Acórdão nº 00151/08.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução20 de Novembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Município de C… veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra de 23.09.2013 que confirmou a sentença de 11.05.2011 pela qual foi julgada procedente a acção administrativa especial intentada pela B... – Estacionamentos S.A.

para anulação da deliberação do executivo Municipal de 22.10.2007 que revogou a declaração de utilidade municipal de um parque de estacionamento da autora, com a inerente revogação da isenção de imposto sobre imóveis.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida violou o disposto no artigo 14º do Código de Procedimento Administrativo, julgando-o aplicável ao caso, quando a norma a aplicar é a que consta do artigo 12.º, n.º 4, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a dar suporte ao acto impugnado.

A recorrida contra-alegou, defendendo a manutenção do recorrido.

O Ministério Público não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I – A declaração de utilidade municipal do parque de estacionamento de que a recorrida é proprietária teve como pressuposto essencial a concessão de descontos especiais aos moradores e comerciantes da zona da Baixa de C... – os quais não foram concedidos – o que tem de ser visto como a aposição, no referido acto, de uma condição resolutiva, uma vez que os ditos descontos são essenciais à realização do sentido – utilidade municipal - desse mesmo acto.

II - O que resulta da deliberação de 22.11.2004 da Câmara Municipal de C… é que só se vê utilidade municipal do aludido parque de estacionamento se forem concedidos descontos especiais aos comerciantes e moradores da zona, uma vez que, caso contrário, teremos um parque de estacionamento com a mesma utilidade que tem qualquer outro.

III – Ainda que, perante uma condição resolutiva, houvesse apenas que declarar a caducidade do acto e não que proceder à respectiva revogação, o certo é que o facto de ter havido esta revogação não é susceptível de bulir, unicamente com base nesse motivo, com a norma que o Tribunal “a quo” entende ter sido violada pelo Recorrente, ou seja, o artigo 140.º do Código de Procedimento Administrativo.

IV – Caso se entenda que estamos perante a aposição de um modo e não de uma condição resolutiva, sempre terá de se considerar que se nos apresenta uma isenção de IMI – benefício fiscal – que tem como pressuposto necessário uma declaração de utilidade municipal.

V - Dependendo a dita isenção, única e exclusivamente, da declaração de utilidade municipal - o que torna aquela primeira um acto vinculado -, o “acto administrativo” a que alude o n.º 4, do artigo 12.º do EBF (actualmente artigo 14.º, n.º 4) tem de ser visto, neste caso em concreto, como reportando-se ao acto pressuposto – declaração de utilidade municipal - e não ao acto do Chefe do Serviço de Finanças que se limita a conceder a isenção com base na utilidade municipal.

VI – Permitindo o artigo 12.º, n.º 4, do Estatuto dos Benefícios Fiscais a revogação de actos administrativos com base no incumprimento das obrigações impostas ao beneficiário, a revogação do acto aqui em questão – mesmo considerando-se que nele foi aposto um modo – encontrava plena sustentação nesse artigo, pelo que não existiria, nesse caso, a impossibilidade revogatória a que alude a sentença recorrida.

VII – O acórdão recorrido faz errada aplicação do artigo 140.º do Código de Procedimento Administrativo, violando-o.

*II - Questão prévia: Invoca a recorrida o seguinte: Por Acórdão do TCA Norte de 03/05/2013, proferido no âmbito do recurso interposto pelo Município de C... (Proc. 151/08.3BECBR), foi decidido não conhecer daquele recurso e convolar o recurso em reclamação para a conferência, nos termos do acórdão uniformizador do STA nº 3/2012, de 05/06/2012, que veio consolidar o entendimento de que “Das decisões do juiz relator sobre o mérito da causa, proferidas sob a invocação dos poderes conferidos no art. 27º, nº 1, alínea i), do CPTA, cabe reclamação para a conferência, nos termos do nº 2, não recurso”.

Pressupõe necessariamente o Acórdão do STA e o Acórdão do TCA Norte, constante dos autos, que a reclamação para a conferência pudesse ainda ser apreciada pelo coletivo de juízes do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra por ter sido apresentada em tempo.

