sequer se encontra vedada a possibilidade de convolação da petição de reclamação apresentada em requerimento de anulação de venda, pois a petição é tempestiva para esse efeito, não havendo assim qualquer impossibilidade legal para que seja assim ordenado, nos termos do artigo 98.º, n.º4 do CPPT e 97.º, n.º3 da LG...

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