Acórdão nº 01026/12.7BEBRG-B de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelJo
Data da Resolução10 de Outubro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Na ação administrativa comum supra indicada, instaurada por GV e outros contra Estado Português, BPP, S.A. (em liquidação); Massa Insolvente do BPP, S.A. e Incertos, o TAF de Braga, correspondendo a solicitação dos Autores, ordenou à Comissão Liquidatária do BPP que informasse sobre a identidade e domicílio daqueles a quem o BPP fez pagamentos depois de 01-12-2008.

A referida Comissão Liquidatária considerou-se impedida de fornecer tal informação porque isso implicaria violação do sigilo profissional e deduziu escusa nos termos do artigo 417º/3/c) do CPC.

Perante isto, nos termos dos artigos 417º/4 CPC e 135º/3 CPP, foi suscitado o presente incidente de derrogação de sigilo bancário.

*FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO*Os factos com interesse para a decisão deste incidente estão materializados nas peças processuais que constituem o presente incidente, destacando-se o seguinte: 1. No âmbito dos autos que correm termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, sob o número 1026/12.7BEBRG, e em que são AA., GMMPV, TCPFG, RMGMV e Réus, Estado Português, BPP, S.A. (em liquidação, Massa Insolvente do BPP, S.A. e “Incertos”, vieram os AA. solicitar se “intime a Comissão Liquidatária do BPP a trazer aos autos informação sobre a identidade e domicilio daqueles a que o BPP fez pagamentos depois de 01 de Dezembro de 2008, que agora são demandados como incertos, de modo a que possam ser pessoalmente accionados e citados”.

  1. Nos referidos autos os AA. peticionam, além do mais, se declare ineficazes em relação aos AA. os pagamentos efetuados pelo BPP, a incertos, depois de 01 de Dezembro de 2008, alegando, em suma, que tais pagamentos causam a diminuição da garantia patrimonial do crédito dos AA. e serem tais pagamentos indevidos e inexigíveis.

  2. Por despacho de 26.09.2013 a fls. 687 dos autos (e a fls. 146 deste incidente) foi determinado que se oficiasse “à Comissão Liquidatária do BPP, através da Massa Insolvente do BPP, S.A, para no prazo de 10 (dez) dias, informar os autos quanto à identidade e domicilio daqueles a que o BPP fez pagamentos depois de 1.12.2008, nos termos solicitados pelos AA.”; 4. A fls. 893 (fls. 2 e 3 deste incidente) veio a «Comissão Liquidatária do BPP, S.A. - Em Liquidação» deduzir escusa, nos termos do art. 417.º, n.º 3, al. c) do CPC, sustentando estar a informação em causa abrangida por segredo bancário nos termos do art. 78.º do RGICSF.

  3. Por despacho de 05-06-2014 o TAF de Braga julgou legítima a escusa referida no ponto anterior, por considerar que “atento o disposto no art. 78.º, n.º 1 e 2 do RGICSF estando em causa a revelação da identificação dos clientes (nomes e domicílios), tendo por referência movimentos nas suas contas, e sem que haja consentimento dos titulares, está a informação requerida pelos AA. sujeita a dever de segredo”.

*DE DIREITO*A questão a decidir é apenas esta: Se se justifica a derrogação do sigilo bancário perante a escusa legitimamente deduzida pela Comissão Liquidatária do BPP.

Como não tem sido objecto de apreciação frequente na Secção de Contencioso Administrativo do TCAN, justifica-se um esforço acrescido para enquadramento geral desta problemática.

*Os parâmetros gerais deste meio processual são sintetizados no Acórdão da 2ª Secção de Contencioso Tributário deste TCAN, de 19-05-2011, Proc. 00069/10.0BECBR-A, cujo sumário se reproduz (fazendo-se aqui a ressalva de que o mencionado artigo 519º nº3, c) e nº4 corresponde, com a mesma redacção, ao actual artigo 417º nº3 c) e nº4 do CPC): «I - Em matéria de segredo profissional, os ministros de religião ou confissão religiosa, os advogados, os médicos, os jornalistas, os membros de instituições de crédito e as demais pessoas a quem a lei permitir ou impuser que guardem segredo profissional podem escusar-se a depor sobre os factos abrangidos por aquele segredo - Cfr. artº135º do CPP; II - Havendo dúvidas fundadas sobre a legitimidade da escusa, a autoridade judiciária perante a qual o incidente se tiver suscitado procede às averiguações necessárias. Se, após estas, concluir pela ilegitimidade da escusa, ordena, ou requer ao tribunal que ordene, a prestação do depoimento - Cfr. nº 2 do mesmo comando jurídico; III - O tribunal superior àquele onde o incidente se tiver suscitado, ou, no caso de o incidente se ter suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o plenário das secções criminais, pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada face às normas e princípios aplicáveis da lei penal, nomeadamente face ao princípio da prevalência do interesse preponderante - Cfr. nº 3, ainda do artº 135º do CPP; IV - Do mesmo modo, no âmbito do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeira (RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31.DEZ, se contêm regras que definem o dever de segredo bancário, os seus destinatários, as suas excepções e as sanções pela sua violação, estando abrangidos pelo segredo bancário os factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações destas com os seus clientes, designadamente, os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias; V - No entanto, porque o segredo bancário não constitui um fim em si mesmo nem sequer um valor absoluto, a lei prevê diversas situações em que o mesmo pode ser derrogado em face de outros interesses públicos ou privados.

VI - O RGICSF, prevê as seguintes excepções ao dever de sigilo: – Autorização do cliente; – No âmbito dos poderes de supervisão e de controlo dos riscos; – Nos termos da lei penal e de processo penal; e – Quando exista outra disposição legal que expressamente limite o dever de segredo.

VII - Por outro lado, conforme resulta do enunciado no art. 519.º-3-c) do CPC, é legítima a recusa de colaboração com o tribunal se a obediência importar violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, mas, como logo se ressalva no mesmo preceito legal, sem prejuízo do disposto no n.º 4, que preceitua que uma vez deduzida escusa com fundamento na alínea c) do número anterior, é aplicável, com as adaptações impostas pela natureza dos interesses em causa, o disposto no processo penal...

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