Acórdão nº 00426/13.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelAlexandra Alendouro
Data da Resolução20 de Novembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES QUE COMPÕEM A SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE: I – RELATÓRIO O MUNICÍPIO DE C...

interpôs recurso jurisdicional do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra proferido em 26.03.2014 que julgou procedente a acção administrativa especial intentada pelo SINDICATO DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL (STAL), em representação dos associados identificados nos autos, e que consequentemente condenou o Recorrente a pagar-lhes, como extraordinário, todo o trabalho prestado no regime de jornada contínua, além das trinta horas semanais desde 1 de Janeiro de 2007, com os acréscimos em cada momento previstos, acrescidos dos juros de mora à taxa legal sobre o montante devido, desde o vencimento de cada prestação até integral pagamento.

*O Recorrente alegou e formulou as seguintes conclusões de recurso: “I - O serviço em que estão integrados os associados do Autor é, nos termos do artigo 42.º, n.º 2, alínea d), do Regulamento dos Horários de Trabalho do Município de C..., um serviço com regime especial de funcionamento, cujos horários de funcionamento e de trabalho não decorrem directamente do dito Regulamento, antes tendo de ser determinados pelo Presidente da Câmara Municipal ou por Vereador ou Dirigente com competência para tanto delegada; II - Ou seja, justamente por se considerarem de funcionamento especial - atentos os serviços que aí se prestam - a determinação do horário de trabalho dos trabalhadores que ali exercem funções carece da prática de um acto administrativo; III - Não tendo havido, após a entrada em vigor do Regulamento dos Horários de Trabalho no Município de C..., qualquer acto administrativo que, para o Serviço Urbano de Higiene - serviço em regime de funcionamento especial - estabelecesse um horário diferente daquele que, até aí, era praticado, deve considerar-se que os trabalhadores ali integrados - em que se incluem os associados do Recorrido - continuam a praticar o horário que, anteriormente, lhes foi estabelecido; IV - O Tribunal a quo, através do acórdão recorrido, substituiu-se ao Recorrente, no âmbito de poderes que só a este cabem - porque incluídos na sua margem de valoração própria -, fixando um horário de trabalho aos associados do Recorrido - fixação essa que, reitera-se, carece da prática de um acto administrativo -, incorrendo o acórdão recorrido dessa forma, em erro de julgamento, violando o princípio da separação de poderes; V - Na verdade, se os referidos serviços têm um regime especial cujo horário, nos termos do Regulamento, carece de ser fixado, previamente, por acto administrativo, não pode um tribunal, sem mais, determinar que o horário dos trabalhadores desse serviço de regime especial é o de jornada contínua de 30 horas - previsto no artigo 33.º, n.º 1 - para, acto contínuo, condenar ao pagamento do trabalho supostamente prestado a mais, a título de trabalho extraordinário; VI - Por outro lado, não obstante o Recorrido ter intentado uma acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido, o Tribunal a quo não condena o Recorrente a praticar um qualquer acto administrativo, antes o condenando, sem mais, ao pagamento aos associados do Recorrido “ … como extraordinário, todo o trabalho prestado além das trinta horas semanais desde 1 de Janeiro de 2007”; VII – O Tribunal a quo decidiu – sem haver, sequer, prova de comunicação apresentada pelos associados do Autor nos termos do aludido artigo 28.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 259/98 – condenar o Recorrente ao pagamento de trabalho extraordinário, na modalidade de “acréscimo na retribuição horária”, sem cuidar de que antes desse pagamento haja um acto administrativo que – tal como vinha peticionado pelo Recorrido – reconheça esse mesmo trabalho como extraordinário; VIII – O Tribunal a quo substitui-se, pura e simplesmente, ao Recorrente, naquilo que só ao Recorrente, compete fazer - autorização/reconhecimento de trabalho extraordinário -, violando, dessa forma, o princípio da separação de poderes; IX – O Recorrente é condenado a pagar aos associados do recorrido montantes a título de trabalho extraordinário sem que haja prova no processo de que esses trabalhadores comunicaram, tal como decorre do artigo 28.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 259/98, qual a modalidade de compensação por que optavam, nos oito dias subsequentes à prestação do dito trabalho extraordinário; X – Ao condenar o Recorrente no aludido pagamento, sem que estejam reunidos os pressupostos legais para o efeito, o acórdão recorrido incorre em erro de julgamento, violando o artigo 28.º, nº 5 do Decreto-Lei nº 259/98.”.

Termina pedindo a procedência do recurso e a revogação do acórdão recorrido.