Certo é que o Acórdão recorrido, datado de 23/09/2013, não se pronuncia sobre tal questão, limitando-se a dizer: “Observando o doutamente determinado pelo Venerando TCA Norte, apreciando como «reclamação para a conferência», nos termos do disposto no nº 2 do artigo 27º do CPTA o recurso interposto contra a sentença proferida ao abrigo da previsão vertida na al. i) do nº 1 da referida norma, o Tribunal Colectivo decide substituir a decisão do relator pelo seguinte:” Sucede, porém, que a sentença do juiz singular havia sido proferida em 11 de maio de 2011, tendo sido enviada notificação às partes logo no dia seguinte.

O recurso então interposto pelo Município de C... deu entrada nos autos em 15/06/2011, ou seja, no final do prazo de 30 dias que terminava nessa mesma data.

Forçoso é, pois, concluir que de há muito havia sido ultrapassado o prazo de 10 dias previsto no art. 29º, nº 1, conjugado com o art. 27º, nº 2, do CPTA, para apresentação de reclamação para a conferência.

Na verdade, a convolação do recurso em reclamação para a conferência só é possível desde que tenha sido observado o prazo desta, como tem vindo a ser entendido em diversos acórdãos.

A propósito deste problema pode citar-se o Ac. do STA de 05/11/2013 (proc. 0532/13) que claramente esclarece no ponto III do seu Sumário: “Determinada a convolução de um recurso em reclamação para a conferência, a apreciação dos respectivos pressupostos cabe ao tribunal recorrido”, o que vem a seguir melhor explicitado no ponto 7. da fundamentação do referido Acórdão.

Como resulta do que ficou dito, não se verificam, neste caso, os pressupostos de admissibilidade da reclamação para a conferência que não deveria ter sido apreciada pelo coletivo de Juízes por extemporânea.

Está em causa a exceção dilatória da extemporaneidade que deveria ter sido conhecida pelo tribunal a quo, por força do disposto no artigo 578º do NCPC.

Não o tendo sido, não é vedado ao tribunal ad quem dela conhecer neste momento, o que se requer.” Vejamos.

O artigo 578º do actual Código de Processo Civil, dispõe o mesmo que dispunha o artigo 495º do anterior Código de Processo Civil: o tribunal deve conhecer oficiosamente, por regra, das excepções dilatórias.

O disposto neste preceito nunca impediu, no entanto, a aplicação das regras de preclusão processual, designadamente quanto à oportunidade de apreciação das excepções e questões a invocar pela partes ou de conhecimento oficioso.

Em particular, como decorre do disposto no art.º 676º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto nos artigos e 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no entendimento uniforme da nossa jurisprudência, o recurso jurisdicional versa sobre as concretas decisões judiciais impugnadas, estando fora do seu âmbito, salvo as que forem de conhecimento oficioso, decidir questões novas que não tenham sido previamente apreciadas pelo tribunal a quo (ver, por todos, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 28.01.2003, no recurso nº 48 363, de 06.10.2004, no recurso nº 722/04, e de 24.04.2007, no recurso 01181/06; e do Tribunal Central Administrativo Sul de 10.07.2008, no processo 03870/08).

Por outro lado, no contencioso administrativo só se podem conhecer das excepções até ao despacho saneador – artigo 87º, n.º2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

O Tribunal, em todo o caso, não pode apreciar questões já apreciadas por decisão com trânsito (formal) em julgado – artigo 672º e 673º do Código de Processo Civil de 1995 e artigos 620º e 621º do Código de Processo Civil de 2013.

Caso julgado que abrange os pressupostos imediatos, de facto e de Direito, da decisão (neste sentido ver o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07-12-2011, no processo n.º 0419/11; do Tribunal Central Administrativo Norte de 05.07.2012, processo 00437/11.6 BEAVR).

No caso concreto o acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 03.05.2013, determinou a convolação do recurso em reclamação, pressupondo, como a recorrida admite, que a reclamação podia ser apreciada por ter sido apresentada em tempo.

A convolação em reclamação tem como pressuposto lógico imediato – logo abrangido pelo caso julgado formal – a inexistência de obstáculos formais ou adjectivos, como a extemporaneidade, à convolação.

Ou seja, este acórdão decidiu, como pressuposto imediato, a questão que a recorrida quer ver apreciada, no...

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