Acórdão nº 00533/10.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2015 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório SARGA, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada contra o Centro Hospitalar de S. J..., EPE, tendente, em síntese e designadamente, a impugnar a decisão do diretor do serviço de urgência da referida entidade, de 18/12/2009, de “dispensar o exercício das suas funções” na VMER (Viaturas Médicas de Emergência e Reanimação), inconformada com o Acórdão proferido em 4 de Dezembro de 2013 (Cfr. fls. 309 a 331 Procº físico) “que julgou a presente ação improcedente”, absolvendo a entidade demandada do pedido, veio interpor recurso jurisdicional do referido Acórdão, proferido em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
Formula a aqui Recorrente nas suas alegações de recurso, apresentadas em 7 de Janeiro de 2014, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 336 a 360 Procº físico): “1./ Resulta da matéria dada por provada que a relação contratual existente entre a A./Recorrente e o R/Recorrido HSJ enquanto aquela prestava a sua atividade na VMER era uma relação de contrato de trabalho.
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/ A tal conclusão não obsta os factos de a atividade na VMER ser prestado mediante a organização de escalas, não existir qualquer acordo escrito entre a A./Recorrente e o Hospital que os vincule a prestar e a receber os serviços ao nível da VMER e até não haver por parte da Direção do SU do HSJ a obrigatoriedade de escalar os seus funcionários designadamente a A. para aquele serviço.
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/É que o vínculo laboral existente entre a A./Recorrente e o R/Recorrido HSJ, sempre que a A./Recorrente se disponibiliza para integrar as escalas e o R./Recorrido HSJ aceita aquela disponibilidade da A./Recorrente para integra-las, estende-se à atividade prestada pela A./Recorrente na VMER que ali é exercida em regime de subordinação jurídica do R/Recorrido HSJ 4./ Ao contrário do que concluiu a sentença recorrida, o afastamento da A/Recorrente das funções na VMER, consistiu numa sanção disciplinar sem precedência de processo disciplinar e logo nula.
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/ É que nos termos do Artigo 3.º nº1 da Lei n.º 58/2008 de 9 de Setembro, considerando-se infração disciplinar o comportamento do trabalhador, por ação ou omissão, ainda que meramente culposo, que viole deveres gerais ou especiais inerentes à função que exerce”, o Diretor do Serviço de Urgência ao imputar à A./Recorrente o “incumprimento reiterado de regras de condução de viatura de emergência VMER, com eventuais riscos para restantes elementos da viatura e outros utilizadores da via pública” imputou-lhe uma infração disciplinar por violação do dever de zelo e prudência pois, um dos deveres inerentes ao exercício das funções da A/Recorrente na VMER é naturalmente conduzir a respetiva viatura, cumprindo as regras do Código da Estrada para aquele tipo de viaturas, não pondo em perigo a vida dos tripulantes da viatura e demais utentes da via.
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/Tratou-se portanto de uma decisão disciplinar que visou sancionar um pretenso comportamento da A./Recorrente e não um mero ato de gestão ou administração de pessoal com motivações exclusivamente organizacionais.
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/Devem por isso ser julgados procedentes por provados os pedidos formulados pela A. nas alíneas a), b), c) e d) do pedido formulado na PI.
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/ Sem prescindir, mesmo que por hipótese que entenda que o ato de exoneração da A/Recorrente do exercício de funções da VMER foi tão só uma dispensa do exercício de funções, nem assim o comportamento do R./Recorrido deixou de ser ilegal por violação do princípio da boa-fé plasmado no Artigo 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, Artigo 6.º A do Código do Procedimento Administrativo e Artigo 86º da Lei n.º 59/2008 de 11 de Setembro 9./O princípio da boa-fé remete a Administração Pública para um padrão ético de comportamento na sua relação com os cidadãos, agindo de forma correta, leal e sem reservas.
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/Trata-se portanto de um princípio programático de comportamento que se materializa através da observância de dois outros princípios: O princípio da proteção da confiança; O princípio da transparência 11./O princípio da proteção da confiança remete-nos para a tutela da estabilidade dos atos da Administração Pública, como condição indispensável à segurança dos cidadãos e à permanência e estabilidade da ordem jurídica, ao passo que, o princípio da transparência convoca o direito e o dever de informação, de fundamentação e de participação dos cidadãos.
