Acórdão nº 1207/11.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 25 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelBENJAMIM BARBOSA
Data da Resolução25 de Outubro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: 1. Relatório 1.1. - As partes e o objecto do recurso R…… S…., S.A.

, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente improcedente a impugnação judicial da liquidação de IRC, referente ao exercício de 2007, que deduziu, veio interpor recurso na parte em que decaiu em cujas alegações formula as seguintes conclusões: 1.ª O presente recurso vem interposto da parte da Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela R…., S…, S.A. (doravante simplesmente R…., Recorrente ou Impugnante) contra a liquidação de IRC que lhe foi dirigida, com respeito ao exercício de 2007.

  1. A Sentença em causa julgou improcedente a fundamentação aduzida pela Recorrente, e, em consequência, determinou a manutenção da correcção ao lucro tributável do grupo de sociedades tributado de acordo com o regime especial de tributação dos grupos (R...E…T…G…S) consubstanciada na desconsideração fiscal do custo relativo aos créditos incobráveis, deduzido pela impugnante com base no disposto no artigo 39° do CIRC. Alem disso, a decisão recorrida determinou a improcedência do pedido quanto a correcção — desfavorável ao sujeito passivo — promovida pelos serviços de inspecção fiscal ao nível da dedução dos prejuízos fiscais reportáveis, no montante de € 67.333.978,98.

  2. Tendo por base a fundamentação da decisão recorrida, defende a Recorrente que a Sentença está ferida de anulabilidade.

  3. Esta resulta, em primeiro lugar, de um deficiente julgamento quanto a matéria de facto provada. Com efeito, entende a Recorrente que grande parte dos factos de que o Tribunal se serviu para fundamentar a sua decisão não são considerados no probatório, existindo igualmente factos não controvertidos, susceptíveis de influenciar as opções de direito, que não são, de todo, considerados pelo Tribunal.

  4. Alem disso, e sem prescindir, entende a Recorrente que o Tribunal fez, em relação à correcção realizada ao nível da desconsideração fiscal do custo relativo aos créditos incobráveis, deduzido pela impugnante com base no disposto no artigo 39° do CIRC, uma interpretação e aplicação inidóneas do Direito consequentemente aplicável.

  5. Do teor da norma do artigo 39° do CIRC, decorre com toda a clareza que o artigo 39° do CIRC regula situações particulares da vivência empresarial — como sejam as situações em que resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência a incobrabilidade (definitiva) de determinados créditos — não acauteláveis por via da constituição de provisões (ou não acauteláveis integralmente por este meio ou não acautelados no caso concreto): o alcance deste preceito é justamente o de fazer presumir que, certificada a incapacidade de um devedor, no âmbito de um processo judicial, de recuperação de empresa, falência, insolvência, ou executivo, fica automaticamente legitimada a inscrição desse credito como custo.

  6. A questão a decidir nos presentes autos prende-se com a questão de saber, para os efeitos da mobilização do artigo 39° do CIRC — antes mesmo de ser lancada não da norma do artigo 23° do CIRC qual o momento processual relevante no processo de insolvência para a classificação de um crédito como incobrável (o momento em que a sentença que a decreta transita em julgado ou um qualquer outro momento que se lhe siga, bem como a todas as reclamações e vinificação de créditos, e pagamentos aos credores?).

  7. A resposta a este problema deve ser procurada, antes de mais, no próprio texto da lei, o qual constitui o ponto de partida do processo hermenêutico e também o seu limite, na medida em que não é possível considerar aqueles sentidos que não tenham nas palavras da lei qualquer apoio, um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso»: se o legislador tivesse querido que apenas o fim do processo de insolvência (decorridas as fases de reclamações e verificação de créditos, e pagamentos aos credores) servisse como meio de prova da incobrabilidade do crédito para efeitos da sua dedução como custo para efeitos de determinação da matéria tributável em sede de IRC, com certeza que o teria dito de forma inequívoca. Pelo contrário, ao ter escolhido uma fórmula da qual não resulta, mesmo que minimamente, essa exigência, havemos de concluir que não a quis erigir em requisito para a comprovação da incobrabilidade (cfr. n.º 3 do artigo 9.° do Código Civil).

  8. Por outro lado, também não são descortináveis os motivos que poderiam justificar que essa exigência devesse necessariamente ter que se reportar a um momento indeterminado do "fim" do processo de insolvência — desde que decorridas as fases das reclamações e verificação de créditos, e pagamentos aos credores ou, pior ainda, os motivos que poderiam justificar que essa exigência não pudesse ser considerada satisfeita com a certidão de sentença transitada em julgado.

