Acórdão nº 1313/12.4BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO MARCHÃO MARQUES |
Data da Resolução | 22 de Novembro de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório I ......................................, intentou contra o LABORATÓRIO NACIONAL DE ENERGIA E GEOLOGIA, I.P. (LNEG), acção administrativa especial de impugnação da decisão do Conselho Directivo do LNEG, de 10 de Abril de 2012, que o condenou numa pena de multa, quantificada em seis remunerações base diárias.
No TAF de Sintra a acção foi julgada procedente e declarada a nulidade do acto impugnado, com a condenação do Laboratório na restituição da quantia de EUR 982,10, acrescida de juros desde a data do seu pagamento.
Não se conformando, vem a Demandada e ora Recorrente interpor recurso jurisdicional para este TCAS, culminando as alegações de recurso que apresentou com as seguintes conclusões: O Recorrido contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e formulando as seguintes conclusões: 1.ª O R. LNEG – Laboratório Nacional de Energia e Geologia, I.P., aqui Recorrente, vem interpor recurso da mui douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo em 08.02.2018, a fls. …, que julgou procedente a presente ação administrativa especial de impugnação da decisão do Conselho Diretivo do LNEG, de 10.04.2012, que condenou o A., ora Recorrido, numa pena de multa quantificada em seis remunerações base diárias, declarando a nulidade desta decisão.
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Entendeu o douto Tribunal a quo que o ato impugnado violava os princípios da presunção de inocência e in dúbio pro reo, porquanto no relatório final do processo disciplinar que deu origem ao ato impugnado, a Instrutora do processo, não obstante ter concluído que não havia sido produzida prova inequívoca de que o A., ora Recorrido, havia agido sem autorização superior, deu ainda assim como provado tal facto.
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Não se conformando com tal aresto, surge o Recorrente, atento ao exposto nas suas conclusões das alegações do recurso interposto, a pugnar pela manutenção na ordem jurídica do ato impugnado, requerendo a anulação da Sentença recorrida, porquanto a mesma “valorou indevidamente a circunstância de ter existido dúvida, para a Sra. Instrutora do Processo, relativamente à existência de autorização superior para os atos praticados pelo A., ora recorrido”.
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Na ótica do Recorrente, o Tribunal a quo interpretou de forma errada o n.º 1 do art.º 5.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (EDTFP), alegadamente ferindo a Sentença de erro de julgamento, já que a dúvida relativamente à existência ou não de uma autorização do superior hierárquico não tem relevância nem os efeitos que lhe foram atribuídos pelo Tribunal a quo.
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Pese embora tal entendimento do Recorrente, é de consignar desde já que o teor da douta Sentença recorrida demonstra que o Tribunal a quo fez in casu uma correta interpretação e aplicação das normas legais ao caso dos autos no que respeita ao vício do ato impugnado que julgou existir, não merecendo, por isso, qualquer censura, em particular a apontada pelo Recorrente.
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Refere o Recorrente que o Recorrido reconheceu a censurabilidade dos atos praticados e, ainda assim, praticou-os de forma intencional, voluntária e consciente, independentemente do conhecimento superior ou da existência de autorização superior para a realização de despesa em nome do LNEG.
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Parece que o Recorrente pretende, com tal entendimento, desvalorizar a dúvida da existência de autorização superior (ainda que verbal) para realização da despesa, bastando-se com a prova da falta de cabimentação para condenar o Recorrido, quando, na própria nota de culpa que o LNEG dirigiu ao Recorrido alude expressamente que a conduta deste, ao adjudicar uma prestação de serviços a uma terceira entidade em nome do LNEG sem autorização superior e sem cabimento, violou os princípios de conduta da administração pública.
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Ora, nos termos daquela nota de culpa eram condições objetivas de punibilidade, cumulativamente e não isoladamente, a falta de autorização superior e a não cabimentação da despesa, pelo que não pode o Recorrente vir agora alegar em sede de recurso que é irrelevante a dúvida relativa a uma eventual autorização superior quanto aos factos praticados pelo Recorrido, por forma a desviar as atenções do julgador quanto à circunstância de ter dado como provado, no âmbito do processo disciplinar, que o Recorrido atuou sem autorização superior quando na realidade não foi produzida, sobre esse mesmo facto, prova inequívoca! Naturalmente, a condenação do Recorrido pela prática de uma infração disciplinar com base nesse facto carecido de prova, implicou uma flagrante violação do princípio da presunção da inocência e do in dúbio pro reo, conforme, de resto, assim bem decidiu a douta Sentença recorrida e que não merece qualquer reparo.
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Na verdade, ditam as regras da prova em processo penal e disciplinar que, no caso de alguma incerteza em matéria probatória, como aconteceu no processo disciplinar dos autos, deve funcionar o princípio in dubio pro reo, atuando a prova em sentido favorável o arguido.
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No caso concreto, resulta cabalmente dos autos a existência de contradições entre depoimentos e entre estes e os documentos juntos aos processos sobre se houve ou não acordo, pelo menos verbal, entre o Dr. H................................ (superior hierárquico do Recorrido) e o Recorrido quanto à autorização da realização da despesa em causa, e, por conseguinte, verificou-se existir dúvida quanto a tal facto, o que implica que, nos termos do principio da presunção da inocência e de in dúbio pro reo, não se possa o mesmo considerar provado, maxime, não se pode considerar provado que o Recorrido atuou sem autorização superior. Porém, não obstante esta flagrante dúvida, os mencionados princípios foram completamente ignorados pelo Recorrente e, até, subvertidos, penalizando o Recorrido ao invés de determinar a sua absolvição, razão pela qual bem andou o douto Tribunal a quo ao julgar procedente a presente ação administrativa e declarar a nulidade da decisão impugnada.
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Outrossim, não pode proceder o argumento do Recorrente nos termos do qual a dúvida sobre a existência de autorização superior não tem relevância quanto à responsabilidade disciplinar do Recorrido, antes pelo contrário: tal dúvida não só faz acionar a aplicação do princípio do in dúbio pro reo ao caso concreto, como é suscetível de influir no grau de culpa do arguido, podendo determinar a exclusão da culpa e a não aplicação de qualquer pena, conforme bem evidencia a douta Sentença Recorrida.
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Com efeito, ficou provado, em primeira instância, que todos os atos praticados pelo A. foram-no na defesa dos interesses científicos e financeiros do LNEG, de modo a resolver uma situação de força maior, conforme expressamente reconhecido no Relatório Final do processo disciplinar, sendo que o Recorrido sempre agiu na convicção que a sua conduta era conhecida e aceite pela hierarquia – não obstante a dúvida probatória quanto a tal facto, que sempre determinaria a absolvição do Recorrido por força dos já mencionado principio do in dubio pro reo.
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E pese embora o Recorrido ter praticado as condutas que lhe são imputadas, não incorreu em qualquer ilícito disciplinar, uma vez que inexiste o primeiro requisito do comportamento ilícito: a culpa. Com efeito, não é possível afirmar a existência de consciência de culpa quando o Recorrido, ao adjudicar e efetuar os trabalhos que importaram a instauração do procedimento disciplinar que conduziu à decisão final e...
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