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/Estando a A/Recorrente ininterruptamente a prestar serviço na VMER entre 1997 e 2009 sem nunca lhe ter sido feita qualquer observação quanto à sua forma de conduzir, essa estabilidade levou-a a confiar que o R/Recorrente HSJ não dispensaria a sua atividade, pelo menos sem lhe dar a oportunidade de se defender e apresentar a sua versão dos acontecimentos que lhe eram imputados 13./Na vertente da transparência, no caso concreto, o princípio da boa-fé impunha por um lado que o R/Recorrido fundamentasse as imputações que fez à A/Recorrente concretizando pelo menos as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreram e não se ficasse por conceitos conclusivos, vagos e genéricos como ”incumprimento reiterado de regras de condução” “eventuais riscos para restantes elementos da viatura e outros utilizadores da via pública”. Por outro lado, o Principio da boa-fé impunha que o R/Recorrido convocasse a A/Recorrente a participar na decisão de a exonerar das funções da VMER, conferindo-lhe um direito de “audiência prévia” ou melhor permitindo exercer o contraditório que mais não é que é uma das garantias fundamentais dos cidadãos e das pessoas jurídicas e consiste essencialmente no direito que todas as pessoas têm de poder expor seus argumentos e apresentar provas ao órgão encarregado de decidir antes que a decisão seja tomada.
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/Temos assim que, também pela violação do principio da boa-fé a decisão de dispensar a A/Recorrente das funções da VMER seria nula 15./ Tendo ficado provados todos os pressupostos da responsabilidade civil do R/Recorrido HSJ ao permitir e consentir a exposição da carta e ao aplicar ilicitamente a sanção disciplinar, bem como os danos não patrimoniais sofridos pela A./Recorrente deve proceder o pedido de indemnização formulado.
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/ Das disposições conjugadas do Decreto- Lei nº 233/2005 de 29 de Dezembro, do Decreto-Lei 558/99, do Decreto-Lei nº 496/80 de 20 de Outubro, do Decreto- Lei 100/99 de 31 de Março, do Decreto-Lei nº 161/96 de 4 de Setembro, da Convenção 149 da Organização Internacional do Trabalho sobre o emprego e condições de trabalho e de vida do pessoal de enfermagem ratificada pelo Decreto-Lei 80/81 de 23 de Junho, do art. 258 nºs 2 e 3 do Código do Trabalho, da lei nº 12-A/2008 de 27 de Fevereiro bem como pelos princípios “ trabalho igual salário igual” e da “norma mais favorável ao trabalhador” tem por isso a A./Recorrente direito a receber relativamente às quantias anuais pagas pelo R/Recorrido HSJ a título de trabalho suplementar e trabalho na VMER, um duodécimo no subsídio de férias e outro duodécimo no subsídio de natal.
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/Revogando-se a sentença recorrida e proferindo-se Acórdão que acolha as conclusões precedentes e condene o R/Recorrido HSJ nos pedidos formulados na PI”.
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por despacho de 9 de Janeiro de 2014 (Cfr. fls. 367 Procº físico).
O aqui Recorrido/Centro Hospitalar veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 17 de Janeiro de 2014, concluindo do seguinte modo (Cfr. fls. 372 a 381 Procº físico): “1ª. A A. está vinculada ao Centro Hospitalar, ora recorrido, por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.
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Os médicos e enfermeiros afetos à VMER eram escolhidos pelo Diretor do SU e pela Coordenadora da VMER entre os funcionários do Hospital que se mostrassem diariamente disponíveis para aquele efeito.
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Só era escalado para os turnos da VMER quem fosse convidado e se disponibilizasse voluntariamente para os integrar.
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Por se tratar de um trabalho prestado em regime de voluntariado não existia, designadamente em relação à recorrente, qualquer acordo escrito que vinculasse as partes a prestá-lo e a recebê-lo.
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Face à inexistência de qualquer obrigatoriedade dos responsáveis do Recorrido em escalar a Recorrente para o Serviço da VMER a sua dispensa de tais escalas não implica qualquer violação da lei ou contrato, nem representa a aplicação de uma sanção disciplinar.
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A A. foi informada das razões que levaram os responsáveis da VMER a dispensá-la das respetivas escalas.
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Não se provou que foram os responsáveis do Recorrido quem afixou a carta enviada à Recorrente no placard colocado numa zona a que só tinham acesso os elementos afetos à VMER.
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Estando a Recorrente vinculada ao Recorrido por uma relação jurídica de emprego público está abrangida pela Lei 12-A/2008 que, no art. 70º n.º 3, refere que a remuneração base anual é paga em 14 mensalidades correspondendo uma delas ao Subsídio de Férias e outro ao Subsídio de Natal.
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A A. não tem, assim, direito a receber os Subsídios de Férias e Natal acrescidos dos suplementos que lhe eram pagos pelo serviço prestado na VMER.
Termos em que devem improceder as conclusões da Recorrente, e consequentemente declarar-se improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida”.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 26/02/2014 (Cfr. Fls. 394 Procº físico), nada veio dizer, requerer ou promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, importando verificar, designadamente, o suscitado, que, em qualquer...
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