Acórdão nº 01116/11.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelPedro Vergueiro
Data da Resolução25 de Maio de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 28-06-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por B...

na presente instância de OPOSIÇÃO relacionada com a execução originariamente instaurada contra a sociedade “C… Cerâmicas, Lda.”, e revertida contra o aludido B…, por dívida referente a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) do 1.º trimestre de 2008, no valor de € 9.832,64.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 181-186), as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…) A- Vem o presente recurso interposto contra a sentença proferida nos presentes autos que julgou a oposição procedente e, em consequência extinguiu a execução revertida contra o oponente.

B- O Tribunal ad quo decidiu no sentido de que o oponente “…a AT não fez prova de que o Oponente exerceu de facto a gerência da primitiva devedora no período temporal relevante (2008), deve essa falta de prova contra si ser valorada, concluindo-se pela inverificação dos pressupostos legais da responsabilização subsidiária do Oponente, que é, por isso, parte ilegítima na execução …” C- A Fazenda Pública não se conforma com o decidido, pois a prova testemunhal produzida demonstrou que o oponente exerceu de facto a gerência na sociedade devedora originária no ano de 2008.

D- A assinatura do oponente nos cheques, bem como nos contratos que a sociedade celebrava, vinculavam a sociedade, sendo atos puros de gerência.

E- O depoimento da testemunha arrolada pelo recorrido permitiu apreender que o ora recorrido praticou atos de representação em nome da sociedade devedora originária, e permitiu estabelecer um fio condutor no que respeita ao envolvimento do oponente na vida da sociedade, pelo que temos de concluir que fica demonstrada a prática de atos em representação da sociedade, como forma de assegurar o giro comercial da mesma.

F- Tendo em conta as norma reguladoras do cheque, o facto do oponente assinar cheques da devedora originária significa que detinha poderes de representação e de vinculação da sociedade.

G- A assinatura dos cheques por parte do recorrido consubstancia a prática de atos relevantes de gestão, que não podem ser descurados ou relativizados, pois ao assinar os referidos cheques relativos à devedora originária, fá-lo voluntariamente, mesmo fazendo-o a solicitação do irmão, tal quer dizer que o oponente assume que tem funções de representação da devedora originária.

H- A gerência é, por força da lei e salvo situações excecionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir atuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito, pelo que, o gerente goza assim de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade, e se os atos praticados por aquele respeitar às relações da sociedade com terceiros estamos no campo dos poderes representativos.

I- Entende a Fazenda Pública que a fatualidade provada, com a prova testemunhal, impõe a conclusão de que o oponente exerceu a gerência de facto na devedora originária no período temporal em causa nos autos, razão porque é responsável subsidiário pelas dívidas revertidas.

J- Conceber que sejam criadas sociedades em que se nomeiam gerentes para a prática de atos de representação da sociedade, praticando atos concretos e próprios de representação e vinculação da sociedade devedora (assinatura de cheques), sem que se retirem as devidas consequências, isto é, desresponsabilizando o seu autor, constitui uma contradição inaceitável, no que reside o erro de julgamento a que nos vimos reportando, e que, do nosso ponto de vista, padece a sentença recorrida.

K- Deste modo, deve ser alterado o item 10 do probatório passando a ter a seguinte redacção: - “ O oponente foi gerente de facto da “C... Cerâmicas, Lda.”, na medida em que praticou actos de gerência da sociedade, manifestada na assinatura dos cheques da devedora originária, documentos estes necessários ao giro comercial da sociedade e atividade típica de gerência”.

L- Sendo a divida exequenda proveniente de IVA de 2008, ganha particular relevância o disposto no artigo 24º da LGT que atribui a responsabilidade subsidiária tributária dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos das pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados, ainda que exerçam somente de facto funções de administração ou gestão naquelas, pelas dividas tributárias cujo facto constitutivo, ou prazo legal de pagamento ou entrega se tenha verificado no período em que exerceram o cargo.

M- O oponente foi revertido com o fundamento no nº 1 alínea b) do artigo 24º da LGT, como se pode aferir do despacho que ordena a reversão, datado de 22/10/2010, pelo que incumbia ao oponente provar que a falta de pagamento das dividas tributárias vencidas durante a sua gerência não lhe podia ser imputada, porque a inexistência ou insuficiência de bens na empresa que geriu não é da sua responsabilidade.

N- O recorrido não fez essa prova.