*O Recorrido apresentou as seguintes conclusões de recurso: “a) O despacho do Exmº Presedente da Câmara Municipal e os horários que o mesmo determinou, que vinham sendo praticados pelos sócios do recorrido feneceram inquestionavelmente no dia 1/1/2007, com a entrada em vigor do “Regulamento dos Horários de trabalho do Município de Cimbra”, a que se reporta o ponto 2 da matéria de facto dada como assente, pelos motivos explanados na alínea A) do capítulo antecedente, designadamente porque o dito instrumento normativo expressava a vontade de não deixar de fora nem um único dos horários de trabalho, não ditando tal regime qualquer modalidade especial de horário de trabalho diário ou de jornada contínua; b) É incontornável que, por força da inércia dos órgãos e entidades competentes do Recorrente os sócios do recorrido continuaram sujeitos a um horário desconforme ao Regulamento, algo que jamais poderia ser assacado aos próprios trabalhadores que apenas cumpriam o que lhes foi superiormente determinado porque nunca lhes competiu por iniciativa própria estabelecer os horários segundo os quais prestariam o seu trabalho; c) Como muito bem sublinha o douto aresto sob recurso, os órgãos e entidades competentes do Recorrente optaram por manter os sócios do Recorrido sujeitos ao mesmo horário, daqui decorrendo não ser curial falar da ausência de um acto autorizando o trabalho suplementar, quando o que se verificou foi a manutenção esclarecida do horário em desconformidade com o regulamentar, ou seja, não se tratou de autorizar trabalho para além do regulamentar mas sim de impor que se perpetuasse o anterior; d) Acrescendo que em aqui acolhimento a doutrina do Supremo Tribunal de Justiça, veiculada pelo Acórdão acima citado, no sentido de que, se os órgãos e entidades competentes do Recorrente mantiveram os sócios do Recorrido sujeitos ao horário revogado, desconforme ao Regulamento, tendo a autarquia recebido e beneficiado do trabalho prestado para além do horário regulamentar, não haveria margem alguma para sustentar a oposição desta ao trabalho suplementar; e) Assim sendo, igualmente não é curial colocar-se a questão de que os trabalhadores abrangidos não fizeram a opção pela modalidade de compensação, quando nunca lhes foi transmitido ou dado a conhecer que desde 1/1/2007, estavam a cumprir trabalho semanal extraordinário; f) Por outro lado, sempre tal questão estaria suprimida pelo facto de os trabalhadores em causa terem requerido o pagamento, nem um pediu a compensação respectiva em tempo; g) Seriamos, por fim, confrontados, por uma situação de, tendo os órgãos e entidades competentes do Recorrente tomado aquele trabalho excedente a que sujeitaram os sócios do Recorrido, remunerando-os apenas com a retribuição base, de trabalho não remunerado que o nosso ordenamento jurídico e constitucional jamais admitiria importando também nesta vertente o Acórdão do Tribunal Constitucional citado pelo Acórdão do STA referenciado; h) São precisamente situações como aquela em apreço nos presentes autos, que constituem o campo privilegiado de aplicação do instituto da acção administrativa especial para condenação à prática do acto devido, no sentido de evitar procedimentos administrativos que se eternizem, permitindo que, em face do comportamento omissivo da Administração, seja permitido ao tribunal que decida como deve esta agir; i) Neste quadro o douto acórdão recorrido contém todos os elementos que a actuação da administração deveria observar, só tendo faltado, eventualmente, a alusão a “acto administrativo”; j) Transitando o acórdão em apreço, ocorrido o respectivo incumprimento pelo Recorrente, em sede de execução de sentença, o tribunal poderia emitir sentença que produzisse os efeitos do acto ilegalmente omitido; i) De onde o acórdão recorrido ter respeitado os ditames das normas do artigo 71º do CPTA.”.

Termina, requerendo que seja negado provimento ao recurso, confirmando-se na íntegra o douto acórdão recorrido.

*O Ministério Público notificado nos termos e para os efeitos previstos no artigo 146.º do CPTA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*Os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.

**lI – DEFINIÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES DECIDENDAS O objecto do presente recurso jurisdicional e, em consequência, o âmbito de intervenção deste tribunal, encontra-se delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas pelo Recorrente a partir da respectiva motivação – artigos 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 3, 4 e 5 e 639.º do Código do Processo Civil (CPC) ex vi artigos 1.º e 140.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) – sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, caso existam, e do disposto no artigo 149.º do CPTA, atenta a natureza “substitutiva” dos recursos jurisdicionais.

As questões suscitadas e a decidir reconduzem-se a saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento por: (i) ter sido proferida em violação do princípio da separação de poderes, em consequência do tribunal a quo se ter substituído à Administração na emissão da declaração de autorização de trabalho extraordinário prevista no artigo 34.º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 259/98, de 18/08; (ii) ter sido proferida com violação do disposto no...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT