Acórdão nº 1726/07.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução19 de Dezembro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório MZMCN, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada originariamente contra o Ministério da Saúde e Centro Hospitalar de VNG/E… EPE, tendente, designadamente, a declarar a nulidade do processo disciplinar que lhe foi instaurado, através do qual lhe foi aplicada pena de multa, inconformado com o Acórdão proferido em 11 de Novembro de 2013, que manteve a precedente decisão de 16 de Dezembro de 2011 que julgou “improcedente a presente Ação”, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferido em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.

Formula o aqui Recorrente/MZMCN nas suas alegações de recurso, apresentadas em 18 de Dezembro de 2013, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 274 a 294 Procº físico): “

  1. O tribunal recorrido, em despacho de 22/2/2010, considerou parte ilegítima o Centro Hospitalar de VNG, EPE, atento o facto de não ser o autor do ato punitivo final, mas a primeira decisão punitiva é do Conselho de Administração desse Centro Hospitalar, que é ato lesivo dos interesses do ora recorrente, sendo a decisão recorrida uma decisão confirmativa dessa decisão.

  2. Quem cobrou a multa referida foi o mencionado Centro de Hospitalar de VNG, EPE, pelo que o mesmo tem interesse direto na manutenção da decisão punitiva, pois, caso contrário, em sede de execução de eventual revogação da decisão punitiva é este Centro de Hospitalar de VNG, EPE que tem de devolver ao ora A. a quantia que, entretanto, já foi cobrada.

  3. Sendo manifesto o interesse direto e imediato do Centro de Hospitalar de VNG, EPE na presente ação, o mesmo é parte legítima, pelo que deve ser revogado o despacho que declarou parte ilegítima para os termos da presente causa o Centro de Hospitalar de VNG, EPE.

  4. Não é pelo facto de estar presente o mandatário do arguido que se pode suprir a falta do mesmo, dado que a sua intervenção técnica situa-se ao nível do aconselhamento jurídico e não ao nível do conhecimento fáctico, pois deste só o arguido tem conhecimento rigoroso e exato.

  5. No decorrer do seu depoimento a testemunha pode referir questões acessórias, como a presença de pessoas, as trocas de palavras, os gestos, etc., que, por muito bem que a inquirição tenha sido preparada, o mandatário pode não ter conhecimento, pelo que, sem que ao arguido seja reconhecido o direito de exigir a sua presença, bem como não lhe sendo reconhecido o direito de formular perguntas, tem de lhe ser reconhecida a faculdade de estar presente para efeitos de assessorar o seu mandatário nestas questões incidentais que podem ocorrer.

  6. O caso é tanto mais relevante quanto é certo que as testemunhas arroladas pelo arguido eram todas funcionários do Centro de Hospitalar de VNG, EPE e consequentemente estariam eventualmente “pressionadas” pelo Conselho de Administração respetivo que fazia uma campanha pessoal contra o ora arguido, pelo que acautelando situações destas, era absolutamente essencial, a presença do arguido para auxiliar o seu mandatário no ato de inquirição das testemunhas, nos mesmos termos em que o arguido pode estar presente ao julgamento em processo penal.

  7. Deve ser revogada a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a arguição da nulidade do processo disciplinar, por a realização do ato de inquirição das testemunhas arroladas pelo arguido, sem a sua presença, apesar de o arguido ter manifestado a vontade de estar presente, por ter violado o disposto no artº. artº. 42º., nº. 1 do EDF, interpretado de harmonia com o disposto no artigo 61º., nº.1, al. a) do Cod. Proc. Penal e com o artº. 32º., nº. 3 da Constituição da República.

  8. Não foi dado cumprimento ao dever de audição de interessados imposto pelo artº. 101º. do Código do Procedimento Administrativo, que seria útil no presente caso, dado que da acusação não consta qualquer referência aos documentos juntos e nem, por isso, o arguido sobre eles se pronunciou, a referência aos mesmos constitui uma questão nova, sobre a qual tem de haver a audição do arguido.

  9. A utilidade do direito de audição resultaria do facto de se alertar para a não consideração desses documentos e ter-se-ia demonstrado que os mesmos antecedem o seu pedido de nomeação para diretor do serviço de neurologia e que a sua nova posição sobre a matéria resultam exatamente deste novo requerimento.

  10. Por isso, por não ter sido dado cumprimento ao dever de audição de interessados imposto pelo art°. 100°. do Código do Procedimento Administrativo, dado que no relatório que serve de fundamentação do ato punitivo terem sido apreciadas questões de facto, sobre as quais o arguido não teve oportunidade de se pronunciar, por não constarem da acusação deduzida, o que constitui nulidade procedimental, que como tal deve ser declarada, considerando-se nula a decisão do processo disciplinar.

  11. Deve ser anulada a decisão punitiva, por não se referir quais os factos que estão provados e quais os não provados, a fim de se poder verificar da regularidade da sanção aplicada, entendendo a sentença recorrida que basta a mera referência para a acusação, a qual engloba factos e considerações de direito.

  12. A fundamentação tida em vista nos Acs. citados na sentença ora recorrida não refere que essa doutrina se aplique aos processos disciplinares, tendo em conta a especial natureza destes, pois, do mesmo modo que os Magistrados Judiciais não podem remeter na sentença final para a acusação, devendo discriminar os factos provados e não provados, também em sede disciplinar, essa enumeração deve ser feita.

  13. A referência genérica aos deveres violados como indiciando os factos provados, é manifestamente ilegal, pois é a partir dos factos provados que se vai concluir quais foram os deveres violados e não o contrário.

  14. Por isso, violou a decisão punitiva o disposto no artº. 65º., nº.1 do Estatuto Disciplinar ao aceitar como base da decisão, para a qual remete, um relatório do instrutor onde não consta a existência material dos factos, pelo que é nula.

  15. Os factos constantes da acusação dizem respeito a uma recusa do ora arguido em se pronunciar sobre qualquer assunto relativo ao funcionamento do Serviço de Neurologia, enquanto não fosse nomeado Diretor do mesmo, recusa esta que ocorreu, quer perante o Diretor Clínico, quer perante o Conselho de Administração, sendo certo que este não é superior hierárquico do ora A.

  16. O arguido recusou-se a pronunciar sobre assuntos organizativos ou administrativos do seu Serviço de Neurologia, dado que se não lhe é reconhecida capacidade para ser nomeado Diretor desse Serviço, apesar de ser o único Chefe de Serviço nele a trabalhar, então não pode, não quer e não deve pronunciar-se sobre as questões organizativas do mesmo, dado que essas questões devem constar do Plano de Ação a apresentar nos termos legais pelo Diretor de Serviço nomeado e da confiança do Conselho de Administração, e que este Conselho deve aprovar, pelo que a acusação nessa parte é formulada em termos genéricos e vagos, dado que a recusa do ora A. é apenas relativamente aos aspetos organizativos e/ou administrativos.

  17. Não tendo sido designado para tal, entendeu que os seus pontos de vista não mereciam a concordância do Conselho de Administração e decidiu remeter-se ao silêncio sobre aspetos administrativos do Serviço de Neurologia e tem direito a esse silêncio, pelo que a decisão ora recorrida padece de vício de fundamentação, pois não explicita os deveres funcionais violados pelo ora recorrente, com o seu comportamento silencioso, que permitam o seu sancionamento, salvo no que se refere ao dever de obediência e que adiante se responderá.

  18. Em todo o caso, deve ser anulada a decisão punitiva, pois não se demonstra que o ora A. tenha violado os deveres que lhe são impostos, tal como se encontram definidos no artº. 3º. Do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, nem os comportamentos que lhe são imputados integram a violação de deveres gerais mencionados na lei e suscetíveis de constituir infração disciplinar.

  19. Nos termos do artigo 3º., nº. 1 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local (EDF), “considera-se infração disciplinar o facto, ainda que meramente culposo, praticado pelo funcionário ou agente com violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função que exerce”.

  20. Os deveres funcionais que a acusação e depois a decisão do recurso hierárquico referem ter sido violados pelo ora respondente são os deveres de obediência, lealdade, zelo e correção, previstos nas alíneas b), c) (esta alínea não referida na acusação), d) e f) (esta alínea também não referida na acusação) do artº. 3º., nº. 4 do EDF.

  21. Ora, não se verifica a violação de qualquer desses deveres tal como eles emergem dos n.ºs 6, 7, 8 e 10 desse artigo 3º. do EDF, sendo que as únicas ordens em forma legal referidas na acusação foram as de comparência nas reuniões em 19 e 29 de Junho, onde o ora respondente esteve comprovadamente presente e as ordens referidas nos pontos 21 e 22, que o ora respondente acatou enviando os ofícios de que ora se juntam cópias.

  22. Não conhece o ora respondente – nem tal é referido, quer na acusação, quer na proposta de decisão final - qualquer norma legal ou regulamentar que lhe imponha ou a qualquer funcionário e em particular no sector clínico que obrigue os funcionários a apresentar propostas para alterar o funcionamento dos serviços.

  23. A ordem dada ao ora recorrente é ilegítima, porquanto não se conforma com a lei, nem com as anteriores decisões do Conselho de Administração, pois não faz parte das funções do ora A. enquanto médico com o grau de chefe de serviço, pronunciar-se sobre aspetos administrativos do serviços, salvo em substituição do diretor de serviço, o que não é o caso presente.

  24. Refere LEAL HENRIQUES, no seu Procedimento Disciplinar, 3ª. Edição...

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