O- A douta sentença incorreu, pois, em nosso entender, em erro de julgamento sobre a matéria de facto, e ainda em erro de julgamento sobre a matéria de direito, consubstanciado este em errada interpretação e aplicação das normas legais citadas, violando o disposto no artigo 24º, nº 1 alínea b) da LGT, pelo que não se deverá manter no ordenamento jurídico.

Termos em que, Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.” Não houve contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em apreciar o invocado erro de julgamento ao nível da matéria de facto e em saber se o Recorrido exerceu a gerência efectiva ou de facto da sociedade originária devedora, no período em que para tal foi nomeado e em que nasceu a dívida exequenda identificada nos autos de molde a poder ser responsabilizado pelo pagamento da mesma.

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… 1. Em 05/08/2008, o Serviço de Finanças de Vila do Conde instaurou contra a sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, o processo de execução fiscal n.º 1902200801078267, para cobrança coerciva de dívida respeitante a IVA do 1.º trimestre de 2008, na quantia exequenda de € 9.832,64 – cfr. fls. 21 do processo físico.

  3. Em 31/03/2009, foi junta aos autos certidão da Conservatória do Registo Comercial, referente à sociedade “C... Cerâmicas, Lda.”, de onde constam, além do mais, as seguintes inscrições: «AP. 14/20000328 CONTRATO DE SOCIEDADE E DESIGNAÇÃO DE MEMBRO(S) DE ÓRGÃO(S) SOCIAIS FIRMA: C... CERÂMICAS, LDA.

    (…) OBJECTO: Comércio a retalho de material de bricolage, equipamento sanitário, ladrilhos e materiais similares CAPITAL: 49.879,78 Euros SÓCIOS E QUOTAS: QUOTA: 24.939,89 Euros TITULAR: J… (…) QUOTA: 12.469,94 Euros TITULAR: B...

    (…) QUOTA: 12.469,94 Euros TITULAR: R...

    (…) FORMA DE OBRIGAR/ÓRGÃOS SOCIAIS: Intervenção de dois gerentes (…) ÓRGÃO(S) DESIGNADOS(S): GERÊNCIA: B...

    Cargo: Gerente R...

    Cargo: Gerente (…)» – cfr. a fls. 28-35 do processo físico.

  4. Em 22/02/2010, o Serviço de Finanças de Vila do Conde lavrou informação no processo referido em 1), com o seguinte teor: O processo em apreço foi instaurado por pagamento em falta de IVA do período de 200803T, no valor de € 9.832,64.

    Dado não se ter verificado o pagamento das dívidas em causa, em termos processuais seguir-se-ia a penhora para garantia das mesmas, porém, verifica-se que os únicos bens em nome da executada, dois veículos automóveis com as matrículas …01 (marca Mitsubishi do ano de 2000) e …MS (marca Volkswagen do ano de 1999), já se encontram penhorados noutros processos da mesma empresa.

    Atendendo ao exposto, é manifesto que o resultado da penhora não será suficiente para satisfazer as dívidas em nome da executada, no valor total de € 126.101,96.

    A executada não tem quaisquer outros bens conhecidos, susceptíveis de penhora, nesta data.

    Assim, tendo em conta o disposto nos artigos 22°, 23°, 24° da Lei Geral Tributária e 153°, 159° e 160° do CPPT, com audição prévia nos termos do artigo 60° da LGT, e de acordo com informação da Conservatória do Registo Comercial de Vila do Conde, estão reunidos os pressupostos para a reversão contra os responsáveis subsidiários a seguir identificados, com vista à cobrança da dívida: B…, NIF 2…e R…, NIF 2…, que exercem o cargo de gerentes desde 09 de Agosto de 2004.

    – cfr. fls. 36 do processo físico.

  5. Em 22/02/2010, foi proferido despacho para audição do Oponente, em sede de reversão, no processo de execução fiscal referido em 1) – cfr. a fls. 38 do processo físico.

  6. Em 22/10/2010, o Serviço de Finanças de Vila do Conde lavrou informação no processo referido em 1), com o seguinte teor: O processo em apreço foi instaurado por dívidas de IVA (pagamento em falta) do período de 200803T, no valor global de € 9.83264.

    Verificada a insuficiência de bens em nome da devedora originária, por despacho de 22 de Fevereiro de 2010, foi ordenada a reversão contra B… e R…, pelo que foram enviadas notificações, através dos ofícios n.° 2262 e 2263, respectivamente, para, no prazo de 10 dias, exercerem o direito de audição prévia.

    Apesar de regularmente notificados, não juntaram ao processo qualquer elemento de defesa.

    – cfr. fls. 40 do processo físico.

  7. Na mesma data, o Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde proferiu...

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