  9. Acresce que, ter que aguardar pelo "fim" do processo de insolvência — decorridas as fases das reclamações e verificação de créditos, e pagamentos aos credores — significaria, face ao momento do trânsito em julgado da sentença de declaração de insolvência, o decurso de muito mais exercícios fiscais do que a necessidade de obediência ao princípio da especialização dos exercícios, consagrado no artigo 18° do CIRC, estaria apta a tolerar.

  10. Se se devesse entender que a ratio da norma do artigo 39° do CIRC — falamos da ratio, já que, como vimos, da sua literalidade não pode retirar-se esta asserção que o reconhecimento fiscal do custo relativo a um crédito sobre uma sociedade declarada insolvente (estado que revela, a partida, uma incapacidade de cumprimento das obrigações assumidas) depende do decurso de todas as fases que se seguem a esta declaração, para que serviria, afinal, o mecanismo nele consagrado? Em que situações seria entendida a consideração directa como custos ou perdas do exercício dos créditos incobráveis? Que sujeito passivo deixaria de considerar integralmente o custo por via da constituição de uma provisão para créditos de cobrança duvidosa, para, optando pelo expediente do artigo 39° do CIRC, ficar prejudicado no relevo fiscal da perda que, muito embora certa, tem que aguardar vários anos ate poder ser considerada? 12.ª A tudo o que vem dito, soma-se um argumento de coerência do sistema fiscal, que se prende com a compatibilidade do regime do reconhecimento como custo ou perda do exercício dos créditos incobráveis para efeitos do IRC, com o regime da dedução (rectificação do imposto) do IVA "respeitante a créditos considerados incobráveis em processo de insolvência quando a mesma seja decretada", ínsito na norma do n° 8 do artigo 7l° do CIVA.

  11. Confrontados os dois regimes, parece nítido que, quaisquer que sejam as consequências fiscais do reconhecimento de um credito como incobrável em resultado de um processo de insolvência devem ter-se por realizados logo no momento em que esta a decretada: a assim para efeitos do IVA — um imposto de cariz extremamente formalista e particularmente zeloso na adopção de medidas destinadas a evitar a fuga e a evasão fiscal — e não deve ser diferente para efeitos do IRC.

  12. Não é, de facto, possível atribuir ao texto do artigo 39° do CIRC a exigência que o Tribunal a quo garante dever ser imposta a recorrente: ao faze-lo, o Tribunal extravasa por completo os limites que lhe estão impostos no domínio da interpretação das normas e viola princípios de ordem constitucional, como sejam, o principio da legalidade (cfr. artigo 103° da CRP), o principio da igualdade (cfr. n.º 3 do artigo 104° da CRP) e o principio da tributação pelo lucro real (cfr. n.º 2 do artigo 104° da CRP), o que se invoca.

  13. A Recorrente entende que a sentença proferida pelo Tribunal a quo é ainda anulável por erro na percepção do direito aplicável a correcção dos prejuízos reportáveis também impugnada nos presentes autos.

  14. Não havendo neste momento qualquer decisão de mérito definitiva sobre as impugnações judiciais das liquidações adicionais a que respeitam as correcções promovidas pela Autoridade Tributaria a exercícios anteriores, nunca a Impugnante poderá ser imputada qualquer falta ou situação de incumprimento relativa aos factores nelas apreciados.

  15. A interpretação defendida pelo Tribunal a quo, a ser admitida, resultaria na possibilidade de o Estado, estando o seu crédito plenamente garantido, poder ainda assim arrecadar a receita em crise, paralelamente e com total alheamento do processo de execução fiscal onde corre tipicamente a cobrança coerciva do montante que perfaz esse seu crédito, o que não pode ser admitido.

* A recorrida FAZENDA PÚBLICA não contra-alegou.

* Neste TCAS o M.º P.º, emitiu parecer no sentido da confirmação da sentença recorrida.

* Após essa pronúncia a recorrente veio peticionar a ampliação do pedido, pretendendo que onde se lê “Termos em que deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado, com todas as legais consequências, designadamente a anulação da sentença recorrida” passe a ler-se: “Termos em que deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado, com todas as legais consequências, designadamente (i) a anulação da sentença recorrida (ii) a condenação da AT a restituir o imposto pago em 19.12.2013 – no montante de € 16.872.418,11 – e respectivos juros indemnizatórios, nos termos e para os efeitos dos artigos 43.º da Lei Geral Tributária e 61.º do CPPT”.

Alega, em síntese, que o pedido se baseia num facto superveniente, a regularização de dívidas de natureza...

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